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Revista Forense

CIVIL

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA

PROCESSO CIVIL

REVISTA FORENSE

Revista Forense – Volume 429 – Jurisprudência – RESP 1.149.487/RJ, Quarta Turma, rel. Min Antonio Carlos Ferreira – Acórdão Palácio da Guanabara

JURISPRUDENCIA

RESP 1.149.487/RJ

Revista Forense

Revista Forense

30/06/2019

Volume 429 – ANO 115
JANEIRO – JUNHO DE 2019
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA,
JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Mendes Pimentel
Estevão Pinto
Edmundo Lins

DIRETORES
José Manoel de Arruda Alvim Netto (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo)
Eduardo Arruda Alvim (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/FADISP)

Abreviaturas e siglas usadas
Conheça outras obras da Editora Forense

HISTÓRIA DO DIREITO

  1. DOUTRINA – Da unidade ou pluralidade de vinculos na obrigação solidaria – Revista Forense – Volume I – 1904.
  2. TRADUÇÕES – Decisões constitucionaes de Marshall – Revista Forense – Volume I – 1904.
  3. JULGADOS – Jurisprudencia civil e commercial – Pactum de Non Alienando – Revista Forense – Volume I – 1904.
  4. PARECERES – Dolo – silêncio intencional – dação em pagamento – Túllio Ascarelli – 21/12/1944 – Revista Forense – Volume CIV outubro de 1945

DOUTRINAS

A. Direito Administrativo

B. Direito Civil

C. Direito do Trabalho

D. Direito Processual Civil

E. Direito Tributário

F. Caderno Especial – Direito Digital e Inovação Tecnológica – Coordenador Marcelo Chiavassa de Paula Lima

ESTUDOS E COMENTÁRIOS

ESTUDOS DE CASOS E JULGADOS

Ementa

Civil e Processual Civil. Recurso especial. Ação de força velha (demanda possessória, processada pelo rito ordinário) proposta em 1895. Dotação para a aquisição de prédio destinado à habitação da Princesa Imperial Dona Isabel e seu Marido. Atual Palácio Guanabara. Direito de habitação. Obrigação do Estado vinculada à monarquia. Próprio nacional. Prescrição.

  1. Caso em que a petição inicial de “ação de força velha” (demanda possessória, processada pelo rito ordinário), proposta em 1895 pelo Conde e pela Condessa d’Eu (Princesa Isabel), discute a posse do Palácio Isabel (atual Palácio Guanabara) e também a propriedade, repelindo a natureza de próprio nacional declarada no Decreto n. 447, de 18.07.1891, e afirmando a existência de esbulho e de confisco por parte do Estado. Em tal contexto, a posse está sendo postulada, igualmente, com fundamento no domínio.
  2. Coisa julgada material descaracterizada quanto ao tema de mérito relativo ao domínio, tendo em vista que, no julgamento da Petição n. 100, ocorrido em 10.08.1895, o STF indeferiu a ação de incorporação proposta pela União tão somente diante de aspectos processuais afetos ao Decreto n. 447/1891, que não serviria como argumento para viabilizar a utilização e o processamento do referido tipo de ação. Remeteu as partes, então, às vias ordinárias.
  3. O Palácio Guanabara, adquirido com recursos do Tesouro Nacional a título de dote, com fundamento nas Leis n. 166, de 29.09.1840, 1.217, de 07.07.1864, e 1.904, de 17.10.1870, destinava-se exclusivamente à habitação do Conde e da Condessa d’Eu por força de obrigação legal do Estado vinculada à monarquia e ao alto decoro do trono nacional e da família imperial.
  4. Com a proclamação e a institucionalização da República, as circunstâncias fundamentais que justificavam a manutenção da posse do palácio deixaram de existir, tendo em vista que foram extintos os privilégios de nascimento, os foros de nobreza, as ordens honoríficas, as regalias e os títulos nobiliárquicos. Em decorrência, as obrigações do Estado previstas nas leis da época perante a família imperial foram revogadas ipso factopela nova ordem imposta, dentre as quais a posse de que trata a ação.
  5. A legislação editada durante a monarquia (Leis n. 166/1840 e 1.904/1870) expressamente conferiu aos imóveis adquiridos para a residência da família imperial natureza de próprio nacional, ou seja, bens de propriedade da Fazenda Nacional.
  6. Durante o regime imperial, não se cogitava da abolição da monarquia, razão pela qual a instituição da república, extinguindo o anterior regime, qualificou nova hipótese de “fim da sucessão” dos privilégios dos membros da família imperial relacionados aos imóveis adquiridos a título de dote com dinheiro público.
  7. Prejudicado o recurso adesivo do Estado do Rio de Janeiro, tendo em vista que o pedido de decretação da prescrição foi subordinado, pelo próprio recorrente, ao efetivo acolhimento da pretensão dos herdeiros do Conde e da Condessa d’Eu. No julgamento, todavia, os referidos recursos especiais não foram providos.
  8. Recursos especiais interpostos por Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros e por Isabel de Orleans e Bragança e outros conhecidos parcialmente e desprovidos, e recurso adesivo interposto pelo Estado do Rio de Janeiro prejudicado.

