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NOVO CPC

PROCESSO CIVIL

Recorribilidade das interlocutórias e sistema de preclusões no Novo CPC – primeiras impressões

AGRAVO DE INSTRUMENTO

AGRAVO RETIDO

NOVO CPC

PRECLUSÕES PARA AS PARTES

PRECLUSÕES PARA O JUIZ

SISTEMA DE RECORRIBILIDADE DE INTERLOCUTÓRIAS

Heitor Vitor Mendonça Sica

Heitor Vitor Mendonça Sica

07/04/2016

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Área do Direito: Processual; Civil

Resumo: O presente texto propõe-se a analisar o novo sistema de recorribilidade de interlocutórias no novo Código de Processo Civil brasileiro e os seus reflexos no regime de preclusões daí decorrente.

Palavras-chave: Agravo de instrumento, Agravo retido, Preclusões para as partes, Preclusões para o juiz

Riassunto: Il testo si propone ad analizzare il nuovo sistema di impugnazioni contro le ordinanze nel nuovo Codice di Procedura Civile brasiliano e suoi riflessi nel regime dele preclusione processuali

Parole chiavi: Ricorso contro ordinanze – Preclusioni per le parti – Preclusione per il giudice.

1. O velho problema da recorribilidade das interlocutórias: breve retrospectiva histórica do direito luso-brasileiro[1]

Barbosa Moreira, em sua clássica obra Comentários ao Código de Processo Civil[2], reconhece que todo sistema processual se defronta com o “problema delicado” da recorribilidade das decisões interlocutórias[3], o qual inclui não apenas delimitar as suas hipóteses de cabimento, mas igualmente a forma pela qual o recurso se processará, o momento de eficácia do efeito devolutivo (imediato ou diferido) e a aptidão ou não de suspender o curso do processo e/ou a eficácia da decisão recorrida.

As escolhas feitas nesse terreno interferem diretamente nos valores mais caros ao sistema processual[4] e, por essa razão, colhe-se nos sistemas processuais contemporâneos e ao longo da História[5] uma miríade de soluções já experimentadas

Na evolução do Direito luso-brasileiro, a questão sempre suscitou polêmicas e, num arco temporal de aproximadamente 600 anos, recebeu tratamentos bastante distintos. Uma breve análise retrospectiva convém para demonstrar a origem do agravo, como modalidade recursal tipicamente luso-brasileira, entre os Séculos XIV e XVI, e os problemas que daí advieram e com os quais o sistema processual brasileiro se vê às voltas até hoje.

No final do Século XIII, D. Afonso III, Rei do então recém-criado Estado Português, baixou lei instituindo a apelabilidade de todas as decisões, que eram classificadas em “sentenças definitivas”, “sentenças interlocutórias” (para a terminologia atual, sentenças terminativas) e “interlocutórias simples” (para nós, interlocutórias tout court). À época, os recursos eram dirigidos ao Rei e sua Corte, e a referida lei tinha o intuito claro de reforçar o poder do soberano na distribuição de justiça.

Anos depois, já no início do Século XIV, D. Afonso IV, alegando que as partes valiam-se maliciosamente das apelações para embaraçar os processos, proibiu a recorribilidade das interlocutórias, exceto daquelas que implicavam o término do processo (isto é, as “sentenças interlocutórias”) e daquelas que poderiam causar dano não passível de reparação pela sentença definitiva[6]. A partir da então, as interlocutórias, uma vez proferidas, não podiam jamais ser revogadas, deixando as partes totalmente desamparadas em casos de injustiças.

Daí é que o procedimento começou a se flexibilizar, conforme também atestam as Ordenações Afonsinas (3.67.2), facultando-se ao juiz revogar a qualquer tempo as “interlocutórias simples”, de ofício ou por requerimento da parte formulado em até dez dias de sua prolação.

E se o juiz não quisesse revogá-las mesmo após pedido da parte? Exatamente aí está a gênese do recurso de agravo. Nessa hipótese, ante o descabimento da apelação e a recusa do juiz em revogar a decisão, impunham as Ordenações Afonsinas (3.67.5) que o juiz deveria extrair o Extormento de agravo” ou a Carta testemunhável”, que eram os meios pelos quais o agravado – litigante que sofrera agravo (rectius, prejuízo) emergente da decisão interlocutória – levava à Corte uma queixa sem forma ou figura de juízo[7].

Pouco a pouco, o nome agravo passou a designar o remédio que se voltava contra o prejuízo surgido da interlocutória inapelável[8], até que, nas Ordenações Manuelinas, editadas definitivamente em 1521, o agravo apareceu como recurso ordinário, em variadas formas, quais sejam: (a) o agravo de instrumento; (b) o agravo de petição (ambos eram cabíveis nos mesmos casos, mas tinham formas diferentes e que eram aplicadas a depender da distância entre o domicílio do recorrente e a órgão que julgaria o recurso); (c) o agravo no auto do processo (originalmente cabível contra “decisões interlocutórias simples dos sobrejuizes, ouvidores, desembargadores ou corregedor e em dois casos específicos: contra a decisão de recebimento da apelação ou da sopricação”[9] e que foi criado “para atender à necessidade de possibilitar a reparação do gravame causado às partes pelas interlocutórias simples”[10]), e, finalmente, (d) o agravo ordinário (anteriormente denominado sopricação, cabível como recurso ao cume da hierarquia judiciária[11]).

As Ordenações Filipinas, de 1603, mantiveram todas as formas de agravo previstas nas Ordenações Manuelinas[12], e vigeram no Brasil até meados do século XIX, quando passaram a ser paulatinamente derrogadas por legislação editada após a Proclamação da Independência[13].

O principal diploma a afastar as Ordenações Filipinas foi o Regulamento n. 737 (editado em 1850 inicialmente para aplicação somente às causas comerciais e, após, estendida para as causas cíveis em geral, por força do Decreto n. 763, de 1890). Esse diploma, reputado por muitos um verdadeiro “Código de Processo Comercial”, manteve apenas o agravo de petição e o agravo de instrumento, mas excluiu o agravo no auto do processo[14] e o agravo ordinário[15].

Os Códigos Estaduais, editados entre as Constituições de 1891 e 1937, foram profundamente influenciados pelas Ordenações Filipinas e pelo Regulamento n. 737, mesclando soluções adotadas no sistema recursal de ambos[16], com pequenas variações quanto às modalidades do agravo[17].

Já o Código de Processo Civil brasileiro de 1939 trouxe algumas inovações[18], ao prever que as decisões interlocutórias “simples” (i.e., que não punham termo ao processo) eram divididas em três categorias: (a) as decisões (taxativamente) listadas no art. 842[19] eram impugnáveis por agravo de instrumento; (b) as decisões também exaustivamente enumeradas pelo art.851 eram desafiáveis por “agravo no auto do processo”[20] (reintroduzido no ordenamento, após ter sido abandonado pelo Regulamento n. 737); e, por fim, (c) as demais decisões não referidas em nenhum dos dispositivos, das quais não se permitia recorrer. Contra essas decisões irrecorríveis eram bastante comuns a impetração de mandado de segurança e o manejo da correição parcial[21].

O Anteprojeto que deu origem ao CPC de 1973 se propunha declaradamente a alterar esse estado de coisas, conforme se infere de sua Exposição de Motivos, da lavra do então Ministro Alfredo Buzaid. Lá se dizia que a instituição de um regime de ampla recorribilidade em separado das interlocutórias seria o único meio de conviver com “litigantes, impacientes de qualquer demora no julgamento do recurso”, que acabavam por “engendrar esdrúxulas formas de impugnação”. Assim, essa opção seria uma medida de conformismo diante da impossibilidade de se “modificar a natureza das coisas” (Capítulo IV, Seção II, item 15). Buzaid também criticava a diferenciação das hipóteses de cabimento dos recursos com base no conteúdo das decisões, e não com base na forma (Capítulo V, itens 26 a 34), sendo esse outro pilar de sustentação do sistema recursal que veio a ser erigido pelo CPC de 1973.

O Anteprojeto originalmente suprimia a figura do agravo no auto do processo, sob o argumento de que ele não apresentava vantagens em relação ao agravo de instrumento o qual, por sua vez, era compatível com a oralidade processual haja vista que não suspendia o curso do procedimento em 1º grau (Capítulo V, item 30). Contudo, a doutrina da época não se convenceu desse argumento e se levantou em defesa da manutenção do “agravo no auto do processo” de tal modo que, durante a tramitação do Projeto no Congresso Nacional, foi ele reinserido[22], agora sob a nova denominação de agravo retido.

Instituiu-se, então, regime de ampla recorribilidade das interlocutórias, com livre possibilidade de o litigante escolher a forma do agravo (retido ou de instrumento)[23].

As opções manifestadas pelo CPC de 1973 trouxeram alguns problemas novos e não resolveram alguns problemas antigos.

Primeiramente, continuava a se mostrar altamente inconveniente a forma de interposição do agravo de instrumento herdada do CPC de 1939, isto é, mediante petição dirigida ao juízo de 1º grau, ao qual cabia instruir o recurso com as cópias indicadas pelo recorrente, colher a resposta do agravado, para, apenas então, remeter o recurso ao tribunal. Mesmo sem suspensão do curso do feito de origem, o simples processamento do recurso atentava severamente contra a celeridade, atravancando o normal andamento do feito em 1º grau.

Ademais, o regime de recorribilidade das decisões interlocutórias instituído pela versão original do CPC de 1973 não fez desaparecer, como se propunha, o mandado de segurança contra ato judicial, que continuou a ser usado, mas com finalidade diversa: em vez de atacar decisões interlocutórias irrecorríveis (que não mais existiam), passou a ser usado concomitantemente ao agravo de instrumento manejado para esse fim, com a finalidade única de suspender a eficácia da decisão recorrida (haja vista que tal providência não era passível de ser obtida por força do recurso, sobretudo face à demora de seu processamento em 1º grau).

A Lei n. 9.139/95 se propôs a enfrentar essas duas mazelas.

O primeiro problema foi resolvido mediante drástica alteração do procedimento do agravo de instrumento, que passou a ser interposto diretamente no tribunal, munido de cópias extraídas pelo próprio litigante (art. 525).

Já o segundo problema foi resolvido mediante a atribuição, ao relator do recurso, do poder de a ele conferir efeito suspensivo (art. 527, II e 558).

Esses dois avanços jamais foram abandonados nos quase 20 anos seguintes de vigência do CPC de 1973 e, como se verá adiante, continuaram prestigiadas pelo CPC de 2015.

Essa reforma legislativa ainda trouxe modificações para o agravo retido. Primeiramente, tornou-se possível, embora não obrigatório, que sua interposição fosse feita oralmente contra as decisões proferidas em audiência (art.523, §3º), salvo no âmbito do procedimento comum sumário, em que a interposição oral em audiência se mostrava, aí sim, forçosa (art.280, III[24]). A forma retida também se tornou obrigatória em outros dois casos: (a) contra decisões relativas a provas no âmbito do procedimento sumário (art.280, III[25]); e (b) contra decisões tomadas depois da sentença (art.523, §4º).

Como se vê, pela primeira vez desde 1973, introduziu-se em nosso sistema regra excepcionando o regime de ampla recorribilidade em separado das interlocutórias, mas limitada a situações bem específicas.

A simplificação do procedimento do agravo de instrumento e o incremento em sua eficácia, somados à generalização das tutelas de urgência (notadamente mercê do novo art.273 do CPC de 1973), contribuíram para uma notável proliferação dessa modalidade de recurso em nossos Tribunais a partir de 1995[26]. O congestionamento dos tribunais tornava-se ainda mais severo pelo fato de que essa mesma reforma lhes atribuiu carga extra de trabalho, ao lhes transferir providências antes executadas em 1º grau (como a realização de exame de admissibilidade dos agravos de instrumento e colheita de contrarrazões[27]).

Ademais, se por um lado desapareceram os mandados de segurança destinados a atribuir efeito suspensivo ao agravo[28], por outro o sistema passou a contar com uma série de “agravos internos”.

Essas razões levaram o legislador a mais uma vez reformar o regime do agravo, por meio da Lei n. 10.352/01. Embora de forma tímida, o diploma aprofundou a tendência já antes verificada, de ampliar os casos de agravo retido[29]. Para tanto, instituiu-se a obrigatoriedade de agravo retido contra todas as decisões proferidas em audiência de instrução, independentemente do procedimento (art. 523, §4º) e, de modo inteiramente inovador, atribuiu-se ao relator do poder de converter o agravo de instrumento em agravo retido (art.527, II) sempre que a decisão recorrida não tratasse de “provisão jurisdicional de urgência” e não houvesse “perigo de lesão grave e de difícil ou incerta reparação”. A conversão era passível de ataque pelo agravo interno.

O resultado da Lei n. 10.352/2001 foi considerado decepcionante. Mesmo à míngua de estatísticas, era possível afirmar que a exigência da forma oral para o agravo retido contra decisões proferidas em audiência de instrução teve impacto mínimo. Já a conversão do agravo de instrumento em retido mostrava-se pouco interessante, pois era mais simples para o relator processar o agravo de instrumento de uma vez, do que se sujeitar ao agravo interno contra a sua conversão em retido.

É nesse cenário que veio a lume a Lei n. 11.187/05, a qual representava nova tentativa de limitar o uso do agravo de instrumento. Em vez de dispor que o relator “poderá converter” o agravo de instrumento em retido (como resultava da reforma de 2001), o art. 527, II, do CPC de 1973 passou a dispor que o relator “converterá” o recurso em retido “salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os autos ao juiz da causa”. Tratava-se de um comando imperativo, que restava reforçado pela eliminação do “agravo interno” contra a decisão que decretava a conversão do agravo de instrumento em retido.

Aparentemente essas soluções engendradas ao longo de uma década de reformas processuais não se mostraram inteiramente satisfatórias em termos de redução do congestionamento dos tribunais por agravos de instrumento.

Uma das possíveis explicações para isso está no fato de que o legislador continuou a deixar os litigantes livres para “arriscar ” a interposição de agravo de instrumento, pois mesmo que não houvesse risco de “lesão grave e de difícil reparação”, o pior que poderia acontecer seria a sua conversão em agravo retido.

Note-se que sempre houve razões eloquentes para que as partes preferissem o agravo de instrumento ao retido, pois o tribunal, ao julgar a primeira modalidade, não tem a considerar o risco de jogar por terra a sentença e, eventualmente, grande quantidade de atividade processual desempenhada pelo juízo de 1º grau.

Ademais, a essa altura pode-se afirmar que a aposta feita no agravo retido partiu de premissas erradas. Imaginava-se que os litigantes valiam-se exageradamente do agravo de instrumento com o objetivo primordial de evitar a preclusão e, para isso, o agravo retido bastaria. Contudo, o que os litigantes pretendiam, ao optar pelo agravo de instrumento em detrimento do retido, era provocar o imediato reexame da questão recorrida, sabedores de que o reexame da mesma questão apenas posteriormente, em caráter preliminar do julgamento da apelação, não passaria incólume pelo receio do tribunal em pronunciar uma nulidade processual, com potencial de contaminar diversos atos subsequentes, incluindo-se em particular a própria sentença apelada.

Não bastasse, o STJ não pôde escapar do reconhecimento de que a indevida conversão do agravo de instrumento em retido ensejava impetração de mandado de segurança[30].

Por fim, há que se considerar também que o critério utilizado para definir o cabimento ou não do agravo de instrumento foi a existência de “lesão grave e de difícil reparação”. Qualquer advogado minimamente preparado poderia argumentar consistentemente, na maioria dos casos, sobre o risco de graves danos se a decisão interlocutória, atacada por agravo de instrumento, não fosse revista de imediato[31]. Às decisões interlocutórias sempre se reservou o exame de questões processuais, de cuja solução depende a validade dos atos subsequentes. Logo, sempre que se posterga a análise de uma questão incidental, assume-se o risco de pronunciar no futuro uma nulidade, a qual tende a contaminar muitos atos praticados em seguida.

Em outro texto[32], ponderei, com base em uma passagem bíblica[33], que “o legislador [em 2005] foi imprudente ao fazer sua construção sobre um terreno arenoso (consistente em um conceito juridicamente indeterminado), e não sobre a rocha (consistente em rol taxativo de hipóteses), expondo-a, assim, às enchentes e ventanias que o seu implemento prático trará”. Ao final, vaticinei: “Só o tempo dirá se a inovação legislativa sobreviverá a essas intempéries. Tudo indica que não”. Pois essa previsão se mostrou certeira: a solução legislativa construída em 2001 e aperfeiçoado em 2005 não sobreviveu, e foi agora abandonada pelo CPC de 2015.

