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TRIBUTÁRIO

Parecer sobre enquadramento da sociedade de prestação de serviço no regime especial de tributação

ALÍQUOTA FIXA

ARQUITETOS

ENGENHARIA CIVIL

ENGENHEIROS

ISS

ISSQN

LANÇAMENTO DE OFÍCIO

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

REGIME ESPECIAL DE TRIBUTAÇÃO

SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS

Kiyoshi Harada

Kiyoshi Harada

17/03/2017

Por Kiyoshi Harada e Marcelo Kiyoshi Harada

A Consulente, por intermédio de seu advogado, Dr. Giscard Gueratto Lovatto, consulta-nos sobre o seu enquadramento no  regime especial de tributação das sociedades de profissionais.

Relata-nos a Consulente que a sua constituição se deu em 17/08/2001, no Município de Hortolândia, para a exploração da atividade de prestação de serviços na área de engenharia civil. O seu quadro societário inicialmente era composto por dois engenheiros civis, detendo, cada um, 6.000 (seis mil) quotas sociais.

No ano de 2007, com a alteração da Lei nº 12.392, de 20-10-2005 que rege o ISS no Município de Campinas que passou a prever a tributação das sociedades de profissionais por meio de alíquota fixa, a Consulente realizou a alteração de seu contrato social, promovendo, dentre outras alterações, a mudança de sua sede social para o Município de Campinas e admitindo em seu quadro societário uma profissional da área de Arquitetura, por meio da cessão e transferência de 120 quotas sociais de um dos sócios originários..

Informa-nos, ainda, que 23/10/2008 a Consulente solicitou a sua inscrição no Cadastro de Contribuintes Mobiliários da Prefeitura do Município de Campinas e enquadramento  como “sociedades de profissionais regulamentadas, apresentando o seu contrato social e informando que o seu quadro societário era composto por três sócios, dois engenheiros e uma arquiteta, sendo autorizado o seu enquadramento no regime especial de tributação das sociedades de profissionais regulamentadas em 03/11/2008 e inscrita no CCM do Município de Campinas sob o nº  155.963-0. A partir daí a Consulente sempre foi tributada pelo regime especial de pagamento do ISS mediante lançamento de ofício.

Em 22/03/2011  a Consulente promoveu nova alteração de seu contrato social para a inclusão de novo sócio no quadro de um outro profissional da área de engenharia, apresentando em 25/10/2011 o requerimento de alteração de seu quadro social perante a Prefeitura Municipal de Campinas, por meio do Documento de Informação Cadastral do ISSQN pessoa jurídica, passando o seu quadro social a ser composto por quatro sócios, restando o requerimento deferido em 18/11/2011.

Em 07/10/2014 promoveu nova alteração contratual para incluir um  técnico em agrimensura nos seus quadros sociais,. Nessa alteração conferiu-se, também, a administração da sociedade aos sócios majoritários. Essa alteração foi registrada em 19/03/2015, sob o nº 51.137, no 1º Registro de Pessoa Jurídica de Campinas.

Informa a Consulente, que ao ingressar com requerimento junto a Prefeitura Municipal de Campinas em 13/04/2015 para alteração de seu cadastro do ISSQN pessoa jurídica para registro da alteração contratual nº 51.137, foi informada que não era permitido a inclusão de profissionais regidos por Conselhos Regionais distintos na sociedade de profissionais.

Dessa forma, a Consulente promoveu nova alteração contratual, também datada de  07/10/2014, procedendo-se a exclusão tanto do técnico em agrimensura quanto da arquiteta do seu quadro social, restando apenas três sócios, todos engenheiros, tendo sido essa alteração contratual registrada em 26/10/2015 no 1º Registro de Pessoa Jurídica de Campinas

Por fim, em 14/01/2016 apresentou o Requerimento Único ao Departamento de Receitas Mobiliárias da Secretaria Municipal de Finanças, requerendo a alteração de seu cadastro do ISSQN, conforme alterações contratuais registradas em 05/03/2015 e 26/10/2015.

