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PROCESSO PENAL

A Credibilidade da Prova Testemunhal no Processo Penal

AMEMORIABILIDADE

ART. 208 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

CREDIBILIDADE

FIDELIDADE

INFORMANTE

PROVA TESTEMUNHAL

TESTEMUNHA

TESTEMUNHABILIDADE

TESTEMUNHO

Guilherme de Souza Nucci

Guilherme de Souza Nucci

06/01/2015

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Testemunha é a pessoa que declara, sob o compromisso de dizer a verdade, de maneira imparcial, ter tomado conhecimento de algo interessante ao processo penal. Por isso, toda pessoa pode ser testemunha (art. 202, CPP). Aqueles que prestam declarações, sem o compromisso, são meros informantes, embora possam colaborar, igualmente, para a apuração da verdade real.

Quando se analisa a credibilidade do testemunho, deve-se iniciar pelo fator denominado testemunhabilidade, isto é, o interesse despertado na comunidade diante da declaração da ocorrência de um fato. Altavilla demonstra que esse interesse termina gerando fenômenos correlatos e conseqüenciais, tais como amemoriabilidade (capacidade que o fato possui de se fazer recordar com precisão), a fidelidade (situação subjetiva gerada no espírito da testemunha, consistente na capacidade de reproduzir com exatidão o que soube) e a sinceridade (situação subjetiva da testemunha, que se expressa sem a intenção de enganar). Sob tais prismas, por vezes, “um depoimento sem lógica, contraditório, é considerado pouco fiel, porque se julga que a testemunha não se recorda bem, ou então insincero, ao passo que os testemunhos correntes dão uma impressão de fidelidade e de veracidade; e pode ser o contrário, provindo o primeiro de uma dificuldade em se exprimir, ou de um fenômeno de timidez, ao passo que a naturalidade do segundo pode derivar de uma hábil preparação” (Psicologia judiciária, v. II, p. 251-252).

Diante disso, é essencial que o magistrado tome as cautelas devidas para interpretar e valorar um depoimento, conferindo-lhe ou não credibilidade, crendo tratar-se de uma narração verdadeira ou falsa, enfim, analisando-o com precisão. Pode dar-se a situação do fato-objeto do testemunho não ser memorável, razão pela qual a pessoa que o presenciou, no contexto da memória naturalmente seletiva que possui o ser humano, afaste-o, relegando-o a um segundo plano. Por isso, nem sempre a testemunha que vacila ao responder às indagações feitas pelo juiz, omitindo situações relevantes, está agindo de má-fé. Por outro lado, em se tratando de fato digno de registro na memória, é possível que a testemunha esteja sendo fiel e sincera ao narrá-lo, embora entre em contradição e ofereça respostas desconexas. Não está mentindo, mas realmente não se recorda, por variadas razões, do que houve. Argumente-se, ainda, que o fato memorável pode ser contado de modo infiel e insincero, mas de maneira perfeita e lógica, fruto, como se viu na lição de Altavilla, do mais arguto preparo. Está mentindo e o magistrado nem percebe. Em conclusão, pois, é curial ter o julgador a sensibilidade para compreender que as pessoas são diferentes na sua forma de agir, captar situações, armazená-las na memória e, finalmente, reproduzi-las. Descortinar e separar o depoimento verdadeiro e crível, do falso e infiel é meta das mais árduas no processo, mas imprescindível para chegar ao justo veredicto.

Outro aspecto extremamente importante é a declaração prestada por criança (sempre informante) e adolescente (informante ou testemunha, conforme o caso, já que podem prestar o compromisso a partir dos 14 anos, segundo o art. 208, CPP). Relatos nos mostram que muitos erros judiciários originam-se da credibilidade exagerada que magistrados concedem a essas informações. Justifica-se essa situação pela fragilidade tanto da criança quanto do adolescente para elaborar uma narrativa fiel dos fatos porventura assistidos, sem lançar qualquer fantasia ou mentira, frutos da inexperiência e da instabilidade psicológica e emocional dos seres em desenvolvimento.