2. Primeira alteração promovida pelo CPC de 2015: cabimento do agravo de instrumento apenas em hipóteses taxativas

Conforme acima destacado, o CPC de 1939 optara pela indicação de um rol taxativo de decisões que desafiava agravo, sendo parte delas pela forma instrumental (art. 842) e parte sob a forma retida (rectius, no “auto do processo”, ex vi do art. 851).

Já o CPC de 1973, em sua redação original, optou pela ampla recorribilidade imediata, outorgando ao recorrente a possibilidade de escolher a modalidade (de instrumento ou retido). As reformas processuais operadas no presente século mantiveram a ampla recorribilidade imediata, mas passaram a limitar o cabimento do agravo de instrumento e dar preferência pelo agravo retido, a tal ponto que, após 2005, o agravo de instrumento passou a ser cabível apenas contra “decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento”.

A solução dada pelo CPC de 2015 representa um parcial retorno à sistemática do CPC de 1939, pois contempla um rol taxativo de matérias passíveis de ataque exclusivamente por meio do agravo de instrumento (art.1.015)[34], quais sejam:

a) Tutela provisória (inc. I): O CPC de 2015 reúne sob a denominação “tutela provisória” os fenômenos da tutela de urgência (cautelar e satisfativa) e a tutela da evidência, disciplinadas nos arts. 294 a 311. A análise da tramitação do projeto que veio a se converter no CPC de 2015 permite inferir que foi proposital a largueza da redação do dispositivo[35], de modo que são agraváveis quaisquer decisões relativas às tutelas provisórias, seja no tocante à sua concessão (isto é, a decisão que a defere, a que nega, a que revoga e a que modifica), bem como aquelas atinentes à sua efetivação (como, por exemplo, a que exige indevidamente caução[36], a que determina meios de apoio à execução específica[37]). Seja como for, se bem interpretado, o par. ún. do mesmo art. 1.015 cobriria as decisões proferidas em sede de efetivação da tutela provisória, à qual se aplica “no que couber” o regime da execução provisória (art. 297, par. ún.).

b) Mérito do processo (inc. II): A leitura desse inciso remete imediatamente ao disposto no art. 356, segundo o qual o juiz pode decidir “parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles: I – mostrar-se incontroverso; II – estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355”, isto é, as hipóteses de julgamento antecipado do mérito, equivalente ao que o art. 330 do CPC de 1973 chamava de “julgamento antecipado da lide”. O Código traz ainda outros exemplos de decisões parciais de mérito agraváveis, tais como a decisão proferida na primeira face da ação de exigir contas (art. 550, §3º[38]) e a decisão que se limita a decretar a dissolução parcial de sociedade (art. 603, caput), postergando a análise quanto aos haveres. Contudo, se o dispositivo quisesse se limitar a essas hipóteses de apreciação de um dos pedidos formulados pelo autor, teria se referido apenas ao “julgamento antecipado parcial do mérito”. Assim, é forçoso inferir que são agraváveis também as decisões que, embora sem julgar procedente ou improcedente parte(s) do(s) pedido(s) – ou seja, sem julgar o mérito propriamente dito –, enfrenta alguma “questão de mérito” (que com ele não se confunde[39]). Exemplo corriqueiro é a da decisão proferida no curso do processo e que rejeita a alegação de prescrição ou decadência: embora aprecie matéria de mérito, não julga o mérito (apenas remove um obstáculo ao exame da procedência ou improcedência do pedido)[40].

c) Rejeição da alegação de convenção de arbitragem (inc. III): O réu está sujeito ao ônus de alegar a existência de convenção de arbitragem na contestação (art. 337, X), sob pena, de não o fazendo, sujeitar-se à preclusão (art. 337, §6º). Se o juiz acolher a alegação, extinguirá o processo sem resolução de mérito (art. 485, VII), e essa decisão será apelável (art. 203, §1º c.c. art. 1.009, caput[41]). Contudo, se a rejeitar, determinará o prosseguimento do processo perante a jurisdição estatal. Ao permitir que o réu interponha agravo de instrumento, o CPC prestigia a arbitragem, permitindo imediato controle da solução dessa questão.

d) Incidente de desconsideração da personalidade jurídica (inc.IV): O incidente de desconsideração da personalidade jurídica permite que, em “todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial” (art. 134), a parte ou o MP, quando intervier (art. 133), peça a citação (art. 135) dos sócios da pessoa jurídica que já é litigante ou da pessoa jurídica formada pelos sócios que já são litigantes (art. 133, §2º), com o fim de que se discuta o cabimento ou não da desconsideração (direta ou inversa, respectivamente). Apenas se deferida a desconsideração é que se amplia subjetivamente a relação processual. A amplitude do dispositivo permite afirmar que é cabível o agravo de instrumento tanto contra a decisão final do incidente, quanto contra a decisão que indeferir o pedido de instauração (art. 135), quanto, finalmente, a decisão que indeferir provas requeridas nos termos do art. 135[42]. O cabimento amplo de agravo contra decisões proferidas no incidente instaurado no cumprimento de sentença ou na execução fundada em título executivo extrajudicial, também encontra amparo na norma mais ampla constante do par. ún. do mesmo dispositivo. Por fim, compete notar que a norma se refere exclusivamente à hipótese de instauração de incidente, não se aplicando à hipótese em que a desconsideração foi requerida na petição inicial e o juiz a deferir. Nesse caso, tratar-se-á de decisão que reconhece a legitimidade passiva de um dos réus (sócio ou da sociedade, a depender do caso) e esse tipo de decisão não é passível de recurso. Já na hipótese de o juiz rejeitar a desconsideração pleiteada na peça inicial, em realidade estará excluindo um dos réus do polo passivo e, como tal, essa decisão é recorrível com fundamento no inc. VII (exclusão de litisconsorte).

e) Rejeição do pedido de gratuidade de justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação (inc. V): O 99, caput e §1º reza que “o pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso” ou, ainda, “por petição simples”, seguindo-se decisão do juiz. Se o pedido for rejeitado, dessa decisão caberá agravo de instrumento por parte do requerente. Se o pedido for deferido, essa decisão não é agravável e caberá à parte contrária apenas apresentar, perante o próprio órgão prolator da decisão, a impugnação à concessão do benefício “na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples” (art. 100). Se a impugnação for acolhida (isto é, o benefício for revogado), a decisão é agravável, mas se a impugnação for rejeitada (isto é, a gratuidade de justiça for mantida), a decisão não comporta agravo de instrumento. Convém ainda ponderar ainda que, a meu ver: (a) não cabe agravo contra a decisão que determina que o requerente do benefício produza prova acerca de sua condição financeira (art.99, §2º ); (b) cabe recurso contra a decisão que deferir parcialmente o benefício (art. 99, §6º ), na parte em que indeferiu o benefício integral (se esse foi o pedido formulado); (c) parece razoável defender o cabimento de revogação ex officio do benefício, hipótese em que também caberia o agravo; e (d) o agravo de instrumento contra a decisão que indeferir ou revogar o benefício está dispensado das custas judiciais até decisão do relator a respeito (arts. 99, §7º e 101, §1º e §2º) de modo que, em caso de indeferimento, a parte disporá de prazo para recolhê-las.

f) Exibição ou posse de documento ou coisa (inc. VI): O dispositivo tem duas partes. A primeira se refere ao meio de prova regulado nos arts. 396 ao 404 e, da maneira como foi redigido, compreende qualquer decisão a respeito, isto é: (a) a que defere ou indefere o pedido de exibição; (b) a que defere ou indefere a produção de prova requerida pela parte contra quem foi formulada a exibição para o fim de justificar que o documento ou coisa não se acha em seu poder (arts. 398 e 402); (c) a que aplica a presunção de veracidade prevista no art. 400; e (d) a que determinar medidas sub-rogatórias ou coercitivas para cumprimento da medida decretada em face de terceiro (art. 403). Mostra-se ilógico e incoerente o tratamento dado a esse específico meio de prova, sobretudo com tal amplitude, sem estendê-lo a outros meios de prova. Uma solução mais equilibrada seria permitir apenas ao terceiro valer-se desse recurso. Já a segunda parte do dispositivo, atinente à “posse” de documento ou coisa, refere-se a decisões interlocutórias que mandam uma parte entregar documento ou coisa por força de reação de direito material e, como tal, mostrar-se-ia desnecessária em razão do disposto no inciso I desse mesmo artigo.

g) Exclusão de litisconsorte (inc. VII): A ilegitimidade ad causam é matéria cognoscível por provocação do interessado e também ex officio (art. 337, XI e §5º) e pode ser reconhecida apenas quanto a parte dos litigantes, de modo a não extinguir o processo por completo (art. 485, II), e sim permitir que o processo continue a tramitar sem o litisconsorte desprovido de legitimidade. Coerente à nova definição de sentença acolhida no art. 203, §1º, trata-se de decisão interlocutória e, por força do dispositivo ora em comento, agravável. Por fim, entendo que não caberá agravo de instrumento nos seguintes casos: (a) contra a decisão que rejeita a alegação de ilegitimidade e mantém o litisconsorte na relação processual; (b) contra a decisão que procede à exclusão do réu original e a sua troca por outro sujeito, nos termos dos arts. 338 e 339, pois não se trata propriamente de “exclusão de litisconsorte” e, ademais, ambos os dispositivos pressupõem concordância do autor[43]; (c) recurso interposto pelo autor apenas contra o capítulo da decisão que fixa as verbas honorárias em favor do réu que foi citado, contratou advogado, se defendeu e restou excluído[44].

h) Rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio (inc. VIII): O art. 113, §1º, autoriza o juiz, de ofício ou a requerimento do réu, a “limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes na fase de conhecimento, na liquidação de sentença ou na execução, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa ou o cumprimento da sentença”. O dispositivo aqui comentado se refere apenas à decisão que rejeita o pedido, da qual pode agravar o réu, para o fim de afastar injusta dificuldade ao exercício do seu direito de defesa. Já os autores nada poderão fazer de imediato contra a decisão que defere o pedido. E mesmo no procedimento da apelação contra a sentença final, a arguição de tal questão se revelará totalmente inócua. Os litisconsortes que permaneceram na relação processual sequer teriam legitimidade para ventilar essa matéria, ao passo que os litisconsortes que foram excluídos poderiam, quando muito, recorrer na qualidade de terceiros interessados, com dificuldades bastante grandes para demonstração de interesse processual.

i) Admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros (inc. IX): Por “intervenção de terceiros” há de se entender todo mecanismo destinado a integrar à relação processual sujeito que dela originalmente não figurava (à luz da petição inicial), de modo espontâneo ou provocado, com ou sem ampliação do objeto litigioso[45]. Assim, à exceção da intervenção do amicus curiae (cujo deferimento ou indeferimento é irrecorrível, por força do art. 138), forçoso reconhecer que o principal foco do dispositivo está nas hipóteses reguladas no Título III do Livro III da Parte Geral do Código (arts. 119 ao 137), isto é, assistência, denunciação da lide, chamamento ao processo e desconsideração da personalidade jurídica[46], sem, contudo, se limitar a elas. Seguindo essa premissa, devem ser consideradas agraváveis também, g., a decisão que determina a inclusão de litisconsorte necessário (art. 115, par.ún.); a decisão que admite a oposição (art. 685)[47]; e a que autoriza a inserção de terceiros no polo ativo ou passivo da reconvenção (art.343, §3º e §4º).

j) Concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução (inc, X): Salvo quando manejados pela Fazenda Pública (art. 910), os embargos à execução não têm efeito suspensivo automático (art. 919, caput), podendo o juiz assim os receber “quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes” (art.919, §1º). Não é difícil notar que não está contemplada pelo dispositivo a hipótese de “indeferimento” do efeito suspensivo. Parece razoável o entendimento de que essa situação acha-se embutida no inciso I, pois a suspensão da execução configura tutela provisória em favor do executado. Entendo que o executado que não conseguir o efeito suspensivo aos seus embargos poderia agravar com fundamento não no inciso X, mas sim no inciso I.

k) Redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, §1º (inc, XI): O art. 373, I e II, do CPC/15 reproduz, de maneira substancialmente igual, o comando do art. 333, I e II, do CPC, dispondo sobre as chamadas regras “estáticas” de distribuição de ônus da prova, fundada na conformação do direito material controvertido, levando em conta critérios abstratos fixados ex vi lege. Já o §1º, que constitui efetiva inovação em nosso ordenamento jurídico, permite que o juiz analise as “peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade” de uma ou mais partes em se desincumbir do ônus probatório imposto pelos incisos I e II ou “à maior facilidade de obtenção da prova” por intermédio do outro litigante e, com base nisso, atribuir o ônus da prova de modo diverso, por decisão fundamentada. A julgar pela redação do caput do art. 1.015, é possível afirmar que tanto a decisão que defere quanto a que indefere a aplicação do art. 373, §1º, se amolda à hipótese de provimento que “versa sobre redistribuição do ônus da prova”

m) Outros casos expressamente referidos em lei (inc, XIII): Trata-se de norma de encerramento, que permite que o próprio Código ou leis extravagantes prevejam o cabimento de agravo de instrumento em outras situações[48]. Um dos exemplos da maior relevância está no art. 354, par. ún.[49], do CPC de 2015 segundo o qual são passíveis de agravo de instrumento algumas hipóteses de resolução parcial do objeto litigioso do processo, quais sejam: (a) quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles forem rejeitados sem resolução de mérito (art. 485); (b) quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles for objeto do reconhecimento de prescrição ou decadência (art. 487, II); e (c) quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles for objeto de homologação de atos de autocomposição unilaterais ou bilaterais (reconhecimento da procedência, transação ou renúncia, ex vi do art. 485, III). Trata-se de uma ampliação considerável ao cabimento do agravo de instrumento que, a bem da clareza, poderia ter sido expressamente referida pelo art. 1.015 e, de resto, englobaria o inciso VII (exclusão de litisconsorte).

n) Decisões interlocutórias proferidas na fase de cumprimento de sentença e no processo de execução: A referência às decisões interlocutórias proferidas no âmbito da execução civil se justifica considerando-se que não há como sujeitar o exequente e o executado à espera por uma sentença apta a ser desafiada por apelação, apta a levar ao tribunal questões incidentais, nos termos do art. 1.009, §1º. Se o juiz indefere uma providência pleiteada pelo exequente e que se mostrava indispensável para satisfação da execução, é possível que a sentença “típica” da execução (a que reconhece a satisfação da execução, a teor do art. 924, II) jamais chegue a ser proferida e, se o for, a questão incidente anteriormente decidida teria se tornado prejudicada. Já para o executado, igualmente seria desproporcionalmente gravoso sujeitá-lo a todas as medidas de agressão à sua esfera jurídica para, somente depois da satisfação do credor, lhe ser deferido pedir o reexame de decisões interlocutórias proferidas no curso da execução, por meio da apelação contra a sentença que decretar a satisfação da execução. Entendo que o dispositivo permite o agravo de instrumento contra decisões proferidas pelo juiz relativamente a matérias de defesa arguidas pelo executado, seja nos próprios autos do cumprimento de sentença (arts. 518[50], 525[51] e 535[52]), seja nos próprios autos da execução de título extrajudicial, salvo quando implicarem extinção da execução (art. 924), hipótese em que caberá apelação (art. 203, §1º c.c. art. 1.009). Questão mais delicada concerne à limitação ou não do agravo de instrumento contra as decisões proferidas em sede de embargos à execução. Em favor da tese de que o par. ún. não se aplica às decisões proferidas em sede de embargos, pode-se argumentar que (a) eles constituem processo de conhecimento incidental à execução[53] (que parece ter sido confirmada pelo novo CPC), de tal modo que as decisões proferidas nessa sede não se confundiriam com aquelas proferidas na própria execução; e (b) A contrario sensu do inciso X, seriam agraváveis, nos embargos, apenas as decisões relativas a “concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo”. Embora eu relute em aceitar que haja diferenças substanciais entre a “simples defesa” e a “demanda”[54] (o que me leva a descartar o primeiro argumento aqui ventilado), o segundo fundamento mostra-se realmente determinante para solução do problema posto. Recorrendo ao aforismo (embora simplório, acertado), de que “a lei não contém palavras inúteis”, pondero que o inciso X seria completamente inútil se as decisões proferidas em sede de embargos estivessem contempladas no par. ún.. Como o inciso X não se refere à impugnação ao cumprimento de sentença, entende-se que esse segundo argumento não se aplicaria a esse instrumento de defesa do executado.

o) Decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença (par. ún.): Entendo que essa disposição se deve exclusivamente a “ecos” das reformas processuais aprovadas em 2005. A liquidação, encarada como mera “fase” do “processo sincrético” desde a reforma do CPC de 1973 pela Lei n. 11.232/05, precisaria ser sempre resolvida por decisão agravável (como, aliás, dispunha expressamente o art. 475-H daquele diploma). Nesse passo, a disposição aqui comentada resolve uma questão que se colocava na vigência do CPC de 1973 reformado na seguinte situação: havia decisões proferidas no curso da liquidação que deveriam ser atacadas por agravo retido (seguindo-se a regra geral do art. 522 reformado pela Lei n. 11.187/05), em que pese não haver ao final dessa fase uma decisão passível de apelação (em cujo procedimento o agravo retido poderia ser reiterado). A solução possível à época do CPC de 1973 reformado era, então, permitir que no processamento do agravo de instrumento contra a decisão que julgasse a liquidação fosse possível reiterar eventuais agravos retidos interpostos durante seu procedimento. Agora, esse problema desapareceu, porque todas as decisões proferidas em sede de liquidação serão agraváveis. Essa solução revela mais uma incoerência do sistema, pois se o juiz indefere determinada prova na “fase de conhecimento”, a decisão não é agravável, mas se o indeferimento ocorrer na “fase de liquidação” (mesmo que realizada sob o procedimento comum, nos termos do art.509, II), caberá o agravo de instrumento. Por essas e por outras é que se deve lamentar que o CPC não tenha abolido essa inútil dicotomia “agravo-apelação”, à qual estamos presos desde antes do descobrimento do Brasil.

p) Decisões interlocutórias proferidas no inventário (par. ún.): O inventário é procedimento vocacionado praticamente a um único desfecho: a sentença homologatória da partilha. Nesse passo, seria absolutamente injusto e contraproducente que as partes se sujeitassem a aguardar tal decisão para, somente aí, suscitar no procedimento de apelação todas as questões decididas no curso do processo, mormente aquelas atinentes a “fatos relevantes (…) provados por documento” (art. 612), nomeação e remoção de inventariante (arts.617 e 622 a 625), autorização para alienação de bens (art. 619, I), etc.. O reexame tardio dessas questões seria totalmente inócuo, razão pela qual acertou, aqui, o legislador.

