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Ínicio

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Tributário

TRIBUTÁRIO

Autos de Infração Exigindo IRPJ e CSLL

DECRETO Nº 9.942/98

ICMS

INCENTIVO FISCAL

LEI ESTADUAL DE Nº 4.859/96

SAFIS

Kiyoshi Harada

Kiyoshi Harada

30/11/2018

A Consulente foi autuada pela Receita Federal de Teresina/PI porque:

  1. a) Teria excluído indevidamente o incentivo fiscal do ICMS do lucro real, pois, segundo o relatório fiscal, o valor da despesa não desembolsada correspondente à isenção do ICMS a ser recolhido integra o giro do negócio da Consulente que dele dispõe como bem quer.

Entendeu o sr. agente fiscal que a isenção do ICMS não se caracteriza como subvenção, representando mera redução de despesa, e, admitindo-se tratar de subvenção governamental ela deveria ter sido classificada pela Consulente como “subvenção corrente para custeio ou operação”, a qual deveria ter sido computada na determinação do lucro real.

Por isso a Delegacia da Receita Federal em Teresina/PI, Seção de Fiscalização – SAFIS, procedeu ao lançamento de ofício do IRPJ e da CSLL incidentes sobre o valor total do incentivo fiscal excluído.

  1. b) Teria omitido receitas financeiras, porque em que pese o sr. agente fiscal ter constado que todos os contratos de empréstimo apresentados pela Consulente possuem cláusula que afasta expressamente a cobrança de juros sobre o empréstimo pactuado, essa regra não onerosa só valeria até a data do vencimento dos empréstimos, e depois haveria cobrança de multa sobre o saldo corrigido e de juros.

Por tal motivo, foi procedido o lançamento de ofício para a exigência dos tributos incidentes sobre as receitas financeiras decorrentes daqueles encargos que, no entender do fisco, eram devidos pelos tomadores de empréstimos inadimplentes e não foram contabilizados pela Consulente.

Diante disso, pede o nosso parecer acerca da incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores correspondentes à isenção do ICMS e sobre os valores correspondentes a multa e juros incidentes sobre os contratos de empréstimos vencidos, que na verdade foram perdoados, formulando os quesitos ao final respondidos.

PARECER

Da exclusão dos valores dos incentivos fiscais do ICMS do lucro real

A Consulente é beneficiária de incentivos fiscais no período abrangido pela atuação representados pela isenção de 100% do ICMS, nos termos do Decreto nº 9.942, de 15-7-1998, do Estado do Piauí, atualizado pelo Decreto nº 11.836, de 1-12-2005, como reconhecido no relatório fiscal.

Assim, ela tem direito de deduzir os valores desses incentivos, que têm a natureza de subvenção para investimento, da base de cálculo de tributos federais.

De fato, com fundamento na Lei Estadual de nº 4.859/96, o Decreto nº 9.942/98 outorgou o incentivo fiscal nos seguintes termos:

Art. 1º Fica concedido ao estabelecimento da empresa BIKE DO NORDESTE S/A, inscrito no CGC/MF, sob nº 02.220.262/0001-97 e no CAGEP sob nº 19.440.014-0, sede e foro na Av. Getúlio Vargas nº 1150, Bairro Tabuleta, município de Teresina/PI, incentivo fiscal equivalente à IMPLANTAÇÃO, para, utilizando os processos de transformação e montagem industrial, fabricar bicicletas, kits, aros e rodas, produtos COM SIMILAR, na forma do disposto no art. 4º, inciso II, alíneas “a” a “d”, da Lei nº 4.859, de 27 de agosto de 1996.

