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EMPRESARIAL

JURISPRUDÊNCIA

Dissolução parcial das sociedades por ações

DISSOLUÇÃO PARCIAL

SOCIEDADES POR AÇÕES

André Santa Cruz

André Santa Cruz

12/08/2016

Peças GEN Jurídico Direito_Empresarial_Esquematizado_Andre_Luiz_Santa_Cruz_Ramos2

Durante muito tempo, a jurisprudência pátria não admitia a figura da dissolução parcial nas sociedades anônimas, em razão da ausência de affectio societatis nesse tipo societário – decorrente do seu caráter de sociedade de capital (intuitu pecuniae) – e do fato de o direito de retirada do acionista estar previsto taxativamente na Lei 6.404/1976. Eis alguns acórdãos do Superior Tribunal de Justiça que entendiam pela impossibilidade da dissolução parcial da S/A:

Comercial. Sociedade anônima. Dissolução parcial. Impossibilidade jurídica do pedido. Nas sociedades anônimas o direito de retirada do acionista é restrito às hipóteses do art. 137 da Lei 6.404/1976, apresentando-se impossível o pedido de dissolução parcial da sociedade, próprio das empresas organizadas por quotas de responsabilidade limitada, sem relevo a qualificação de coligada da empresa acionista, cuja condição poderá ser desfeita mediante alienação de ações de modo a reduzir a menos de dez por cento do capital da sociedade anônima. (AgRg no Ag 34.120/SP, Rel. Min. Dias Trindade, 3.ª Turma, j. 26.04.1993, DJ 14.06.1993, p. 11.785)

Comercial. Sociedade anônima. Dissolução. Impossibilidade jurídica do pedido. Carência de ação.

I – Pedido de dissolução, in casu, é juridicamente impossível pois a espécie societária admite o direito de recesso do sócio descontente.

II – Recurso não conhecido. (REsp 171.354/SP, Rel. Min. Waldemar Zveiter, 3.ª Turma, j. 16.11.2000, DJ 05.02.2001, p. 99)

Sociedade anônima. Dissolução parcial. Precedentes da Corte.

1. É incompatível com a natureza e o regime jurídico das sociedades anônimas o pedido de dissolução parcial, feito por acionistas minoritários, porque reguladas em lei especial que não contempla tal possibilidade.

2. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 419.174/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 3.ª Turma, j. 15.08.2002, DJ 28.10.2002, p. 311)

No entanto, com o passar do tempo a jurisprudência foi mudando seu entendimento, passando a permitir a dissolução parcial das sociedades anônimas fechadas organizadas como grupos familiares, porque nessas é patente a presença da affectio societatis. Nesse sentido, eis alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça:

(…) Não há impossibilidade jurídica no pedido de dissolução parcial de sociedade anônima de capital fechado, que pode ser analisado sob a ótica do art. 335, item 5, do Código Comercial, desde que diante de peculiaridades do caso concreto. – A “affectio societatis” decorre do sentimento de empreendimento comum que reúne os sócios em torno do objeto social, e não como consequência lógica do restrito quadro social, característica peculiar da maioria das sociedades anônimas de capital fechado. (…) (REsp 247.002/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 04.12.2001, DJ 25.03.2002, p. 272)

Direito comercial. Sociedade anônima. Grupo familiar. Inexistência de lucros e de distribuição de dividendos há vários anos. Dissolução parcial. Sócios minoritários. Possibilidade.

Pelas peculiaridades da espécie, em que o elemento preponderante, quando do recrutamento dos sócios, para a constituição da sociedade anônima envolvendo pequeno grupo familiar, foi a afeição pessoal que reinava entre eles, a quebra da affecttio societatis conjugada à inexistência de lucros e de distribuição de dividendos, por longos anos, pode se constituir em elemento ensejador da dissolução parcial da sociedade, pois seria injusto manter o acionista prisioneiro da sociedade, com seu investimento improdutivo, na expressão de Rubens Requião.

O princípio da preservação da sociedade e de sua utilidade social afasta a dissolução integral da sociedade anônima, conduzindo à dissolução parcial.