Note-se, por oportuno, que todas as questões listadas no art. 1.015 podem ser resolvidas no corpo da sentença, hipótese em que o recurso delas cabível é o de apelação, nos termos do art. 1.009, §3º. Nesse ponto, o Código consagrou o “princípio da unirreorribilidade”[55].

Por fim, relevante destacar que o sistema contém uma incoerência estrutural ao limitar a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias proferidas em 1º grau de jurisdição (art. 1.015), mas permitir sem restrições a recorribilidade de decisões interlocutórias proferidas pelo relator, sobretudo nos processos de competência originária do tribunal (art. 1.021[56]). De lege ferenda, entendo que seria o caso de estender ao agravo interno voltado contra decisões monocráticas interlocutórias, as mesmas hipóteses de cabimento do agravo de instrumento (art. 1.015)[57].

3. Segunda alteração promovida pelo CPC de 2015: agravo voltou a ser recurso contra decisão que não põe fim ao procedimento em 1º grau, independentemente do conteúdo

A redação original do art. 162, §1º e §2º, do CPC de 1973 traçava os conceitos de sentença e decisão interlocutória com base em critério meramente formal e topológico. A primeira era ato decisório que punha fim ao processo (com ou sem resolução de mérito), e a segunda era o provimento proferido no curso do processo (com o propósito primordial de resolver questão incidente). Ninguém duvidava que essa classificação original do Código de 1973 apresentava enormes falhas[58]. Mas também jamais se questionou seu mérito de simplificar o sistema recursal, delimitando com clareza o cabimento da apelação e do agravo, e deixando o princípio da fungibilidade recursal – tão útil sob a vigência do Código de 1939 – relegado a um plano secundário.

A Lei n. 11.232/05 alterou essas definições com o objetivo de adequá-las à extinção (quase) completa do processo autônomo de execução de título judicial[59], e sua substituição pela “fase” de cumprimento de sentença no contexto de um “processo sincrético”. Após essa reforma legislativa, não fazia mais sentido afirmar que a sentença que reconhecia exigibilidade de obrigação de pagar, fazer, não fazer ou dar dava fim ao processo, pois ele continuaria para a execução forçada da obrigação. Assim, a distinção entre os provimentos com fundamento no critério topológico desapareceu, passando-se a se distinguir sentença e decisão interlocutória com base em seu conteúdo. A primeira “implica alguma das situações previstas nos artigos 267 e 269” do CPC (artigo 162, § 1º[60]); a segunda “resolve questão incidente” (artigo 162, § 2º). Talvez a única reminiscência do critério formal de distinção das hipóteses esteja no § 2º do artigo 162, não atingido por essa última reforma, e que pontua ser a decisão interlocutória ato do juiz praticado “no curso do processo”.

Afora os diversos problemas de ordem redacional[61], a novidade legislativa trouxe enorme impacto ao sistema recursal. A dúvida girava em torno do recurso cabível contra as decisões que, apesar de ostentar conteúdo de sentenças (pois aplicavam alguma das hipóteses dos arts. 267 e 269 do CPC de 1973), não punham fim ao procedimento em 1º grau. Exemplos não faltavam: indeferimento liminar da reconvenção (CPC/73, art. 267, I); exclusão de litisconsorte (CPC/73, art. 267, VI); decretação de prescrição ou decadência quanto a apenas um dos pedidos cumulados (CPC/73, art. 269), etc. Duas soluções básicas se colocavam: a primeira consistia em continuar admitindo-se o agravo de instrumento, de tal modo a ignorar qualquer impacto da alteração do conceito de sentença no plano recursal; a segunda apegava-se ao texto do artigo 513 do CPC de 1973 para defender o cabimento da apelação, ainda que com alguma adaptação de ordem formal, de modo a criar a chamada “apelação de instrumento”[62].

Quando examinei a questão pouco depois da promulgação da Lei n. 11.232/05, entendi que a segunda solução era largamente preferível, pois bastava uma simples adaptação formal (atinente à formação de autos), mantendo-se todas as demais características do procedimento da apelação (efeito suspensivo automático, cabimento de sustentação oral, de embargos infringentes, de revisão etc.). Faria muito mais sentido adaptar a mera questão formal, mas manter a coerência do sistema em tratar igualmente recursos que desafiavam decisões substancialmente idênticas, mas distinguidas apenas pelo momento do procedimento em que proferidas.

Contudo, prevaleceu na doutrina[63] e nos tribunais[64] o entendimento de que caberia agravo contra as decisões que não pusessem fim ao procedimento em primeiro grau de jurisdição, ainda que aplicassem alguma das hipóteses dos arts. 267 ou 269 do CPC de 1973.

Pois foi exatamente essa a solução (incoerente) acolhida pelo CPC de 2015. Sentença passou a ser definida pelo art. 203, §1º, da seguinte forma: “pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”. Já decisão interlocutória “é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § 1º” (art. 203, §2º). Da primeira cabe apelação (art. 1.009, caput); de algumas das segundas, cabe agravo de instrumento (art. 1.015), conforme acima destacado.

Pode-se dizer que houve, de certo modo, retorno ao modelo original do CPC de 1973, isto é, a definição do recurso cabível (apelação ou agravo) baseado na posição da decisão recorrida no procedimento. De fato, nota-se com facilidade que, dentre as decisões passíveis de ataque por meio de agravo de instrumento, há algumas que claramente aplicam hipóteses dos arts. 485 e 487, embora sem por fim ao procedimento em 1º grau de jurisdição, tais como a exclusão de litisconsorte (art. 1.015, VII c.c. art. 485, VI) e, principalmente, as que tratam do “mérito do processo” (art. 1.015, II c.c. art. 487).

A meu ver, a solução adotada pelo CPC de 2015 não é adequada na medida em que trata de maneira diferente fenômenos essencialmente iguais. Se o juiz resolve aplicar o art. 356 e julgar o mérito de apenas um dos pedidos cumulados, a parte que pretender recorrer deverá se valer do agravo de instrumento, o qual via de regra não tem efeito suspensivo (art. 1.019, I), e não admite sustentação oral (art. 937, VIII). Se o juiz entender por bem não desmembrar o objeto litigioso e proferir uma única decisão sobre todos os pedidos cumulados, o recurso cabível contra essa exata mesma decisão é a apelação, a qual tem, de regra, efeito suspensivo automático (art. 1.012) e comporta sustentação oral (art. 937, I). Duas situações essencialmente iguais não poderiam ter recebido tratamentos tão distintos.

4. Terceira alteração promovida pelo CPC de 2015: fim do agravo retido.

O agravo retido sempre se mostrou um instrumento controvertido e, conforme destacado no item, supra, sofreu com diversas “idas-e-vindas” na história do nosso sistema processual. Após ter herdado tal figura das Ordenações (com o nome de “agravo no auto do processo”), o ordenamento brasileiro o abandonou (no Regulamento n. 737) e posteriormente o resgatou (no CPC de 1939). Buzaid pretendia abolí-lo, mas o CPC de 1973 o manteve. Já as reformas de 1995, 2001 e 2005 o valorizavam significativamente. Pois o CPC de 2015 escreveu mais um capítulo nessa novela, ao voltar à solução adotada em 1850 para o fim de suprimir o agravo retido.

Quando comparado com o agravo de instrumento, o retido constituía remédio mais adequado à celeridade, à concentração e à oralidade[65], além de prestigiar o juiz de 1º grau, por postergar e tornar meramente eventual o controle de suas decisões interlocutórias.

Contudo, quando analisado isoladamente, o agravo retido apresentava alguns inconvenientes. De início, havia certa contradição no fato de se exigir do litigante a interposição do recurso no prazo preclusivo exíguo de 10 dias, para depois deixá-lo esquecido por meses ou anos a fio, sem qualquer utilidade. Esse problema revelava-se mais insidioso pelo fato de que o exame do agravo retido era meramente eventual, se cumpridas duas condições: (a) se houvesse apelação contra a sentença final; e (b) se o agravante expressamente reiterasse o agravo retido ao interpor ou contrarrazoar a apelação. A preclusão, que sempre se mostrou um instrumento a serviço da celeridade processual, aqui conspirava contra a razoável duração do processo, pois impunha aos litigantes a observância de um procedimento relativamente complexo, previsto no art.523, §2º do CPC de 1973[66], o qual causava, inevitavelmente, algum embaraço na marcha processual, sem qualquer utilidade imediata e concreta em favor da celeridade processual.

A opção do Anteprojeto que deu origem ao CPC de 2015, jamais questionada durante a tramitação do projeto no Senado e na Câmara, foi pela abolição do agravo retido, de tal modo que as decisões não passíveis de impugnação por meio do agravo de instrumento passaram a se sujeitar ao regime do art. 1.009, §1º, do CPC de 2015, assim redigido: “As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não  são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões”. Aqui parece inegável a influência do microssistema dos Juizados Especiais (Cíveis, Federais e da Fazenda Pública[67]), em que se admite apenas um recurso, contra a decisão final, o qual pode levar o órgão recursal toda a matéria decidida em 1º grau.

Note-se que o substitutivo da Câmara dos Deputados, embora tenha prestigiado a ideia de extirpar do sistema o agravo retido, propunha a introdução de uma técnica muito similar. Refiro-me ao §2º do seu art. 1.022, segundo o qual a apelação ou as contrarrazões de apelação só poderiam impugnar a decisão interlocutória não agravável se o litigante houvesse feito “prévia apresentação de protesto específico contra a decisão no primeiro momento” em que coubesse “à parte falar nos autos, sob pena de preclusão”.

Percebe-se com clareza que se tratava de um expediente que, sob o ponto de vista do regime preclusivo, fazia as vezes do agravo retido, embora despido da denominação, do ônus de exposição imediata de razões pela parte e contrarrazões pelo adversário[68] e da possibilidade de retratação do juiz (que talvez fosse a única virtude concreta do agravo retido sob o regime do CPC de 1973). Era o chamado “protesto anti-preclusivo”.

Entendo que se tratava de uma formalidade desnecessária, que causaria tumulto processual e não traria nenhum benefício. Exigir-se-ia das partes a apresentação de uma peça completamente vazia de significado, cujo único objetivo seria evitar uma preclusão, sem que se vislumbrasse aí o compromisso com o objetivo primordial desse instituto, que é a celeridade processual. Ademais, se acenderiam questionamentos em torno de matérias que estariam a salvo ou não da preclusão, gerando discussões que embaraçariam o julgamento da apelação[69].

Essa proposição da Câmara foi, em boa hora, excluída pelo Senado Federal quando do retorno do projeto para observância do art. 62 da Constituição Federal. Do relatório da Comissão Especial do Senado, aprovado em 04.12.2014, extrai-se o seguinte fundamento para essa exclusão:

É forçoso excluir os §§ 1º e 2º do art. 1.022 do SCD [Substitutivo da Câmara dos Deputados],[70], com o consequente resgate do parágrafo único do art. 963 do PLS, em razão de, ao criar um protesto, com rígida preclusão, estar a restabelecer a lógica do ‘agravo retido’, embora com outro nome, indo de encontro à filosofia simplificadora do PLS em matéria recursal”. [71].

Assim, diante de uma decisão interlocutória irrecorrível, o litigante não está sujeito ao adimplemento imediato de qualquer ônus, podendo simplesmente silenciar[72]. Apenas quando da interposição ou da resposta a apelação é que a matéria precisa ser ventilada, sob pena, aí sim, de preclusão[73]. E nem se diga que a necessidade do “protesto anti-preclusivo” decorreria do art. 278, caput, pois se trata de norma geral, aplicável às nulidades não cognoscíveis de ofício, e que não sobrevive à norma especial do art. 1.009, par. ún., segundo a qual a eventual nulidade de uma decisão interlocutória não agravável pode ser atacada em apelação ou contrarrazões de apelação, independentemente de qualquer formalidade e com expressa ressalva quanto à inexistência de preclusão até então. O ataque a essas decisões interlocutórias irrecorríveis em sede de apelação ou contrarrazões é o comportamento previsto expressamente pelo sistema, de tal modo que não se podem considerar legítimas quaisquer expectativas do adversário de que esse poder não será exercido no momento oportuno. Não há expectativas legítimas contra legem.