Art. 2º O incentivo fiscal de que trata este Decreto terá o prazo máximo de 10 (dez) anos, e corresponderá, observado o disposto nos §§ 1 e 2, à dispensa de 60% (sessenta por cento) do ICMS apurado durante esse período de tempo, nos termos do art. 4º, inciso II, alíneas “a” a “d”, da Lei nº 4.859, de 27 de agosto de 1996, na ocorrência de:

(…)

  • 1º O incentivo fiscal de que trata este artigo será considerado como IMPLANTAÇÃO SEM SIMILAR, portanto, com dispensa do pagamento de 100% (cem por cento) do ICMS apurado, pelo prazo de 15 (quinze) anos, observado o disposto nos §§ 55 e 65, na forma do art. 4º, inciso III, da Lei nº 4.859, de 27 de agosto de 1996, desde que fiquem comprovadas a criação e manutenção, nos quadros da empresa, de 500 (quinhentos) ou mais empregados, na ocorrência de:*

*Caput do § 1º com redação dada pelo nº 10.962, de 23 de dezembro de 2002, Art. 1º.

Como se vê, o incentivo fiscal outorgado corresponde à IMPLANTAÇÃO SEM SIMILAR de unidade produtora, pelo que foi dispensado o pagamento de 100% do ICMS.

Logo, nos termos da legislação do imposto de renda, os valores desses incentivos não devem ser computados na determinação do lucro real.

É o que dispõe o art. 443 do RIR:

Art. 443. Não serão computadas na determinação do lucro real as subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, e as doações feitas pelo Poder Público, desde que (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 38, § 2º, e Decreto-Lei nº 1.730, de 1979, art. 1º, inciso VIII):

I – registradas como reserva de capital que somente poderá ser utilizada para absorver prejuízos ou ser incorporada ao capital social, observado o disposto no art. 545 e seus parágrafos; ou

II – feitas em cumprimento de obrigação de garantir a exatidão do balanço do contribuinte e utilizadas para absorver superveniências passivas ou insuficiências ativas.

Entretanto, violando o fisco o princípio da hierarquia vertical das leis, valeu-se do Parecer Normativo CST nº 112/78 para desqualificar o incentivo fiscal da Consulente como subvenção para investimento.

O próprio argumento do fisco para tributar o valor desses incentivos consignado no item 16 do Relatório Fiscal favorece a Consulente. Vejamos:

O benefício fiscal (isenção do ICMS) foi concedido em favor do fiscalizado sem vinculação com qualquer aplicação específica dos recursos em bens ou direitos referentes à implantação ou expansão do empreendimento econômico. Os únicos condicionantes para a concessão da isenção foram: a instalação da indústria e a criação/manutenção de, no mínimo, 500 (quinhentos) empregos, conforme se depreende dos atos legais embasadores e concessivos de seu direito, conforme a seguir:

Ora, se a instalação da indústria reconhecida no Relatório não for subvenção para investimento o que seria? As despesas com a montagem de unidade industrial, na verdade, sem similar, como referido no Decreto nº 9.942/98 do Estado do Piauí, não podem ser classificadas como despesas de custeio. Elas fomentam e expandem a atividade industrial e a geração de empregos diretos e indiretos, o suficiente para a caracterização das despesas de investimento.

Para evitar interpretações aleatórias, deve-se buscar o conceito do que sejam subvenções de investimento no ramo de direito a que pertence essa categoria jurídica, ou seja, no Direito Financeiro, no qual se insere a classificação de despesas.

O art. 443 do RIR refere-se a “subvenções para investimento”.

Logo, é preciso buscar os conceitos de um e de outro na Lei nº 4.320/64, que estatui normas gerais de Direito Financeiro aplicável no âmbito das três esferas políticas.

Nos termos do § 3º do art. 12 da Lei nº 4.320/64, subvenções são transferências destinadas a cobrir despesas de custeio das entidades beneficiadas, distinguindo-se como:

I – subvenções sociais, as que se destinam a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa;

II – subvenções econômicas, as que se destinem a empresas públicas ou privadas de caráter industrial, comercial, agrícola ou pastoril.

Resulta desses textos que subvenções são auxílios pecuniários para fins sociais ou econômicos.