Analisando os pedidos de alteração cadastral, a autoridade fiscal do Município de Campinas concluiu que a Consulente a partir de 2012 passou a ter membros de conselhos profissionais distintos, por conta da separação dos Conselhos Regionais de Engenharia e Arquitetura, concretizada em 26/12/2011, deixando, portanto, de usufruir do regime de tributação de ofício do ISSQN das sociedades de profissionais regulamentadas, pois para usufruir desse regime todos os sócios devem ter a mesma atividade, profissional, “assim entendida a sociedade cujo exercício das atividades profissionais dos sócios seja regido pelo mesmo Conselho de Classe”, nos termos do art. 28, § 4º, I da Lei nº 12.393/2005.

Diante disso, apesar de deferida as alterações cadastrais da Consulente, foi a mesma desenquadrada do regime de tributação fixa no período de 01/2012 a 09/2015 para ser tributada sob o regime de lançamento por homologação, conforme Decisão Protocolo nº 2016/03/03026, publicada em 24/05/2016 abaixo transcrita:

“Determino que para o período compreendido entre janeiro de 2012 a setembro de 2015 a referida sociedade seja desenquadrada do regime fixo e seja tributada por homologação, pois a sociedade nesse ínterim possuía Arquitetos e Engenheiros que passaram a ser regidos por conselhos diferentes: CAU e CREA o que contraria o disposto na Lei do ISSQN 12.392/05 em seu artigo 28, § 3º e seguintes, que determina que todos os profissionais vinculados à sociedade para fazerem jus ao regime fixo de tributação do ISSQN fixo sejam ligados ao mesmo conselho de classe profissional. determino, também, que, a partir de outubro de 2015 ela volte ao regime fixo, sendo tributada por três profissionais de nível superior vinculados à sociedade, pois passou a ter somente engenheiros em sua composição societária.”

A Consulente apresenta o contrato social e alterações posteriores, bem como requerimentos alteração de informação cadastral do ISS pessoa Jurídica junto à Prefeitura do Município de Campinas e lançamentos de ofício dos ISS por alíquota fixa dos exercícios de 2011 a 2014.

Diante de tais fatos, a Consulente pede nosso parecer  jurídico quanto a procedência ou não da pretensão do fisco municipal formulando os seguintes quesitos:

1) Engenheiros  e Arquitetos podem ser considerados como profissionais de ramos distintos só pelo fato da superveniência de novo órgão regulador dos Arquitetos – CAU?

2) O lançamento de ofício por alíquota fixa até o exercício de 2014, apesar de a Lei nº 12.378, de 31 de dezembro de 2010, que desmembrou o CREA para formar o novo Conselho para regular os Arquitetos – CAU – se era do conhecimento geral desde a publicação dessa lei, não caracteriza um contradição do fisco de Campinas que promoveu o desenquadramento do regime de tributação por alíquota fixa sob o fundamento de que sociedade que tenha como sócios profissionais regidos por Conselhos distintos não podem usufruir do regime especial de tributação?

3) O lançamento de ofício do ISS por alíquota fixa até o exercício de 2014, quando já estava em pleno vigor o novo Conselho –  CAU – e a Lei municipal de Campinas, a de nº 12.392/05 só previa a tributação pelo regime especial em relação a sociedades com profissionais regidos pelo mesmo Conselho fiscalizador, não implicou vinculação da administração a seus próprios atos?

4) Qual a medida cabível em face do exposto em seu parecer jurídico?

PARECER

Trata-se de desenquadramento da consulente do regime de tributação do ISS por alíquota fixa com efeito retroativo, sob a alegação de que no período de janeiro de 2012 a setembro de 2015 a consulente mantinha em seu quadro social arquitetos[1] e engenheiros que passaram a ser regidos por Conselhos diferentes: CAU e CREA, respectivamente,  conforme Decisão

Protocolo nº 2016/03/03026, publicada em 24/5/2016 retrotranscrita.  Segundo essa Decisão, a Lei local de nº 12.392/05, em seu art. 28, § 3º e seguintes determinam que os profissionais vinculados à sociedade só fazem jus ao regime de tributação do ISS por alíquota fixa se ligados ao mesmo Conselho de classe profissional. Determinou, também, que a partir de outubro de 2015 ela volte ao regime fixo porque houve retirada da arquiteta ….,  com instrumento de alteração do contrato social registrado em 26/10/2015 no 1º Registro de Pessoa Jurídica de Campinas.

