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Remessa necessária (art. 496, CPC/2015)

ART. 496

PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

RECURSO

REEXAME NECESSÁRIO

REMESSA NECESSÁRIA

Elpídio Donizetti

Elpídio Donizetti

23/08/2017

O princípio do duplo grau de jurisdição consiste na possibilidade assegurada às partes de submeterem matéria já apreciada e decidida pelo juízo originário a novo julgamento por órgão hierarquicamente superior. Embora se trate de princípio ínsito ao sistema recursal, o duplo grau de jurisdição também encontra seu fundamento nas hipóteses em que, vencida a Fazenda Pública, a sentença precisa ser submetida ao tribunal, para fins de confirmação, mesmo que não haja recurso por parte do ente público vencido.

Trata-se do reexame necessário – ou remessa necessária –, que não deve ser considerado recurso, seja por lhe faltar tipicidade, seja por não deter diversos dos requisitos básicos exigidos para caracterização dos recursos, tais como a necessidade de fundamentação, o interesse em recorrer, a tempestividade, o preparo, entre outros. Por esse motivo, entende-se que a remessa necessária tem natureza jurídica de condição de eficácia da sentença, não se relacionando, portanto, com os recursos previstos na legislação processual.

O reexame necessário foi, ou melhor, ainda é, alvo de pesadas críticas pela doutrina, uma vez que reflete um privilégio da Fazenda Pública totalmente dispensável. Alfredo Buzaid, mentor do Código de Processo Civil de 1973, já lutava pela extinção desse instituto desde o Código de 1939. Na obra Da apelação ex officio no sistema do Código de Processo Civil, publicada em 1951, o ilustre doutrinador defendia a desnecessidade de se manter esse instrumento de defesa do fisco, posto que, nem histórica, nem cientificamente, se justificava a manutenção no sistema do direito processual civil de 1939.[1]

Buzaid ainda tentou excluir esse instituto da legislação processual quando elaborou o anteprojeto do Código de 1973. Infelizmente não obteve o apoio necessário para expurgar esse privilégio desarrazoado e “anti-isonômico”.[2]

Atualmente, o que se observa é uma advocacia pública bem estruturada, com condições para recorrer de todas as decisões opostas aos interesses da Fazenda Pública. Nesse contexto, submeter ao duplo grau de jurisdição as sentenças que lhe são contrárias é algo totalmente fora de propósito, sobretudo em face da morosidade processual que acomete o direito brasileiro.

Não foi por outra razão que os arts. 13 da Lei nº 10.259/2001 e 11 da Lei nº 12.153/2009, que tratam, respectivamente, dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal e Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, proibiram, expressamente, o reexame necessário nas causas dos respectivos juizados, porquanto, tendo em vista o pequeno valor limite para a competência, deve prevalecer a simplicidade e a celeridade processual.

Pouco tempo depois da edição da Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, o legislador tratou de restringir o cabimento da remessa necessária em todos os casos em que o valor da condenação ou do litígio não ultrapassava sessenta salários mínimos, ou, ainda, quando fossem procedentes os embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor (art. 475, § 2º, do CPC/1973). A inovação mais marcante da Lei nº 10.352/2001, que alterou o CPC de 1973, foi afastar o reexame quando a sentença estivesse em consonância com jurisprudência do plenário do STF ou com súmula de tribunal superior (art. 475, § 3º, CPC/1973).

No anteprojeto do novo CPC uma das propostas era a extinção da remessa necessária. Apesar de não ter havido adesão de parte da bancada legislativa, o art. 496 da nova legislação restringiu, ainda mais, as hipóteses de aplicação do instituto. Veja:

Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal;

1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.

2º Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.

3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I – 1.000 (mil) salários mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – 500 (quinhentos) salários mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;

III – 100 (cem) salários mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público.

4º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:

I – súmula de tribunal superior;

II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

IV – entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.

Como se vê, o novo Código estabelece valores diferenciados de acordo com o ente envolvido. De fato, os entes mais bem aparelhados são os que menos precisam desse privilégio, sendo plenamente justificável a diferenciação. Ressalte-se que tal ideia já havia sido proposta em diversos projetos de lei, dentre os quais citamos o PL nº 3.533/2004, que previa a remessa necessária apenas nos casos em que a sentença fosse desfavorável aos Municípios com população igual ou inferior a um milhão de habitantes.

O parâmetro “valor da condenação” somente se aplica às hipóteses em que a sentença contiver valor certo e líquido. Assim, para os casos em que for necessária a liquidação, a remessa continua sendo obrigatória. Esse já era, inclusive, o entendimento do STJ.[3]

A redação do § 4º ampliou as hipóteses nas quais deverá prevalecer o entendimento jurisprudencial em detrimento da remessa necessária. As novas disposições permitem a efetivação do princípio da razoável duração do processo especialmente aos casos em que, inevitavelmente, o desfecho da demanda seria apenas confirmado pelo tribunal superior. A premissa nesses casos é: se a sentença está de acordo com o entendimento dos tribunais superiores, não há razões para submetê-la a reexame para simples confirmação do fundamentado utilizado pelo julgador na fundamentação da sentença originária.


[1]? BUZAID, Alfredo. Da apelação ex officio no sistema do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1951. p. 58-59.
[2]? O termo é utilizado por Ada Pellegrini Grinover (GRINOVER, Ada Pellegrini. Os princípios constitucionais e o Código de Processo Civil. São Paulo: José Bushatsky, 1975).
[3]? STJ, Súmula nº 490: “A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas”.

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