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Kiyoshi Harada

Kiyoshi Harada

21/06/2019

Existem duas propostas de reforma em discussão no Congresso Nacional. A primeira delas é a PEC nº 293-A/04 cujo relatório elaborado pelo ex Deputado Luis Carlos Haluy já foi aprovado na Comissão Especial da Câmara dos Deputados. Ela unifica dez tributos entre contribuições sociais, impostos federais, impostos, estadual (ICMS) e municipal (ISS), criando o Imposto sobre Operações de Bens e Serviços – IBS – de competência legislativa federal, mas com fiscalização e arrecadação compartilhada pelos três entes federativos.

A segunda é a PEC nº 45/19, menos radical que a primeira: funde o PIS, a COFINS, o IPI, o ICMS e o ISS para formar o IBS, um imposto de incidência plurifásica, de caráter não-cumulativo e tributado por fora. Não se sabe como é possível colocar em prática tal proeza.

Existe ainda em gestação uma terceira proposta. Antevendo a resistência dos Estados e dos Municípios em razão da quebra do princípio federativo essa proposta fatia as duas primeiras em duas partes: em um primeiro momento haveria apenas unificação de quatro ou cinco tributos federais (PIS, COFINS, parte do IOF, IPI e eventualmente a CSLL) para formar o IBS, dispensando a alteração constitucional.

Em um segundo momento o Estado perderia o ICMS e o Município perderia o ISS, os quais seriam incorporados ao IBS. Ela acaba com a contribuição previdenciária, sem considerar se a reforma previdenciária irá substituir ou não o atual sistema contributivo e de repartição de recursos pelo sistema de capitalização.

O que é pior, planta a semente da CPMF com outra roupagem jurídica para financiar a Previdência Social. Haveria transferência do déficit previdenciário para o déficit da União. É trocar seis por meia dúzia!

Inoportunidade de uma reforma que altera radicalmente o Sistema Tributário Nacional esculpido na Constituição

É inoportuna uma reforma profunda do Sistema Tributário estruturada na Constituição, como as pretendidas pela PEC nº 293-A/04 e PEC nº 45/19 em discussão na Câmara dos Deputados, em um momento de profunda recessão econômica e de conflito permanente entre os Poderes.

Conviver durante os longos 10 ou 15 anos de transição com o Sistema Tributário atual, que é colocado de cabeça para baixo pelas reformas referidas, com o novo Sistema complexo em que se misturam tributos de espécies diferentes e pertencentes a esferas políticas igualmente diferentes, para criar o IBS, um imposto de difícil conceituação, além de tumultuar a vida dos agentes produtivos irá inexoravelmente aumentar a carga tributária no decorrer dos experimentos com o novo Sistema.

O próprio longo período de transição já revela a dificuldade de operacionalizar no âmbito de uma Federação como a nossa, um imposto de competência da União, mas fiscalizado, arrecadado e partilhado por três entidades políticas agrupadas em torno de um Comitê Gestor Nacional dotado de poder normativo e de representação judicial e extrajudicial das três entidades políticas tributantes. A confusão que irá causará salta aos olhos. Abolir o IPI e o ICMS é fácil.

O difícil é lidar com os problemas que isso acarretará para a Federação Brasileira, a começar pela questão dos créditos fiscais acumulados, principalmente em razão da Lei Kandir. Se fosse simples não precisaria de tantos lustros para promover a substituição definitiva de um Sistema pelo outro. Na passagem do sistema Tributário de 1967/69 para o de 1988 levou-se apenas cinco meses (art. 34 do ADCT).

Daí porque é inoportuna a discussão dessas PECs que abrigam propostas de Sistema Tributário de dificilíssima operacionalização, apesar de seus apoiadores enxergarem nelas uma simplificação tributária. Pela vivência que temos com a matéria tributária no setor público e no setor privado antevejo infindáveis problemas de toda ordem que não se limitam à exata conceituação constitucional do que seja operação de bens e serviços. Com toda certeza irá aumentar a carga tributária e a carga burocrática.

Positivamente, neste cenário econômico recessivo em que não há sinais de diminuição da taxa de desemprego não é ocasião adequada para adicionar dificuldades tributárias aos agentes econômicos, nem de experimentar e testar um novo Sistema Tributário incerto e de consequências imprevisíveis.

