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Os 6 meses do Novo CPC e as jornadas de direito processual

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Os 6 meses do Novo CPC e as jornadas de direito processual

6 MESES DO NOVO CPC

COLUNA NOVO CPC

CPC 2015

JORNADAS DE DIREITO PROCESSUAL

NCPC

PRECEDENTES

RECURSOS

TUTELA PROVISÓRIA

Luiz Dellore
Luiz Dellore

19/09/2016

Em vigor desde 18 de março de 2016[1], [em setembro] chegamos ao 6º mês de vigência do Novo Código de Processo Civil (CPC). E a data coincidiu com a realização das XI Jornadas de Direito Processual, destacado evento brasileiro de processo civil – que, neste ano, ocorreu em conjunto com o evento do Instituto Ibero-Americano de processo civil (XXV Jornadas).

Foram 3 dias de intensos debates a respeito do nosso NCPC – e, também, um olhar para o que está acontecendo nos demais países. Assim, esta coluna tem por objetivo trazer uma breve resenha do que se debateu no evento, e que funciona como um balanço do 1º semestre de vida do novo Código.

A programação foi intensa, pois eram 5 painéis acontecendo ao mesmo tempo, sendo que no total foram mais de 75 mesas de debates, de modo que inviável uma análise de TODO o evento (portanto, na verdade, foram vários eventos, com vários enfoques, tudo dependendo de quais painéis cada um assistiu). Mas, para trazer uma visão um pouco mais ampla, a coluna é escrita a quatro mãos[2].

1) Ainda sobre a conveniência do NCPC neste momento

Ainda que o Código já tenha 6 meses, pairou em vários momentos do evento a dúvida: “será que deveríamos ter feito esse Código, agora”?

Em debate em um dos painéis das Jornadas Ibero-Americanas, a posição mais cética foi externada pelo Professor italiano Federico Carpi, o qual afirmou estar convencido de que as reformas processuais são a solução adotada pelos países quando não têm mais ideia do que fazer diante das dificuldades de transformar a cultura dos operadores da justiça civil… (acrescentou, ainda, que as editoras jurídicas também gostam do fenômeno…).

Isso se reforçou em painel voltado à discussão do papel da pesquisa empírica no aperfeiçoamento de nossa justiça civil.

É fato que as sucessivas reformas pelas quais passou nossa legislação processual nas últimas décadas – NCPC inclusive – em regra desprezaram os poucos dados sobre o funcionamento do Judiciário de que já dispunha nosso país e tiveram por base, principalmente, as opiniões que os especialistas envolvidos formaram a partir de seus estudos teóricos e suas experiências de vida pessoais. Essa é sem dúvida uma rica fonte de conhecimento, mas que por ser construída a partir de experiências parciais e fragmentárias, parece não ser o método suficiente para a construção das soluções mais eficientes para a administração da justiça considerada em seu contexto global[3].

Do mesmo modo, os resultados das intervenções passadas nunca foram adequadamente medidos. A pesquisa empírica, que tem ganhado uma importância crescente, visa a integrar esses conhecimentos com dados colhidos da realidade concreta, tratados de maneira objetiva e controlável, de modo a que as impressões subjetivas sejam conjugadas com fenômenos concretos mensuráveis.

Trata-se assim de “substituir o argumento de autoridade pela autoridade do argumento”[4], o que é essencial para a construção de uma adequada política de solução de conflitos, pois aquilo que os dados revelam muitas vezes contrariam a intuição do estudioso mais qualificado.

O interesse no tema é potencializado pela reforma processual, que nos dá a oportunidade de avaliar de maneira objetiva quais as alterações que se revelarão eficazes para o aumento da rapidez e da qualidade da prestação da justiça, quais das grandes promessas da nova lei merecerão ser ampliadas e quais aquelas que deverão ser abandonadas.

2) Os temas mais recorrentes a respeito do NCPC – balanço de um semestre de vigência

Como já dito, foram 5 painéis simultâneos ao longo do evento, de modo que muitos foram os assuntos enfrentados, por professores de todo o país – e não só do Brasil, já que foi um evento internacional.

Mas, considerando o NCPC, dentre os temais mais discutidos, podemos destacar: (i) tutela provisória, (ii) precedentes e (iii) recursos.

Não por acaso, pois são temas bastante polêmicos, que a doutrina e o cotidiano forense estão discutindo intensamente.

E o balanço de 6 meses de vigência do NCPC se dá em relação a tais pontos.

TUTELA PROVISÓRIA

Como já vinha se apontando, há grandes dificuldades quanto à tutela provisória[5].

Dentre outras, podemos apontar:

– há fungibilidade de mão dupla ou mão única entre tutela cautelar e antecipada?

– a estabilização da tutela antecipada é coisa julgada ou outro instituto? Se outro, qual?

– se o juiz entender que a hipótese era de cautelar mas depois outro magistrado entender que era caso de tutela antecipada, há a estabilização?