Recurso parcialmente conhecido, mas improvido. (REsp 111.294/PR, Rel. Min. Barros Monteiro, Rel. p/ Acórdão Min. Cesar Asfor Rocha, 4.ª Turma, j. 19.09.2000, DJ 28.05.2001, p. 161)

(…) III – Sociedade anônima. Dissolução parcial. Possibilidade jurídica. Requisitos.

1. Normalmente não se decreta dissolução parcial de sociedade anônima: a Lei das S/A prevê formas específicas de retirada – voluntária ou não – do acionista dissidente.

2. Essa possibilidade é manifesta, quando a sociedade, embora formalmente anônima, funciona de fato como entidade familiar, em tudo semelhante à sociedade por cotas de responsabilidade limitada. (…). (REsp 507.490/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3.ª Turma, j. 19.09.2006, DJ 13.11.2006, p. 241).

Finalmente, diante de posicionamentos divergentes no âmbito de suas Turmas, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça pacificou a questão, entendendo pela possibilidade de dissolução parcial da sociedade anônima nos casos em que se verifique a presença de vínculo intuitu personae (affectio societatis) e a posterior quebra desse vínculo, por algum motivo. Nesses casos, é preferível a dissolução parcial da sociedade, com a continuação desta, do que sua dissolução total, o que atentaria contra o princípio da preservação da empresa. Confira-se a ementa do acórdão:

(…) III – É inquestionável que as sociedades anônimas são sociedades de capital (intuitu pecuniae), próprio às grandes empresas, em que a pessoa dos sócios não tem papel preponderante. Contudo, a realidade da economia brasileira revela a existência, em sua grande maioria, de sociedades anônimas de médio e pequeno porte, em regra, de capital fechado, que concentram na pessoa de seus sócios um de seus elementos preponderantes, como sói acontecer com as sociedades ditas familiares, cujas ações circulam entre os seus membros, e que são, por isso, constituídas intuitu personae. Nelas, o fator dominante em sua formação é a afinidade e identificação pessoal entre os acionistas, marcadas pela confiança mútua. Em tais circunstâncias, muitas vezes, o que se tem, na prática, é uma sociedade limitada travestida de sociedade anônima, sendo, por conseguinte, equivocado querer generalizar as sociedades anônimas em um único grupo, com características rígidas e bem definidas.

Em casos que tais, porquanto reconhecida a existência da affectio societatis como fator preponderante na constituição da empresa, não pode tal circunstância ser desconsiderada por ocasião de sua dissolução. Do contrário, e de que é exemplo a hipótese em tela, a ruptura da affectio societatis representa verdadeiro impedimento a que a companhia continue a realizar o seu fim, com a obtenção de lucros e distribuição de dividendos, em consonância com o artigo 206, II, “b”, da Lei n.º 6.404/1976, já que dificilmente pode prosperar uma sociedade em que a confiança, a harmonia, a fidelidade e o respeito mútuo entre os seus sócios tenham sido rompidos.

A regra da dissolução total, nessas hipóteses, em nada aproveitaria aos valores sociais envolvidos, no que diz respeito à preservação de empregos, arrecadação de tributos e desenvolvimento econômico do país.

À luz de tais razões, o rigorismo legislativo deve ceder lugar ao princípio da preservação da empresa, preocupação, inclusive, da nova Lei de Falências – Lei n.º 11.101/2005, que substituiu o Decreto-lei n.º 7.661/1945, então vigente, devendo-se permitir, pois, a dissolução parcial, com a retirada dos sócios dissidentes, após a apuração de seus haveres em função do valor real do ativo e passivo.

A solução é a que melhor concilia o interesse individual dos acionistas retirantes com o princípio da preservação da sociedade e sua utilidade social, para evitar a descontinuidade da empresa, que poderá prosseguir com os sócios remanescentes.

