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Forma dos Atos Processuais

ATOS NÃO SOLENES

ATOS PROCESSUAIS

ATOS SOLENES

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

CPC

LEGISLADOR PROCESSUAL

LEI Nº 11.419/2006

PROCESSO ELETRONICO

Elpídio Donizetti

Elpídio Donizetti

26/04/2018

Os atos jurídicos, quanto à forma, são classificados em atos solenes e não solenes. Solenes são aqueles para os quais a lei prevê uma forma como condição de validade; subordinam-se, geralmente, à forma escrita, a tempo e lugar previstos na lei. Não solenes são os atos que podem ser praticados de forma livre.

A regra é a forma livre dos atos jurídicos (art. 107 do CC). Excepcionalmente, a lei condiciona a validade do ato jurídico à forma, como ocorre com os atos que visem à constituição, à transferência, à modificação ou à renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no País. Nesses casos, a escritura pública é essencial.

O ato processual, como espécie do ato jurídico, segue a mesma regra. Diz a doutrina que o ato processual não requer forma determinada, a não ser quando a lei expressamente o exigir (art. 188). Não é bem assim. Entre o gênero ato jurídico e a sua espécie “ato processual” há uma grande diferença.

Um ato jurídico, mais especificamente, um negócio jurídico – por exemplo, um contrato de locação –, pode ser celebrado verbalmente. Em tempos de embusteiros e mentirosos, pode até ocorrer que na hora de exigir o que se pactuou uma das partes se esquive com relação às obrigações contratadas. De qualquer forma, o negócio jurídico, celebrado por meio da expressão da palavra – expresso, portanto –, é absolutamente válido. A comprovação pode até acarretar dificuldade se o réu negar o fato constitutivo do direito do autor (a existência do contrato e as obrigações pactuadas). Mas a questão será de prova, não de validade da manifestação da vontade dos contratantes.

Essa liberdade de expressão ainda não alcançou o processo. O feixe das relações jurídicas é criado e desenvolvido entre as partes por meio de atos processuais, os quais sempre são praticados ou, quando nada, registrados por meio da palavra escrita. Não se admite um processo oral – embora muito se mencione o princípio da oralidade –, no qual o autor se dirige ao juiz e faz o seu pedido, com a respectiva fundamentação. O juiz, a seu turno, admite aquela petição e dá ordem ao escrivão para contatar o oficial de justiça e mandá-lo citar o réu; avisado oralmente da demanda. O réu, formalmente, mas sem qualquer escrito na mão, se dirige ao juiz e faz a sua defesa. Isso pode ter ocorrido nos primórdios do Império Romano. Hoje, não existe.

Os atos processuais que formam o processo são praticados por meio da escrita ou assim registrados, formando os autos. Todos os atos processuais, sem exceção, são escritos. De regra, a parte, por meio de seu advogado, leva o seu ato de postulação (num sentido amplo) já escrito, seja a petição inicial, a resposta, o pedido de provas, o recurso e assim por diante. Também o juiz, desde o início, se manifesta por meio da escrita, iniciando a sua participação no processo com o tradicional “Cite-se o réu”. O oficial de justiça faz a citação, manifestando essa vontade estatal por meio da palavra, mas registra-o na respectiva certidão. Apresentada a resposta, vem a fase probatória. As partes prestam depoimento pessoal e as testemunhas são ouvidas. Tudo oralmente (em certos casos, admite-se o depoimento escrito), mas também esses atos processuais são registrados no processo. Resumindo: a manifestação da vontade dos agentes do processo – atos processuais praticados pelas partes, pelo juiz e auxiliares – pode-se dar por escrito ou oralmente; mas nessa última hipótese é reduzida a termo. Nem mesmo os procedimentos adotados nos juizados especiais escapam a essa formalidade mínima. A regra é a oralidade. Partes, juiz e auxiliares podem se manifestar oralmente, mas tudo é reduzido a termo (convertido em texto escrito).

Em alguns casos o CPC, além de se utilizar da escrita (imediata ou mediatamente), prescreve a forma como requisito de validade do ato processual. Isso ocorre, por exemplo, no caso das intimações que, se não realizadas por meio eletrônico, serão consideradas feitas somente quando publicadas no órgão oficial. Mesmo assim, pelo princípio da instrumentalidade das formas (art. 276), admite-se, atendidos certos requisitos, que o ato seja praticado de outra forma, desde que alcance a finalidade. É o caso, por exemplo, da utilização do aplicativo WhatsApp como ferramenta para a realização de intimação das partes que assim optarem. Mas não deixa de ter uma forma determinada e ser escrita, possibilitando a cópia e a colagem nos autos, providência que pode ser substituída pelo registro escrito (certidão) do escrivão.