As despesas de investimento estão definidas no § 4º do art. 12:

  • 4º Classificam-se como investimentos as dotações para o planejamento e a execução de obras, inclusive as destinadas à aquisição de imóveis considerados necessários à realização destas últimas, bem como para os programas especiais de trabalho, aquisição de instalações, equipamentos e material permanente e constituição ou aumento do capital de empresas que não sejam de caráter comercial ou financeiro.

Nesse conceito estão abrangidas as transferências para implantação de indústria e sua expansão, inclusive aquisição de imóveis necessários a essa implantação ou expansão.

Conjugando-se os dois conceitos que derivam da lei aplicável nacionalmente, temos que as subvenções para investimento são ajudas financeiras destinadas a fomentar as atividades econômicas (industrial, comercial ou pastoril).

Via de regra, essas transferências ocorrem para o setor público, o que não impede de o Poder Público destinar ajuda financeira ao setor privado a título de subvenções para investimentos. É o que está prescrito no art. 19 da Lei nº 4.320/64:

Art. 19. A Lei de Orçamento não consignará ajuda financeira, a qualquer título, a empresa de fins lucrativos, salvo quando se tratar de subvenções cuja concessão tenha sido expressamente autorizada em lei especial.

É o caso da Consulente que recebeu as subvenções para investimentos representadas pela isenção de 100% do ICMS com base na autorização específica da Lei nº 4.859, de 27-8-1996, do Estado de Piauí, cujo art. 1º assim prescreve:

Art. 1º O incentivo fiscal de dispensa do pagamento referente ao Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, a ser concedido aos empreendimentos industriais e agroindustriais, considerados prioritários para o Estado do Piauí, por motivo de implantação, relocalização, revitalização e ampliação de unidades fabris já instaladas, obedecerá a forma e as condições previstas nesta Lei. (grifamos)

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se:

(…)

II – implantação – a instalação de estabelecimento industrial ou agroindustrial que venha a entrar em operação a partir da data da publicação do Regulamento desta Lei; (grifamos)

Em consequência, foi editado o Decreto nº 9.942/98, concretizando o incentivo fiscal autorizado por lei.

Onde está a ilegalidade da exclusão dos valores desses incentivos fiscais da apuração do lucro tributável?

Descabe a desqualificação de subvenção para investimento em despesas correntes para custeio, como fez a fiscalização para efeito de enquadramento no art. 392 do RIR:

Art. 392. Serão computadas na determinação do lucro operacional:

I – as subvenções correntes para custeio ou operação, recebidas de pessoas jurídicas de direito público ou privado, ou de pessoas naturais (Lei nº 4.506, de 1964, art. 44, inciso IV).

Inconfundível a despesa de custeio que integra a categoria econômica de Despesas Correntes, com a despesa de investimento que integra a categoria econômica de Despesas de Capital, segundo a Lei nº 4.320/64.

Por isso, as Câmaras do CARF, seguindo a orientação da Câmara Superior de Recursos Fiscais, vêm decidindo que os valores de incentivos fiscais do ICMS concedidos pelos Estados para “fomentar a manutenção e a ampliação da atividade industrial e a geração de empregos diretos e indiretos, o que demonstra o caráter de incentivo aos investimentos”, podem ser deduzidos do lucro tributável (julgamento dos incentivos fiscais instituídos pela Lei gaúcha de nº 11.028/97 e pela Lei baiana de nº 7.024/97).

A Câmara Superior de Recursos Fiscais, no julgamento da Lei do Estado do Amazonas de nº 1.939/89 em 2010, também manifestou o mesmo entendimento.

Não há como confundir despesas de investimentos expressas no Decreto concessivo da isenção fiscal à Consulente com despesas de custeio para cobrir os custos e despesas operacionais da Consulente.

