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João Eduardo Lopez Queiroz

João Eduardo Lopez Queiroz

21/09/2015

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Segundo Willian A. Robson, a ideia de criação de Agências Reguladoras “apareceu em meados do século XIX, na Inglaterra, como um instrumento para a regulação dos ferrocarriles (linhas de ferro) no interesse público. Se tratava da noção de democracia capitalista victoriana sobre a forma de conciliar o interesse público em um serviço monopolístico de capital importância com o afã de lucro próprio das sociedades por ações. A ideia se estendeu de pronto aos Estados Unidos e a Comissão Reguladora tem passado a ocupar, neste país, uma extraordinária importância, tanto no Governo Federal como no dos Estados. As comissões reguladoras independentes estão representadas ao nível federal por instituições tão formidáveis e poderosas como a Interstate Commerce Comission, a Securities and Exchange Comission, o Civil Aeronautics Board, e quiçá uns vinte ou mais organismos similares que constituem o que o Presidente do Committe on Administrative Management qualificou em 1937 como a quarta arma do Governo”.[1]

Na segunda metade do século XIX, surgem, portanto, nos EUA as primeiras agências de regulação. O campo histórico do estudo dos entes regulatórios está diretamente atrelado à criação das Comissões Regulatórias – Agências Reguladoras – nos EUA, principalmente com a Interstate Commerce Comission (ICC), em 1887.

Édson Nunes afirma que, “em 1887, nasceu a primeira agência regulatória americana, a Interstate Commerce Comission (ICC), conforme modelo federativo-progressista, com o objetivo de regulamentar preços e evitar a concentração excessiva do setor ferroviário”.[2] A Interstate Commerce Comission (ICC), em 1887, surge, portanto, para a organização das tarifas ferroviárias e taxas de armazenamento para cereais, depois que os poderosos proprietários das ferrovias e dos silos tentaram elevar os preços para o uso de suas instalações.

Após essa Agência, muitas outras sobrevieram, sempre na tentativa de preservar o bem-estar social com a regulação, principalmente com a crise americana de 1929. Juan José Montero Pascual, nesse sentido, afirma que “o New Deal da década dos 30 reforçou o modelo de regulação por Comissões Independentes. A depressão econômica foi tão profunda que obrigou as autoridades públicas a repensar suas funções. A resposta do Governo Federal foi uma maior intervenção encaminhada a substituir os mecanismos de mercado que, por uma parte, eram acusados de haver provocado a depressão, e, por outro, haviam sofrido um colapso e eram incapazes de governar certos setores. Assim se generalizou a regulação econômica nos setores básicos, com o fim de estabilizá-los através da fixação de barreiras de entrada e da imposição de ajustes de preços aos operadores privados. Se criam assim a Federal Power Commission (1930), a Federal Communications Commission (1934), e a Securities and Exchange Commission (1934)”.[3]

Dessa forma, o autor realça a importância dessas comissões reguladoras independentes criadas no New Deal para toda a teoria da regulação, pois elas “respondiam a um equilíbrio de interesses. Por uma parte, defendiam as empresas do setor de diversas ameaças: a Depressão, a Intervenção Local, a intervenção das autoridades antitruste e inclusive da concorrência de novos atores. Por outra parte, defendiam os consumidores da ameaça das subidas excessivas de preços”.[4]

As Comissões Reguladoras independentes federais encarregadas do controle de serviços de utilidade pública exerciam, pela imposição de obrigações jurídicas, de fazer ou de não fazer, um controle contínuo e concentrado sobre uma série de indústrias, em princípio com o objetivo de defender interesse geral limitando a liberdade de contratação dos atores privados do setor. As principais condutas eram: a) obrigar as empresas privadas a oferecer seu serviço a todo aquele que o requeresse sob circunstâncias razoáveis; b) obrigar a requerer preços razoáveis por meio da limitação da liberdade de fixação de preços, determinando às comissões apresentarem a tabela de preços permitidos. Para manter esse sistema estável, foi necessária a criação de barreiras de entrada a produtos estrangeiros.[5]

As agências reguladoras surgem, portanto, como intermediadoras entre o Estado e os prestadores de serviços de atividade econômica,[6] o que exigirá do administrador público, a partir de agora, a diminuição considerável de suas características burocráticas e a ampliação de suas características negociadoras, ou seja, passa-se de uma administração burocrata para uma gerencial, todavia a sua mera criação e introdução no sistema não gerarão os efeitos desejados se a qualidade de suas regulações não alcançar níveis satisfatórios.