De resto, cabe destacar que essa alteração traz três efeitos colaterais os quais, creio, merecem análise, ainda que breve:

  1. Alteração da configuração do efeito suspensivo da apelação. Barbosa Moreira enunciou lição clássica no sentido de que a sentença sujeita a apelação com efeito suspensivo ex lege (que continua a ser a regra, a teor do art. 1.012, caput, do CPC de 2015) não tem sua eficácia suspensa em razão da interposição do recurso: a eficácia já estaria represada no momento do proferimento, sob condição suspensiva, aguardando-se o transcurso do prazo para apelação, de tal modo que o advento do recurso apenas daria continuidade a essa suspensão[74]. Essa conhecida lição doutrinária foi parcialmente afastado pelo CPC de 2015. Isso porque a apelação tornou-se palco para impugnar não apenas a sentença, mas também as decisões interlocutórias não agraváveis, cujos efeitos começaram a ser produzidos tão logo prolatadas e que não serão suspensos pelo advento da apelação (mesmo que ela siga a regra geral do art. 1.012, caput). A lição de Barbosa Moreira, contudo, continua válida apenas para o fenômeno que ele se propôs a descrever (isto é, o efeito da apelação em face da sentença).
  2. Alteração da natureza jurídica das contrarrazões de apelação. Sob o CPC de 1973, as contrarrazões de apelação constituíam mero instrumento de resposta, inapto para promover qualquer ampliação no objeto do juízo de mérito recursal. Mesmo que o apelado não se limitasse a rebater as razões de recurso e se ocupasse de suscitar as “questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro” e os fundamentos do pedido ou da defesa que não precisaram ser acolhidos porque o apelado já saiu vencedor com base em outros argumentos, ainda assim não havia ampliação do objeto do juízo de mérito. A rigor tratar-se-iam de matérias que seriam devolvidas ao tribunal mesmo sem as contrarrazões (CPC/73, arts. 515, §1º e §2º), por simples força da admissão da apelação (face à verticalidade do efeito devolutivo[75]). Ainda à luz do diploma de 1973, as contrarrazões que reiteravam agravo retido também não representavam, elas próprias, ampliação do objeto do juízo de mérito recursal. Tratava-se de pedir que um recurso antes interposto fosse examinado. O acórdão tinha um capítulo para o agravo retido e outro para a apelação. Agora, à luz do sistema de recorribilidade das interlocutórias instituído pelo CPC de 2015, é evidente que as contrarrazões passam efetivamente impugnar decisões interlocutórias, as quais não seriam automaticamente devolvidas ao tribunal pelo recurso. Os dispositivos dos acórdãos terão que começar a fazer referência ao provimento ou improvimento da apelação e dos pedidos de reforma de interlocutórias formulados nas contrarrazões de apelação.
  3. Possibilidade de apelação exclusivamente da decisão interlocutória não agravável. Na vigência do CPC de 1973, a parte que interpusesse um agravo retido e realmente quisesse que ele fosse apreciado pelo tribunal ficava em uma posição incômoda: ou precisaria ostentar interesse para interpor apelação (e, nela, reiterar o agravo) ou, então, ficaria “de mãos atadas” aguardando que seu adversário apelasse (para, então, reiterar o agravo retido nas contrarrazões). Agora, não. Essa modalidade de recurso foi eliminada e criou-se textualmente a possibilidade de impugnar decisões interlocutórias não agraváveis na apelação. Não me parece que o art. 1.009, §1º, tenha condicionado a impugnação da interlocutória não agravável necessariamente à existência de impugnação da própria sentença, pois pode existir interesse para a primeira e faltar interesse para a segunda. É interessante notar que Fredie Didier Jr. E Leonardo Carneiro da Cunha (Apelação contra decisão interlocutória não agravável: a apelação do vencido e a apelação subordinada do vencedor: duas novidades do CPC-2015, inédito) reconhecem essa circunstância, mas defendem que essa apelação seria subordinada ou condicionada. Penso que não necessariamente. O objeto da decisão interlocutória agravável pode ser completamente independentemente do desfecho da sentença, como, por exemplo, a condenação da parte, no curso do processo, a uma pena por litigância de má-fé. Nessa hipótese, a apelação se processará sem qualquer subordinação ou condicionamento ao recurso do adversário.

5. CPC de 2015 não alterou o regime de preclusões para as partes

Apesar da íntima relação entre recorribilidade das interlocutórias e o regime preclusivo[76], entendo que as alterações promovidas quanto ao agravo de instrumento não trouxeram inovações no âmbito da preclusão, a despeito do que afirma o art. 1.009, §1º.

A primeira constatação é a de que a combinação do art. 1.015 com o art. 1.009, §1º, revela que continuaram a ser recorríveis todas as decisões interlocutórias, com a diferença de que algumas podem ser desafiadas de imediato (por agravo de instrumento, ex vi do art. 1.015), ao passo que todas as demais são recorríveis quando da interposição ou da resposta a recurso contra a decisão final (ex vi do art. 1.009, §1º).

O sistema continua a ser conotado pela mesma carga preclusiva dirigida à atividade processual das partes – que estão sujeitas ao ônus de recorrer para evitar que uma sobre uma questão incidente recaia preclusão – apenas lhes conferindo um prazo de impugnação maior, conforme há tempos reconhece a doutrina que se dedicou ao estudo do sistema recursal dos Juizados Especiais[77]. É nesse exato mesmo sentido a Exposição de Motivos do Anteprojeto que veio a se converter no CPC de 2015:

Todas as decisões anteriores à sentença podem ser impugnadas na apelação[78]. Ressalte-se que, na verdade, o que se modificou, nesse particular, foi exclusivamente o momento da impugnação, pois essas decisões, de que se recorria, no sistema anterior, por meio de agravo retido, só eram mesmo alteradas ou mantidas quando o agravo era julgado, como preliminar de apelação. Com o novo regime, o momento de julgamento será o mesmo; não o da impugnação.

Assim, a parte que sucumbiu diante de uma decisão interlocutória está autorizada a discuti-la em momento processual mais distante e, se não o fizer no tempo e forma adequada, via de regra o tribunal não poderá examinar a questão quando do julgamento da apelação. Eis aí configurada a preclusão para as partes exatamente da mesma forma.

Por essa razão, não se mostra muito preciso esse texto legal ao dispor que “As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não ficam cobertas pela preclusão”. O fenômeno efetivamente se mostra presente com os mesmos contornos do CPC de 1973.

6. CPC de 2015 alterou sutilmente o regime de preclusões para o juiz

Resta indagar se foi mantido o mesmo o regime de preclusão dirigida aos poderes decisórios do juiz, isto é, se ele está impedido ou não de reanalisar no curso do processo decisão interlocutória anteriormente prolatada. A questão é complexa, e exige exame detido.

Na linha de estudo anterior[79], parece-me relevante destacar que a preclusão que atinge os poderes das partes não se confunde com a preclusão que atinge os poderes do juiz, em decorrência das substanciais e inegáveis diferenças entre os princípios e fundamentos que regem as posições jurídicas ocupadas pelas partes e pelo juiz na relação processual. As partes acham-se governadas por um regime de autorresponsabilidade e normalmente estão sujeitas a ônus processuais[80]. Já o juiz, ao contrário, na qualidade de agente do Estado de Direito, exerce exclusivamente poderes-deveres[81]. Em decorrência disso, o regime de preclusões para as partes é muito mais rígido do que para o juiz, justamente porque o interesse que inspira o exercício das posições jurídicas das primeiras é (ao menos imediatamente) privado, e do segundo, exclusivamente público.

Assim, o ordenamento processual outorga às partes oportunidades determinadas e impõe requisitos para que essas façam valer suas alegações, produzam suas provas, suscitem nulidades e impugnem decisões que lhe tenham sido desfavoráveis. Esgotadas tais oportunidades, a parte via de regra está sujeita ao efeito extintivo da preclusão.

Para o que aqui importa, o CPC de 1973 estabelecia o ônus das partes de impugnar toda e qualquer decisão interlocutória (por meio de agravo de instrumento ou retido), sob pena de, não fazendo, sujeitar-se ao impedimento de rediscutir a questão (ao menos em regra). Essa preclusão que atingia o direito das partes em recorrer produzia, via de regra, preclusão para o juiz, consubstanciado no impedimento de reanalisar a questão já decidida e não oportunamente recorrida[82]. Excepcionalmente o juiz se achava investido de poderes(-deveres) de reanalisar algumas matérias já anteriormente decididas mesmo à falta de impugnação oportuna e formalmente adequada pela parte interessada, se isso fosse necessário para restabelecer a correta aplicação das normas processuais que, ao menos em sua maioria, têm caráter público e cogente. Propus, naquela oportunidade, que essas exceções concerniam ao controle da regularidade das condições da ação, pressupostos processuais e do respeito ao regime formal do processo, bem como no tocante às questões relativas à prova, aos meios de apoio à execução e ao exercício dos poderes administrativos do juiz[83].

Assentadas essas premissas, a questão que se coloca é a seguinte: o CPC de 2015 passou a permitir, de forma genérica, que o juiz reveja as decisões interlocutórias anteriormente proferidas no curso do procedimento?

Entendo que, nesse ponto, o CPC de 2015 também não inovou.

Tal como descartei, para exame do problema à luz do CPC de 1973 que possam ser úteis os seus arts. 471 e 473[84], entendo necessário também deixar de lado os arts. 505 e 507 do CPC de 2015, de redação quase igual à dos dispositivos revogados. De fato, o primeiro desses dispositivos trata da coisa julgada material e do impedimento extraprocessual para que o juiz examine em um ulterior processo as questões de mérito decididas por sentença anterior, transitada em julgado. O segundo dispositivo trata da preclusão para as partes, da qual não decorre sempre e necessariamente uma preclusão para o juiz, conforme pretendi demonstrar no outro trabalho aqui muitas vezes referido.

Assim, impõe-se necessário continuar a perquirir em outros quadrantes do sistema sobre existência ou não de uma proibição para o juiz alterar decisões interlocutórias antes proferidas (ao menos como regra geral).

Quanto às decisões das quais cabe agravo de instrumento (listadas no art. 1.015), entendo que realmente não se poderia cogitar de qualquer mudança. Essa modalidade de recurso continuou a respeitar suas raízes luso-brasileiras, e manteve o juízo de retratação por parte do prolator da decisão recorrida (art. 1.018, caput e §1º). Se apenas o agravo de instrumento enseja a retratação, sem ele o juiz não pode fazê-la (ao menos, repita-se, como regra). Nesse particular, não se vislumbra nenhuma novidade em relação ao CPC de 1973, pois a estrutura é a mesma.

Já quanto às decisões interlocutórias das quais não cabe agravo de instrumento (que não existiam à época do CPC de 1973), ainda assim entendo que o juiz não está livre para se retratar quando bem entender. Isso porque o sistema continua a privilegiar a ideia de que a retratação é excepcional, reservada para situações excepcionais e taxativamente previstos.

Além da situação acima referida (art. 1.018, §1º), incluem-se as hipóteses de apelação contra as sentenças de improcedência liminar (art. 332, §3º), de indeferimento da petição inicial (art.331) e terminativas em geral (art. 485, §7º), bem como o agravo interno (art. 1.021, §2º). Embora simplório, o brocardo “a lei não contém palavras inúteis” há que ser observado, de modo a se extrair a conclusão de que se a lei não autorizou a livre revisão das decisões interlocutórias. Com a supressão do agravo retido, o CPC excluiu oportunidade de retratação judicial e, nessa medida, reforçou o caráter preclusivo do sistema.

Afora essa modificação sutil, permanecem plenamente válidas as conclusões a que cheguei no trabalho anterior, muitas vezes aqui referido, no sentido de ressalvar da preclusão dirigida à atividade decisória do juiz algumas matérias, como o controle da regularidade das condições da ação, dos pressupostos processuais e do regime formal do processo, bem como no tocante às questões relativas à prova, aos meios de apoio à execução e ao exercício dos poderes administrativos do juiz[85].

Convém lembrar, contudo, que a possibilidade de reexame dessas matérias resta afastado apenas pela formação da coisa julgada, especialmente a material. E, nesse particular, é forçoso reconhecer que o CPC de 2015 passou a prever expressamente a existência de decisões interlocutórias que resolvem antecipada e parcialmente o mérito (art. 203, §1º c.c. art. 356). À falta de agravo de instrumento (art. 1.015, II), essas decisões transitarão materialmente em julgado, de modo a impedir qualquer discussão, mesmo quanto às matérias cognoscíveis ex officio, salvo aquelas que puderem ser alegadas em sede de ação rescisória[86], em que pesem as discussões sobre o termo inicial do prazo decadencial bienal.

7. Potencial aumento da incidência de sucedâneos recursais, em especial o mandado de segurança[87]

A história mostra que sempre que o sistema processual se propôs a extinguir recursos, reduzir seu cabimento ou diminuir sua efetividade (especialmente no campo das decisões interlocutórias), teve que passar a lidar com o aumento da incidência de meios sucedâneos de impugnação às decisões judiciais, notadamente o mandado de segurança.

Tem-se nesse remédio de índole constitucional uma verdadeira “válvula de escape” do sistema recursal, sobretudo face ao que emerge, a contrario sensu, do art. 5º, II, da Lei n. 12.016/09 (“art. 5º. Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: (…) II – de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo”).

Pois ao limitar o cabimento do agravo de instrumento, seguramente haverá litigantes que lançarão mão do mandado de segurança. Pense-se, por exemplo, na decisão que indefere a realização de uma prova pericial, contra a qual não cabe agravo de instrumento[88]. Se a fonte de prova está prestes a se perder, e a parte entender que a prova é fundamental para o deslinde da controvérsia, poderá buscar defender seu “direito líquido e certo” a essa providência instrutória. Outro exemplo está na decisão que rejeita a alegação de incompetência relativa[89]; o réu pode sustentar que a indevida manutenção da causa perante o foro do domicílio do autor lhe causará prejuízo incontornável para desempenho do seu direito de defesa.

Ou seja, é possível (e até provável) que acabe triunfado, pela via do mandado de segurança contra a decisão interlocutória irrecorrível, a mesma tese que o STJ acabou acolhendo quando examinava a legalidade da conversão do agravo de instrumento em retido, isto é, que não seria aceitável postergar para a fase de apelação o reexame de decisão com “efeitos imediatos e irreversíveis, sob pena de tornar a via recursal inócua” (AgRg nos EDcl no REsp 1115445/DF, 1ª Turma, j. 11/05/2010, rel. Min. Luiz Fux).

Nesses casos, é provável que haja profusão de mandados de segurança, com diversos inconvenientes de ordem formal não existentes no procedimento do agravo de instrumento, como, por exemplo, (a) a necessidade de intimação do juiz prolator da decisão atacada, na qualidade de autoridade coatora[90]; (b) a necessidade de citação pessoal da parte contrária, na qualidade de “litisconsorte necessária”[91]; (c) cabimento de sustentação oral[92]; (d) oitiva do Ministério Público[93]; (e) cabimento de recurso ordinário dirigido ao STJ contra o acórdão denegatório da segurança[94]; e, finalmente, (f) prazo decadencial extenso, de 120 dias[95].

E nem poderia se cogitar de alteração legislativa que tornasse mais abrangente a restrição imposta pelo art.5º, II da Lei n. 12.016/09, pois tal medida certamente seria reputada contrária ao inciso LXIX do art.5º da Constituição Federal[96].

Trata-se de risco que o nosso sistema processual se dispôs a assumir e que pode se revelar insidioso. Nas conclusões de outro trabalho aqui muitas vezes referido[97], pontuei algumas considerações que continuam a valer para a análise do CPC de 2015:

O estudo da história do recurso de agravo, desde suas origens no Direito lusitano reinol, até a recente reforma processual, nos invoca a figura de Prometeu, conhecido personagem da mitologia grega e protagonista da clássica obra teatral de Ésquilo intitulada “Prometeu Acorrentado”.

Assim como Prometeu – que, segundo o mito grego, desafiou a tirania de Zeus e tomou a ousadia de roubar do Olimpo o fogo monopolizado pelos deuses, trazendo-o para uso dos mortais – o surgimento do agravo em Portugal, entre os séculos XIII e XIV, foi fruto da rebeldia e do inconformismo dos litigantes diante da lei régia que proibia apelação contra grande parte das interlocutórias. Surgido como remédio excepcional e sem figura de juízo, acabou se ordinarizando, e ficou impregnado em nossa cultura processual, não tendo jamais deixado de figurar entre os recursos, seja em terras brasileiras, seja em terras lusitanas, até hoje[98].

Ainda segundo a lenda, a audácia de Prometeu atraiu a ira de Zeus, que então lhe impôs como castigo ficar, por todo o sempre, acorrentado a uma montanha (o Monte Cáucaso), onde um abutre diariamente devoraria partes do seu fígado, sem matá-lo, dada a capacidade regenerativa desse órgão. Com o agravo não foi diferente: o legislador jamais tencionou exterminá-lo (e nem poderia), mas há mais de um século envia-lhe abutres para enfraquecê-lo (em forma de novos códigos processuais ou de reformas nos diplomas já existentes).

Esse longínquo atrevimento dos súditos do reino lusitano, ao forçarem a criação do agravo, gerou essa condenação eterna. Mas o agravo sempre encontra a incrível capacidade de se regenerar (distorcendo, na prática, as restrições “tirânicas” do sistema ou, quando não, travestindo-se em outros meios de impugnação sucedâneos, como o mandado de segurança e a correição parcial).

Não temos dúvidas de que o agravo permanecerá vivo e saudável, sempre se regenerando, de uma forma ou de outra, após cada investida legislativa orientada a mitigá-lo, o que nos conduz a um problema aparentemente insolúvel.

(…)

A esperança de sucesso da reforma, nesse particular, é que haja litigantes que não estejam dispostos a lançar mão do writ como sucedâneo recursal na maioria dos casos. Mas mesmo assim, seguramente haverá uma notável proliferação dos embargos declaratórios e, sobretudo, dos pedidos de reconsideração.

Havíamos sustentado no nosso já referido escrito sobre o mesmo problema aqui enfocado[99], e aqui reiteramos, que possível solução para parte do problema estaria na fixação de um rol taxativo de casos em que, em razão do conteúdo da questão decidida, o agravo cabível seria necessariamente o retido (na oportunidade, alvitramos, de lege ferenda, que esse rol fosse composto de decisões em matéria probatória e de decisões que afastam argüições de falta de condições da ação e de pressupostos processuais).