Repita-se: é a própria fiscalização que faz referência às despesas para investimento quando alega: “Os únicos condicionantes para a concessão da isenção foram: a instalação da indústria e a criação/manutenção de, no mínimo, 500 (quinhentos) empregos, conforme…”.

Ora, não se trata de “únicos”, mas de tudo o que é preciso para caracterizar despesas de investimentos.

Finalmente, o incentivo fiscal foi concedido à Consulente por prazo certo e sob condição na forma do art. 178 do CTN:

Art. 178 – A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104. (Redação dada pela Lei Complementar nº 24, de 7.1.1975)

Assim, se o incentivo fiscal não foi cancelado nem anulado pelo governo do Estado do Piauí, ele cumpriu os objetivos de fomentar e expandir a atividade industrial naquele Estado.

Não cabe ao fisco federal fiscalizar a aplicação dos recursos provenientes do incentivo fiscal outorgado à Consulente pelo Estado do Piauí. Cabe apenas fiscalizar o cumprimento dos termos e condições dos incentivos fiscais outorgados pela União.

Se o ente político titular da outorga isencional deu-se por satisfeito com a destinação dos recursos dela decorrentes, não cabe ao fisco de outra esfera política contestar.

Assim, não procede a autuação nesse particular por afrontar disposições expressas da legislação tributária e contrariar julgado do CARF.

São indevidos os tributos exigidos a esse título, quais sejam o IRPJ e a CSLL, conforme adiante demonstrado.

Reconhecido está no auto de infração que a Consulente celebrou com as empresas coligadas, Claudio S/A e outras, diversos contratos de empréstimos, isto é, transferência de recursos financeiros a título não oneroso, sem cobrança de encargos financeiros, conforme cláusula 2ª de um dos contratos da espécie transcrito no item 27 do auto de infração:

Clausula 2ª – Considerando que o presente empréstimo é feito entre empresas coligadas indiretamente, as partes pactuam que não haverá incidência de juros sobre o empréstimo ora contratado, que é tido a título gratuito, afastando expressamente a incidência do art. 591 do Código Civil.

O fisco reconheceu a gratuidade do empréstimo previsto nos contratos entre as empresas coligadas, porém essa exoneração de encargos financeiros só valeu até o final do prazo contratual. Após o vencimento do contrato, impunha-se a cobrança de multa de 2% sobre o saldo corrigido, além de juros de 1% por mês de atraso.

Não era o caso de prever nos contratos a dispensa de multas e de juros moratórios, como é obvio. Não se celebra contrato no pressuposto de seu inadimplemento que depende de fatores futuros e incertos, às vezes, de natureza conjuntural.

As tomadoras de empréstimo não conseguiram honrar os compromissos assumidos. Pleitearam junto à Consulente e obtiveram dela a renúncia das multas e dos juros moratórios, conforme se verifica dos documentos contábeis exibidos ao subscritor deste parecer, nos quais não se encontram contabilizados nem o pagamento de multa e juros de uma parte, nem o recebimento dessas verbas de outra parte. A razão desse perdão, presume-se, é a mesma que levou a Consulente a dispensar a percepção de juros compensatórios, conforme a prescrição da cláusula 2ª do contrato antes referida.

Não era o caso de aditar os contratos findos para dispensar a cobrança de multas e juros moratórios, tendo em vista a convergência de vontades entre as partes. Não houve, pois, omissão de receitas.

Os juros moratórios distinguem-se dos juros compensatórios ou simplesmente juros. Estes representam uma compensação pela aplicação de um capital, representam fruto do capital mutuado.

Na opinião abalizada de Maria Helena Diniz:

Os juros são o rendimento do capital, os frutos civis produzidos pelo dinheiro, sendo, portanto, considerados como bem acessório, visto que constituem o preço do uso do capital alheio, em razão da privação deste pelo dono, voluntária ou involuntariamente[1]. (grifamos)

No mesmo sentido, as lições de Silvio Rodrigues[2] e Washington de Barros Monteiro[3].