Portanto, para se avaliar o desenvolvimento das Agências Reguladoras faz-se necessário analisar o quadro da Regulação no Brasil, comparado com outros países, dentro do contexto adequado. Daniel Kaufmann, Aart Kraay e Massimo Mastruzzi[7] se encarregam, desde 2003, da apuração desses dados e da sua disponibilização. Esses pesquisadores partem do conceito de “Qualidade Regulatória” para apuração dos resultados, em que, segundo a sua metodologia, a “qualidade regulatória capta a percepção da capacidade do governo para formular e implementar políticas públicas e regulações sólidas, que permitem e promovem o desenvolvimento do setor privado”.[8]

A qualidade da regulação é um dos indicadores básicos de governança regulatória. Luiz Alberto dos Santos explica que “a governança regulatória não se resume, porém, ao enfrentamento de temas relacionados apenas à organização e funcionamento das agências reguladoras e órgãos supervisores ou formuladores das políticas setoriais. Ela se insere em um contexto maior que diz respeito ao funcionamento do governo como um todo, no exercício de suas capacidades e em suas relações com a sociedade e agentes econômicos. Essa governança é ainda mais complexa em virtude dos fatores determinantes da democracia, tão representativa quanto a governança democrática ou democracia participativa, que surge a partir das demandas cada vez mais intensas da sociedade organizada e dos grupos de interesse”.[9]

Kélvia Albuquerque, após explicitar sua concepção de regulação com um sentido geral de instrumentos jurídico-normativos que visam promover o bem-estar social e econômico dos seus cidadãos, admite que “a intervenção regulatória passou a ganhar extrema importância em razão da crescente complexidade e da mutabilidade das economias, além da necessidade de resolver complexos problemas sociais. A qualidade da regulação, sendo esta uma das principais ferramentas de atuação dos governos nas últimas décadas, passou a ser fundamental para a efetividade da ação governamental e para o desenvolvimento econômico dos países”.[10]

Dentro do conceito de intervenção regulatória, dada a amplitude de seus objetivos, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE)[11] identifica três grandes categoriais de regulação:[12]

a) Regulação econômica: diz respeito à intervenção governamental nas decisões empresariais relativas a determinados mercados quando estes falham em emitir sinais corretos, via mecanismo de preços, que garantiriam as escolhas adequadas e, assim, maximizariam o bem-estar social.

b) Regulação social: refere-se à intervenção governamental para a proteção de interesses públicos relevantes, como saúde, segurança e meio ambiente.

c) Regulação administrativa: consubstancia-se na série de exigências governamentais e formalidades administrativas necessárias para assegurar a aplicação das normas, tais como o preenchimento de formulários e outros documentos.

A seguir, apresentaremos os gráficos disponibilizados pelo Banco Mundial analisando a qualidade regulatória, e, em seguida, faremos uma análise crítica.

O primeiro gráfico envolve os países-membros da OCDE, os não membros e a posição do Brasil.

1

Em uma escala de qualidade de 0 a 100, o Brasil atinge 55, o que é considerado razoável, mas muito longe da escala alcançada pelos países-membros da OCDE (89) e mesmo do somatório dos países não membros (77).

No quadro em que se comparam os países da América do Norte, Central e do Sul, percebem-se algumas variações interessantes.

Claramente, o Brasil se encontra em melhor situação do que países em constantes crises econômicas, tais como Argentina, Bolívia, República Dominicana e Equador. Todavia, se compararmos a países um pouco mais estáveis, como Costa Rica, México, Peru, Porto Rico e Uruguai, o Brasil acaba sendo superado.

Se compararmos com os países desenvolvidos da América, EUA, Canadá e Chile,[13] a situação é destoante. O EUA, que é o terceiro entre eles, atinge percentual acima dos 85%, enquanto Canadá e Chile alcançam percentuais acima de 92%.

2

Entretanto, o próximo quadro, atualmente, é o de maior interesse para o Brasil, pois o comparamos com os países em desenvolvimento.