Reforma tributária no nível infraconstitucional

Uma boa, oportuna e necessária reforma é a que se faz na legislação infraconstitucional para simplificar o Sistema Tributário vigente. No momento é preciso fazer alguns ajustes na legislação tributária sem alteração constitucional. A seguir citaremos a título ilustrativo as seguintes propostas:

Unificação do PIS/COFINS

Apesar de o produto de arrecadação dessas contribuições sociais terem destinação diversa, o fato gerador é idêntico. O artifício legislativo para aumentar essas contribuições por meio de regime não-cumulativo deve ser abolido em razão do dinamismo legislativo caótico na exclusão/inclusão de despesas detutíveis, que causam total insegurança jurídica. Quanto menos normas, mais fácil a operacionalização dos tributos e menor os conflitos entre fisco-contribuinte. A destinação dos recursos arrecadados é questão a ser resolvida pela LOA. Não é preciso ter um tributo para cada finalidade.

IRPJ e CSLL

Pelas mesmas razões retro devem ser unificados sem perda do montante da arrecadação atual. Não faz sentido uma despesa paga a título de CSLL ter que integrar a base de cálculo do IRPJ que tem como pressuposto um acréscimo patrimonial.

Contenção do poder normativo de órgãos administrativos fiscais

A fúria legislativa de órgãos administrativos fiscais, nas três esferas impositivas com fundamento no art. 100 do CTN, há de ser limitada para a edição apenas de normas internas. Tudo o mais deve ser regulamentado somente por Decreto do Executivo, porém, nos exatos limites das leis que devem ser claras. Qualquer excesso há de ser sustado por Resolução da respectiva Casa Legislativa como permite a Constituição.

Obrigatoridade da instituição da compensação tributária

Deve se tornar obrigatória a compensação tributária prevista no art. 170 do CTN, concedendo aos entes políticos um prazo certo para regulamentá-la, a fim de abaixar o incrível montante da divida ativa estocada e diminuir o elevado índice de inadimplência dos contribuintes, sem capacidade contributiva para suportar a pesada carga tributária em um momento de profunda recessão econômica. Cada ente político deverá definir na respectiva LOA o montante do tributo a ser compensado em cada exercício (pode ser valor fixo ou percentual da receita tributária prevista).

Decorrido o prazo de regulamentação, ante a omissão do ente político o contribuinte deverá ter o direito à compensação por iniciativa própria, comunicando o fato ao fisco competente. Outrossim, a compensação prevista no art. 105 do ADCT deve ser tornada autoaplicável por iniciativa do precatorista a exemplo do que dispunha o § 2º, do art. 78 do ADCT, pois, decorridos mais dois anos e meio até agora nenhuma entidade política devedora regulamentou a matéria.

Estímulo à transação tributária

Essa modalidade de extinção do crédito tributário tem previsão no art. 171 do CTN, mas ela não vem sendo implementada pela maioria dos Estados e Municípios. Somente no Município de Blumenau é que se tem notícia de sucesso com a implantação da transação tributária. A não regulamentação da transação tributária seria apenada com sanções políticas contra entes políticos omissos, proibindo o recebimento de transferências voluntárias a que alude o art. 25 da LRF, bem como a obtenção de avais do Tesouro para operações de crédito.

Aumento da eficiência dos órgãos da Administração destinados à cobrança de tributos

É patente a carência de recursos materiais e pessoais dos órgãos incumbidos da cobrança de tributos. Nenhuma das Procuradorias Fiscais (da União, Estados e Municípios) conta com a quantidade de pessoal compatível com o volume de estoque da dívida ativa. Nenhuma delas conta com serviço de localização de devedores e de seus bens, impedindo a seleção qualitativa das execuções fiscais a serem ajuizadas.

Na busca da eficiência da execução forçada seria de todo conveniente uma ligeira alteração na Lei nº 6.830/86, inserindo como requisito da inicial a juntada de termo de penhora administrativa, conforme proposta que fizemos no passado, para que o Judiciário não se transforme em órgão de localização do executado e de seus bens, prejudicando o andamento regular das execuções de devedores solventes. Essa providência forçaria as Procuradorias Fiscais a promover a execução qualitativa dos créditos tributários.