A essa altura, porém, nem mesmo essa solução nos parece ser de grande utilidade, em face dessa notável “capacidade regenerativa” do agravo, e sua aptidão de transmudar-se em outros meios de impugnação. Tantas forem as decisões interlocutórias tomadas no processo, tantos serão os meios de impugnação apresentados pela parte, sempre sob o argumento de que há risco de difícil ou incerta reparação. E, como regra, efetivamente o estarão.

Diante dessa constatação, surge-nos como alternativa reduzir o número de interlocutórias tomadas no curso do processo, concentrando ao máximo a decisão de questões incidentais, de maneira que a impugnação a elas se faça de uma única vez, ou na menor quantidade de oportunidades possível.

Veja-se que não se trataria apenas de relegar para momento oportuno a recorribilidade de todas as interlocutórias proferidas em momento anterior, pois aí se deixa a porta aberta para que os litigantes se antecipem em impugná-las, sempre sob o argumento do risco imediato de dano.

Tratar-se-ia, isso sim, de decidir a maior quantidade de questões incidentais em um só momento processual. E para tanto, o processo haveria, necessariamente, de alargar o campo do (hoje quase inexistente) princípio da oralidade, que traz necessariamente a seu reboque o sub-princípio da concentração, segundo clássica lição de Chiovenda.

E aqui saímos de um problema, para cair em outro, consistente nas enormes (e antigas) dificuldades práticas de efetiva aplicação do princípio da oralidade, que incluem desde questões geográficas (dadas as dimensões continentais do Brasil) e físicas (atinentes à precariedade da estrutura do Judiciário), até, sobretudo, culturais.

Diante desse quadro, no mínimo desolador, cabe bem aqui, para encerrar, breve passagem da já citada peça teatral de Ésquilo. Nela, a personagem “o Poder”, encarregada de cobrar de Vulcano o cumprimento da condenação imposta por Zeus, constata, referindo-se a Prometeu: “[d]e que serve lamentar a sorte deste criminoso, uma vez que não há remédio possível para seu mal? Não te canses, pois, na busca de um socorro inútil.”[100].

8. Estrutura do procedimento e recorribilidade das interlocutórias

Retomando a ideia desenvolvida no item anterior, convém enfatizar, na linha da lição de Barbosa Moreira[101], que “todo sistema de recursos reflete necessariamente as características da estrutura do procedimento de grau inferior”. Cabe, então, uma palavra a esse respeito, levando-se em conta que a estrutura do procedimento comum do CPC de 2015 é consideravelmente diferente da estrutura do procedimento ordinário do CPC de 1973[102].

Dentre as características estruturais do procedimento que impactam de maneira mais significativa o regime de recorribilidade das interlocutórias, está o grau de concentração de atos processuais.

A clássica lição de Chiovenda[103] propõe que a concentração de atos processuais seria um mero corolário da oralidade processual, juntamente com outros três, quais sejam: (a) imediatidade (contato direto entre juiz e partes); (b) identidade física do juiz (o juiz que instrui a causa profere sentença); e (c) irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias.

Contudo, revendo essa quase centenária construção teórica, entendo mais adequado reconhecer que a concentração dos atos processuais constitui o verdadeiro elemento de estruturação do procedimento, do qual a oralidade mostra-se mero corolário. Invertem-se os papéis.

Para comprovar essa afirmação, pense-se, hipoteticamente, em um procedimento para prestação de tutela cognitiva em que todas as atividades processuais se realizassem totalmente agrupadas, sem intervalos de tempo entre umas e outras. Tal solução talvez se mostre inviável para a maior parte dos litígios. Ainda assim, o raciocínio revela que esse elevado grau de concentração só se atingiria por meio da adoção da oralidade em larga escala, de modo a reunir em uma única audiência a articulação da demanda e da defesa, a instrução probatória, a solução de questões incidentes e a prolação de sentença.

Nesse passo, a concentração de atos processuais depende, necessariamente, da oralidade pois, do contrário, os atos processuais escritos demandam tempo para serem praticados e integrados ao procedimento, e são mediados por atos de comunicação processual e providências de ordem burocrática (como, por exemplo, juntadas de peças aos autos).

Entretanto, o inverso não é verdadeiro: é perfeitamente possível (embora altamente indesejável) que o procedimento seja desenvolvido de maneira espaçada, ainda que conotado por alto grau de oralidade, por intermédio de diversas audiências.

Em suma, concentração implica oralidade, mas oralidade não acarreta necessariamente concentração.

A oralidade, por sua vez, traz consigo de maneira automática a imediatidade, pois se os atos são praticados oralmente pelos sujeitos processuais, é evidente que haverá contato direto entre eles (ainda que realizado remotamente, por intermédio de avançadas tecnologias, isto é, as chamadas “videoconferências”).

Para encerrar, resta apenas analisar a relação entre concentração e oralidade, de um lado, e, de outro, os dois últimos corolários desenhados por Chiovenda, isto é, identidade física do juiz e, o que mais importa aqui, a irrecorribilidade em separado das interlocutórias.

Quanto menos concentrado for o procedimento (sendo ele predominantemente escrito ou oral, pouco importa), menores são as chances de adequada implementação do princípio da identidade física. Um processo que se prolonga muito no tempo, com atividades espaçadas, sofre com o risco muito maior de circunstâncias que impedem de proferir sentença o juiz que comandou a instrução (aposentadoria, promoção, remoção, licença etc,). Já um procedimento concentrado aumenta naturalmente as chances de o juiz que presidiu a colheita da prova esteja ainda disponível para prolatar a decisão final. A concentração propicia reais condições para implementação da identidade física, mas a oralidade, por si só, não.

Por fim, há que se reconhecer que quanto maior for a concentração procedimental, menor margem haverá para a recorribilidade em separado das interlocutórias. Retornando ao cenário hipotético alvitrado acima: se na mesma audiência o juiz resolver todas as questões incidentais e proferir sentença, é evidente que as partes só poderão interpor um recurso contra todas as decisões até então exaradas. Já em um procedimento oralizado, mas não concentrado, as questões incidentes são resolvidas de forma espaçada, abrindo-se espaço para que se analise não apenas o poder das partes em atacá-las em separado, como também o eventual poder do juiz em revê-las[104].

Em resumo: o sistema marcado por alto grau de concentração das atividades processuais ficará naturalmente dispensado de se preocupar com a recorribilidade das interlocutórias. O ordenamento jurídico brasileiro contempla dois microssistemas em que essa afirmação se revela correta: o processo do trabalho[105] e o processo nos Juizados Especiais (Cíveis, Federais e da Fazenda Pública[106]). Nesses casos, a falta de um recurso contra as decisões proferidas pelo juízo de 1º grau no processo de conhecimento não causa maior embaraço, salvo no tocante às tutelas de urgência, principalmente em caráter liminar[107].

O procedimento comum ordinário desenhado pelo CPC de 1973, especialmente na fase postulatória, propiciava potencialmente grande espaçamento entre diversas decisões interlocutórias. De fato, havia diversas posturas do réu que ensejavam decisões interlocutórias em separado, antes do exame de quaisquer das matérias preliminares, arguidas na contestação.

Já o CPC de 2015 concentra de maneira muito mais intensa as postulações do réu na contestação, reduzindo, do ponto de vista formal, a tipologia dos instrumentos de resposta[108]. De fato, passaram a ser matérias necessariamente alegáveis no bojo da contestação a denunciação da lide (art. 126 c.c. art. 131), o chamamento ao processo (art. 131), a incompetência relativa (art. 337, II), a incorreção do valor da causa (art. 337, III) e a impugnação ao benefício de gratuidade de justiça concedido ao autor (art. 337, XIII).

Isso significa que, após a contestação e a oitiva do autor a respeito dela (art. 351), o juiz decidirá concentradamente sobre quase todas as questões processuais, na fase de saneamento e organização do processo (art. 357). Tem-se, pois, um avanço do CPC de 2015 em relação ao CPC de 1973, pois a concentração evita o risco de interposição de vários agravos de instrumento ao longo da fase postulatória (um contra a decisão que examina a alegação de incompetência relativa, outro atinente ao valor da causa etc.). Haverá apenas um recurso contra a decisão de saneamento e organização do processo e, mesmo assim, cabível apenas contra as matérias passíveis de enquadramento no art. 1.015.

Aliás, essa constatação não deixa de causar perplexidade. Imagine-se que, ao seguir o roteiro prescrito pelo art. 357 para o saneamento e organização do processo, o juiz resolva questões agraváveis (como a revogação do benefício da gratuidade e a exclusão de litisconsorte) e outras não agraváveis (como a correção do valor da causa e a incompetência). Embora formalmente concentradas em uma única decisão, nem todas as matérias serão passíveis de recurso imediato; algumas ficarão à espera de eventual questionamento em apelação ou contrarrazões de apelação. Essa constatação expõe uma certa contradição do modelo procedimental e recursal construído pelo CPC de 2015. Entendo que, se o tribunal já terá de toda forma o trabalho de julgar um agravo de instrumento, seria mais lógico que já examinasse todas as demais questões resolvidas pela mesma decisão. Trata-se, contudo, de proposição de lege ferenda, que não encontra abrigo à luz do art. 1.009, §1º.

9. Questões de direito intertemporal

As pesquisas sobre direito intertemporal decorrentes de um novo diploma legal costumam despertar muito interesse logo que esse entra em vigor, mas desaparecem por completo pouco tempo depois.

Raros são os estudos sobre esse importantíssimo tema que têm período de “sobrevivência” maior do que os primeiros meses de transição entre uma lei velha e outra nova.

Talvez o melhor exemplo dessa exceção seja a obra de Galeno Lacerda publicada no primeiro ano de vigência do Código de 1973, intitulada O novo direito processual civil e os feitos pendentes, que traz diretrizes utilíssimas que não se aplicam somente aos problemas decorrentes da aplicação daquele diploma naquele momento histórico, mas fornecem material perene e seguro para qualquer investigação em torno do tema.

Assim, mesmo correndo o risco de que o presente item caia completamente no vazio, poucos meses após sua elaboração, não custa nada pensar em problemas que podem ocorrer durante o período de transição da disciplina do agravo anterior e posterior ao CPC de 2015. E para tanto, pode-se perfeitamente partir das lições ainda atuais de Galeno Lacerda.

Segundo o mestre gaúcho[109], a regra geral que emerge do art. 1211 do CPC de 1973 – e que foi prestigiada pelo art. 1.046 do CPC de 2015 –, é a de que o direito processual novo se aplica aos feitos pendentes. Essa regra, a rigor, gera mais problemas do que soluciona. Seria muito mais simples se nosso legislador tivesse escolhido norma parecida com a ditada pelo art.192 da nova lei de falências e recuperação de empresas (Lei n. 11.101/2005): “esta Lei não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei no 7.661, de 21 de junho de 1945.”

Seja como for, no tocante aos recursos, Galeno Lacerda[110] começa por distinguir duas situações: a primeira do recurso interposto sob a vigência da lei velha, e a segunda do recurso oferecido já sob o império da lei nova.

No primeiro caso, a solução é bem tranquila, não havendo dificuldade de enxergar no recurso já interposto um ato consumado, o qual a lei nova não pode atingir retroativamente. Se um dado recurso era cabível e, depois de interposto, sobrevém uma lei nova que o exclui, o recorrente não será prejudicado, sob pena de se ferir o preceito constitucional que protege o direito adquirido (CF, art. 5º, XXXVI). Isso soluciona os casos de agravos de já interpostos e que deixaram de ser cabíveis no momento em que o art. 1.015 passou a viger.

A dificuldade é um pouco maior se o recurso é interposto já sob a égide da lei nova. Novamente duas situações diversas se colocam: (a) a decisão recorrida poder ter sido prolatada e publicada ainda sob vigor da lei velha, ou (b) embora a decisão date dos tempos de vigência da lei velha, as partes são intimadas depois do início de vigor da lei nova.

Resolvendo-se a dúvida sob a ótica do direito adquirido, em ambas as situações o resultado é o mesmo: o recurso deverá observar os ditames da lei velha. Se era cabível sob a lei velha, e deixou de sê-lo depois, a lei não prejudicará o direito adquirido do recorrente.

Essa solução passa pela constatação de que o simples proferimento da decisão – independentemente da intimação – já confere às partes o direito de recorrer. A intimação apenas inaugura o prazo recursal, mas não obsta que a parte, dando-se por ciente da decisão, antecipe-se para dela recorrer[111]. Em síntese: com o simples proferimento da decisão, a parte sucumbente adquire o direito ao recurso segundo a lei vigente naquele momento.

Assim, se o agravo de instrumento era perfeitamente cabível antes do início de vigência do CPC de 2015 e, depois, passou a não mais ser (porque não se encaixa mais no art; 1.015), está preservado o direito do litigante em recorrer.

Uma vez interposto o recurso, sob a égide do CPC revogado, seu processamento deve se dar a partir de então à luz do CPC de 2015, por aplicável o princípio tempus regit actum.

10. Dos requisitos intrínsecos do agravo de instrumento.

O art. 1.017 é de manifesta simplicidade. Primeiramente, ele repete a bem sucedida fórmula implementada pela Lei n. 9.139/95, ao reformar o CPC de 1973, no sentido de determinar que o agravo de instrumento seja interposto por petição dirigida ao tribunal competente (e protocolada na forma de um dos incisos do §2º do art. .1.017, adiante comentado). De resto, quanto ao conteúdo da peça, não há muito o que comentar, haja vista que seria impensável que, mesmo sem norma expressa, algum advogado deixasse de mencionar “os nomes das partes”, “a exposição do fato e do direito[112]” e “as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão e o próprio pedido[113]” (incisos I a III do artigo 1.016). Merece breve destaque apenas a parte final do inciso IV, que exige a apresentação do “endereço completo dos advogados constantes do processo”. Trata-se de exigência que tinha sentido em um sistema em que as intimações eram feitas pela via postal ou por mandado. Contudo, considerando-se que o art. 272, reforçado nesse particular, pelo art. 1.019, II, impõe a intimação dos advogados pelo Diário Oficial, o inciso IV ora em exame acaba por se revelar inútil. De toda forma, mesmo que falte algum desses requisitos, a combinação dos arts. 1.017, §3º com o art. 932, par.ún. impõe ao relator o dever de dar oportunidade ao recorrente de sanar o vício em cinco dias, sob pena, aí sim, decretar a inadmissibilidade do recurso.