Assevera Lacerda de Almeida que os juros compensatórios, por representarem a renda ou o fruto do capital, “têm certa analogia com o aluguel ou renda no contrato de locação…”.[4]

Esses juros compensatórios têm previsão no art. 591 do Código Civil vigente:

Art. 591. Destinando-se o empréstimo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual.

Os juros moratórios representam uma indenização pelo retardamento culposo no cumprimento obrigacional. Nesse sentido, as ligações de Silvio Rodrigues e Washington de Barros Monteiro nas obras retrocitadas.

Os juros moratórios estão regulados no art. 404 do Código Civil vigente:

Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar. (grifamos)

Esse parágrafo único não deixa dúvida quanto à natureza indenizatória dos juros de mora. Assim, os juros moratórios, tanto quanto a multa contratual por inadimplemento, têm natureza indenizatória, o que afasta a incidência do imposto de renda ao teor do art. 43 do CTN, ou seja, a disponibilidade jurídica ou econômica da renda ou proventos de qualquer natureza. Por isso escrevemos:

Pela própria conceituação constitucional e legal do imposto, o elemento objetivo de seu fato gerador só poderia ser a renda ou proventos no sentido de riquezas novas, de acréscimos patrimoniais, que decorrem de algo preexistente: a fonte produtora.[5]

Quanto à multa contratual destinada à reparação do dano patrimonial na hipótese de inadimplemento obrigacional é a própria legislação que a coloca fora do campo de incidência do imposto de renda (art. 70, § 5º, da Lei nº 9.430/96 e art. 39, inciso XVIII, do RIR).

Interpretando os textos legislativos, o E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região firmou a tese de que:

As verbas indenizatórias recebidas por pessoas jurídicas não sofrerão incidência do IR, apenas quando oriundas de rescisão contratual, forem pagas em virtude de término de relação trabalhista, ou quando destinadas a reparar danos patrimoniais sofridos pelo contribuinte (AC nº 473.778/CE, Rel. Des. Federal Bruno Leonardo Câmara Carrá, DJe de 14-10-2011, p. 309). (grifamos)

Dessa forma, a multa contratual e os juros moratórios representativos de danos causados por descumprimento contratual nada acrescentam ao patrimônio preexistente da Consulente.

A partir desse conceito de acréscimo patrimonial como fato gerador do imposto de renda, vasta doutrina e jurisprudência formaram-se em torno da percepção de valores pecuniários, nem sempre tributáveis.

É o caso do preço percebido na desapropriação a título de justa e prévia indenização referida no inciso XXIV do art. 5º da CF.

Consoante escrevemos, a “expressão justa indenização, a nosso ver, significa recomposição do patrimônio do expropriado antes existente”.[6]

Por essa razão é tranquila a jurisprudência do STJ no sentido de não incidência do imposto de renda sobre o preço da justa indenização em ação expropriatória (Resp nº 9600407/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 15-9-2008; Resp nº 118.534/RS, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ 19-12-1997, MS nº 1289/DF, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ 1-3-1993).

Na esteira dessa jurisprudência, o CARF editou a Súmula nº 42 com o seguinte teor:

Não incide imposto sobre a renda das pessoas físicas sobre os valores recebidos a título de indenização por desapropriação.

Na mesma linha de raciocínio, vem decidindo a jurisprudência de nossos tribunais no sentido de não incidência do imposto de renda sobre férias e licença-prêmio indenizadas em dinheiro. O STJ até editou súmulas a respeito:

Súmula 125. O pagamento de férias não gozadas por necessidade de serviço não está sujeito à incidência do Imposto sobre a Renda.

Súmula 136. O pagamento de licença-prêmio não gozada por necessidade de serviço não está sujeito ao Imposto de Renda.