O equívoco da decisão é manifesto pelas seguintes razões:

a) A Lei local de nº 12.392/05 sobrepõe à lei de regência nacional do ISS

A Lei do Município de Campinas de nº 12.392/05 inovou o disposto no Decreto-lei de nº 406/68, de natureza complementar, desobedecendo ao comando constitucional decorrente do art. 146, III, a da CF.

Ora, está sob reserva de lei complementar a instituição de normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente a definição da base de cálculo de imposto previsto na Constituição, no caso, o ISS.

E o art. 9º, §§ 1º e 3º do Decreto-lei nº 406/68, lei materialmente complementar, dispõe:

“Art. 9º A base de cálculo do imposto é o preço de serviço.

1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.

3º Quando os serviços a que se referem os itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91 e 92 da lista anexa forem prestados por sociedades, estas ficarão sujeitas ao imposto na forma do § 1º, calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo responsabilidade pessoal, nos termos da lei aplicável”.

Ora, a lei de regência nacional do ISS não distingue a sociedade uniprofissional da sociedade pluriprofissional, muito menos os profissionais legalmente regulamentados pertencentes ao mesmo Conselho Regional ou a Conselhos Regionais distintos, no caso, CREA e CAU, como prescreve equivocadamente  a lei local.

Não há como inverter a hierarquia vertical das leis para fazer prevalecer a lei municipal contra texto expresso da lei complementar, aplicável no âmbito nacional em nome da unidade político-jurídica nacional.

b) Indevida distinção entre sociedade uniprofissional e sociedade pluriprofissional na aplicação do § 3º, do art. 9º do Decreto-lei nº 406/68

O Supremo Tribunal Federal, à época em que era competente para zelar pela aplicação uniforme da legislação federal, firmou posição em torno da matéria não permitindo a distinção de sociedade de profissionais em uni e pluriprofissional para o efeito de tributação pelo regime privilegiado.

Nesse sentido, a remansosa jurisprudência do STF, cujos acórdãos foram proferidos sob a égide da Emenda Constitucional nº 1/69, quando a matéria concernente à negativa de vigência de Lei Federal era de sua competência (art. 119, III, a), conforme ementas abaixo:

“Imposto sobre serviços. Decreto-lei 406/68, art. 9, parágrafo 3º (redação do Decreto-lei 834/69). – Nega vigência a tais dispositivos a decisão que os considera aplicáveis tão somente a sociedades civis constituídas exclusivamente de profissionais de uma mesma categoria, pois a Lei Federal em causa não autoriza a distinção pretendida pelo fisco municipal. A hipótese de incidência contempla a sociedade civil prestadora de serviços profissionais de caráter interdisciplinar. Recurso extraordinário conhecido e provido” (RE n° 91.311, Rel. Min. Rafael Mayer, DJ de 21-12-1979, p. 09667).

“Imposto sobre serviços. Sociedade civil de profissionais de qualificações diversas. Tratamento tributário favorecido (art. 9º, pars. 1º e 3º do DL 406/68, modificado pelo DL 834/69). Ausência de afronta a Lei Federal, que não autoriza a distinção pretendida pelo fisco municipal. Precedente do STF (RE 81.193, DJ 17.3.78). Recurso extraordinário não conhecido” (RE n° 88.531, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, DJ de 25-4-1978, p. 02627).

“Imposto sobre serviço. Sociedade civil, composta de profissionais de qualificações diversas, que prestam serviços mistos. Calculo do imposto. Ausência de afronta a Lei Federal. Recurso extraordinário não conhecido” (RE n° 81.193, Rel. Min. Bilac Pinto, DJ de 17-2-1978).