11. Dos requisitos extrínsecos do agravo de instrumento

Quanto aos documentos que devem formar o instrumento de agravo, o art. 1.017, incisos I a III, §1º e §5º, ocupa-se dos documentos que devem formar o instrumento, cabendo a respeito algumas observações. Manteve-se a lógica vigente no CPC de 1973 reformado em distinguir as cópias trasladadas dos autos de origem em duas categorias: obrigatórias e facultativas, sendo as primeiras aquelas indispensáveis para aferição dos requisitos de admissibilidade recursal e as demais aquelas que se mostrassem úteis para compreensão da controvérsia travada no agravo. Essa dicotomia revelava-se útil na medida em que dela se extraía o entendimento de que a falta de peças obrigatórias ensejaria a inadmissão do recurso (salvo raras exceções), ao passo que a ausência de peças facultativas, não. Contudo, essa dicotomia já vinha sendo relativizada pelos tribunais na vigência do CPC de 1973, que diuturnamente negavam seguimento a agravos ante a falta de peças que, embora não listadas dentre as obrigatórias, seriam imprescindíveis para a compreensão da questão recorrida (constituiriam, sem qualquer base legal, uma terceira categoria de peças, as “essenciais” ou “necessárias”, ao lado das obrigatórias e facultativas). A rigor, à luz do CPC de 2015, essa classificação se torna desnecessária, seja porque o §3º do art. 1.014 obriga o relator a oportunizar ao recorrente a complementação do instrumento sem limitar às peças facultativas, seja porque o §5º dispensa a apresentação de cópias no agravo de instrumento interposto contra decisão proferida em autos digitais, cabendo ao tribunal consultá-los diretamente. Seja como for, a quantidade de peças obrigatórias exigidas pelo art. 1.017, I, aumentou em relação ao dispositivo equivalente na legislação revogada, pois passou a incluir a petição inicial, a contestação e a petição que ensejou a decisão agravada, a demonstrar que as peças obrigatórias passam também a ter um papel relevante não apenas no juízo de admissibilidade, mas também no de mérito. Outra novidade relevante, e digna de nota, concerne à possibilidade conferida pelo inciso II de o advogado do agravante declarar, sob sua responsabilidade, a inexistência de determinada peça reputada obrigatória pelo inciso I. Tal declaração inverte o ônus da prova para o agravado, a quem competiria apresentar a peça faltante. Nesse caso, não poderá o relator afastar o comando do §3º do mesmo art. 1017 e deverá dar oportunidade para correção (se necessária) antes de inadmitir o recurso[114], sem prejuízo de aplicar as sanções decorrentes de eventual má-fé, além de eventualmente oficiar o órgão competente para apuração de responsabilidade do subscritor do agravo pela declaração inverídica. Por fim, o §1º do art. 1.017, ao regular o tema das custas processuais decorrentes da interposição do agravo, acolhe a distinção entre o preparo recursal – contraprestação paga ao Estado-juiz pelo serviço jurisdicional prestado em sede recursal, que têm natureza de taxa (CF, art. 145, II e CTN, arts. 77 e ss.), e, como qualquer tributo, deve ser majorada por lei – dos emolumentos para prática de atos específicos realizados pela Serventia Judicial – em especial o chamado “porte de retorno”, isto é, custo do envio postal dos autos físicos do agravo de instrumento findo ao órgão de 1º grau – os quais podem ser instituídas ou majoradas por atos infralegais, emanados dos tribunais. É ainda pertinente destacar as seguintes disposições relacionadas ao tema fora do capítulo destinado ao regime do agravo de instrumento: (a) o art. 1.004, §1º, dispensa do recolhimento de quaisquer custas (taxa e emolumentos) os recursos interpostos pelo Ministério Público, pela União, pelo Distrito Federal, pelos Estados, pelos Municípios, e respectivas autarquias”; (b) O art. 1.007, §3º, limitou o poder dos tribunais em cobrar o “porte de retorno” quando os autos de forem eletrônicos; (c) equiparam-se os efeitos da falta de recolhimento das custas à insuficiência do recolhimento, pois em ambos os casos o relator é obrigado a outorgar à parte o prazo de cinco dias para correção do vício (art. 932, par.ún., 1.017, §3º), com a diferença de que no caso de falta de recolhimento, o recorrente deverá, no prazo assinado pelo juiz, pagar as custas em dobro (art. 1.007, §4º), ao passo que no caso de insuficiência, bastará completar o valor (art. 1.017, §2º); (d) o art. 1.007, §7º, traz salutar norma que impede uma das mais odiosas filigranas formais às quais o tribunais (sobretudo os superiores) já se apegaram para não conhecer recursos, ao dispor que “o equívoco no preenchimento da guia de custas não implicará a aplicação da pena de deserção, cabendo ao relator, na hipótese de dúvida quanto ao recolhimento, intimar o recorrente para sanar o vício no prazo de cinco dias”. No tocante ao local e forma de interposição, o dispositivo disponibiliza ao recorrente diversos meios para apresentação do agravo de instrumento, mas todas elas voltadas à hipótese em que a peça será física. De fato, em se tratando de recurso a ser interposto por peticionamento eletrônico, tornam-se descabidas essas possibilidades, cabendo à parte apresentar a peça na forma digital, com os requisitos formais previstos nos arts. 192 e 193, bem como a Lei n. 11.419/2007 (que continua em vigor). Em se tratando de peça física, o lugar preferencial será o tribunal competente para julgar o agravo de instrumento (inciso I) a quem, aliás, o recurso é dirigido (art. 1.016, caput). Contudo, a fim de facilitar o acesso do recorrente ao tribunal, o dispositivo contempla expressamente a possibilidade de protocolo da peça: (a) no local em que se acha sediado o juízo prolator da decisão recorrida (inciso II); (b) pelo correio (inciso III) contando-se o prazo da data da data da postagem (art. 1.003, §4º); ou (c) por fax (inciso IV), aplicando-se aqui o disposto na Lei n. 9.800/99 (que também continua em vigor) e o §4º do mesmo art. 1.017 (segundo o qual as peças formadoras do instrumento só precisam ser apresentadas com o original, bastando a transmissão, por fax, da própria peça com os requisitos do art. 1.016. Finalmente, a combinação dos arts. 1.017, §3º com o art. 932, par. ún., permite reconhecer uma notável novidade no CPC de 2015 em relação ao CPC de 1973, isto é, o dever do juiz em oportunizar à parte a correção de vícios em seu agravo de instrumento antes de declará-lo inadmissível (assim também entendeu o Fórum Permanente de Processualistas Civis, em seu enunciado n. 82: “É dever do relator, e não faculdade, conceder o prazo ao recorrente para sanar o vício ou complementar a documentação exigível, antes de inadmitir qualquer recurso, inclusive os excepcionais. (Grupo: Ordem dos Processos no Tribunal, Teoria Geral dos Recursos, Apelação e Agravo))”. Contudo, não é todo vício que enseja a aplicação do dispositivo. Tomando emprestada a classificação de Barbosa Moreira[115] para os requisitos de admissibilidade dos recursos, seriam sanáveis apenas dois dos requisitos extrínsecos (regularidade formal e preparo). O terceiro dos requisitos extrínsecos (tempestividade) e os requisitos intrínsecos (cabimento, legitimidade, interesse e inexistência de fato impeditivo e extintivo) não são passíveis de correção. Quando muito, o relator estaria sujeito a oportunizar ao recorrente o prévio debate dessas questões, antes de decidir, nos termos do art.9º, oportunidade em que será possível esclarecer algum aspecto relacionado à admissibilidade recursal.

12. A alteração da sistemática do artigo 526 do CPC/73

O dispositivo 1.018 do Novo CPC trata da juntada, aos autos de origem, da cópia do agravo de instrumento interposto, no prazo de três dias a contar da interposição do recurso. Desde o momento em que regra similar foi inserida no CPC de 1973 por força de reforma processual, considera-se que ela teria dupla finalidade[116]: (a) facilitar o conhecimento do agravado acerca das razões do recurso e das peças que o instruíram; e (b) permitir que o juiz prolator da decisão agravada exerça o juízo de retratação (que é inerente a essa modalidade de recurso e vem prestigiada pelo CPC de 2015, conforme deixa claro o §1º). A finalidade prevista na letra ‘b’, supra, permanece imutável em se tratando de autos físicos ou autos eletrônicos. Contudo, o objetivo referido no item ‘a’, acima, fica esvaziado em se tratando de agravo de instrumento processado em autos eletrônicos (em que o acesso do agravado às razões recursais e às peças que formaram o instrumento é imediato). Atento a essa realidade, o dispositivo diferencia as consequências da omissão do agravante em adotar essa providência em autos eletrônicos e em autos físicos. De fato, a conjugação do §1º, do §2º e §3º permite inferir que a juntada da cópia do recurso nos autos de origem é uma faculdade, e não ônus, cuja falta não enseja a inadmissibilidade do recurso, mas apenas a impossibilidade de o juízo a quo exercer o juízo de retratação. Contudo, quanto os autos do recurso forem físicos, a falta de cumprimento dessa formalidade, desde que alegada e provada pelo agravado ao responder o recurso, ensejará a inadmissibilidade do recurso. Se o agravado não alegar e provar o fato na forma e tempo devidos, não se poderá apenas o agravante com a inadmissibilidade do recurso. Teria andado melhor o legislador se tivesse sujeitado o agravado a outro ônus: o de provar que a omissão do agravante em cumprir a providência aqui em tela lhe causou prejuízo[117]. Se o agravado pôde responder ao recurso normalmente, a inadmissibilidade recursal desponta solução exageradamente formalista. Por fim, quanto à retratação do juízo a quo, importa destacar que: (a) ela pode ser parcial, de modo que nesse caso o agravo de instrumento não ficará inteiramente prejudicado[118]; (b) não pode ocorrer se o agravo de instrumento já foi julgado, haja vista que a decisão do tribunal substitui a decisão recorrida (art. 1.008).

13. Juízo de admissibilidade do agravo de instrumento.

O artigo 1.019 estabelece o roteiro a ser seguido posteriormente ao protocolo do agravo de instrumento, isto é: (a) Distribuição, feita conforme os arts. 284 ao 286 e 930, e as regras complementares do regimento interno do tribunal respectivo; (b) Análise da admissibilidade recursal (art. 932, III), com eventual determinação para correção do vício sanável (art. 932, par. ún.,), ou inadmissão liminar e monocrática em caso de vício insanável; (c) Análise de mérito, destinada a verificar se a tese defendida no recurso contraria entendimentos consagrados em enunciados de súmula do STF ou STJ ou acórdãos que julgam processos repetitivos no STF, STJ ou tribunais de 2º grau (art. 932, IV), caso em que o recurso será improvido liminar e monocraticamente; (d) Análise do cabimento da antecipação de tutela recursal, seja para sustar os efeitos da decisão recorrida (efeito suspensivo) ou conceder a providência negada em 1º grau (o que vinha sendo impropriamente chamado de “efeito ativo”), por meio de decisão monocrática liminar recorrível por agravo interno (art. 1.020); (e) Intimação do agravado em nome do seu advogado, via de regra pelo Diário Oficial, ou, apenas excepcionalmente, por carta com aviso de recebimento salvo se não tiver procurador constituído, hipótese em que haverá intimação por carta; (f) Resposta do agravado em 15 dias, em que poderá juntar documentos e apontar vícios, os quais, se forem sanáveis, podem ser corrigidos no prazo de cinco dias (art. 1.017, §3º c.c. art. 932, par.ún.); e (g) Intimação do MP nas causas em que intervier. A respeito do disposto no inciso II, três ponderações se mostram necessárias. A primeira é a de que esse dispositivo excepciona, sem razão, o disposto no art. 346, segundo o qual “Os prazos contra o revel que não tenha patrono nos autos fluirão da data de publicação do ato decisório no órgão oficial”. A segunda, é a de que a intimação postal do réu ainda não citado para responder ao agravo de instrumento lhe dará conhecimento acerca da demanda proposta no juízo de origem dispensando-se sua citação. A bem da segurança jurídica, poder-se-ia considerar que a apresentação de contrarrazões ao agravo de instrumento constitui “ingresso” do réu na causa, a atrair a incidência do art. 239, §1º. Por fim, é necessário investigar se a antecipação de tutela recursal é apta à “estabilização”, nos termos do art. 304. A favor da resposta negativa, pode-se afirmar que seria passível de estabilização apenas a “tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303” (isto é, por meio de procedimento da tutela antecipada requerida em caráter antecedente e autônomo e concedida pelo juízo de 1º grau). A favor da resposta positiva, tem-se a falta de proibição expressa e o fato de que o art. 304 condiciona a estabilização à falta de interposição do “respectivo recurso”, sem se limitar ao agravo de instrumento (art. 1.015, I), o que poderia permitir contemplar o agravo interno (art. 1.037).

14. Prazo para julgamento do agravo de instrumento

O prazo previsto nesse dispositivo pode ser excedido, por igual período, havendo “motivo justificado” (art. 227). Após o transcurso dessa prorrogação, três consequências podem ser cogitadas: (a) Responsabilização civil do relator, por meio de ação própria, quanto aos prejuízos causados pela parte em razão do descumprimento do dever de “velar pela duração razoável do processo” (art. 139, II) a qual, contudo, fica afastada sempre se comprovar “justo motivo” (art. 143, II); (b) Responsabilização administrativa do relator, por meio de representação movida por qualquer parte, o Ministério Público ou a Defensoria Pública perante o corregedor do tribunal ou o Conselho Nacional de Justiça (art.235); (c) Remessa dos autos ao substituto legal para prática do ato em dez dias, por força de decisão do corregedor do Tribunal ou do relator no Conselho Nacional de Justiça nos autos da mesma representação referida no art. 235. De todo modo, convém lembrar que o cumprimento das providências indicadas neste artigo sujeita-se igualmente ao respeito à ordem cronológica nos processos, nos termos e condições do art. 12.


