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Narrativas Culturais e Sociedade de Mercado

NARRATIVAS CULTURAIS

SOCIEDADE DE MERCADO

José Manuel de Sacadura Rocha

José Manuel de Sacadura Rocha

15/05/2019

Uma forma de organização da produção social não se sustenta sem a contribuição das formas culturais, da linguagem, educação, comunicação, política e direito. A divisão outorgada pela especificidade do modo de produção capitalista, entre o saber e o fazer, entre o poder-fazer e o poder-sobre (poder logístico e de gestão que subordina o fazer), obrigou ao aprimoramento de outras formas sociais que em conjunto possibilitam o funcionamento da sociedade em sua totalidade conforme essa divisão e subordinação. A reprodução social nos termos dados pela extrema divisão e especialização exige, concomitantemente, níveis de ideologização (valores, visão de mundo, regime político) adequados a esses termos nas mais variadas dimensões da linguagem e cultura, na educação e nas artes.

Neste sentido, pôde-se afirmar que as manifestações culturais se exprimem por metanarrativas, que tais narrativas, no entanto, não aparecem necessariamente na contemporaneidade como “grandes narrativas”, mas como discursos próprios e pertinentes aos movimentos sociais das coletividades e grupos em busca de reconhecimento e direitos humanos, ou micronarrativas.

Tais discursos apresentam dois níveis de relacionamento, dois momentos de movimento em direção às demais dimensões da totalidade social: 1. nível de conformação – relacionamento lateral, horizontal, com as demais formas superestruturais; 2. nível de derivações – relacionamento vertical, diretamente com a forma de produção de mercadorias. Tanto no movimento de conformação (entre as dimensões culturais), como no movimento de derivação (na relação com a estrutura da organização produtiva social), os relacionamentos se verificam em graus de intensidade e força variáveis entre si, experimentando sempre determinações e determinando ao mesmo tempo todos os campos e dimensões da totalidade social em movimento; destas relações e movimentos nascem espaços que oportunizam a potencialidade de outras forças, modificando as formas das diversas dimensões existentes, organizando permanentemente uma nova totalidade da vida social tanto no que diz respeito à sua produtividade, como nas mediações e realizações culturais/ artísticas.

Niklas Luhmann (2009) afirma “que a sociedade é composta por vários sistemas sociais comunicativos – um sistema maior (sociedade) possui vários sistemas menores (economia, direito, política, religião, moral, estética), mas um subsistema pode conter outros subsistemas menores e assim sucessivamente.” (ROCHA, 2019, p. 204)[1]. Mas não é possível que um subsistema reaja ao que lhe é exterior aniquilando-se ou congelando-se – daí que as ações de reestruturação e adequação de um subsistema só podem ser efetuadas no limite de seus próprios elementos constitutivos, que em Luhmann diz respeito ao conceito de “encerramento operativo”.

Por outro lado, esta noção de subsistemas que atuam entre si como ambientes externos explica que não há como garantir o “patrimônio” exclusivo uma vez que “o meio só pode influir causalmente em um sistema no plano da destruição.” (LUHMANN, 2009, p. 130)[2].

O conceito de “acoplamento estrutural” leva Luhmann a afirmar que uma dimensão da totalidade social (a econômica ou a cultura), e seus estratos (subsistemas financeiro ou educacional) atuam selecionando e restringindo os elementos constitutivos a partir dos quais se reprocessam seus papeis e operações sociais – por exemplo, nos sistemas sociais existem relações inequívocas entre economia e política, política e direito, direito e cultura, cultura e Estado etc. Esta visão emprestada da autopoiesis[3] sistêmica também nos ajuda a entender os mecanismos de micronarrativas próprias e endereçamentos “exclusivos” dos vários estratos sociais, como subsistemas em relação uns aos outros, sem privilegiar necessariamente nenhum deles.

Mais ou menos, todas as manifestações e atividades práticas da cultura (educação, arte, jurídico, político), bem como as iminentemente ideológicas (filosofia, religião), que se verificam no nível da superestrutura social, possuem sua autonomia, promovem intercâmbios entre si, por conformação, mas não com uma mesma densidade e intensidade. Isto não quer dizer, por outro lado, que não ajam sobre a estrutura econômica da produção, circulação e financiamento mercantil (sociabilidade mercantil); e também aqui não agem da mesma forma nem com a mesma intensidade – como é percebível, por exemplo, no agir estatal e jurídico sobre a economia em comparação com, por exemplo, o agir filosófico ou da arte sobre essa mesma economia.


[1] ROCHA, José Manuel de Sacadura. Sociologia Jurídica: fundamentos e fronteiras. 6ª ed. Rio de Janeiro: GEN/Forense, 2019.
[2] LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas. Petrópolis: Vozes, 2009.
[3] Os conceitos de “encerramento operativo” e “acoplamento estrutural” fazem parte dos estudos sobre autopoiesis dos chilenos Maturana e Varela em sua Teoria de Sistemas. Veja-se: MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. De máquinas y seres vivos: autopoiesis, la organización de lo vivo. Buenos Aires, Argentina: Lumen, 2003.

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