“Imposto sobre serviços. Sociedade civil. Profissionais de qualificações diversas. Benefício fiscal. Decreto-lei 406/68, art. 9º, par-3º (redação do Decreto-lei 834/69). O art. 9º, par. 3º. c/c o art. 1º do DL. 406/68 (redação do DL 834/69). Assegura a tributação do ISS, na forma fixa, quer as sociedades uniprofissionais, quer as pluriprofissionais. Precedentes do STF. Recurso extraordinário não conhecido” (RE n° 96.475, Rel. Min. Rafael Mayer, DJ de 4-6-1982, p. 05463).

A jurisprudência mais recente do STJ retornou a tese consagrada no passado pelo Supremo Tribunal Federal à época que a discussão da matéria era de uma competência.

Senão vejamos:

“TRIBUTÁRIO. ISS. ART. 9º, §§ 1º e 3º, DO DECRETO LEI Nº 406/68. SOCIEDADE PLURIPROFISSIONAL DE ARQUITETOS E ENGENHEIROS. INEXISTÊNCIA DE CARÁTER EMPRESARIAL. RECOLHIMENTO DO ISS SOBRE ALÍQUOTA FIXA. POSSIBILIDADE. CONCLUSÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM COM BASE EM FATOS E PROVAS DOS AUTOS. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. 1. O Tribunal a quo ao analisar os fatos e as provas dos autos, concluiu que a parte agravada não apresenta natureza de organização empresarial, permitindo o recolhimento do ISS sobre alíquota fixa. A alteração destas conclusões demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ. Precedente. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg no REsp nº 1486568 / RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, Dje de 13-11-2014).

“TRIBUTÁRIO. ISS. ARTIGO 9º, PARÁGS. 1º E 3º, DL 406/68. SOCIEDADE SIMPLES PLURIPROFISSIONAL DE ADVOGADOS E CONTADORES. INEXISTÊNCIA DE CARÁTER EMPRESARIAL. SERVIÇO PRESTADO DE FORAM PESSOAL. RECOLHIMENTO DO ISS SOBRE ALÍQUOTA FIXA. POSSIBILIDADE. 1. O que define uma sociedade como empresária ou simples é o seu objeto social. No caso de sociedades formadas por profissionais intelectuais cujo objeto social é a exploração da respectiva profissão intelectual dos seus sócios, são, em regra, sociedade simples, uma vez que nelas faltarão o requisito da organização dos fatores de produção, elemento próprio da sociedade empresária: doutrina do Professor ANDRÉ LUIZ SANTA CRUZ RAMOS (Direito Empresarial Esquematizado, São Paulo, Método, 2014). 2. Ambas as Turmas que compõem a Primeira Seção entendem que o benefício da alíquota fixa do ISS somente é devido às sociedades uni ou pluriprofissionais que prestam serviço em caráter personalíssimo sem intuito empresarial. Precedentes. 3. No caso, tratando-se de sociedade em que o objeto social é a prestação de serviços técnicos de consultoria e de assessoria, prestados diretamente pelos sócios, em que o profissional responde pessoalmente pelos serviços prestados, faz jus ao recolhimento do ISS na forma do art. 9º, parágs. 1º e 3º do DL 406/1968. 4. Recurso Especial provido para reconhecer o direito da recorrente ao recolhimento do ISS com base no art. 9º., parágs. 1º e 3º. do DL 406/1968. Invertido os ônus sucumbenciais.” (REsp nº 1512652/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 30-3-2015).

Na mesma linha, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conforme ementa abaixo:

“TRIBUTO – ISS – Município de São Roque – Pretensão da contribuinte de, na condição de sociedade profissional, cujos sócios prestam serviços sob responsabilidade pessoal, recolher o imposto sobre valor fixo, nos termos dos §§ 1º e 3º do art. 9º do Decreto-lei nº 406/68 – Ação anulatória c/c declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária julgada improcedente – Suficiência de provas documentais acerca da condição da interessada de sociedade beneficiária do pretendido tratamento – Hipótese de correlação entre as atividades dos sócios, embora não haja identidade de profissão – Habilitação de ambos para a prestação de serviços na área da saúde – Recurso provido.” (Apelação nº 0008616-35.2012.8.26.0586, Rel. Des. Erbetta Filho, j. 30-4-2015).

