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Felipe Santana Novais

Felipe Santana Novais

21/11/2014

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A máquina penal do Estado, instrumento de controle que busca garantir a paz social, nunca se comportou no Brasil de maneira tão atípica quanto nos últimos tempos. Após o Supremo Tribunal Federal condenar às agruras do cárcere figuras poderosas e influentes da República, o início da sétima etapa da operação lava jato surpreendeu por conta do cumprimento de diversos mandados de prisões preventivas e temporárias contra dirigentes e controladores das chamadas “grandes empreiteiras”, subvertendo a lógica do combate à corrupção adotada até aqui. Em boa parte, pode-se dizer que tal acontecimento foi possível graças aos avanços que o ordenamento pátrio tem vivenciado em relação à utilização da contribuição premiada, que ganhou um importante fôlego a partir da edição da Lei 12.850/2013 e a qual será melhor analisada no presente artigo.

O Juiz Federal Sérgio Moro, ao deferir os pedidos e expedir os mandados, observou que não obstante o tamanho e a notoriedade da operação e o fato de já terem sido presos diversos executores, o esquema criminoso investigado não aparentava estar desmantelado, inclusive, a partir de informações fornecidas por colaboradores (tratados em linguagem não técnica como “delatores”), foi possível contabilizar diversos pagamentos recentes aos operadores do esquema, o que demonstraria a suposta habitualidade criminosa e a reiteração delitiva dos empreiteiros, representando uma grave lesão à ordem pública. Além disto, entendeu que os investigados estavam tentando colocar em risco à instrução criminal, apresentando documentos falsos e intimidando testemunhas, e muitos estavam deixando o Brasil frequentemente o que, combinado com evidente poderio econômico destes, poderia resultar em fuga definitiva.

Sobre tais pontos, cumpre esclarecer que, neste momento, não estamos diante de um juízo condenatório, mas tão somente acautelatório e cujos principais escopos são os de tentar impedir que os supostos crimes continuem a ser praticados e permita que as investigações consigam avançar em seu curso natural para que possam os agentes estatais esclarecer, dentre tantas acusações, quais irão frutificar ou não. Logo, é recomendável que sejam apreciadas com a cautela que as garantias inerentes ao nosso Estado Democrático de Direito exigem em relação aos investigados.

Contudo, não restam dúvidas que, independente dos resultados, esta operação já se tornou uma importante referência na maneira como se investiga e combate a corrupção e o crime de lavagem de dinheiro em nosso país, desnudando as escusas relações entre agentes do mundo público e privado e implicando em relevantes consequências econômicas, políticas e sociais. No âmbito do direito penal, notadamente, demonstrou a importância das informações obtidas por meio da delação premiada, as quais serviram como formidáveis combustíveis para o avanço das investigações que buscam desmantelar tais esquemas ilícitos.

Antes de tudo, importa dizer que os grandes esquemas criminosos envolvendo lavagem de dinheiro e corrupção são, por óbvio, mais engenhosos e menos visuais que os demais crimes, o que denota um esforço maior das autoridades no momento de combatê-los. Não obstante o fato de raramente resultarem em reprimendas severas aos seus articulares, são tais esquemas responsáveis pela subtração de uma parte considerável dos recursos nacionais, fazendo com que seus efeitos, ainda que indiretos, sejam desastrosos e alcancem potencialmente considerável parte da coletividade. Neste sentido, tem-se como positivo o avanço do ordenamento jurídico e da jurisprudência sobre a contribuição premiada .

A força das contribuições interessadas daqueles que desejam se ver livres das reprimendas resultantes de suas condutas criminosas, fulcral para o avanço das investigações, parece-nos nitidamente relacionadas com os desdobramentos do julgamento da Ação Penal nº 470, alcunhada de “mensalão”, posto que a prisão em massa dos envolvidos resultou em uma valiosa lição aprendida tanto por corruptos quanto pelos corruptores de maneira fulcral e definitiva: engendrar uma estratégia de acobertamento dos membros mais importantes e influentes do topo da pirâmide criminosa, na esperança de mantê-los fortes para que estes, valendo-se de seus louros, arrastem a possível punição dos demais membros à poeira dos arquivos e da impunidade, já não parece um bom negócio.