Questões polêmicas, com diversas opiniões entre os palestrantes.

PRECEDENTES

Diversos debates foram travados quanto ao tema[6]:

– a vinculação de precedentes (arts. 926 e 927) é constitucional?

– a propalada vinculação de precedentes vem sendo aplicada pelos tribunais, nesses 6 meses iniciais?

– os relatores estão julgando monocraticamente (art. 932, IV e V) apenas nas hipóteses de precedentes vinculantes.

– foi adequada a forma como regulamentados os precedentes no NCPC?

– o IRDR deve ser observados pelos juizados especiais ou a previsão do art. 985, I é inconstitucional?

Novamente, dissenso entre os palestrantes.

RECURSOS

Quanto aos recursos, muitos temas foram enfrentados, mas merece destaque a polêmica relativa ao agravo de instrumento. Segue o debate relativo de cabimento do art. 1.015 ser taxativo ou não[7].

Há discussão a respeito dos recursos cabíveis quanto à tutela provisória, inclusive voltando-se a se falar em fungibilidade.

Além disso, outros assuntos com destaque foram (iv) mediação e a (não realização) da audiência do art. 334[8], (v) o art. 139, IV (e a polêmica a respeito da recente decisão que determinou a retenção de carteira de motorista e passaporte[9]) e a (vi) coisa julgada, especialmente seus novos limites objetivos[10].

Em síntese: aos 6 meses de vigência, há muitas dúvidas, divergências e polêmicas a respeito do novo Código – e assim seguirá por um longo tempo, até definição do Superior Tribunal de Justiça (ou, em alguns casos, mesmo do Supremo Tribunal Federal, como na retenção de passaporte).

Enquanto isso, o processo (que é instrumento) fica no ponto central de debate (em detrimento do direito material a ser decidido…).

3) Esperança a partir de reformas em outros países

A realização conjunta dos Congressos dos Institutos Ibero-americano e brasileiro propiciou uma ótima oportunidade para a comparação de experiências de reforma processual em países que vivem realidades e desafios que em muitos pontos se aproximam, ao mesmo tempo em que são distintos pelos contextos locais.

Uma técnica que tem se disseminado é a da audiência dedicada ao saneamento e organização do processo, complementada por poderes de direção pelo juiz. Trata-se de instituto presente nas reformas de países como Brasil (2015), Colômbia (2012) e Espanha (2000).

No nosso modelo, essa seria a audiência de saneamento compartilhado, que deve ser feita nas causas que apresentem complexidade de fato ou de direito (art. 357, § 3º).

Acerca do Código de Processo Civil Espanhol de 2000[11], o Professor espanhol Manuel Ortells trouxe um relato sobre o modo como a reforma foi capaz de – mesmo contra os prognósticos da doutrina – efetivamente alterar a prática processual pela difusão dessa audiência, que tem desempenhado um papel importante para o aumento de efetividade dos processos.

Essa transformação foi auxiliada por medidas simplificadoras como a profissionalização dos cartórios e o incentivo ao uso da ação monitória (na qual não há audiência), que passou a ser empregada na grande maioria das demandas de pagamento de quantia, de maneira célere, com baixo grau de recorribilidade e diminutos índices de reforma em grau de recurso.

Esse informe de sucesso pode ser animador para países como Brasil e Colômbia[12], mas deve se destacar que a utilização da audiência apenas nos casos em que ela seja potencialmente útil foi a chave para o bom funcionamento do sistema.

Assim, esse contexto parece confirmar que a escolha da audiência inaugural de conciliação e mediação obrigatória do art. 334 foi inadequada no Brasil – a qual, frise-se, foi bastante debatida (e criticada) nos painéis brasileiros, especialmente em virtude da falta de estrutura em nosso país para sua realização.

E os primeiros 6 meses de vigência do Código já parecem demonstrar isso, considerando que não vem sendo designada por uma grande quantidade de magistrados.

4) Conferência final

No encerramento, interessantes palestras dos Professores Fernando Gajardoni (outro dos autores da coluna no JOTA) e Carlos Carmona, cada qual com uma visão distinta a respeito dos limites do negócio jurídico processual no NCPC (art. 190)[13]. Houve rico debate entre os professores, causando risos na plateia[14].

A seguir, a Professora Ada Grinover – homenageada do evento – proferiu palestra em que reafirmou as bases para uma teoria geral do processo (método de estudar todas as facetas do direito processual à luz da Constituição Federal, tendo como objetivo a tutela e a indicação dos princípios gerais aplicáveis a todas as demandas processuais), também com momentos lúdicos[15].

Após, a exposição final do Congresso: o inspirador discurso do presidente do Instituto Ibero-americano, Professor Eduardo Oteíza, da Argentina.