Nesse V. Acórdão o TJESP retomou a antiga jurisprudência do STF sustentando ser indiferente a noção de uniprofissionalidade, bastando a correlação das atividades em lugar das identidades das profissões para fazer jus ao regime jurídico prescrito no § 3º, do art. 9º do Decreto-lei nº 406/68.

É o caso sob consulta em que há presença de arquiteto e de engenheiros que, embora regidos por Conselhos distintos – CREA e CAU – ambos exercem atividades iguais ou correlatas de serviços de engenharia em geral constantes como objeto da sociedade consulente. De fato, pelo exame do art. 7º da Lei nº 5.194/66, que regula o exercício da profissão de engenheiros, as atividades e atribuições profissionais do engenheiro coincidem na maioria das hipóteses com as atribuições dos arquitetos e urbanistas previstos no art. 2º da Lei nº 12.378/10, que regula o exercício da arquitetura e urbanismo. Ambos os profissionais promovem execução de obras e serviços, estudos, projetos, planejamento, fiscalização e condução de obras etc.

c) O parágrafo único, do art. 966 do Código Civil exclui do conceito de empresário os exercentes de profissão intelectual de natureza científica, literária ou artística.

A jurisprudência atual do STJ e do TJESP, ao retomar a antiga jurisprudência da Corte Suprema harmoniza-se com o preceito do parágrafo único, do art. 966 do Código Civil que assim prescreve:

“Art. 966 – Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Parágrafo único – Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”

Sobre esse dispositivo escrevemos:

“Por expressa previsão do parágrafo único estão excluídos do conceito de empresário os exercentes de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, salvo se o exercício da profissão constituir-se em elemento da atividade organizada em empresa. É o  caso, por exemplo, de um farmacêutico que a par de aviar as receitas médicas mantém um estabelecimento destinado a comercializar remédios. Outro exemplo: um médico mantém comercialmente um SPA onde exerce, também, a sua profissão de médico para atender os frequentadores do SPA. A presença de auxiliares ou colaboradores igualmente não descaracteriza a SUP. Essas pessoas limitam-se a exercer uma atividade-meio para que os sócios, profissionais legalmente regulamentados, possam prestar o serviço especializado (atividade-fim). Parece patente que a colaboração de terceiros a título de atividade-meio para atingir a atividade-fim não descaracteriza os serviços de natureza pessoal executados pelos sócios que assumem a responsabilidade pela prestação de tais serviços”[2].

d) Da vinculação da administração a seus próprios atos

Foi a própria administração municipal de Campinas quem promoveu o enquadramento da consulente no regime de tributação especial do ISS em plena vigência da Lei nº 12.378/2010, que criou o Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU – devidamente publicado no DOU, pelo que, a ninguém é dado alegar ignorância da lei. E até o ano de 2014 continuou promovendo o lançamento de ofício pelo valor fixo.

Como se sabe, no lançamento de ofício todo o ônus da correta interpretação da legislação tributária recai única e exclusivamente ao sujeito ativo do tributo. Daí a tendência de convolar o lançamento de ofício em lançamento por homologar a maioria dos tributos vigentes, onde o sujeito passivo arca com o encargo de interpretar o texto legal e as normas complementares, apurar o imposto devido, comunicar ao fisco o montante do tributo apurado e promover o seu recolhimento, sob condição de ulterior homologação, expressa ou tácita pela autoridade fiscal competente.

Como transferir a responsabilidade pela prática de atos de ofício ao contribuinte, impondo-lhe pesadas sanções retroativas, obrigando-o a recolher o ISS pelo preço dos serviços prestados no período de janeiro de 2012 a setembro de 2015, acrescidos de juros, correção monetária e multa?

Por óbvio essa pretensão fiscal atenta contra o princípio da razoabilidade, um limite imposto pela Constituição à ação do próprio legislador.

e) Da ilegalidade do desenquadramento com efeito retroativo

Como se não bastasse o quanto exposto no item anterior, o desenquadramento com efeito retroativo levado a efeito fisco campineiro viola frontalmente o disposto no art. 146 do CTN, in verbis:

“Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em consequência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução”.