Acórdão

A Quarta Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente e, nesta parte, negou provimento aos recursos especiais interpostos por Pedro Henrique de Orleans e Bragança e Outros e por Isabel de Orleans e Bragança e Outros; e julgou prejudicado o recurso adesivo interposto pelo Estado do Rio de Janeiro, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Buzzi, Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.

Brasília-DF, 6 de dezembro de 2018 (data do julgamento)

Ministro Antonio Carlos Ferreira

Relator

Relator:Ministro Antonio Carlos Ferreira
Recorrente:Pedro Henrique de Orleans e Bragança e Outros
Advogados

:Mário Alberto Pucheu e Outro(s) – RJ008447
Sergio Bermudes e Outro(s) – RJ017587
Recorrente:Isabel de Orleans e Bragança e Outros
Advogado:Dirceu Alves Pinto e Outro(s) – RJ007570
Recorrente:Estado do Rio de Janeiro
Procurador:Sérgio Teixeira Firmo e Outro(s) – RJ034823
Recorrido:Os Mesmos
Recorrido:União
Interes.:Pedro de Orleans e Bragança – Espólio
Repr. por:Afonso de Bourbon de Orleans e Braganca – Inventariante
Advogado:José Carlos de Araújo Almeida Filho e Outro(s) –  RJ071627

Certidão de Julgamento

Quarta Turma
Número Registro: 2009/0132773-3Processo EletrônicoREsp 1.149.487/RJ
Números Origem:  3960592021925889659846
Pauta: 04.09.2018Julgado: 04.09.2018

Relator

Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. Paulo Eduardo Bueno

Secretária

Dra. Teresa Helena da Rocha Basevi

Autuação

Recorrente:Pedro Henrique de Orleans e Bragança e Outros
Advogados:Mário Alberto Pucheu e Outro(s) – RJ008447
Sergio Bermudes e Outro(s) – RJ017587
Recorrente:Isabel de Orleans e Bragança e Outros
Advogado:Dirceu Alves Pinto e Outro(s) – RJ007570
Recorrente:Estado do Rio de Janeiro
Procurador:Sérgio Teixeira Firmo e Outro(s) – RJ034823
Recorrido:Os Mesmos
Recorrido:União
Interes.:Pedro de Orleans e Bragança – Espólio
Repr. por:Afonso de Bourbon de Orleans e Braganca – Inventariante
Advogado:José Carlos de Araújo Almeida Filho e Outro(s) – RJ071627

Assunto: Direito Civil – Coisas – Posse

Certidão

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:Adiado para a sessão de 27.11.2018 por indicação do Sr. Ministro Relator.
Certidão de Julgamento
Quarta Turma
Número Registro: 2009/0132773-3Processo EletrônicoREsp 1.149.487 / RJ
Números Origem:  39605 92021925889659846
Pauta: 27.11.2018Julgado: 27.11.2018

Relator

Exmo. Sr. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. Hindemburgo Chateaubriand Pereira Diniz Filho

Secretária

Dra. Teresa Helena da Rocha Basevi

Autuação

Recorrente:Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros
Advogados:Mário Alberto Pucheu e Outro(s) – RJ 008447
Sergio Bermudes e Outro(s) – RJ 017587
Recorrente:Isabel de Orleans e Bragança e Outros
Advogado:Dirceu Alves Pinto e Outro(s) – rj007570
Recorrente:Estado do Rio de Janeiro
Procurador:Sérgio Teixeira Firmo e Outro(S) – RJ 034823
Recorrido:Os Mesmos
Recorrido:União
Interes.:Pedro de Orleans e Bragança – Espólio
Repr. por:Afonso de Bourbon de Orleans e Braganca – Inventariante
Advogado:José Carlos de Araújo Almeida Filho e Outro(s) – RJ071627

ASSUNTO: Direito Civil – Coisas – Posse

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Senhor Presidente, acompanho o magnífico voto de Vossa Excelência, o qual, aliado às belíssimas sustentações orais, nos fizeram rememorar importantes momentos de nossa  história.

Ressalto, como já fez Vossa Excelência, que não estamos julgando aqui uma possível reparação global que fosse devida à nossa Família Imperial quando de seu banimento do País, mas apenas a questão relativa ao título pelo qual o Palácio Izabel, hoje Palácio Guanabara, era ocupado e eventual direito de indenização pelo seu desapossamento.

Esse prédio foi adquirido, com recursos da Nação, para habitação da Princesa Imperial. Não era de propriedade do Conde e da Condessa d’Eu, Princesa Isabel. Idêntica questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal, em acórdão proferido em 16.3.1898, relação ao denominado Palácio Leopoldina, em ação possessória ajuizada por Dom Pedro Augusto de Saxe Coburgo Gotha e Bragança, cujo regime jurídico era o mesmo, estabelecido pelas mesmas leis e semelhantes contratos matrimoniais.

