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ELEITORAL

Representação eleitoral com normas de eficácia postergada

ANALOGIA

ARTIGO 347 DO CÓDIGO ELEITORAL

ASTREINTES

CRIME

DESCUMPRIMENTO

DESOBEDIÊNCIA ELEITORAL

IRREGULARIDADE

NORMA DE EFICÁCIA POSTERGADA

NORMAS DE COMANDO DETERMINANTE

NORMAS DE COMANDO PROIBITIVO

Francisco Dirceu Barros

Francisco Dirceu Barros

15/09/2016

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EMENTA: 1. Normas eleitorais de eficácia postergada. 2. Divisão das normas eleitorais de eficácia postergada. 3.A impossibilidade jurídica do uso da analogia para dar eficácia às normas eleitorais de eficácia postergada. 4.A impossibilidade jurídica do uso de uma representação propriamente dita nas normas de eficácia postergada. 5. O pedido de providência cumulado com tutela inibitória. 6. Legitimidade para executar astreintes imposta pelo descumprimento de ordem judicial.

1. Normas eleitorais de eficácia postergada

Norma de eficácia postergada são aquelas de aplicação indireta ou mediata, ou seja, não são capazes de gerar os efeitos finalísticos imediatos, há necessidade, portanto, de uma ordem judicial para efetivar a sua aplicação.

Há no direito eleitoral várias normas que estabelecem permissões, determinações e proibições sem a respectiva sanção imediata.

2. Normas eleitorais de eficácia postergada

As normas eleitorais de eficácia postergada, dividem-se em:

a) Normas de comando determinante

São normas que estabelecem uma vedação indireta, na medida em que expressamente determinam como a conduta eleitoral deve ser realizada.

Exemplos:

Artigo 39, § 3º da lei 9.504/97:

O funcionamento de alto-falantes ou amplificadores de som, ressalvada a hipótese contemplada no parágrafo seguinte, SOMENTE É PERMITIDO entre as oito e as vinte e duas horas, sendo vedados a instalação e o uso daqueles equipamentos em distância inferior a duzentos metros:

I – das sedes dos Poderes Executivo e Legislativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, das sedes dos Tribunais Judiciais, e dos quartéis e outros estabelecimentos militares;

II – dos hospitais e casas de saúde;

III – das escolas, bibliotecas públicas, igrejas e teatros, quando em funcionamento.

§ 4º A realização de comícios e a utilização de aparelhagens de sonorização fixas são permitidas no horário compreendido entre as 8 (oito) e as 24 (vinte e quatro) horas, com exceção do comício de encerramento da campanha, que poderá ser prorrogado por mais 2 (duas) horas.

 Artigo 38, § 1º da lei 9.504/97:

Todo material impresso de campanha eleitoral deverá conter o número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ ou o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas – CPF do responsável pela confecção, bem como de quem a contratou, e a respectiva tiragem.

b) Normas de comando proibitivo

São normas que estabelecem uma vedação direta, na medida em que expressamente determinam como a conduta eleitoral não pode ser realizada.

Exemplos:

Artigo 38 § 4º da lei 9.504/97:

É proibido colar propaganda eleitoral em veículos, exceto adesivos microperfurados até a extensão total do para-brisa traseiro e, em outras posições, adesivos até a dimensão máxima fixada no § 3º.

Artigo 39 §§ 6º e 7º da lei 9.504/97:

§ 6º É vedada na campanha eleitoral a confecção, utilização, distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor.

§ 7º É proibida a realização de showmício e de evento assemelhado para promoção de candidatos, bem como a apresentação, remunerada ou não, de artistas com a finalidade de animar comício e reunião eleitoral.

3. A impossibilidade jurídica do uso da analogia para dar eficácia às normas eleitorais de eficácia postergada

Observe nos exemplos supracitados que não há um preceito sancionador e não é juridicamente possível, usar a analogia, aplicando-se uma sanção estranha ao dispositivo violado, se a lei não cogitou de prevê-la.

É necessário, portanto, que a lei eleitoral tipifique não só a conduta proibida como também a sanção em seu preceito secundário, pois não havendo previsão legal, não é possível a aplicação de multa em atenção ao princípio da legalidade.

Dizia Carbonell que “o princípio da legalidade, substancial ao Estado de Direito, tem sua origem histórica na Revolução francesa e sua origem ideológica no pensamento iluminista. Veio a supor o desejo dos homens de substituir o governo caprichoso dos homens pela vontade geral, pela vontade expressada através da norma, da lei.” [1]

Na imposição da sanção eleitoral cível ou criminal, veda-se a analogia in malam partem, definida como aquela que, arrimada em dispositivos legais aplicáveis a situações símiles, fundamenta a aplicação da sanção nas normas de eficácia postergadas.