[1] Alguns dos itens deste ensaio contém ideias por mim já desenvolvidas em ensaios anteriores, em especial os seguintes: (a) Recorribilidade das interlocutórias e reformas processuais: novos horizontes do agravo retido, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, v.8, Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr. (coord.). São Paulo: RT, 2005, p.161-230; (b) O agravo e o “mito de Prometeu”: considerações sobre a Lei n. 11.187/2005, In. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, v. 9, Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr. (coord.), São Paulo: RT, 2006, p.193-219; e (c) Segundas reflexões sobre a nova lei do agravo, Revista do Advogado, v.26, n. 85, São Paulo: Associação dos Advogados de São Paulo, maio de 2006, p.149–158.
[2] Comentários ao Código de Processo Civil, 12 ed. rev., atual., Rio de Janeiro: Forense, 2005, v.5, p.488.
[3] O CPC de 2015 define as decisões interlocutórias por exclusão, a partir do conceito de sentença. De acordo com o art. 203, §1º, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”, ao passo que o §2º define decisão interlocutória como “todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no §1º”
[4] O regime de recorribilidade das decisões interlocutórias constitui foco permanente de tensão, sobretudo porque nele se chocam os valores mais importantes na órbita do processo civil, embora conflitantes entre si: (a) a busca pela melhor justiça ao caso concreto; (b) a necessidade de segurança jurídica como postulado inerente ao Estado de Direito; e (c) a premente exigência de celeridade processual. A ampla recorribilidade em separado das interlocutórias atende ao primeiro valor acima elencado, pois fornece às partes meios para provocar o reconhecimento de injustiças eventualmente cometidas no curso do procedimento, permitindo imediata correção de rumo quando for o caso. Porém, conforme adiante demonstrado, a ampla possibilidade de recurso contra questões incidentais está historicamente ligada a um forte regime preclusivo. De fato, caso quede irrecorrida determinada decisão interlocutória, ou caso o recurso contra ela interposto seja rejeitado, a decisão torna-se, no mais das vezes, imutável, e imune de ataques das partes e de revogação pelo magistrado que a prolatou, de tal modo a valorizar a segurança jurídica. Por fim, ao restringir a recorribilidade das interlocutórias, o sistema aposta na celeridade processual, em que pese assumir o risco de manter “incubadas” invalidades processuais que eventualmente levarão muito tempo para ser reconhecidas e, se o forem, se gerará enorme atraso processual (face ao desperdício de atividade processual e eventual necessidade de repetição de atos).
[5] A rigor, pode-se detectar no Baixo Império Romano as primeiras tentativas de equacionar a questão.  José Rogério Cruz e Tucci e Luiz Carlos de Azevedo (Lições de história do processo civil romano, 1ª ed., 2ª tir., São Paulo: RT, 2001, p.169-170) mencionam fragmento do Digesto (49.5.2) da época dos Severos, que atesta serem apeláveis as decisões interlocutórias. Moacyr Lobo da Costa confirma que a appellatio contra interlocutórias era cabível no Século III d.C., e que a prática foi posteriormente proibida pelo Código Teodosiano e pelo Código Justinianeu (O agravo no direito lusitano, Estudos de história do processo: recursos, São Paulo: FIEO, 1996, p.134-135).
[6] Ambas as leis aqui referidas acham-se reproduzidas no Livro 3 das Ordenações Afonsinas, de 1446, respectivamente nos Títulos 71 e 72. Não deve causar espanto o fato de o mesmo monumento legislativo trazer normas contraditórias entre si, pois se tratava de uma mera compilação, cuja aplicação exigia do intérprete a análise das sucessivas derrogações.
[7] Cfr., v.g., Barbosa Moreira, Comentários…, cit., v.5, p.486.
[8] Cfr., v.g., Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1975, v.7, p.264.
[9] Cfr., v.g.,. José Rogério Cruz e Tucci, Jurisdição e poder: contribuição para a história dos recursos cíveis, São Paulo: Saraiva, 1987, p.168.
[10] Cfr., v.g., Moacyr Lobo da Costa. Origem do agravo no auto do processo, Estudos de história do processo, cit., p.189.
[11] Cfr., v.g., Cruz e Tucci, Jurisdição e poder, cit., p.168.
[12] Cfr., v.g., Alcides de Mendonça Lima, Introdução aos recursos cíveis, 2 ed., rev. e atual., São Paulo: RT, 1976, p.21.
[13] Como não poderia deixar de ser, a Proclamação da Independência marcou o momento em que os caminhos das legislações portuguesa e brasileira se separaram. Contudo, o peso da tradição é tão intenso que ambos os ordenamentos continuaram por séculos cultivando a dicotomia “agravo-apelação”, tipicamente luso brasileira a qual se manteve intacta pelo CPC brasileiro de 2015, mas foi abandonada pelo CPC português de 2013. De fato, seu art. 644 do CPC de 2013 passou a prever o cabimento de apelação tanto as decisões finais, quanto algumas decisões interlocutórias.
[14] Idem, p.38.
[15] Cfr., v.g., Cruz e Tucci, Jurisdição e poder, cit., p.188-189.
[16] Cfr., v.g., Alcides de Mendonça Lima, Introdução aos recursos cíveis, p.44.
[17] Cfr., v.g., Barbosa Moreira, Comentários…, cit., v.5 p.478.
[18] Além dos recursos em face das interlocutórias, de que se ocupa o texto, convém destacar que as decisões definitivas de mérito eram atacadas pela apelação (art.820), ao passo que as terminativas deveriam ser desafiadas pelo agravo de petição (art.846).
[19] Para citar alguns exemplos de decisões enumeradas no art.842, vejam-se aquelas que inadmitiam intervenção de terceiros (inc.I), que julgassem exceção de incompetência (inc.II) ou que inadmitiam a apelação (inc.IX); havia outras, como aquelas mencionadas nos incisos VII e VIII que diziam respeito a procedimentos especiais, e as dos incisos XI a XIII aplicáveis apenas a hipóteses do processo de execução. É fácil perceber não haver qualquer rigor técnico ou científico para determinar que decisões seriam agraváveis de instrumento e quais não. O rol era taxativo, e não admitia interpretação extensiva (por exemplo: a decisão que admitisse a intervenção de terceiros não poderia ser agravada com fundamento no art.842, I).
[20] Já o rol do art.851 era mais restrito e, pode-se dizer, um pouco mais lógico, embora também tecnicamente frágil. No inciso I trazia-se a decisão que rejeita exceção de litispendência e de coisa julgada; o inciso II mencionava a decisão que indefere prova, ou que importe de qualquer modo em “cerceamento de defesa”; o inciso III inseria a decisão concessiva de “medidas preventivas” no curso da lide, e, por fim, o inciso IV, que incluía a decisão que considerava ou não saneado o processo (exceto nos casos em que o extinguia sem exame de mérito, pois dela caberia agravo de petição, como a parte final desse próprio inciso advertia).
[21] Conforme noticia, por exemplo, José Frederico Marques, Instituições de direito processual civil, 1 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1958, v.2, p.380 e ss..
[22] Athos Gusmão Carneiro (Recurso especial, agravos e agravo interno, 2 ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001, p.96, nota 2) relata ter sido a emenda legislativa, apresentada no Senado da República inspirada em sugestão de Moniz de Aragão.
[23] Antes das reformas de 2001 e 2005, Teresa Arruda Alvim Wambier (O novo regime do agravo,  2 ed. rev. e atual., São Paulo: RT, 1996, p. 255 e ss.) lecionava que a liberdade de opção entre as duas formas de agravo era limitada, apenas, pela exigência do interesse recursal; em algumas situações, o agravo sob a forma retida não pode ser admitido, pois quando de sua eventual e oportuna apreciação pela instância superior, o dano causado pela decisão agravada pode já ter se consumado e ser irreversível.
[24] Com redação dada pela Lei n. 9.245/95.
[25] Idem.
[26] Trata-se de fato reconhecido de maneira uníssona, cumprindo citar apenas a guisa de exemplo alguns autores que examinaram a questão poucos anos após o advento da Lei n. 9.139/95: Carlos Alberto Carmona (O sistema recursal brasileiro – breve análise crítica, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos, (Série Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos, v.3), Eduardo Pellegrini de Arruda Alvim, Nelson Nery Jr., Teresa Arruda Alvim Wambier (coord.), São Paulo: RT, 2000, p.41) e dos mais destacados artífices das duas primeiras “ondas” de reformas processuais, Sálvio de Figueiredo Teixeira (O prosseguimento da reforma processual, O prosseguimento da reforma processual, Revista de Processo, v.24, n. 95, jul-set/1999, p. 10).
[27] Fato notado, por exemplo, por Barbosa Moreira, Reformas do CPC em matéria de recursos, Revista Forense, v. 97, n. 354, mar-abr/2001, p.178.
[28] Como testemunha Barbosa Moreira, com base em estatísticas, no artigo Reformas do CPC em matéria de recursos, cit.., p.177, nota 2.
[29] Como reconheceu Sálvio de Figueiredo Teixeira (Prosseguimento da reforma processual, cit., p.10) e também observam vários autores que se debruçaram sobre o estudo dessa reforma processual, como v.g. José Miguel Garcia Medina (A recentíssima reforma do sistema recursal brasileiro – análise das principais modificações introduzidas pela lei 10352/2001 e outras questões, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e outras formas de impugnação às decisões judiciais (Série Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos, v.6), Nelson Nery Jr., Teresa Arruda Alvim Wambier (coord.), São Paulo: RT, 2002,  p.353-354); e Fabiano Carvalho (Os agravos e a reforma do código de processo civil, in A nova etapa da reforma do código de processo civil, Hélio Rubens Batista Ribeiro Costa, José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro e Pedro da Silva Dinamarco (coord.), São Paulo, Saraiva, 2002, p.288–289).
[30]V.g. RMS 25934/PR, Corte Especial, rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 27/11/2008, Dje 09/02/2009 e RMS 30269/RJ, 4ª Turma, j. 11/06/2013, rel. Min. Raul Araújo.
[31] Trata-se de conclusão a que cheguei nos já referidos textos Recorribilidade das interlocutórias…, cit. e O agravo e o “mito de prometeu, cit..
[32] O agravo e o “mito de Prometeu”, cit.
[33] Mateus 7, 24-27
[34] Registre-se, por oportuno, que o Senado excluiu 8 (oito) hipóteses de agravo de instrumento contempladas pelo substitutivo aprovado pela Câmara dos Deputados em 26.03.2014, quais sejam, decisão “que versar sobre competência” (art. 1.028, inciso X), “determinar a abertura de procedimento de avaria grossa” (XI),” indeferir a petição inicial da reconvenção ou a julgar liminarmente improcedente” (XII), “redistribuir o ônus da prova nos termos do art. 380, § 1º” (XIII); converter a ação individual em ação coletiva (XIV), “alterar o valor da causa antes da sentença” (XV); “decidir o requerimento de distinção na hipótese do art. 1.050, § 13, inciso I” (XVI); resolver o requerimento previsto no art. 990, § 4º” (XVIII), “indeferir prova pericial” (XIX) e “não homologar ou recusar aplicação a negócio processual celebrado pelas partes” (XX).
[35] De fato, o art. 1.028, I, do substitutivo da Câmara limitava o cabimento do agravo de instrumento contra decisão interlocutória que “conceder, negar, modificar ou revogar a tutela antecipada”. Note-se que o Senado alterou a terminologia do Código, e passou a usar o termo “tutela provisória” para designar o que a Câmara dos Deputados denominara “tutela antecipada”.
[36] Art. 520, IV, c.c. art. 297, par. ún..
[37] Art.536, §1º, c.c. art. 297, par. ún..
[38] O enunciado n. 177 do Fórum Permanente de Processualistas Civis reconheceu, corretamentre, tratar-se de decisão agravável: “A decisão interlocutória que julga procedente o pedido para condenar o réu a prestar contas, por ser de mérito, é recorrível por agravo de instrumento. (Grupo: Procedimentos Especiais)”.
[39] De fato, o mérito deve ser entendido como o(s) pedido(s) formulado(s) pelas partes, iluminado(s) pela(s) causa(s) de pedir, e não se confunde com as questões de mérito, que encerram pontos controvertidos de fato e de direito que se antepõem como fundamentos necessários para que se atinja uma solução final para o(s) pedido(s) formulado(s) pelas partes. Trata-se de distinção acolhida, v.g., por Dinamarco (O conceito de mérito no processo civil, Fundamentos do processo civil moderno, 5 ed., rev. São Paulo: Malheiros, 2002, t.1, p. 273 e ss) e Kazuo Watanabe (Da cognição no processo civil. 2. ed. atual. Campinas: Bookseller, 2000, p. 106).
[40] No trabalho Preclusão processual civil, p.204-205, acolhi a tese defendida, dentre outros, por Dinamarco (Nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2003, p.281-282) no sentido de que “O Código de Processo Civil não abre a menor possibilidade de cindir o julgamento do mérito mediante a antecipação de algumas das questões diretamente ligadas a ele”, e que na sentença “se inclui não somente a decisão da causa, como a solução de todas as questões jurídico-substanciais capazes de influir sobre tal decisão”. Contudo, o CPC de 2015 alterou completamente as bases que o diploma anterior fornecia para sustentar essa tese, a começar pelo reconhecimento expresso e textual do julgamento antecipado parcial de mérito. Assim, revejo a posição anterior, de modo a afirmar que é, sim, possível que o juiz aprecie alguma questão de mérito no curso do processo sem, contudo, proferir decisão que aplique o disposto no art. 487, I.
[41] Salvo numa hipótese muito excepcional, em que a convenção de arbitragem cobrir apenas parte dos pedidos formulados. Nesse caso, a extinção do processo sem resolução de mérito é meramente parcial, e essa parte da decisão é agravável.
[42] Não fosse assim, seria forçoso subverter a lógica do art. 1.009, §1º, para admitir que o agravo de instrumento contra a decisão final do incidente fosse instrumento apto a levar ao tribunal decisões proferidas no curso do incidente.
[43] Haverá nesse caso preclusão lógica, a teor do art. 1.000 (“A parte que aceitar expressa ou tacitamente a decisão não poderá recorrer.”).
[44] Nesse último caso, não há mal em admitir que, após impugnar a própria exclusão, o autor peça em caráter subsidiário a revisão das verbas sucumbenciais. De outra parte, entendo imprescindível admitir que o réu excluído, mas não contemplado com as verbas sucumbenciais, possa de imediato recorrer, pois a partir de então ele não mais participará do processo e, portanto, não terá como suscitar essa questão em sede de apelação (aliás, considerando esse mesmo aspecto, o STJ entendeu descabida a conversão de agravo de instrumento em retido à luz do CPC de 1973: RMS 42501/PA, 4ª Turma, j. 21/11/2013, rel. Min. Raul Araújo).
[45] Segundo a recorrente classificação proposta por Athos Gusmão Carneiro (Intervenção de terceiros. 18. ed. rev. atual., São Paulo: Saraiva, 2009, p.56), pode-se falar em “intervenção por ação” e “intervenção por inserção”.
[46] Que, aliás conta com regime próprio no inc. IV do mesmo art. 1.015.
[47] Contudo, os meios de intervenção de terceiros que são encerados por sentença – caso da habilitação (por força de norma expressa do 692) e os embargos de terceiro (por uma interpretação sistemática e histórica dos art. 674 e 681) – não se aplicará o inciso aqui em exame, mas sim a combinação do art. 1.009, §1º e do art. 1.015.
[48] Aliás, em vários pontos o CPC reiterou desnecessariamente o cabimento de agravo de instrumento em situações já previstas no art. 1.015 (art.101 vs art. 1.015, V; art. 356, §5º  vs art. 1.015, II etc.,).
[49] Art. 354. Ocorrendo qualquer das hipóteses previstas nos arts. 485 e 487, incisos II e III, o juiz proferirá sentença. Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput pode dizer respeito a apenas parcela do processo, caso em que será impugnável por agravo de instrumento.
[50] Art. 518. Todas as questões relativas à validade do procedimento de cumprimento da sentença e dos atos executivos subsequentes poderão ser arguidos pelo executado nos próprios autos e nestes serão decididas pelo juiz.
[51] O dispositivo regula a “impugnação ao cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de obrigação de pagamento de quantia certa”, que é apresentada “nos próprios autos”
[52] O dispositivo “impugnação ao cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de obrigação da Fazenda Pública quanto ao pagamento de quantia certa”, que é igualmente apresentada “nos próprios autos”
[53] Trata-se da visão tradicional sobre esse instrumento que, apesar de constituir meio de defesa do executado, encerra demanda na acepção estrita do termo, o que se confirmaria pelo fato de serem “distribuídos por dependência” e “autuados em apartado” (art.914, §1º) e serem resolvidos por sentença (art. 920), no qual são fixados honorários sucumbenciais (art. 85, §13º).
[54] Esse foi o tema central de minha monografia O direito de defesa no processo civil brasileiro – um estudo sobre a posição do réu, São Paulo: Atlas, 2011.
[55] O dispositivo, que foi oportunamente comentado, deixa uma dúvida. Se a questão incidente for resolvida por decisão interlocutória não agravável, a parte prejudicada por reiterá-la ao interpor ou responder apelação contra a sentença final. Contudo, se a questão incidente for resolvida na sentença, poder-se-ia imaginar que a parte estaria sujeita ao ônus de apelar (principal ou adesivamente). Contudo, para manter a coerência do sistema, parece que a única solução possível seria permitir que a matéria fosse suscitada apenas em sede de contrarrazões de apelação da parte adversa.
[56] Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal.
[57] Em tese seria necessário, novamente a bem da coerência do sistema, estender as restrições do art. 1.015 ao recurso especial e ao recurso extraordinário direcionados contra “acórdãos interlocutórios” proferidos sobretudo no âmbito dos processos de competência originária do tribunal. Contudo, somente uma emenda constitucional, que alterasse os arts. 102, III, e 105, III, poderia instituir tais limitações. Revela-se, aqui, mais uma incoerência do sistema recursal.
[58] Amplamente demonstradas por Teresa Arruda Alvim Wambier, Os agravos no CPC, 4 ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2006, p.102 ss..
[59] Dizia-se que o abandono dessa dicotomia não foi completo, porque mesmo após a Lei n. 11.232/05 continuou a existir a execução de título judicial autônoma contra a Fazenda Pública (CPC/73, artigos 730-731), e tendo por objeto sentença estrangeira, sentença arbitral e sentença penal condenatória (da qual constem valores de dano líquidos), bem como acordo extrajudicial homologado judicialmente (CPC/73, artigo 475-N, inc. II, IV, V, VI), nas quais não se cogita de prévia fase de conhecimento perante o juízo que processará os atos executivos.
[60] Registre-se que esse texto foi alvo de duríssimas críticas de Barbosa Moreira, em A nova definição de sentença, cit., p.173-174.
