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Reforma Previdenciária #2: Alteração na Assistência Social (Art. 203)

ALTERAÇÃO NA ASSISTÊNCIA SOCIAL ART. 203

ASSISTÊNCIA SOCIAL

BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA

BPC

LBI

LEI 8.213/91

LTERAÇÃO NA ASSISTÊNCIA SOCIAL

PCD

PEC 06/2019

REFORMA PREVIDENCIÁRIA

Marco Aurélio Serau Junior

Marco Aurélio Serau Junior

25/02/2019

Damos continuidade à série especial de publicações no GEN Jurídico sobre a Reforma Previdenciária (PEC 06/2019).

Falaremos nesta coluna a respeito das alterações que se pretende promover no campo da Assistência Social (prevista nos arts. 203 e 204 da Constituição Federal), especialmente no benefício de prestação continuada (BPC), estabelecido no art. 203, inciso V. O texto da proposta encontra-se ao final do artigo, no formato de anexo, para favorecer a leitura.

A PEC 06/2019 altera a redação do inciso V e insere o inciso VI e os §§ 1º e 2º no bojo do artigo 203. Ademais, também cria regras de transição específicas para o BPC.

Em síntese, cinde o tratamento jurídico dado ao BPC, separando nos incisos V e VI, respectivamente, os requisitos necessários para sua obtenção no caso de PcD ou pessoas idosas. Ademais, altera sua natureza jurídica, que deixa de ser um benefício a cargo da Seguridade Social, passando a ser apenas uma garantia de transferência de renda – o que compreendemos pode empobrecer seu vigor normativo e sua efetividade.

A Reforma Previdenciária também busca substituir o atual conceito de hipossuficiência, pelo de miserabilidade, que é mais restritivo e, cremos, também pejorativo, pois traz a ideia de “pessoas miseráveis”. Hipossuficiência é um conceito normativo mais adequado aos objetivos constitucionais de proteção da dignidade da pessoa humana, pois simplesmente se refere à incapacidade econômica de prover o próprio sustento ou vê-lo provido pela família.

Em relação às PcD, o Texto Constitucional passa a exigir avaliação biopsicossocial para caracterização da deficiência.

Essa previsão a respeito de avaliação biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, decorre do conceito de deficiência adotado na Convenção da ONU de 2007, da qual o Brasil é signatário, e já possuía reflexo na legislação previdenciária nacional na Lei Complementar 143/2015 (aposentadoria especial da PcD) e na Lei Brasileira de Inclusão (LBI).

Quanto ao critério de miserabilidade (sempre adotada a ressalva expressa acima), a PEC 06/2019 exige “renda mensal integral per capita familiar interior a um quarto do salário mínimo”. Porém, a regra é mais restritiva que a atual, pois se estabelece que “o valor da renda mensal recebida a qualquer título por membro da família do requerente integrará a renda mensal integral per capita familiar”.

Esse critério bastante abrangente, no sentido de que os valores recebidos a qualquer título por qualquer membro da família integram a renda mensal familiar, permite afastar a excludente prevista no artigo 34 do Estatuto do Idoso (que exclui do cálculo da renda familiar as aposentadorias de até um salário mínimo recebidas por um membro da família).

Parece excluir, também, a possibilidade de outras formas de comprovação da hipossuficiência, doravante miserabilidade, o que já é admitido pelo Poder Judiciário, com segurança, desde o julgamento pelo STJ do REsp repetitivo 1.112.557/MG (veja-se, quanto a isso, explicação específica em meu livro Curso de Processo Judicial Previdenciário).

Ao restringir outras formas de comprovação da miserabilidade, essa pretensão da Reforma Previdenciária acaba por esbarrar nas garantias de amplo acesso à justiça e de independência jurisdicional, muito relevantes nas ações previdenciárias.

A PEC 06/2019, por fim, ainda traz expressivas regras de transição em relação ao BPC.

Nestas, estabelece-se que não cabe o abono anual para esse benefício e, mais grave, estabelece-se um critério progressivo, fásico no dizer da PEC 06, em relação ao valor do BPC.