Retirada gradual dos incentivos fiscais

Os incentivos fiscais vêm causando um rombo anual de mais de 20% da receita tributária. Pagamento de tributos é dever de todos. Os empresários precisam se acostumar a andar com as próprias pernas e não com as do povo em geral que vive em condições desconfortáveis, senão em miséria. As desigualdades regionais ou sociais devem ser resolvidas por meio de políticas públicas adequadas, a serem implementadas com os recursos provenientes da arrecadação tributária. Os tributos devem ter por função primordial prover o erário para que o Estado possa alcançar os seus fins.

A eternização dos incentivos à ZFM (mais de 80 anos) não faz sentido. Se não se desenvolveu os pólos industrial, comercial e de agronegócios até hoje isso não irá acontecer mais, porque os empresários lá estabelecidos estão se transformando em agentes exportadores de créditos fiscais para empresários situados fora da ZFM. É preciso avaliar o custo/benefício. Outrossim, os incentivos fiscais direcionados afrontam o princípio de livre iniciativa, ferem o princípio da isonomia e causam aumento tributário para os demais contribuintes não contemplados pelos aludidos incentivos.

Fixação de prazo máximo de três anos para finalização do processo administrativo tributário

Atualmente não há prazo legal para finalização do processo administrativo tributário, por conta da jurisprudência de nossos tribunais que fixaram a tese da fluência do prazo prescricional para cobrança do crédito tributário tão somente após o esgotamento do prazo de pagamento voluntário, depois da notificação da decisão administrativa final. O tempo de duração do processo depende de ato potestativo da Fazenda. Não é por acaso que a União mantém um estoque de dívida ativa da ordem de R$1.8 trilhão.

Urge fixar um prazo legal de forma expressa, embora implícita no CTN, estipulando o tempo razoável de três anos, findo o qual o recurso do contribuinte será considerado provido e o recurso da Fazenda será considerado como não provido. Uma Medida Provisória no governo Lula foi baixado nesse sentido, para resolver o problema do represamento de recursos das partes no Ministério da Previdência Social, para decidir sobre a renovação do CEBAS para fins de isenção da contribuição social das entidades filantrópicas.

Proibição de alteração da legislação tributária mais que duas vezes ao ano

É preciso fixar em nível de lei complementar a proibição de alterar a legislação tributária por mais de duas vezes ao ano, sendo obrigatória a sua consolidação até o dia 31 de janeiro de cada exercício, sob pena de sanções políticas (proibição de receber transferências voluntárias e aval do Tesouro nas operações de crédito). Frequentes alterações da legislação tributária torna complexa e caótica essa legislação e traz insegurança jurídica, além de equívocos na jurisprudência que nem sempre consegue acompanhar a dinâmica das modificações legislativas.

Reforma tributária por meio de emendas pontuais

No nível constitucional basta alguns pequenos ajustes por meio de emendas pontuais, sem mexer na estrutura do Sistema Tributário Nacional, como adiante enumerados:

(a) Lei complementar para definir fato gerador de contribuição social

Bastará simples acréscimo do inciso IV, ao art. 146 da CF para colocar sob reserva de lei complementar a definição de fato gerador de contribuição social, a fim de por termo à prática legislativa de instituir impostos inominados ou taxas inconstitucionais sob a roupagem de contribuição social, burlando o princípio discriminador de impostos. Isso aconteceu com o antigo IPMF convolado em CPMF, e também, com a taxa de iluminação pública convolada em contribuição para custeio de iluminação pública, ferindo a natureza dessa espécie tributária que tem ínsita a prestação de um benefício específico.