Observa-se que a criança, por ficar sempre na superfície das coisas, quer por preguiça de espírito, quer por ignorância ou falta de hábito, termina guardando na memória poucos dados interessantes sobre determinado fato. O que é velho na sua memória sempre prejudica o novo. Assim, seu processo de associação de idéias é sensivelmente diminuído. Quando colocada para reconhecer algum suspeito, pode trazer à sua memória a imagem de pessoas conhecidas e não exatamente do agente do crime, prejudicando o reconhecimento ou terminando por reconhecer quem efetivamente não cometeu a infração penal. Tendo em vista que a memória da criança é frágil, muitas são as situações em que, forçada a se lembrar de algo importante, termina completando a sua falta de informação com dados extraídos da fantasia e da imaginação. O infante tem dificuldade de lidar com a noção de espaço e tempo, razão pela qual, desejando o juiz captar, exatamente, o que lhe significou determinado período, deve lançar mão de comparações. Assim, em lugar de falar em horário de adulto (19:00 horas, 23:00 horas etc.), precisa fazer referência ao horário da própria criança, como o momento em que almoça, janta, brinca, vai para a cama etc. Lembremos, ainda, que, por ser altamente sugestionável, jamais deve o magistrado completar-lhe frases, pedindo que confirme com um “sim” ou um “não”. A criança, para agradar quem a ouve, certamente terminará concordando com o almejado pelo interrogante.

Sob outro aspecto, a turbulência da adolescência apresenta apenas algumas diferenças com a fase infantil. Deve-se continuar a ter cautela com determinados depoimentos, agora, especialmente, no contexto sexual, pois o desenvolvimento do ser humano, nessa fase, é marcado pelo descobrimento da sua sexualidade. Tal situação pode acarretar perturbações sensoriais, emotivas e psicológicas, razão pela qual a fantasia ingressa nas suas narrativas, também como forma de suprir determinadas frustrações e incompreensões. Segundo estudos realizados, somente a partir dos 14 anos começa a pessoa a se tornar mais confiável nos seus relatos, o que, aliás, redundou no já mencionado art. 208 do Código de Processo Penal.

Por fim, outro fator interessante que o juiz pode e deve levar em consideração é a natural diferença entre os depoimentos prestados por homens e mulheres, especialmente pelo fato de que cada um dos sexos capta, armazena e reproduz o que viu ou ouviu de maneira distinta e peculiar, havendo divergente intercomunicação entre o racional e o emotivo de cada um. O homem é mais racional, enquanto a mulher é mais influenciada e condicionada pela emotividade ao apreender acontecimentos, guardando-os na memória. Por outro lado, quanto à impulsividade, a mulher apresenta-se mais instável e não constante no seu comportamento, gerando decisões mais rápidas, imprevistas e até inesperadas. Tende, pois, a descontrolar-se mais facilmente no depoimento, que é um ato formal e cerimonioso. No aspecto intelectivo, a mulher possui inteligência mais analítica do que o homem, captando particularidades de um fato de maneira mais hábil, embora tenha dificuldade de ordenar o que captou, apresentando em visão unitária ao juiz. Cabe a este ter a devida paciência para extrair o conjunto da narrativa. Pequenos detalhes para a mulher são fundamentais, enquanto para o homem, irrelevantes. Na verdade, a testemunha do sexo masculino fornece um quadro mais unitário do que viu e ouviu, embora não se possa exigir do homem muitos detalhes, pois é da sua própria formação intelectiva não armazená-los. Em matéria de captação de elementos sensíveis, muito peculiares aos crimes sexuais, contra a honra, passionais em geral, a testemunha-mulher tem maiores condições de descrição do fato, até porque trabalha com a intuição, apreendendo elementos que ao homem passam desapercebidos (cf. Mario Fedeli, Temperamento, caráter, personalidade – ponto de vista médico e psicológico, p. 228-229).

Em suma, a tarefa do julgador, ao analisar a credibilidade da prova testemunhal, é um exercício de sensibilidade e paciência, representando, muitas vezes, um autêntico jogo de comparações e confrontos.


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