Este será pago no montante de R$ 400,00 (quatrocentos reais) para a pessoa em situação de miserabilidade com 60 anos de idade, aumentando de valor progressivamente, até que chegue no valor correspondente ao salário mínimo para as pessoas com 70 anos de idade.

A PEC 06/2019 propõe um gatilho automático de idade: sempre que houver aumento da expectativa de sobrevida dos brasileiros, o que é constatado pelo IBGE, haverá um ajuste das idades previstas no art. 203, ou seja, poderá ser exigido mais do que 70 anos para a concessão do BPC.

Outra situação inadequada trazida nas regras de transição para o BPC reside na definição de miserabilidade a partir não somente da faixa de renda, mas também da inexistência de patrimônio familiar. A PEC define que só caberá o BPC quando houver patrimônio familiar inferior a R$ 98.000,00 (noventa e oito mil reais), que hoje correspondem a aproximadamente 100 salários mínimos.

Ora, a pretensão da PEC, neste trecho, é de que as pessoas dilapidem seu patrimônio familiar (certamente bastante humilde, considerado o parâmetro estabelecido), normalmente acumulado ao longo de toda uma vida e em geral consistente apenas no imóvel de moradia familiar, antes de requerer ou fazer jus o BPC.

Essa situação afronta diretamente o princípio da dignidade humana, visto que promove a miserabilidade, determinando a dilapidação de patrimônio familiar e efetivamente reduzindo as pessoas à condição de miserabilidade que passará a ser exigida pela norma – não somente aquele que pretende obter o BPC, mas todos seus familiares, pois a redução de patrimônio afetará a todo o núcleo familiar, inclusive as pessoas não elegíveis para o BPC, como as que não sejam idosas ou não sejam PcD.

Finalmente, as regras de transição para o BPC ainda promovem ampliação do que se considera núcleo familiar para fins de cálculo da renda mensal per capita em relação ao rol hoje previsto no art. 16 da Lei 8.213/91.

Nesse sentido, passa a exigir que a renda mensal obtida por madrastas e padrastos, residentes no mesmo teto, componha a renda mensal familiar. Essa nova exigência colide com o art. 226, da Constituição Federal, que assegura a autonomia na constituição do arranjo familiar, que não pode ser afetado pelo Estado. Com efeito, não se pode admitir que, em regra, as rendas de padrastos e madrastas sejam direcionadas para o núcleo familiar. Ignora-se outras possibilidades de constituição familiar e “força-se” aí uma figura de família recomposta.

Pode ser, quanto a isso, que os filhos menores não dependam da renda de padrastos e madrastas, mas que percebam pensão alimentícia dos respectivos genitores; mesmo que não esteja presente a renda derivada de pensão alimentícia, pode haver de um determinado arranjo familiar em que os padrastos e madrastas não se comprometam economicamente naquele teto. Não é uma situação rara na realidade social brasileira.

As alterações que se pretende efetuar no art. 203 da Constituição Federal fazem parte de um panorama mais amplo da proposta de Reforma Previdenciária, que promove uma constitucionalização de diversos temas previdenciários e assistenciais até hoje objeto de legislação ordinária. Aqui, se busca constitucionalizar os requisitos etários e critérios de hipossuficiência econômica; a definição do núcleo familiar e os valores dos benefícios que serão creditados aos beneficiários; as impossibilidades de cumulação de benefício e descabimento do abono anual.

Nossa Constituição Federal é considerada, com razão, prolixa. Mas a extensão do Texto Constitucional sempre teve a ver com o objetivo de resguardar melhor os direitos das pessoas, eximindo-os da ameaça de supressão ou restrição por parte do legislador ordinário. O movimento promovido pela PEC 06/2019, que atinge outros benefícios previdenciários, constitucionaliza tópicos jurídicos com o objetivo de restringir e engessar direitos fundamentais, o que é contraditório com a Teoria Geral de Direitos Fundamentais e os princípios do Direito Constitucional.