Curvando-se às decisões dos tribunais, a Receita Federal adotou como regra a não exigência do imposto na hipótese de férias integrais ou proporcionais convertidas em pecúnia: Solução de Divergência nº 1, de 2 de janeiro de 2009, publicada no DOU do dia 6-1-2009.

Outrossim, foram expedidas decisões pelas Superintendências Regionais da Receita Federal quanto à não incidência do imposto de renda sobre os valores relativos ao abono pecuniário de férias de que trata o art. 143 da CLT, conforme se verifica do Processo de Consulta nº 2/08 – SRRF/9ª RF.

A exemplo das férias indenizadas em dinheiro, uniformizou-se a jurisprudência perante os Tribunais Regionais do Trabalho no sentido da não incidência do imposto de renda sobre os juros moratórios (TRT/SP – 01104200708502005, RO, AC. 4ª T. 20100131373, Rel. Paulo Augusto Câmara, DOE 12-3-2010; TRT/SP – 00858199246302 006 – AP –AC. 2ª T. 2009 0476632, Rel. Odette Silveira Moraes, DOE  7-7-2009 etc.).

O Tribunal Superior do Trabalho, com o apoio no parágrafo único do art. 404 do CC, também decidiu no mesmo sentido (E – RR 1401/1999 – 006 – 09 – 00.0).

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região igualmente adotou o mesmo posicionamento (TRF4 – 1ª T. Ap. ReeNec. nº 2007.71.00.035 623-1, RS, Rel. Juiz Federal Marcelo de Nardi, j. 27-8-2008, v.u.).

Por fim, o Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista a disposição do Código Civil/2002, também fixou o entendimento pela não incidência do imposto sobre os juros moratórios, conforme se verifica na ementa abaixo:

TRIBUTÁRIO RECURSO ESPECIAL ART. 43 DO CTN IMPOSTO DE RENDA JUROS MORATÓRIO CC, ART. 404: NATUREZA JURÍDICA INDENIZATÓRIA NÃO INCIDÊNCIA.

  1. Os valores recebidos pelo contribuinte a título de juros de mora, na vigência do Código Civil de 2002, têm natureza jurídica indenizatória. Nessa condição, portanto, sobre eles não incide imposto de renda, consoante a jurisprudência sedimentada no STJ.
  2. Recurso especial improvido. (REsp nº 1.037.452/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 10-6-2008).

Colocando termo à discussão, o STJ decidiu em caráter de Recurso Repetitivo, consagrando a tese da não incidência do imposto de renda, impondo multa à parte recalcitrante, conforme ementa abaixo:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. NÃO INCIDÊNCIA. JUROS DE MORA. CARÁTER INDENIZATÓRIO. TEMA JULGADO PELO STJ SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. AUSÊNCIA DE QUALQUER UM DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC. IMPOSSIBILIDADE DE EFEITOS INFRINGENTES.

  1. Conforme consignado no acórdão embargado, a questão da natureza indenizatória dos valores recebidos pelo contribuinte a título de juros de mora vinculados a verbas trabalhistas reconhecidas em decisão judicial foi pacificada pela Primeira Seção desta Corte, por maioria, na assentada de 28.9.2001, sob o regime do art. 543-C do CPC (REsp 1.227.133-RS, Relator para o acórdão Min. Cesar Asfor Rocha), de maneira a afastar a incidência do imposto de renda sobre a verba.
  2. A embargante, inconformada, busca com a oposição destes embargos declaratórios ver reexaminada e decidida a controvérsia de acordo a sua tese.
  3. A inteligência do art. 535 do CPC é no sentido de que a contradição, omissão ou obscuridade, porventura existentes, só ocorre entre os termos do próprio acórdão, ou seja, entre a ementa e o voto, entre o voto e o relatório etc., o que não ocorreu no presente caso.
  4. Em face do caráter infringente dos embargos de declaração opostos contra acórdão assentado em jurisprudência firmada no rito previsto no art. 543-C do CPC, impõe-se aplicação de multa em 1% (um por cento) sobre o valor da causa (mutatis mutandis, Questão de Ordem no REsp 1.025.220/RS apreciada pela Primeira Seção – aplicação de Multa – art. 557, § 2º, CPC).

