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Eugenio Pacelli

Eugenio Pacelli

31/05/2017

Quem conhece um pouco do Direito legislado no Brasil, e, mais especificamente, do texto que dá abrigo a diversas normas constantes da Lei 12.850/13 – hoje famosíssima pelas delações premiadas – já   terá certamente experimentado não poucas impressões de estranheza. Exemplo: mas não diz o texto que o juiz somente poderá reduzir a pena, de um a dois terços, conceder perdão judicial e até impor medidas restritivas de direito ao colaborador? Por que então a imprensa nos informa diariamente que nesse ou naquele acordo de delação já se definiu a pena máxima a ser aplicada e, na mesma página, antecipou-se também modalidade de pena ainda em fase de investigação?

O risco de se escrever sobre o tema é que também já há para ele – e qualquer outro de igual jaez – a crítica pronta: tentativa de minar a Lava Jato e manifestação de quem parece demonstrar apreço pela corrupção. E da idiotia desse maniqueísmo seguem outros, todos imbuídos do mesmo espírito de Justiça: querem impedir a transformação do Brasil, tarefa essa de que estariam incumbidos os combativos membros do parquet, o douto juiz Moro e agora o não menos douto ministro Fachin.

Peço licença para não entrar nesse turbilhão insensato. O bem que essa Operação trouxe ao Brasil não tem preço. Tampouco poderá ser mensurado a curto prazo. Isso é fato consumado. Mas essa conclusão não fecha a questão. Se e quando tiver havido violação à Lei, não poderemos nos calar. Tem lição histórica no mundo civilizado no sentido de não admitir os meios ilegais mesmo para a concretização de ótimos fins. Temos até norma constitucional na mesma linha, a assegurar a inadmissibilidade da prova ilícita. Discordar dessa escolha é legítimo! Ignorá-la é inadmissível, tal como consta da norma constitucional! A Constituição da República de 1988, cantada em verso e prosa em tantas instâncias, deve ser integralmente respeitada. E não apenas contingencialmente. Uma coisa é conversa (legítima) de comício, seja em botequim, seja nos espaços de deliberação popular mais racionais; outra, é conversa de tribunais, com o Direito vigente!

Vejo graves problemas jurídicos nas antecipações de penas que vem sendo utilizadas na maioria esmagadora das colaborações encetadas pelo Ministério Público. Nesse ponto, vi diversas da Polícia Federal que me parecem muito mais e melhor orientadas pela Lei 12.850/13. A pena a ser reduzida, e na medida de redução prevista em Lei, é aquela a ser imposta na decisão condenatória, após o processo e respectiva instrução. Não outra, idealizada com antecipação de proveitos pelas partes que a ajustam. No Brasil não há previsão do plea bargaining norte-americano: não se negocia tudo, e, menos ainda, a impunibilidade. O caso mais recente, de generosidade jamais vista no Brasil, ultrapassou qualquer limite do razoável. E da Lei, é claro. Que prevê o não ajuizamento de ação penal apenas quando se comprovar não serem os líderes da organização aqueles que primeiro fazem uso da delação. Aliás, a Lei vem no singular…

Fiquemos apenas, e, contudo, com um aspecto bastante complexo daquilo que vem sendo feito na Suprema Corte, mais recentemente. Nos tribunais, como se sabe, o julgador não é um órgão singular; e, sim, o colegiado (turma ou plenário). Poderia o relator homologar acordo sem a chancela do Colegiado competente. Competente para, ao final do processo, aplicar a pena prevista na Lei? Parece-me que não. Houve recente pronunciamento de ministro da Suprema Corte apontando os defeitos da antecipação de pena e também da subtração da jurisdição do Colegiado.

Mais complexo que tudo isso, porém, é o seguinte: quais serão as consequências da anulação do acordo, se constatada a sua manifesta ilegalidade? Na mesma manifestação, um dos ministros da Suprema Corte minimizou a eficácia da homologação judicial do acordo, sugerindo que ela não vincularia o julgamento final.

Bem, se for essa a solução, seria melhor combinar com os russos (lembrança saudosa de Garrincha) antes, pois eles estão fazendo acordos acreditando na idoneidade do ajuste chancelado pelo Judiciário e nos Poderes Públicos constituídos. As promessas são generosas. E as delações insistem em atender e justificar essa generosidade, ainda quando, segundo a imprensa, as provas não vão além da palavra do colaborador. Como ficaremos? A homologação não vale? O juiz ou o Tribunal podem aplicar pena com absoluta desconsideração daquela ilegalmente ajustada no acordo? Mas o controle de legalidade da homologação não exige, pelo menos, o atendimento aos limites da Lei? Ou se homologa qualquer ajuste de conveniência, na expectativa de desfazer o erro mais adiante?

Enfim, alguém terá que pagar a conta nos casos de homologação de acordos manifestamente contrários à Lei, com aptidão suficiente a subverter e contaminar a liberdade e a vontade do colaborador, aquinhoado que se veria por promessas com chapéu alheio e definitivamente impagáveis.


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