Embargos de divergência improvidos, após rejeitadas as preliminares. (EREsp 111.294/PR, Rel. Min. Castro Filho, 2.ª Seção, j. 28.06.2006, DJ 10.09.2007, p. 183)

O STJ já teve a oportunidade de analisar o tema em outras ocasiões, mantendo-se fiel ao entendimento consolidado no julgado acima transcrito. Nesse sentido:

Comercial. Sociedade anônima familiar. Dissolução parcial. Inexistência de affectio societatis. Possibilidade. Matéria pacificada.

I. A 2.ª Seção, quando do julgamento do EREsp n. 111.294/PR (Rel. Min. Castro Filho, por maioria, DJU de 10.09.2007), adotou o entendimento de que é possível a dissolução de sociedade anônima familiar quando houver quebra da affectio societatis.

II. Embargos conhecidos e providos, para julgar procedente a ação de dissolução parcial. (EREsp 419.174/SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 2.ª Seção, j. 28.05.2008, DJe 04.08.2008)

O tema voltou a ser discutido pela Segunda Seção do STJ posteriormente, a fim de que o tribunal esclarecesse uma questão: a mera quebra da affectio societatis em uma sociedade anônima fechada de cunho familiar é suficiente para permitir que um sócio peça a sua dissolução parcial, ou é preciso aliar a esse fato a circunstância de a companhia mostrar-se inviável economicamente? Segundo a Ministra Isabel Gallotti, a mera quebra da affectio societatis não seria suficiente. Confira-se, a propósito, o seu argumento:

É possível o conhecimento dos embargos de divergência na hipótese em que o acórdão embargado entendeu possível a dissolução parcial de sociedade anônima de caráter familiar e fechado em razão, exclusivamente, da quebra da affectio societatis, e os paradigmas concluíram pela necessidade de conjugação com fato que demonstre a sua inviabilidade econômica, pois é manifesta a divergência com o acórdão embargado, o qual adotou a exceção admitida no julgamento dos paradigmas como regra, passando a  reconhecer o direito de dissolução parcial da sociedade anônima   fechada saudável exclusivamente em razão da vontade unilateral e potestativa dos autores, que afirmam não mais querer se manter na sociedade.

Não é possível a dissolução parcial de sociedade anônima de caráter familiar e fechado em razão, exclusivamente, da quebra da affectio societatis, pois ao decidirem pela constituição de sociedade  anônima e não de uma sociedade limitada, os sócios fundadores da   empresa familiar optaram por regência legal própria, devendo ser respeitado, salvo situações excepcionalíssimas, o modelo societário estabelecido pelos fundadores, talvez, até mesmo, com o objetivo de limitar as hipóteses de dissolução e recesso.

No entanto, o argumento acima transcrito não prevaleceu, e a Segunda Seção do STJ esclareceu que, em se tratando de sociedade anônima fechada, basta que exista a quebra da affectio societatis para se admitir o pedido de dissolução parcial por parte de um dos sócios. Confira-se a ementa do julgado:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.  DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE ANÔNIMA DE CARÁTER FAMILIAR E FECHADO. REQUISITO DA QUEBRA DA AFFECTIO SOCIETATIS AFIRMADO SUFICIENTE PELOS ACÓRDÃOS EXPOSTOS COMO PARADIGMAS. ACÓRDÃO EMBARGADO QUE JULGOU NO MESMO SENTIDO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 168/STJ.

1.- O Acórdão ora embargado, firmando, como único requisito à dissolução parcial da sociedade anônima familiar fechada a quebra da affectio societatis, julgou exatamente no mesmo sentido dos Acórdão invocados como paradigmas pretensamente divergentes, de modo que não cabem Embargos de Divergência, nos termos da Súmula 168/STJ.

2.- Subsistência da orientação constante do Acórdão embargado: “A 2ª Seção, quando do julgamento do EResp n. 111.294/PR (Rel. Min. Castro Filho, por maioria, DJU de 10.09.2007), adotou o entendimento de que é possível a dissolução de sociedade anônima familiar quando houver quebra da affectio societatis (EResp 419.174/SP, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO, DJ 04.08.2008)”.

3.- Embargos de divergência não conhecidos. (EREsp 1079763/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/04/2012, DJe 06/09/2012)


* Extraído do livro Direito Empresarial Esquematizado, 6ª edição, da editora Método.


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