[61] Por mim destacadas no texto Algumas implicações do novo conceito de sentença no processo civil, de acordo com a lei n.. 11.232/2005, Reflexões sobre a reforma do Código de Processo Civil, Carlos Alberto Carmona (coord.), São Paulo: Atlas, 2007, p.186-209.
[62] O objetivo era permitir a bifurcação do procedimento, de modo a permitir a subida do recurso e a continuidade do procedimento em 1º grau de jurisdição.
[63]V.g., Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina (Breves comentários à nova sistemática processual civil, v.2, São Paulo, RT, 2006, p.36-37); Flávio Cheim Jorge, Marcelo Abelha Rodrigues e Fredie Didier Jr. (A terceira etapa da reforma processual civil, São Paulo, Saraiva, 2006, p.68 ss.); e Daniel Mitidiero (A nova execução – comentários à Lei n. 11.232, de 22 de dezembro de 2005, Carlos Alberto Alvaro de Oliveira (coord.), Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.8).
[64] A propósito confira-se a excelente pesquisa jurisprudencial realizada por Cláudia Helena Poggio Cortez, O novo conceito de sentença visto pelos tribunais. Revista de Processo, v.34. n.171, p.282-97, mai.2009.
[65] Como pontua, por exemplo, Pontes de Miranda (Comentários…, cit., v.7, p.273).
[66] Após recebimento do agravo retido, o juiz deveria fazer o exame de admissibilidade, e, se positivo, abria prazo para resposta da parte adversa, seguindo-se a possibilidade de o juiz de retratar-se.
[67] Art. 41 da Lei n. 9.099/95, art. 5º da Lei n. 10.259/01 e o art. 4º da Lei n. 12.153/09.
[68] Esse potencial retorno do agravo retido, disfarçado sob as vestes do “protesto”, invoca o chiste de Gabriel Rezende Filho sobre o “agravo no auto do processo”, à luz do CPC de 1939, “Esse recurso vem representando na legislação pátria – em volteios funambulescos de dança macabra – a figura lúgubre de uma entidade jurídica dotada da prosperidade de morrer e renascer de tempos em tempos da própria cinza” (Curso de direito processual civil, 2 ed., São Paulo: Saraiva, 1950, v.3, p.143).
[69] De fato, o protesto originou-se na Justiça do Trabalho, com fundamento no art. 795 da CLT (“As nulidades não serão declaradas senão mediante provocação das partes, as quais deverão argüi-las à primeira vez em que tiverem de falar em audiência ou nos autos.”. Esse dispositivo, por sua vez, enuncia regra muito parecida com a do art. 245 do CPC/73 e do art.278 do CPC/15 (“A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão”). Contudo, diferentemente da regra da CLT, os dois CPCs ressalvam a aplicação do dispositivo para as “nulidades que o juiz deva decretar de ofício,”.
[70]Rectius: Substitutivo da Câmara dos Deputados.
[71] Embora não se possa confundir mens legis com mens legislatoris, essa eloquente exclusão afasta por completo qualquer possibilidade de se exigir das partes o alegado “protesto” apenas com base no art. 278, acima mencionado.
[72] Note-se que se o litigante mostrar-se expressa ou tacitamente conformado com a decisão, haverá de se aplicar o art. 1.000, que prevê uma hipótese de preclusão lógica, com a seguinte redação: “Art. 1.000. A parte que aceitar expressa ou tacitamente a decisão não poderá recorrer. Parágrafo único. Considera-se aceitação tácita a prática, sem  nenhuma reserva, de ato incompatível com a vontade de recorrer.
[73] Questão interessante, e que pode surgir, se refere à existência ou não de preclusão para a parte que apela sem suscitar determinada matéria nos termos do art. 1.009, §1º, e, depois, o faz ao contrarrazoar apelação (principal ou adesiva) do seu adversário. Penso que não se pode estabelecer nesse caso a preclusão, pois é legítimo que a parte opte por limitar a extensão das questões devolvidas ao tribunal em sua apelação, e constatar o interesse em suscitar uma questão incidental não agravável apenas aio responder apelação do seu adversário. Um exemplo extremo ilustra esse entendimento: pense-se na parte que, tendo saído vencedora, apela apenas para aumentar o valor dos honorários sucumbenciais. Não haveria interesse em impugnar, nessa oportunidade, uma decisão interlocutória que indeferiu a realização de uma prova pericial. Contudo, à vista da apelação (principal ou adesiva) do adversário, que pugnava pela integral reforma da sentença, passou o litigante a ostentar interesse em apontar eventual cerceamento de defesa.
[74]Comentários…, cit., v.5, p. 258.
[75] Cfr., v.g., Dinamarco, Efeitos dos recursos, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos, de acordo com a lei 10.325/2001, (Série Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos, v.5), Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier (coord.), São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002, p.39-43.
[76] Por mim amplamente destacado em Preclusão processual civil, cap.8.
[77] “Essa característica do processo especial, de não admitir recurso contra decisão interlocutória, não quer dizer que fica vedada, de modo absoluto, a repropositura de questões junto ao órgão recursal. Uma vez proferida a sentença, o recurso contra ela interposto será eficaz para o reexame de todas as questões que foram objeto de decisões interlocutória” (Demócrito Reinaldo Filho, Juizados especiais cíveis, 2 ed., São Paulo: Saraiva, p.193). No mesmo sentido, Athos Gusmão Carneiro (Recurso especial, agravos e agravo interno, p.105).
[78] Essa primeira afirmação está em contradição com o art. 928, par. ún., do Anteprojeto, segundo o qual apenas as decisões não atacáveis por agravo de instrumento “não ficam acobertadas pela preclusão, podendo ser impugnadas pela parte, em preliminar, nas razões ou contrarrazões de apelação”.
[79]Preclusão processual civil, cap.8.
[80] Segundo conhecida fórmula, trata-se de “imperativos de próprio interesse”. A parte sujeita ao ônus processual pode, licitamente, escolher a prática do ato processual ou não. Se o fizer, goza de vantagens. Se não o fizer, suportará desvantagens, mas que não podem ser consideradas como sanções, pois a omissão no adimplemento do ônus não constitui comportamento antijurídico.
[81] O juiz recebe do Estado poderes e deve exercê-los de acordo com o ordenamento jurídico. Não há propriamente uma ampla liberdade de escolha entre exercer ou não o poder conferido pelo sistema processual.
[82] Esse fenômeno não se confunde com a impossibilidade legal de o juiz apreciar de ofício questões que as partes tenham deixado de propor, pois aqui não há a perda do poder do juiz em resolver a questão, mas sim a ausência de poder, ab initio, para fazê-lo.
[83]Preclusão processual civil, cap.8.
[84] Idem, ibidem.
[85] O art. 337, §5º, do CPC de 2015 (tal como faziam os arts. 267, §3º, e 301, §4º, do CPC de 1973) dispõe sobre a possibilidade de o juiz conhecer ex officio todas as matérias de cunho processual listadas nos 13 incisos do dispositivo, à exceção de competência relativa e convenção de arbitragem. Segundo as conclusões atingidas no meu Preclusão processual civil (cap.8), sempre que o sistema atribuiu ao juiz o poder de conhecer de ofício determinada matéria, lhe conferiu concomitantemente o poder de reanalisar essa questão mesmo que anteriormente decidida e ainda que a parte não tenha interposto o respectivo recurso. A ideia é a de que se o sistema pretendeu ignorar a omissão da parte em alegar a matéria, pretendeu igualmente ignorar sua inércia em recorrer, de modo que confiou ao órgão julgar a missão de dar correta solução à questão. No tocante às demais matérias referidas, as mesmas conclusões atingidas continuam aplicáveis, à falta de qualquer modificação do Código a respeito, cumprindo remeter o leitor para a consulta àquela obra, evitando-se, assim, o risco de desvirtuar o objetivo destes comentários.
[86] Ainda que o prazo para ajuizar ação rescisória contra a decisão interlocutória de mérito seja contado a partir da “última decisão proferida no processo” (art. 975).
[87] Para amplo exame desse tema, confiram-se os artigos anteriormente mencionados, isto é, Recorribilidade das interlocutórias e reformas processuais, cit., e O agravo e o “mito de Prometeu”, cit..
[88] O Substitutivo da Câmara incluíra essa hipótese no rol de decisões agraváveis (art. 1.028, XIX), mas o Senado a excluiu.
[89] Também se tratava de caso previsto no substitutivo da Câmara dos Deputados (art. 1.028, X), mas que foi excluído pelo Senado.
[90] Nos termos do art. 7º, I, da Lei n. 12.016/09. Tal providência seria dispensável se o meio de impugnação fosse o agravo de instrumento, pois o art. 1.016 aboliu o pedido de “informações” formulado pelo relator prolator da decisão agravada.
[91] Trata-se de providência considerada necessária pela doutrina e pela jurisprudência, por força da aplicação do CPC ao mandado de segurança. Se a meio de impugnação fosse o agravo de instrumento, o ato de comunicação pessoal só seria necessário quando o agravado não tiver advogado constituído pois, do contrário, a intimação seria feita de maneira muito mais simples, pelo Diário Oficial (art. 1.019, II).
[92] O art. 937 prevê sustentação oral quando do julgamento de qualquer mandado de segurança (inciso VI), mas limita o seu cabimento ao “agravo de instrumento interposto de decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência”.
[93] Por força do art. 12, II, da Lei n. 12.016/09. Poder-se-ia cogitar de alterar a Lei n. 12.016/09 para o fim de ressalvar a oitiva do MP nos casos de mandado de segurança contra ato judicial praticado em processo no qual o MP não intervém.
[94] A teor do art. 105, II, b, da Constituição Federal. Lembre-se que o recurso ordinário permite amplo reexame da causa e não se sujeita a diversos requisitos formais aplicáveis ao recurso especial.
[95] A teor do art. 23 da Lei n. 12.016/09
[96] A provável escapatória dos tribunais será generalizar o entendimento (esdrúxulo) de que o mandado de segurança contra ato judicial só pode ser admitido quando atacar “teratologia”, isto é, uma decisão incrivelmente ilegal e abusiva (acolhendo essa tesem, vejam-se recentes acórdãos do STJ: AgRg no MS 21.350/RO, Rel. Ministro Paulo De Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 12/11/2014, DJe 17/11/2014 e AgRg no MS 21.185/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Corte Especial, julgado em 15/10/2014, DJe 28/10/2014). A contrario sensu, essa tese aceita que ilegalidades não teratológicas passem incólumes do controle via mandado de segurança. Ademais, a tese confunde juízo de admissibilidade com juízo de mérito do writ. Ou seja, trata-se de entendimento que conflita com a Constituição Federal e com o ordenamento infraconstitucional.
[97] O agravo e o “mito de prometeu,. cit.”.
[98] O texto foi escrito em 2005 antes, portanto, do CPC português de 2013, que aboliu a dicotomia “apelação-agravo”
[99] Recorribilidade das interlocutórias…, cit.
[100] Versão de Elza de Andrade, Interpalco, 2005.
[101]Comentários…, cit., p.488.
[102] O exame aqui levado a cabo leva em conta a prestação de tutela cognitiva, que apresenta estrutura mais rigidamente definida. No tocante à prestação de tutela executiva, a variedade de técnicas processuais e a diferente cadência dos atos processuais faz com que o raciocínio aqui desenvolvido não se aplique. Ademais, a questão das limitações à recorribilidade em separado da s interlocutórias é impertinente ao âmbito da execução, em que todas as decisões são agraváveis por instrumento (art. 1.015, par. ún.).
[103]Instituiciones de derecho procesal civil, trad. de Emilio Gomez Orbaneja, Madrid: Revista de Derecho Privado, 1954, v.3, p.167.
[104] Nesse sentido, Ovídio Baptista da Silva (Decisões interlocutórias e sentenças liminares, Da sentença liminar à nulidade da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.3) assim pontuou: “Se fosse praticamente possível a construção de um sistema processual que se submetesse ao princípio da oralidade absoluta e radical – com seu consectário lógico da concentração numa única audiência do inteiro tratamento da causa – as decisões interlocutórias acabariam desaparecendo. A frequência com que elas aparecem, num determinado sistema processual, aumenta na mesma proporção em que o sistema se afasta da oralidade e da concentração e tende-se a tornar-se ordinário, com predomínio da escritura sobre a comunicação oral”. Penso que esse ensinamento mereceria apenas um pequeno reparo: as decisões interlocutórias não desapareceriam, em realidade, elas são tantas quantas forem as questões incidentais a serem resolvidas (seja o processo oral, seja o processo escrito). Apenas serão elas decididas de uma só vez e, possivelmente, pouco (ou nenhum) tempo haverá para que as partes interponham recursos em separado ou se cogite de o juiz alterá-las).
[105] O enunciado n. 214 da Súmula do TST assentou o seguinte: “Na Justiça do Trabalho, nos termos do art. 893, § 1º, da CLT, as decisões interlocutórias não ensejam recurso imediato, salvo nas hipóteses de decisão: a) de Tribunal Regional do Trabalho contrária à Súmula ou Orientação Jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho; b) suscetível de impugnação mediante recurso para o mesmo Tribunal; c) que acolhe exceção de incompetência territorial, com a remessa dos autos para Tribunal Regional distinto daquele a que se vincula o juízo excepcionado, consoante o disposto no art. 799, § 2º, da CLT”.
[106] Art. 41 da Lei n. 9.099/95, art. 5º da Lei n. 10.259/01 e o art. 4º da Lei n. 12.153/09.
[107] Trata-se de problema existente no Processo do Trabalho e nos Juizados Especiais Cíveis (regulados pela Lei n. 9.099/95, embora ele esteja mais bem equacionado no primeiro terreno. De fato, ante a inexistência de recurso contra a decisão concessiva de tutela de urgência, o TST pacificou o cabimento do mandado de segurança, por meio do enunciado n. 414 da sua Súmula, assim redigido: “Mandado de segurança. antecipação de tutela (ou liminar) concedida antes ou na sentença. I – A antecipação da tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A ação cautelar é o meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso. II – No caso da tutela antecipada (ou liminar) ser concedida antes da sentença, cabe a impetração do mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio. III – A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão da tutela antecipada (ou liminar)”. Já no âmbito da aplicação da Lei n. 9.099/95, alguns Juizados Especiais Cíveis aceitam o agravo de instrumento (mesmo à falta de qualquer norma que o autorize), e outros aceitam o mandado de segurança, mas dirigido ao colégio recursal, e não ao Tribunal de Justiça respectivo, na linha da Súmula n. 376 do STJ (“Compete a turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial.”), que foi editada por meio de uma aplicação analógica do art.21, VI, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (“Art. 21 – Compete aos Tribunais, privativamente: (…) VI – julgar, originariamente, os mandados de segurança contra seus atos, os dos respectivos Presidentes e os de suas Câmaras, Turmas ou Seções”).Tecnicamente, a Súmula do STJ (editada em março de 2009) poderia ser considerada superada pelo entendimento do STF exarado em maio do mesmo ano sobre o descabimento de qualquer remédio imediato (seja agravo de instrumento, seja mandado de segurança) sem que com isso se ofendam as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório (RE 576847, Rel.  Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 20/05/2009). Esse problema não ocorre nos Juizados Especiais Federais e da Fazenda Pública, já que o art. 5º da Lei n. 10.259/01 e o art. 4º da Lei n. 12.153/09 ressalvaram a recorribilidade das decisões que concedem tutela urgente, no curso do procedimento.
[108] Sobreviveu como matéria alegável em separado da contestação e passível de decisão antes da fase de saneamento apenas o pedido de desmembramento do litisconsórcio facultativo (art.113, §2º).
[109]O novo direito processual civil e os feitos pendentes, Brasília: Forense INL, 1974, p.10 e ss..
[110]O novo direito processual civil e os feitos pendentes, cit., p.57 e ss..
[111] Cfr. pontuou com ênfase Cândido Rangel Dinamarco, Tempestividade dos recursos, Revista dialética de direito processual, v.16, 2004, p.9 e ss..
[112] Quanto à desnecessidade de exigir que o agravante indique, de forma absoluta, os artigos de lei em que amparada a sua pretensão à luz dos brocardos iura novit curia e da mihi factum dabo tibi jus: STJ, REsp 818738/PB, 3ª Turma, j. 19/08/2010, rel. Min. Sidnei Beneti). Sobre a suficiência do pedido de provimento do recurso, por equivalente ao de reforma da decisão: STJ, REsp 236553/SP, 3ª Turma, j. 22/02/2005, rel. Min. Humberto Gomes de Barros.
[113] Quanto à desnecessidade de referência a todos os advogados das ´partes, bastando um que tenha poderes: STJ, REsp 510057/SP, 4ª Turma, j. 16/10/2003, rel. Min. Cesar Asfor Rocha; quanto à irrelevância da falta de referência ao endereço na peça recursal, se consta da cópia da procuração que forma o instrumento ou mesmo por quaisquer outros elementos constantes dos autos: STJ, AgRg no AREsp 363825/SP, 4ª Turma, j. 18/03/2014, rel. Min. Raul Araújo e AgRg no AREsp 276389/PA, 2ª Turma, j. 16/05/2013, rel. Min. Herman Benjamin.
[114] Acolhendo o entendimento de que, ausentes peças necessárias para a compreensão da controvérsia travada no agravo de instrumento, o relator deverá dar ao recorrente oportunidade para emenda, indicando com precisão o que reputa necessário: STJ, REsp 1102467/RJ, Rel. Ministro Massami Uyeda, Corte Especial, julgado em 02/05/2012, DJe 29/08/2012
[115] Barbosa Moreira, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil, 12 ed. rev., atual., Rio de Janeiro: Forense, 2005, v.5, p. 263
[116] Sobre a dupla finalidade da juntada aos autos de origem da cópia do agravo de instrumento, isto é, para possibilitar ao magistrado de primeiro grau o exercício do juízo de retratação e garantir que a parte agravada terá conhecimento do conteúdo do agravo, possibilitando o adequado exercício da ampla defesa e do contraditório, STJ, REsp 1207287/GO, 4ª Turma, rel. Ministro Raul Araújo, julgado em 06/12/2011, Dje 01/02/2012. Sobre a preclusão da alegação da parte agravada em suscitar a omissão da agravante em juntar aos autos de origem a cópuia do agravo de instrumento interposto: STJ, REsp 1008667/PR, Corte Especial, rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 18/11/2009, Dje 17/12/2009).
[117] Reconhecendo o descabimento da inadmissibilidcade do recurso por falta de juntada do agravo de instrumento aos autos de origem quando não houve prejuízo: STJ, REsp 915570/PR, 4ª Turma, rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 06/12/2011, Dje 01/02/2011
[118] Quanto ao reconhecimento de prejudicialidade parcial do agravo em caso de retratação parcial do juízo de 1º grau quanto à decisão recorrida: STJ, REsp 968432/MG, 4ª Turma, rel. Ministro João Otávio de Noronha, julgado em 04/08/2011, Dje 05/09/2011.

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