Consoante já escrevemos, “esse dispositivo reforça o princípio da imodificabilidade do lançamento após regular notificação do sujeito passivo.

Qualquer alteração introduzida de ofício ou em decorrência de decisão judicial nos critérios adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento só pode ser efetivada relativamente ao mesmo contribuinte, quanto ao fato gerador ocorrido posteriormente à introdução do novo critério jurídico. É um dispositivo fundado no princípio da segurança jurídica que decorre da previsibilidade, isto é, o contribuinte sabe de antemão o que o fisco poderá fazer e não fazer no exercício do lançamento tributário.

A eventual inovação das normas complementares que integram a legislação tributária (arts. 96 e 100 do CTN), tratando-se de normas relativas ao lançamento, só poderá ser aplicada relativamente ao mesmo contribuinte aos fatos geradores ocorridos posteriormente à inovação. As situações consolidadas anteriormente à inovação dessas normas complementares sobrevivem sem quaisquer alterações. É que mudança de critério jurídico para realização do lançamento equivale à modificação da norma definidora do fato gerador da obrigação tributária”.[3]

Nesse sentido é a jurisprudência do STJ:

“EMENTA.

TRIBUTÁRIO. MERCADORIA IMPORTADA. ICMS. MOMENTO DO FATO GERADOR. ARTIGO 155, § 2º, IX, “A”, DA CF/88. ARTIGO 34, § 3º, DO ADCT. CONVÊNIO 66/88. ACÓRDÃO RECORRIDO FUNDADO EM MATÉRIA EXCLUSIVAMENTE INFRACONSTITUCIONAL. ENTENDIMENTO DO STF CONSOLIDADO NA SÚMULA N.º 661. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 577/STF LIMITADA AOS FATOS GERADORES ANTERIORES À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.

1. O recolhimento prévio do ICMS como condição para desembaraço aduaneiro de mercadoria importada passou a ser exigido após a promulgação Constituição Federal de 1988, nos termos na Súmula n.º 661, do STF (“Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro”),  não mais se justificando, a partir de então, a incidência da Súmula n.º 577/STF (“Na importação de mercadoria do exterior, o fato gerador do imposto de circulação de mercadorias ocorre no momento de sua entrada no estabelecimento do importador”)

2. “A modificação introduzida, de ofício ou em consequência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução” (art. 146, do CTN)

3. ‘O artigo 146 do CTN positiva, em nível infraconstitucional, a necessidade de proteção da confiança do contribuinte na Administração Tributária, abarcando, de um lado, a impossibilidade de retratação de atos administrativos concretos que implique prejuízo relativamente à situação consolidada à luz de critérios anteriormente adotados e, de outro, a irretroatividade de atos administrativos normativos quando o contribuinte confiou nas normas anteriores’. (Leandro Paulsen, in Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 8ª ed., Ed. Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2006, pág. 1.086)

6. Recurso Especial da Fazenda Nacional provido” (Resp nº 810565/SP, Rel. Min. Luix Fux, DJe de 03-03-2008).

No mesmo sentido o Recurso Especial  nº. 826.333/PE, DJe  de 03-04-2008, de relatoria do Min. Luiz Fux.

Até mesmo órgão colegiado de tribunais administrativos vem decidindo na mesma linha:

“O disposto no art. 146 do Código Tributário Nacional não autoriza a revisão de entendimento sobre situação de conhecimento do Fisco a fatos pretéritos, a qual só passou a atribuir relevância jurídica em momento posterior à utilização reiterada do regime jurídico” (Recurso ordinário – Proc. Adm. nº 2014.0.083.340-6 – 3ª Câmara do Conselho Municipal de Tributos da Prefeitura de São Paulo, j. de 17-10-2014).

Por todos os fundamentos retroexaminados é absolutamente nulo e insubsistente  a decisão de desenquadramento com efeito retroativo do regime de tributação fixa do ISS, beirando o ato administrativo praticado pela autoridade fiscal à configuração do crime de excesso de exação previsto no parágrafo único, do art. 316 do Código Penal.