Além da forma, o Código estabelece requisitos de validade para o ato processual. Exemplos: requisitos da petição inicial (art. 319), da sentença (art. 489) e das cartas (de ordem, precatória e rogatória). A forma é livre, mas nem tanto. Tais atos exigem requisitos; nesse sentido, são extremamente formais. Já dissemos que os atos são escritos ou registrados por essa forma. Quanto ao meio onde se registra os atos processuais, cujo conjunto vai formar os autos do processo, pode ser físico ou virtual (chamado eletrônico).

A evolução tecnológica levou o legislador processual à previsão da prática de atos processuais por meios eletrônicos. Com o advento da Lei nº 11.419/2006, que acrescentou o § 2º ao art. 154 do CPC de 1973, tornou possível a produção, a transmissão, o armazenamento e a assinatura de todos os atos processuais por meio eletrônico. Por ser cada vez mais evidente a necessidade de otimização dos atos processuais através de meios eletrônicos, o novo CPC trouxe regramento especial para tratar da matéria. Cumpre, pois, ater com maiores minúcias a essa inovação quanto à prática e ao registro dos atos processuais, o que se passa a fazer no tópico seguinte. De antemão, registro que mesmo no chamado processo eletrônico ainda há muita escrita em papel e escaneamento para inclusão nos autos. Mas ainda vai chegar o dia de o processo (na verdade, os autos) eletrônico comportar a inserção de áudios e imagens, além de outros recursos importantes para a comprovação dos fatos jurígenos. A citação, por exemplo, quando impossível de ser realizada por e-mail, será feita oralmente, o laptop do oficial de justiça filmará o réu, e tudo (áudio e imagem) ficará registrado nos autos. O processo eletrônico do limiar do Século XXI ainda é muito precário, causando mais dores de cabeça do que alegria aos advogados. Mas vamos chegar lá. É preciso ter fé.

Por falar em processo eletrônico, abro um tópico para mencionar a convenção ou negócio jurídico processual, porque são temas que se imbricam. Quanto mais o processo pender para o privado (contratualismo) mais informal poderá ser, com a utilização de ferramentas virtuais que caracterizam essa tal pós-modernidade. O novo CPC prevê a possibilidade de alteração do procedimento para “ajustá-lo às especificidades da causa” (art. 190). O dispositivo é claramente inspirado nos movimentos do contratualismo processual, que permitem uma adequação do instrumento estatal de solução de litígios aos interesses das partes e ao direito material que os consubstanciam. Trata-se de uma baita novidade. No Estado liberal clássico, o processo já foi compreendido como “coisa das partes”; no Estado social, como “coisa do Estado”, caracterizada pelo exagerado protagonismo judicial; agora, no limiar do Século XXI, cujo Estado, pelos mais entusiastas, recebe o qualificativo “democrático de direito”, a vara curvou de uma extremidade à outra e está voltando a um ponto mediano. Dizem os mais otimistas que o processo estatal-privatístico mitigará o protagonismo judicial e injetará mais ânimo nas amorfas partes, tendendo a ser mais equalizado e cooperativo. Quem viver, verá.

A alteração procedimental só pode ser realizada quando a causa versar sobre direitos que admitam autocomposição e as partes forem plenamente capazes. A modificação deve ser realizada mediante consenso e pode incluir o ajuste quanto aos prazos processuais.

Nada impede que a flexibilização quanto ao procedimento seja ajustada na fase pré-processual, ou seja, antes mesmo da existência da demanda. Em todo caso – convenção firmada antes ou após o processo – ainda que a lei não exija a homologação do juiz, é possível que este controle a sua validade (art. 190, parágrafo único).

O professor e magistrado Fernando da Fonseca Gajardoni, enumera algumas situações que podem admitir a convenção sobre o procedimento. Dentre elas, citamos: (i) a ampliação e a redução dos prazos de resposta e de recursos; (ii) estabelecimento de novas formas de comunicação, inclusive por meio de aplicativos de mensagens; (iii) opção por memoriais escritos em vez de debate oral; (iv) comparecimento das testemunhas sem necessidade de expedição de carta precatória ou rogatória.[1]

O Fórum Permanente de Processualistas Civis, nos Enunciados 19 e 21, também trouxe alguns exemplos de negócios jurídicos processuais que poderão ser pactuados em conformidade com o art. 190:

Pacto de impenhorabilidade, acordo de ampliação de prazos das partes de qualquer natureza, acordo de rateio de despesas processuais, dispensa consensual de assistente técnico, acordo para retirar o efeito suspensivo da apelação, acordo para não promover execução provisória (Enunciado 19);

Acordo para realização de sustentação oral, acordo para ampliação do tempo de sustentação oral, julgamento antecipado da lide convencional, convenção sobre prova, redução de prazos processuais (Enunciado 21).