Vedar o emprego de medida provisória em matéria tributária

Bastará simples acréscimo do inciso V ao elenco do art. 62 da CF. A MP viola o princípio da legalidade tributária (nullum tributum sine praevia lege), além de concorrer para conferir dinamismo caótico à legislação tributária. Na hipótese de rejeição da MP quem pagou o tributo não o recebe de volta e quem não pagou não precisa mais pagar, incorrendo na violação do princípio da isonomia, além de atentar contra a moralidade pública.

c) Proibir a tributação por dentro

Bastará simples inserção do 8º ao art. 150 da CF para vedar a inclusão do valor do tributo na sua base de cálculo e na base de cálculo de outros tributos. Todos os tributos seriam de incidência por fora conferindo a transparência tributária referida no § 5º, do art. 150 da CF para que o consumidor possa aferir o peso da tributação que está suportando na compra de mercadorias e no recebimentos dos serviços prestados. Acabaria com o contingente de inadimplentes e de sonegadores fiscais à medida que o não pagamento do tributo reservado ao fisco caracterizaria apropriação indébita.

É preciso superar a cultura da nebulosidade tributária que conduz à política de tributação exacerbada de forma enrustida, que transforma, por exemplo, a alíquota legal de do ICMS de 18% em uma alíquota real de 21,95%. Com a tributação por fora as infindáveis discussões judiciais em torno de exclusões da base de cálculo dos diferentes tributos que tomaram conta dos tribunais desaparecerão de vez, abrindo espaço para o Judiciário ocupar-se de outras questões mais relevantes.

Como está calcula-se que as discussões prosseguirão por mais de meio século. O cálculo do IBS por fora, da forma como se acha redigido na PEC nº 45/19 será inexequível. A tributação por fora é incompatível com tributação de incidência plurifásica e não cumulativa mediante compensação do que foi cobrado na operação anterior.

Proibir efeito modulatório

A modulação de efeitos em matéria tributária, prática observada no STF como decorrência do longo tempo consumido para o julgamento do mérito de um processo em que não foi conhecida ou concedida a medida cautelar, ofende, às escâncaras, os princípios da legalidade, da isonomia, da capacidade contributiva e da vedação do efeito confiscatório, além de ferir o princípio da moralidade pública.

A modulação de efeitos vem estimulando os governantes na instituição ou majoração de tributos de forma inconstitucional na certeza da morosidade do Judiciário e da impunidade.

Enfim, são emendas que não destroem o Sistema Tributário vigente, como fazem as PECs nºs 293-A/04 e 45/19 em discussão no Congresso Nacional. Ao contrário, mantêm os conceitos formados ao longo de mais de três décadas pela doutrina e jurisprudência e aperfeiçoam a estrutura do Sistema Tributário Nacional, tão bem esculpido pelo legislador constituinte original de 1988, concorrendo para conferir transparência, segurança jurídica e eficiência ao Sistema Tributário, aumentando o volume da arrecadação tributária sem majorar as alíquotas ou a base de cálculo dos tributos.

Considerações finais

Uma reforma radical do Sistema Tributário Nacional é tarefa do legislador constituinte originário, quando se fará um novo pacto federativo para a distribuição da renda tributária. E deve ser precedida de um estudo feito por profissionais com larga experiência no trato com a matéria tributária que conheçam o Sistema Tributário vigente habilitando-os a identificar as virtudes a serem preservadas e os defeitos a serem eliminados.

É preciso, também, que esses profissionais conheçam de perto a jurisprudência de nossos tribunais, a fim de apontar os pontos polêmicos do Sistema Tributário em vigor que mais demandas judiciais estão provocando, ao ponto de absorver cerca de 60% do tempo reservado ao Judiciário para dirimir conflitos de natureza tributária.

Em que pese a boa intenção dos autores da Reforma Tributária e de seus apoiadores tudo indica que o momento atual, caracterizado pela recessão econômica, desarticulação do governo e falta de sintonia entre Parlamento e Executivo não é adequado para implantar um novo Sistema Tributário incerto e de difícil operacionalização que irá conviver simultaneamente com o atual Sistema Tributário por longos quinze anos (PEC nº 293-A/04) ou por dez anos (PEC nº 45/19).

O certo é o Executivo e o Legislativo agirem em harmonia em torno da Reforma Tributária em um outro momento, depois de aprovada a Reforma da Previdência Social e o País tiver ingressado no ritmo de crescimento econômico. Por ora, basta a reforma no nível infraconstitucional e no nível constitucional limitar-se às emendas pontuais retroapontadas que certamente trarão a desejada simplificação tributária e sensível melhora na arrecadação tributária seguida de diminuição da carga tributária e burocrática.

Fonte: Harada Advogados


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