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Beautiful butterfly. Green swallowtail butterfly, Papilio palinurus. Insect in the nature habitat. Butterfly sitting in the green leaves, Indonesia, Asia. Wildlife scene from green forest.

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Gente Feia. Gente Bonita.

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

DISCRÍMEN

DISCRIMINAÇÃO

PRINCÍPIO DA ISONOMIA

VALOR SOCIAL DO TRABALHO

Antonio Fernando Costa Pires Filho

Antonio Fernando Costa Pires Filho

14/07/2016

Beautiful butterfly. Green swallowtail butterfly, Papilio palinurus. Insect in the nature habitat. Butterfly sitting in the green leaves, Indonesia, Asia. Wildlife scene from green forest.

Pode uma empresa colocar um anúncio no jornal exigindo pessoas bonitas para contratação?

Fere, tal anúncio, nossos valores ou princípios constitucionais, como o princípio da isonomia (art. 5º, inc. I, CF)?

Seria o anúncio uma forma de discriminação, vedada pelo inc. IV, do art. 3º, da CF?

Feriria o anúncio a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho (art. 1º, incs. III e IV, CF)?

Cremos que não.

O princípio da isonomia cuida de tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades. Se houver um fator de discriminação, conhecido como discrímen, deve ser lógico e razoável. O vocábulo “discrímen” significa discriminação, que significa “separar”, “excluir” ou “desigualar”.

Celso Antônio Bandeira de Mello, em obra de leitura obrigatória, fornece-nos dois exemplos de não ferimento do princípio da isonomia: a) um concurso público somente para negros, para que o Estado possa estudar as práticas esportivas mais adequadas, exercícios físicos e doenças da raça negra, mediante fornecimento de material sanguíneo, testes físicos, etc por parte dos aprovados; b) um concurso público para “guardas de honra”, com exigência, no edital do concurso, de altura mínima de 1,80m para inscrição, e sexo masculino. Os candidatos aprovados serão guardas do Executivo, em cerimônias militares oficiais, os “guardas de honra” (a obra de leitura obrigatória é “Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade”, São Paulo: Malheiros).

Em ambos os exemplos, o discriminador (discrímen) é lógico: discrimina-se pela cor de pele porque as doenças a serem estudadas têm a ver com a cor de pele. De nada adiantaria ao Estado a inscrição e aprovação de um indivíduo da raça branca. No outro caso, a altura é fator discriminante (discrímen) porque é necessária à função dos guardas palacianos (dragões da independência), mormente por causa da guarda das muradas. A compleição física e a força, para este cargo, também autorizam a discriminação em face do sexo feminino.

Pois bem. Quanto ao aspecto da beleza na contratação trabalhista, o art. 7º, XXX, CF assim determina: “Proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”.

E seu complemento infraconstitucional, o art. 373-A, CLT, introduzido na CLT pela Lei nº 9.799/99, proíbe a discriminação na hora da contratação trabalhista. Vejamos este dispositivo em sua inteireza:

“Art. 373-A – Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado:

I – publicar ou fazer publicar anúncio de emprego no qual haja referência ao sexo, à idade, à cor ou situação familiar, salvo quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir;

II – recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível;

III – considerar o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional;

IV – exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego;

V – impedir o acesso ou adotar critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez;

VI – proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias.

Parágrafo único – O disposto neste artigo não obsta a adoção de medidas temporárias que visem ao estabelecimento das políticas de igualdade entre homens e mulheres, em particular as que se destinam a corrigir as distorções que afetam a formação profissional, o acesso ao emprego e as condições gerais de trabalho da mulher”.

Nosso caso se encaixa no inciso I supra, e este mesmo inciso I prevê a exceção: “salvo quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir”.

Gente feia. Gente bonita.

Ora, é óbvio que a natureza da profissão de modelo, por exemplo, exige mulheres altas e bonitas. Bonitas segundo o padrão estético brasileiro, o qual certamente é diferente do africano. Mas não vamos discutir, aqui, o padrão estético nem o gosto das pessoas. No Brasil, é fato, temos um conceito mediano do que sejam mulheres bonitas, e estas mulheres são aquelas exigidas para a profissão de modelo. O fator estético, aqui, é essencial, sendo o discrímen, na hora da contratação para a profissão de modelo, razoável.

Assim, o mesmo se aplica para um escritório ou empresa que deseje uma secretária com boa aparência, bonita e agradável, para receber clientes, muito mais do que uma secretária para atuar 100% como secretária. O diploma de secretária ou outras qualificações de secretária, para este escritório, vêm em segundo lugar. O desejo da empresa é causar, no caso, boa primeira impressão, sendo este o fator que autoriza o discrímen no anúncio do jornal. A empresa, aqui, deseja mais uma boa impressão do que um currículo marcante. Há empresas, todavia, que não se importam com a aparência da secretária, valorizando, preferencialmente, outras qualidades em seu currículo.

O que não pode ocorrer, em absoluto, é um anúncio solicitando apenas homens para o cargo de diretor de uma empresa ou apenas advogados do sexo masculino para concorrer a uma vaga num escritório de advocacia. A beleza, aqui, nada teria a ver com o cargo. O discrímen seria ilógico. O mesmo se diga de editais de concursos públicos com limite de idade máxima de 45 anos para inscrição. O STF, apreciando esta questão, editou a Súmula nº 683, que tem a seguinte dicção: “O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido”.

O STF admite a discriminação por idade, é verdade, mas somente quando presente a razoabilidade. Deve haver uma ligação de essencialidade entre o discrímen e o fato. Por óbvio, não pareceria razoável a contratação de pessoas idosas, com mais de 70 anos de idade, para a profissão de lixeiro ou carteiro, as quais exigem grande esforço físico diário.

E na prática? Existe discriminação? Sim. Existe. Contra mulheres, que muitas vezes recebem salários menores do que os dos homens, homossexuais, transexuais, pessoas com AIDS, negros, índios, ateus, estrangeiros, pobres, pessoas com deficiência e por aí vai. Cabe à sociedade, incentivada pela mídia, tribunais, família, ações afirmativas por parte do Estado, enfim, incentivada por todos, estimular o não preconceito, o não racismo e o não sexismo.

Deve-se incitar e encorajar a busca da dignidade da pessoa humana no trabalho, até mesmo porque o trabalho, como quer o texto constitucional, deve ter uma valor social, que impacta e afeta de modo positivo e construtivo toda a sociedade. Não nos esqueçamos, também, do art. 170, CF, que traz logo em seu caput três princípios da ordem econômica: a) valorização do trabalho humano; b) asseguramento a todos de existência digna; c) asseguramento desta existência digna com base em justiça social.

A discriminação de pessoas feias e bonitas, pois, é possível somente quando analisamos o caso concreto. Havendo liame lógico e razoável entre a discriminação (discrímen) e o fato (trabalho a ser desenvolvido), pode-se discriminar.

Para muitas pessoas, na verdade, feio não é o que revela a aparência exterior, pois não ligam para a beleza, mas estas pessoas se importam, isto sim, com a falta de caráter, corrupção, desonestidade, desonra, depravação moral, falta de princípios, maldade, malícia, preguiça, avareza, inveja, mau humor e todo tipo de perversidades e feiura que comumente atentam contra o bem e a beleza interior.

Gente feia. Gente bonita.

E então? Você é atraente?


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