Embargos de declaração rejeitados, com aplicação de multa. (EDcl no AgRg no Resp nº 1.220.923/RS, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 22-6-2012).

Resumindo e concluindo, a inclusão dos valores da multa contratual e dos juros moratórios na base de cálculo do IRPJ e da CSLL é duplamente indevida. Primeiro porque há dispensa expressa da Consulente quanto à percepção desses encargos, tendo em vista que o empréstimo foi feito sem caráter mercantil a suas empresas coligadas. Em segundo lugar porque, em face do caráter indenizatório dessas verbas, a sua percepção, de qualquer forma, não poderia acarretar a ocorrência do fato gerador do imposto de renda que se assenta na disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos, significando um acréscimo ao patrimônio preexistente.

A CSLL é mera consequência da incidência do IRPJ. Onde este não existir, aquela também não existirá.

  1. O incentivo fiscal de 100% do ICMS outorgado à Consulente pelo Decreto nº 9.942/98 do Estado do Piauí com base na Lei estadual de nº 4.859/96 classifica-se como subvenção para investimento?

R: Sim, nos termos da Lei nº 4.320/64 que estatui normas gerais de Direito Financeiro como demonstrado no corpo do parecer (§ 3º, II, c.c. § 4º do art. 12).

  1. Os valores desse incentivo fiscal podem ser deduzidos do lucro real?

R: Sim, nos termos do art. 443 do RIR e conforme tranquila jurisprudência administrativa do CARF.

  1. A não contabilização dos valores dos juros moratórios e da multa contratual pactuados nos contratos de empréstimos celebrados com empresas coligadas, em face da prévia renúncia da Consulente quanto à percepção desses encargos, caracteriza omissão de receita?

R: Não. Houve prévia renúncia da Consulente quanto à percepção desses encargos financeiros de forma verbal, tanto é que não constam nos documentos contábeis da Consulente nem nos das empresas coligadas quaisquer recebimentos ou pagamentos, respectivamente, a título de multa e juros. Como os empréstimos foram feitos para as empresas coligadas da Consulente, a mesma razão que a levou a dispensar o pagamento de juros compensatórios, dispensa essa aceita pelo fisco, conduziu a Consulente a renunciar aos juros moratórios e à multa contratual.

  1. São tributáveis pelo IRPJ e pela CSLL os juros moratórios e a multa por inadimplemento obrigacional?

R: Não. Os juros moratórios, por não terem natureza jurídica de acessório da obrigação principal, a exemplo dos juros compensatórios, mas, por ter natureza jurídica indenizatória, a teor do parágrafo único do art. 404 do Código Civil, não são abrangidos pelo campo de incidência do imposto sobre a renda ante ao que dispõe o art. 43 do CTN. A jurisprudência dos tribunais, mencionada no corpo deste parecer, é tranquila quanto a isso.

Quanto à multa contratual, desde que destinada a reparar os danos patrimoniais, como no caso da Consulente, há exclusão da incidência do imposto sobre a renda pela própria legislação tributária (arts. 70, § 5º, da Lei nº 9.430/96 e 39, XVIII, do RIR). A jurisprudência também é tranquila nesse sentido.

É o nosso parecer, s.m.j.


[1]Curso de direito civil brasileiro. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 368.
[2]Direito civil: parte geral das obrigações. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 315.
[3]Curso de direito civil: direito das obrigações. São Paulo: Saraiva, 1962, p. 369.
[4]Obrigações. Rio de Janeiro: Tipografia Revista dos Tribunais, 1916, p. 178.
[5] Cf. nosso Direito financeiro e tributário. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 403.
[6]– Cf. nosso Desapropriação doutrina e prática. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 41.

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