RESPOSTAS AOS REQUISITOS

1- Engenheiros  e Arquitetos podem ser considerados como profissionais de ramos distintos só pelo fato da superveniência de novo órgão regulador dos Arquitetos – CAU?

R: Engenheiro e arquiteto,  apesar de a Lei nº 12.378/2010 ter promovido a criação do CAU, continuam com as atividades que na maioria dos casos são comuns aos dois profissionais. Ademais, como demonstrado no corpo do parecer a noção de uniprofissionalidade (SUP) não tem a menor relevância jurídica,  à luz da lei de regência nacional do ISS – § 3º, do art. 9º do Decreto-lei nº 406/68 – que não distingue sociedades uniprofissionais das sociedades pluriprofissionais, e da jurisprudência dos tribunais, inclusive, a do STJ que passaram a acompanhar a antiga jurisprudência do STF, quando o exame da matéria era de uma competência. Os Tribunais administrativos, também, se curvaram a essas decisões judiciais que, pelo novo CPC, não podem delas divergir.

2) O lançamento de ofício por alíquota fixa até o exercício de 2014, apesar de a Lei nº 12.378, de 31 de dezembro de 2010, que desmembrou o CREA para formar o novo Conselho para regular os Arquitetos – CAU – já era do conhecimento geral desde a sua publicação, não caracteriza um contradição do fisco de Campinas, que promoveu o desenquadramento do regime de tributação especial sob o fundamento de que sociedade que tenha como sócios profissionais regidos por Conselhos distintos não podem usufruir do regime  de tributação por alíquota fixa?

R: A contradição é óbvia. Se a Prefeitura de Campinas vinha promovendo o lançamento de ofício do ISS pelo regime da tributação pelo valor fixo durante a plena vigência da Lei nº 12.378/10, que criou o CAU separando-o do CREA, como pode, em 2015 promover o desenquadramento retroativo até o ano de 2014, sob o fundamento de que sociedade que tenha arquiteto e engenheiros em seu quadro, regidos por Conselhos diferentes, não pode usufruir do regime especial de tributação? O relevante juridicamente não é o fato de a consulente ter levado ao conhecimento do fisco a retirada da sociedade da sócia arquiteta mas, apenas e tão somente o fato de ter comunicado o seu ingresso, dela arquiteta,  na sociedade consulente lá permanecendo mesmo após o advento do CAU, que resultou do desmembramento do CREA. Relevante observar, ainda,  que a lei municipal de nº 12.392/05 já previa a vedação do regime especial do ISS para profissionais pertencentes a conselhos diferentes antes mesmo da criação do CAU, por desmembramento do CREA.

3) O lançamento de ofício do ISS por alíquota fixa até o exercício de 2014, quando já estava em pleno vigor o novo Conselho –  CAU – e a Lei municipal de Campinas, a de nº 12.392/05 só previa a tributação pelo regime especial em relação a sociedades com profissionais regidos pelo mesmo Conselho fiscalizador, não implicou vinculação da administração a seus próprios atos?

R: O lançamento de ofício do ISS pelo valor fixo até o exercício de 2014, por óbvio, vincula a administração ao regime de tributação por ela eleito.

O princípio da vinculação da administração a seus próprios atos é uma decorrência não apenas de natureza legal, como de natureza ético-moral, por isso mesmo essa vinculação se faz até mesmo no erro de administração. Só o administrado, quando não lhe convém,  fica à salvo dessa vinculação por causa do princípio da universalidade da jurisdição.

4) Qual a medida cabível em face do exposto em seu parecer jurídico?

R: Esgotado o procedimento administrativo em curso, caso  não logre êxito, a consulente poderá ingressar com a ação ordinária de anulação do ato administrativo contra a Municipalidade  de Campinas, com o pedido de tutela de urgência de que trata o art. 300 do CPC vigente, a fim de afastar o perigo de dano decorrente de outros procedimentos fiscais tendentes à obtenção do título executivo.

É o nosso parecer s.m.j.


[1] Na verdade uma arquiteta.
[2] Cf. nosso ISS doutrina e prática, 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 228.
[3]Código tributário nacional comentado, 2ª edição. São Paulo: Rideel, 2016, p. 228-229.

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