Neste sentido o TSE:

“Este Tribunal já decidiu, em hipóteses análogas, que, inexistindo previsão de multa no § 3º do art. 39 da Lei nº 9.504/97, esta não pode ser aplicada, ainda que por interpretação conjunta com outras normas. Menciono, a respeito, o seguinte julgado recente: Propaganda eleitoral. Alto-falantes ou amplificadores de som parágrafo 3º do artigo 39 da lei nº 9.504/1997 sanção inexistência. A transgressão ao § 3º do artigo 39 da Lei nº 9.504/1997 gera providência administrativa para fazer cessá-la, não havendo campo para a incidência de multa, ante ausência de previsão legal. (REspe nº 35.724, rel. Min. Marco Aurélio, DJE de 14.9.2012, grifo nosso)”.

“Nessa esteira, não encontra respaldo jurídico a imposição de multa por analogia, razão pela qual merece reforma o acórdão regional. […]”. (Recurso Especial Eleitoral nº 524-54.2012.6.19.0255 – classe 32 – Carapebus – Rio de Janeiro. Relator: Ministro Henrique Neves da Silva. TSE).

Aplicação de multa por alistamento extemporâneo. Analogia. Impossibilidade. (Res. nº 22.152, de 23.2.2006, rel. Min. Humberto Gomes de Barros.)

“À mingua de previsão legal, não cabe ao juiz aplicar, por analogia, o artigo 39, S 8°, da Lei nº 9.504/97, bem como os artigos 14 e 17 da Resolução TSE nº 22.718, para impor aos Representados, ora Recorrentes, multa eleitoral, sob pena de malferimento dos princípios constitucionais da legalidade e da reserva legal. Precedentes. (Recurso Eleitoral nº 3189, Acórdão nº 205/2009, rel. Juiz Álvaro Joaquim Fraga, em 18.06.2009)”.

4. A impossibilidade jurídica do uso de uma representação propriamente dita nas normas de eficácia postergada

Não é juridicamente possível o uso de uma representação propriamente dita, para dar eficácia as normas de comando determinante e as normas de comando proibitivo, porque se têm uma causa de pedir, mas não temos um pedido, qual seja uma sanção imediata.

No mesmo sentido:

“De acordo com o art. 242, caput da Lei nº 4.737/65 e o art. 50 da Resolução TSE nº 23.370/2011, é vedada a veiculação de propaganda eleitoral que sugira ao eleitor o apoio à determinada candidatura por parte de figura política que se sabe inexistente, todavia, também é verdade que a legislação eleitoral não comina, na hipótese de não observância dos normativos legais em comento, qualquer sanção, motivo pelo qual a improcedência da representação é medida que se impõe. 2. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada. Representação julgada improcedente. (Recurso Eleitoral nº 13084, TRE/CE, Rel. Francisco Luciano Lima Rodrigues. j. 07.05.2013, unânime, DJe 17.05.2013)”.

5. O pedido de providência cumulado com tutela inibitória

A medida cabível será o pedido de providência cumulado com tutela inibitória.

O pedido será:

“…… o deferimento da presente pedido de providência cumulado com tutela inibitória, determinando-se que os representados se abstenham imediatamente de (Explicar aqui em que consiste a abstenção), sob pena de:

a) aplicação de astreintes, com fulcro no artigo 139 do Novo Código de Processo Civil , em valor estipulado por V. Excelência.

Conforme Rizzo: “[…] as astreintes constituem técnica de tutela coercitiva e acessória, que visa a pressionar o réu para que o mesmo cumpra mandamento judicial, pressão esta exercida através de ameaça a seu patrimônio, consubstanciada em multa periódica a incidir em caso de descumprimento” [2]

No mesmo sentido o TSE:

As astreintes destinam-se ao cumprimento da determinação judicial e não ao ressarcimento do dano de direito material, circunstância que também reforça a ilegitimidade ativa ad causam daqueles eventualmente ofendidos pela prática da propaganda eleitoral irregular. Agravo regimental desprovido. (Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 615769, TSE/SP, Rel. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin. j. 10.11.2015, unânime, DJe 11.03.2016)

Não há teratologia quando as astreintes, fixadas de forma proporcional, por dia, e de acordo com o porte econômico da empresa, atingem alto valor em razão da recusa em cumprir a determinação judicial por 10 dias. Agravo regimental a que se nega provimento. (Agravo Regimental em Recurso em Mandado de Segurança nº 87160, TSE/PR, Rel. Henrique Neves da Silva. j. 16.02.2016, unânime, DJe 03.03.2016).

b)Incidência no crime tipificado no artigo 347 do Código Eleitoral.