******

“Art. 203. (…)

V – garantia de renda mensal, no valor de um salário-mínimo, à pessoa com deficiência, previamente submetida à avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, que comprove estar em condição de miserabilidade, vedada a acumulação com outros benefícios assistenciais e previdenciários, conforme disposto em lei; e

VI – garantia de renda mensal de um salário-mínimo para a pessoa com setenta anos de idade ou mais que comprove estar em condição de miserabilidade, que poderá ter valor inferior, variável de forma fásica, nos casos de pessoa idosa com idade inferior a setenta anos, vedada a  acumulação com outros benefícios assistenciais e com proventos de aposentadoria, ou pensão por morte dos regimes de previdência social de que tratam os art. 40 e art. 201 ou com proventos de inatividade e pensão por morte decorrentes das atividades de militares de que tratam os art. 42 e art. 142, conforme dispuser a lei.

§1º Para os fins do disposto nos incisos V e VI do caput,:

I – considera-se condição de miserabilidade a renda mensal integral per capita familiar inferior a um quarto do salário-mínimo e o patrimônio familiar inferior ao valor definido em lei;

II – o valor da renda mensal recebida a qualquer título por membro da família do requerente integrará a renda mensal integral per capita familiar.

§2º O pagamento do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência previsto no inciso V do caput ficará suspenso quando sobrevier o exercício de atividade remunerada, hipótese em que será admitido o pagamento de auxílio-inclusão equivalente a dez por cento do benefício suspenso, nos termos previstos em lei.”

CAPÍTULO VII

DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS RELACIONADAS À ASSISTÊNCIA SOCIAL E A OUTRAS MATÉRIAS

Transferência de renda à pessoa com deficiência em condição de miserabilidade

Art. 40. Não será devido abono anual para a pessoa com deficiência beneficiária da renda mensal e do auxílio-inclusão a que se referem o inciso V do caput e o § 2º do art. 203 da Constituição.

Transferência de renda à pessoa idosa em condição de miserabilidade

Art. 41. Até que entre em vigor a nova lei a que se refere o inciso VI do caput do art. 203 da Constituição, à pessoa idosa que comprove estar em condição de miserabilidade será assegurada renda mensal de R$ 400,00 (quatrocentos reais) a partir dos sessenta anos de idade.

§1º A pessoa que estiver recebendo a renda na forma prevista no caput ao completar setenta anos de idade, e desde que atendidos os demais requisitos, fará jus à renda mensal de um salário-mínimo prevista no inciso VI do caput do art. 203 da Constituição.

§2º As idades previstas neste artigo deverão ser ajustadas quando houver aumento na expectativa de sobrevida da população brasileira, nos termos do disposto no § 4º do art. 201 da Constituição.

§3º É vedada a acumulação da transferência de renda de que trata este artigo com outros benefícios assistenciais e com proventos de aposentadoria ou pensão por morte dos regimes de previdência social de que tratam os art. 40 e art. 201 da Constituição ou com proventos de inatividade e pensão por morte de que tratam os art. 42 e art. 142 da Constituição, observadas as condições estabelecidas em lei.

§4º Não será devido abono anual para a pessoa idosa beneficiária da renda mensal de que trata este artigo.

Condição de miserabilidade

Art. 42. Até que entre em vigor a nova lei a que se referem os incisos V e VI do caput do art. 203 da Constituição, serão observados os seguintes critérios, em complemento ao disposto no § 1º do referido dispositivo:

I – para verificação da condição de miserabilidade, o patrimônio familiar deverá ser inferior a R$ 98.000,00 (noventa e oito mil reais); e

II – para fins do disposto neste artigo, considera-se que a família é composta pelo requerente e, desde que vivam sob o mesmo teto, por:

  1. cônjuge ou companheiro;
  2. pai ou mãe;
  3. irmãos solteiros;
  4. filhos e enteados solteiros; ou
  5. menores tutelados

Parágrafo único. Na ausência dos membros da família a que se refere a alínea “b” do inciso II, a família poderá ser composta por madrasta e padrasto do requerente, desde que vivam sob o mesmo teto.

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