Não obstante a previsão legal que possibilita a ampla celebração de negócio jurídico processual, o Conselho Nacional de Justiça foi chamado a intervir num caso de utilização do aplicativo mais conhecido e utilizado pelo brasileiro (WhatsApp). Um juiz do Estado de Goiás, diante da inconteste credibilidade do meio (creio que muito superior à dos correios e dos sites juntos), resolveu utilizá-lo nas intimações do Juizado onde laborava. O Cartório enviava uma mensagem, via WhatsApp, para a parte. Se aparecesse o tique azul que confirma a leitura da mensagem, ela era considerada intimada. Aliás, além do tique, a parte intimada teria que responder à mensagem do Cartório. O Juiz teve muita cautela e ministrou muito caldo de galinha exatamente para não fazer mal a ninguém, principalmente aos mais envelhecidos pela burocracia processual. Mesmo assim, a Corregedoria de Justiça não gostou da novidade e mandou parar. Então, o CNJ ratificou a utilização da modernidade, por meio do PCA (procedimento de controle administrativo) nº 0003251-94.2016.2.00.0000.

O que se exige, nesse caso, é que o processo verse sobre direitos que admitam autocomposição e as partes, plenamente capazes, manifestem a concordância com o meio utilizado. Ora, se preenchidos tais requisitos, é lícito às partes convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo (art. 190, caput), com muito mais razão pode estabelecer sobre a forma de intimação. O CNJ ratificou a utilização do referido aplicativo. Nem precisava, uma vez que o próprio Código, nas circunstâncias apontadas, autoriza as partes a convencionarem sobre seus ônus e faculdades no processo. Um exemplo bizarro: as partes podem convencionar que as intimações sejam feitas pelo jornaleiro. Se até isso é possível, em face da liberdade de convenção para ajustamento às especificidades da causa, o que dizer da aplicação do e-mail, do WhatsApp, Facebook e quejandos. Gente, vamos parar de desperdiçar tinta com o que já está escrito.

A inovação é bastante significativa e, se utilizada com cautela[2], pode trazer maior efetividade ao processo. Para tanto, é imprescindível a cooperação entre os jurisdicionados e a fiscalização por parte do magistrado, que pode anular a convenção em caso de abuso.

É possível, ainda, de acordo com o art. 191, que seja formalizado um calendário, com a anuência do juiz, para a prática dos atos processuais. Caso o juiz aceite a fixação de um calendário, os seus prazos, geralmente impróprios, passarão a ser próprios. Isso porque o CPC/2015 dispõe, expressamente, que o calendário não somente vinculará as partes, mas também o juiz. Sendo assim, é preciso que o juiz e as partes avaliem se há, ou não, estrutura material para a aplicação e efetivação da norma. De todo modo, não há qualquer penalidade para o juiz – pelo menos expressamente. Para as partes o descumprimento do prazo acarreta preclusão (art. 223).

Faço aqui uma observação. Se o juiz admite calendarizar o processo, fixando o dia da entrega da prestação jurisdicional, caracterizada pelo ato decisório, por que não, de ofício, calendarizar para todos? Parece-me que o atendimento prioritário de uma parte, porque teve condições de contratar advogados mais experientes, a ponto de envolver o juízo numa calendarização do processo, que passa a ter prazo para começar e terminar, constituiria flagrante quebra da isonomia. Nada justifica que a pessoa humilde, desigual perante tudo e todos, não possa ter um prazo definido para conhecer os termos da resolução do litígio. Em situações de desequilíbrio, a meu ver, caberia ao juiz dar um empurrãozinho no prato da balança, a fim de restabelecer a isonomia, pelo menos no que respeita à mitigação da morosidade. Seja bem-vinda a calendarização. Para todos.


[1]      DUARTE, Zulmar; DELLORE, Luiz; GAJARDONI, Fernando; ROQUE, André Vasconcelos. Teoria geral do processo: comentários ao CPC de 2015 – Parte Geral. São Paulo: Forense, 2015. p. 625.
[2]      Aqui vale o alerta da professora Teresa Arruda Alvim, para quem o art. 190 não permite a pactuação de negócio jurídico processual que tenha por objeto deveres processuais imperativos. As partes não poderiam, por exemplo, dispor em negócio jurídico processual que uma decisão poderá ser não fundamentada, ou que, em eventual demanda, as partes não estão obrigadas a cumprir as decisões judiciais (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil. Artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015. p. 356-357). Outros limites foram estabelecidos nos Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “O negócio jurídico processual não pode afastar os deveres inerentes à boa-fé e à cooperação” (Enunciado nº 6); “Não são admissíveis os seguintes negócios bilaterais, dentre outros: acordo para modificação da competência absoluta, acordo para supressão da 1ª instância” (Enunciado nº 20).

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