A partir da memória das figuras de notáveis autores como Couture e Calamandrei, fomos lembrados da responsabilidade do processualista e daquele que atua com o processo, em qualquer lugar do mundo, na pacificação das respectivas sociedades.

Tomou como exemplo Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Itália e Espanha, países que foram fragmentados pelo autoritarismo, pela guerra civil, pelo terrorismo e pela violência cotidiana, destacando que o processo civil teve papel relevante nessas sociedades, na transição entre sistemas políticos[16].

E lhe assiste toda razão ao fazer esse chamado, pois nem sempre é fácil nos lembrarmos que para muito além de temas como aqueles que cercam a técnica, o verdadeiro propósito de nossos estudos está na missão de pacificar com justiça o convívio entre os homens. Que tal consciência se faça sempre presente.

Por fim, o Prof. Paulo Lucon, presidente do IBDP, declarou encerrados os trabalhos e convidou a todos para as próximas Jornadas, em setembro de 2018 em Belo Horizonte.

Assim, fica a todos o convite para nos encontrarmos no próximo evento!

(E, as dúvidas: como estará a jurisprudência acerca do NCPC até lá? Quantas reformas já terão havido?)

por Luiz Dellore e Marco Antonio Perez


Referências:

[1] Se quiser, relembre a polêmica acerca da data da vigência do NCPC: http://jota.info/vigencia-do-novo-cpc-um-irdr-para-chamar-de-seu

[2] Além de Luiz Dellore que regularmente elabora a coluna, este texto é também escrito por Marco Antonio Perez de Oliveira, que cumpriu uma programação em parte distinta do outro autor.

[3] Ao se manifestar nesse painel, após provocação da presidente de mesa, Profa. Andrea Caraciola, a Profa. Ada indagou: “Quais dados empíricos levaram à extinção dos infringentes? E quais dados levaram à criação do rol de cabimento do agravo”?

[4] Comentário da Professora Maíra Machado, da FGV, no referido painel.

[5] Aqui na coluna o assunto foi tratado nos seguintes textos: http://jota.info/acautelar-ou-satisfazer-o-velho-problema-no-novo-cpc e http://jota.info/novo-cpc-tutela-antecipada-e-os-tres-pecados-capitais.

[6] Esse assunto foi enfrentado na coluna, em diversas oportunidades: http://jota.info/precedentes-no-novo-cpc-fast-food-brasileiro, http://jota.info/novo-cpc-precedentes-e-contraditorio, http://jota.info/abracadabra, http://jota.info/colegialidade-nos-tribunais-e-o-novo-cpc e http://jota.info/o-novo-cpc-nao-e-o-que-queremos-que-ele-seja.

[7] Acerca desse tema, vide http://jota.info/hipoteses-de-agravo-de-instrumento-no-novo-cpc-os-efeitos-colaterais-da-interpretacao-extensiva.

[8] A respeito da audiência, conferir as seguintes colunas: http://jota.info/a-dificil-conciliacao-entre-o-novo-cpc-e-a-lei-de-mediacao e http://jota.info/novo-cpc-vale-apostar-na-conciliacaomediacao.

[9] A respeito, texto da coluna (http://jota.info/a-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia) e notícia no JOTA (http://jota.info/desembargador-concede-hc-para-devedor-que-teve-cnh-suspensa-e-passaporte-apreendido).

[10] Acerca da coisa julgada, texto da coluna (http://jota.info/novo-cpc-que-coisa-julgada-e-essa) e a apresentação de Luiz Dellore nas Jornadas (http://www.dellore.com/products/jorrnadas-ibdp-set16/).

[11] Ley de Enjuiciamento Civil.

[12] No Código General de Proceso colombiano de 2012, a obrigatoriedade da audiência na generalidade dos casos foi enfatizada pelo professor Jaime Parra como uma das apostas da nova legislação. Mas isso talvez só seja possível pelo fato de muitos casos serem decididos, com respaldo legal, pelos tenderos de esquina, que são particulares respeitados na comunidade que absorvem grande parte da demanda jurisdicional em assuntos de menor complexidade e valor.

[13] Quanto ao tema, veja http://jota.info/o-negocio-juridico-processual-a-favor-da-eficiencia-do-poder-judiciario, do próprio Gajardoni.

[14] E, ao pedir a palavra a respeito do debate entre os dois professores, a Prof. Ada em grande parte acompanhou o que foi dito por Gajardoni, criticando a posição de Carmona no sentido de, por exemplo, permitir que por NJP seja escolhido um juiz (pessoa física) como o responsável por julgar determinada causa.

[15] Especialmente se referindo ao “boneco de Olinda” que foi feito em homenagem a ela e como foram pensadas algumas dedicatórias – em que, por exemplo, desejou a uma advogada de instituição financeira que fosse “boazinha com os consumidores”.

[16] E destacou especialmente a Colômbia neste momento, na pacificação com as FARC.


VEJA AQUI OUTROS TEXTOS DA SÉRIE CPC 2015

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