Defendemos no livro Direito Criminal, Tomo I (Parte material), editora Juruá, que para configuração do crime de desobediência eleitoral, exige-se que a ordem judicial direta e individualizada.

No mesmo sentido o STF:

A jurisprudência é firme no sentido de que, para a caracterização do crime de desobediência eleitoral, “exige-se o descumprimento de ordem judicial direta e individualizada” (RHC nº 1547-11, rel. Min. Laurita Vaz, DJE de 11.10.2013). No mesmo sentido: Habeas Corpus nº 130882, Relª Min. Cármen Lúcia, DJE de 10.11.2011; STF: Inquérito nº 2004, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 28.10.2004.

No mesmo sentido o TSE:

O descumprimento de ordem judicial direta e individualizada é suficiente para caracterizar o crime de desobediência previsto no art. 347 do Código Eleitoral. (Recurso em Habeas Corpus nº 42, TSE/SP, Americana, Relª. Minª. Ellen Gracie Northfleet. j. 02.04.2002, DJ 24.05.2002, p. 144).

c) Fixar prazo para saneamento da irregularidade constatada, sob pena de imposição de astreintes e crime de desobediência eleitoral.

É possível também que a ordem seja com uma obrigação de fazer, qual seja, corrigir a irregularidade constatada, sob pena de imposição de astreintes e crime de desobediência eleitoral.

Dissertando sobre a tutela específica das obrigações de fazer e não fazer, Humberto Theodoro júnior afirma:

“Duas garantias estarão confrontadas: a da efetividade da tutela jurisdicional, devida ao autor e acobertada pela medida antecipatória, e a de intangibilidade da situação do réu, antes do julgamento definitivo, resguardada pela vedação ao autor de obter provimento provisório de efeito irreversível. Mesmo quando o risco de irreversibilidade estiver presente, mas afetar o perigo corrido por ambas as partes, caberá ao juiz determinar qual o perigo mais relevante, segundo os interesses contrapostos e, à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade dispensar a tutela àquele que se revelar mais carente dela. Se a posição que, diante da prova inequívoca disponível, se apresenta como a que deva sair vitoriosa no provimento final, é a do autor, e se esta solução só protegerá seu direito se a medida de efeitos irreversíveis lhe for de imediato proporcionada e, parece claro que o princípio da razoabilidade se aplica para determinar seja deferida a antecipação, ainda que isto implique sujeitar o réu ao risco da irreversibilidade. Em suma: como princípio, não se antecipam provimentos de efeitos irreversíveis; mas se o único meio de assegurar a efetividade da tutela de que o autor se apresenta predominantemente merecedor (em relação ao réu) exige medida faticamente irreversível, não poderá esta ser-lhe vedada, sob pena de subtrair-lhe a garantia fundamental de pleno acesso à justiça.”[3]

No mesmo sentido:

I-Inexiste previsão de multa para a distribuição de adesivos de campanha sem o CNPJ ou CPF do responsável pela confecção, bem como do contratante e a respectiva tiragem, como previsto no art. 38 § 1º da Lei nº 9.504/97 e art. 12, parágrafo único, da Resolução TSE nº 23.370/12. II. Correta a decisão recorrida ao fixar prazo para saneamento da irregularidade constatada, sob pena de imposição de astreintes. III. Todavia, não há que se falar em aplicação analógica do art. 36, § 3º da Lei nº9.504/97 para que seja fixada sanção pecuniária, uma vez que não se pode aplicar multa a não ser que exista previsão legal específica que a estabeleça, conforme preceitua o princípio da legalidade, insculpido no art. 5º, XXXIX da Constituição Federal. IV. Provimento parcial do recurso para afastar a penalidade de multa. (TRE-29445 RJ. Relator: Marcus Henrique Niebus).

6. Legitimidade para executar astreintes imposta pelo descumprimento de ordem judicial

O TSE já consolidou no sentido de que a legitimidade para ajuizar ação de execução de astreintes, imposta pelo descumprimento de ordem judicial relativa à retirada de propaganda eleitoral irregular, é da União.

Conferir: (REspe nº 1168-39/PR, de minha relatoria, DJe de 09.09.2014. Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 169974, TSE/SP, Rel. Luciana Christina Guimarães Lóssio. j. 13.10.2015, unânime, DJe 19.11.2015).


[1] (No mesmo sentido: MATEU, Juan Carlos Carbonell. Derecho penal: concepto y princípios constitucionales. 3ª edição. Valencia: tirant lo blanch alternativa, 1999, p. 108. Livre tradução.)
[2] (AMARAL, Guilhenme Rizzo. As Astreintes e o Processo Civil Brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 85).
[3] (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela específica das obrigações de fazer e não fazer. In: Jus Navegandi. n. 56. [Internet] http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2904 [Capturado 06.09.2016].

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