3

Ao analisarmos esse quadro, percebe-se que o Brasil (55) se encontra atrás de México (67) e África do Sul (64). Todavia, está bem à frente de China (43), Rússia (37) e Índia (34).

Seria até um alento, se não fosse pelo fato do nosso país ter organizado uma estrutura regulatória por meio da criação de dez Agências Reguladoras e ainda contabilizar outros órgãos reguladores em sua estrutura (BACEN, CADE, CONAB, entre outros).

Portanto, a qualidade regulatória no Brasil necessita de maior cuidado, pois, embora tenhamos todo um aparato para realizar a regulação, na prática o nosso desempenho não é proporcional aos investimentos dispostos na manutenção da estrutura de nossas Agências e outros órgãos reguladores.


[1] ROBSON, William A. Industria nacionalizada y propriedad pública. Madrid: Tecnos. 1964. p. 27-28.
[2] NUNES, Édson. Agências regulatórias. Revista de Direito Público Econômico, Belo Horizonte: Fórum, n. 2, p. 183, abr.-jun. 2003.
[3] PASCUAL, Juan José Montero. La desregulación estadounidense y la última crisis del servicio público en Europa. Boletín Mexicano de Derecho Comparado – Nueva Serie, año XXXI, n. 94, p. 108, enero-abr. 1999.
[4] PASCUAL, Juan José Montero. La desregulación estadounidense y la última crisis del servicio público en Europa. Boletín Mexicano de Derecho Comparado – Nueva Serie, año XXXI, n. 94, p. 108, enero-abr. 1999.
[5] PASCUAL, Juan José Montero. La desregulación estadounidense y la última crisis del servicio público en Europa. Boletín Mexicano de Derecho Comparado – Nueva Serie, año XXXI, n. 94, p. 108, enero-abr. 1999.
[6] Nesse sentido, Eros Roberto Grau leciona: “‘Ao afirmar que serviço público é tipo de atividade econômica, a ela atribui a significação de gênero no qual se inclui a espécie, serviço público’.
“‘Ao afirmar que o serviço público está para o Setor Público assim como a atividade econômica está para o Setor Privado, a ela atribui a significação de espécie.’
“Daí a verificação de que o gênero– atividade econômica ­– compreende duas espécies: o serviço público e a atividade econômica” (GRAU, Eros. A ordem econômica na Constituição de 1988. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 103).
[7]KAUFMANN, Daniel; KRAAY, Aart;  MASTRUZZI, Massimo. The Worldwide Governance Indicators: Methodology and Analytical Issues – The Worldwide Governance Indicators are available at: www.govindicators.org. Disponível em: <http://info.worldbank.org/governance/wgi/index.aspx#doc>. Acesso em: 29 ago. 2015.
[8] Disponível em: <http://info.worldbank.org/governance/wgi/index.aspx#doc>. Acesso em: 29 ago. 2015.
[9] SANTOS, Luiz Alberto. Desafios da governança regulatória no Brasil. In: PROENÇA, Jadir Dias; COSTA, Patrícia Vieira da; MONTAGNER, Paula (Org.). Desafios da regulação no Brasil. Brasília: ENAP, 2006. p. 119-120.
[10] ALBUQUERQUE, Kélvia. A visão da Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. In: PROENÇA, Jadir Dias; COSTA, Patrícia Vieira da; MONTAGNER, Paula (Org.). Desafios da regulação no Brasil. Brasília: ENAP, 2006. p. 83-86.
[11] Criada em 1961, a OCDE visa ajudar os países associados na busca do crescimento econômico sustentável, com equilíbrio fiscal, contribuindo para o desenvolvimento da economia mundial. Os países-membros são: Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Coreia, Dinamarca, Eslováquia, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Nova Zelândia, Noruega, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Tcheca, Suécia, Suíça e Turquia. Israel, Chile, Estônia e Eslovênia também estão sendo aceitos como membros.
[12] Cf. OCDE. The OECD Report on Regulatory Reform– Synthesis. Paris, 1997, p. 6. Disponível em: <http://www.oecd.org/dataoecd/17/25/2391768.pdf./>. Acesso em: 22 ago. 2015.
[13] Consideramo-lo desenvolvido pelo fato de a OCDE tê-lo aceito como membro.

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