O grande poder de fogo gerado a partir deste despertar geral, apenas reitera a importância do instituto, sendo que, indubitavelmente, a operação lava jato, tem se mostrado um exemplo irrefutável desta nova realidade.

A colaboração premiada foi introduzida no Brasil a partir das convenções de Palermo (art. 26) e Mérida (art. 37), ambas devidamente internadas em nosso ordenamento jurídico (Decretos nº 5.015/2004 e 5.687/2006) e, no âmbito das organizações criminosas, teve seu tratamento legal mais recente conferido pela Lei 12.850/2013[1].  Segundo Adalberto José Aranha, a contribuição se trata da “afirmativa feita por um acusado, ao ser interrogado em juízo ou ouvido na poli?cia, e pela qual, ale?m de confessar a autoria de um fato criminoso, igualmente atribui a um terceiro a participação como seu comparsa[2]

Em primeiro lugar, restringindo o escopo da análise aos dispositivos em comento e aos acordos realizados na operação lava jato, verifica-se que uma colaboração bem-sucedida pode implicar em benefícios substanciais para aquele que a ela se submete: desde o perdão judicial (extinguindo a punibilidade no âmbito penal) até a redução em 2/3 da pena privativa de liberdade ou substituição desta por restritiva de direitos, a depender da aceitação do magistrado. Para que, contudo, ela seja válida, a legislação exige que haja efetividade e voluntariedade na vontade de colaborar com o Estado, ou seja, aquele que se mostra interessado em contribuir, deve fazê-lo sem embargos e de maneira que, efetivamente, consiga atingir a organização criminosa ou o esquema fraudulento que fazia parte, caso queira receber alguma contrapartida.

Avançando em suas condicionais, a legislação impõe que, a partir da colaboração, seja possível o atingimento de ao menos um resultado efetivo, podendo tanto ser a identificação dos demais criminosos, a revelação da estrutura hierárquica e divisão de tarefas da organização criminosa, a recuperação total ou parcial daquilo que foi indevidamente arrecadado a partir das atividades ilícitas e/ou a localização de eventual vítima, desde que sua integridade física seja preservada.

Existem outros pontos trazidos pela legislação que são relevantes e merecem algum destaque, dentre eles, o fato de autorizar o membro do Ministério Público a deixar de oferecer denúncia ao colaborador, desde que este tenha sido o primeiro a delatar e não seja o líder da organização criminosa e a possibilidade de ocorrer a redução de até metade da sentença ou a progressão imediata de regime ao condenado.

Estes novos benefícios, sem dúvidas, tornam-se absolutamente atrativos aos que desejam se ver livres da cadeia e, sem dúvidas, conferem um fôlego enorme às autoridades que desejam investigar crimes complexos, estruturados em uma organização e praticados de maneira muito bem articuladas. Neste sentido, conferir um maior poder àqueles que conduzem um investigação, sem dúvidas, faz com o que o Estado tenha uma maior condição de fazer frente às organizações criminosas, muitas delas absolutamente poderosas e incrustadas em diversos setores da sociedade.

A nova lei, ainda muito nova em nosso ordenamento, vem mostrando seu potencial na operação lava jato. Nesta etapa, o foco das investigações já se encontra em um patamar avançado acerca de como o esquema funcionava, para muito além dos simples operadores, atingindo já o topo da pirâmide dos malfeitores que, possivelmente, sugaram bilhões do patrimônio público. Frise-se: dificilmente tais resultados teriam sido possíveis caso os operadores do esquema não tivessem feito acordos com a Justiça e, neste sentido, os autos da operações e as decisões prolatadas deixam pouca margem para dúvidas.

A partir de agora, com a detenção provisória de executivos das grandes empresas investigadas, supostamente no comando de um esquema criminoso, o efeito em cadeia pode ser ainda maior, já que agora serão eles que, no intuito de se livrarem das punições penais, podem se valer do mesmo instituto da contribuição premiada para revelar outras peças e personagens ocultos mais importantes e que estejam ainda mais posicionados no âmago da corrupção brasileira. A conferir.


[1] Sem prejuízo das demais leis que tratam sobre o assunto: Leis nº. 8.072/90, 9.034/95, 9.080/95, 9.613/98, 9.807/99 e 10.409/02.
[2] ARANHA, Adalberto Jose? Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. 5. ed. Sa?o Paulo: Saraiva, 1999. p. 122.
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