Sustentam os recorrentes que não seriam iguais as circunstâncias do Palácio Leopoldina e do Palácio Izabel, porque o Palácio Leopoldina teria sido indenizado ao viúvo da precocemente falecida Princesa Leopoldina.

Ocorre que, dos próprios documentos trazidos nos memoriais, observo que o acordo relativo ao dote da falecida Princesa Leopoldina, que foi firmado em 1888, portanto, durante a Monarquia, estabelecia que fosse pago o dote da falecida Princesa – devido em decorrência do falecimento, nos termos do contrato matrimonial – na importância de 1.200 (mil e duzentos) contos de réis: um terço para o viúvo e dois terços para os quatro filhos, valores esses que deveriam ficar em usufruto dos beneficiários. Além disso, foi estabelecido que, fora essa quantia, o Palácio Leopoldina ficaria em “administração e usufruto” do segundo Duque de Saxe, filho da Princesa Leopoldina, o qual já havia atingido a maioridade.

Portanto, essas quantias que foram destinadas à família da Princesa Leopoldina, ainda durante a Monarquia, foram pagas por força de outras cláusulas do contrato matrimonial que não estipulavam apenas o valor para aquisição para moradia do que viria a ser depois denominado “Palácio Leopoldina” (assim como o Palácio Isabel). Elas previam dotação para compra de móveis, enxoval e apetrechos para guarnecer os Palácios e também previam dotação anual para a manutenção da família e havia estipulação também do que aconteceria em caso de morte de um dos cônjuges. Tudo isso estava disciplinado nesses contratos.

No caso da Princesa Leopoldina, pois, como ela faleceu ainda durante a Monarquia, foi seguido à risca o contrato matrimonial e houve o pagamento dessa dotação, que não correspondia ao valor do Palácio, mas a outras estipulações. O Palácio, expressamente nesse acordo, ficou sob usufruto e administração do filho mais velho da falecida Princesa Leopoldina, que era o morgado, Príncipe Pedro Augusto. Quando proclamada a República, também o Palácio Leopoldina foi tomado, o que ensejou essa ação possessória julgada pelo Supremo Tribunal Federal, a propósito do Palácio da Leopoldina, que, a meu ver, constitui precedente de hipótese absolutamente semelhante para que se julgue o presente caso.

Assim, não estamos aqui discutindo outras indenizações a que pudesse fazer jus a Princesa Isabel e que, certamente, não foram recebidas, porque ela foi banida, juntamente com a Família Imperial, ao contrário da Princesa Leopoldina, que faleceu antes do fim da Monarquia.

No tocante a ela, o seu contrato matrimonial foi completamente cumprido com o pagamento da dotação destinada ao seu viúvo e filhos, ficando o Palácio na administração do seu filho mais velho, tendo sido posteriormente ocupado pelo Governo republicano, assim como ocorreu com o Palácio Izabel.

Nesse sentido, reporto-me a escrito de Dom Carlos Tasso de Saxe-Coburgo e Bragança, bisneto da Princesa Leopoldina, publicado em 2012 pela Editora Senac/SP, sob o título “A Intriga”, em que são narradas, dentre outros fatos atinentes à Monarquia, as circunstâncias do casamento das princesas Isabel e Leopoldina:

Dom Pedro II, um homem de grande prestígio, mas que não era rico, vivia unicamente com sua dotação, que, por sua vontade, nunca foi aumentada durante todo o seu longo reinado. Ele destinava grande parte dos seus recursos a ações beneficentes e bolsas de estudo. Abnegado, vivia como um modesto burguês.

Portanto, do ponto de vista econômico, suas filhas não podiam ser vistas como grandes herdeiras. Receberiam um dote, fixado pelas câmaras, uma casa em uso de propriedade do Governo e uma vasta área de terreno, sempre pertencente ao Estado, que deveriam medir e beneficiar às próprias custas. Se vendessem algum lote daquela porção de terra, o dinheiro seria convertido em títulos da dívida pública, os quais não eram comerciáveis. Era um presente realmente curioso!

Acompanho, portanto, o voto do Relator.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.149.487 – RJ (2009/0132773-3)

Certidão

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Adiado por indicação do Sr. Ministro Relator.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.149.487 – RJ (2009/0132773-3)

VOTO

Relator:Ministro Antonio Carlos Ferreira
Recorrente:Pedro Henrique de Orleans e Bragança e Outros
Advogados:Mário Alberto Pucheu e Outro(s) – RJ008447
Sergio Bermudes e Outro(s) – RJ017587
Recorrente:Isabel de Orleans e Bragança e Outros
Advogado:Dirceu Alves Pinto e Outro(s) – RJ007570
Recorrente:Estado do Rio de Janeiro
Procurador:Sérgio Teixeira Firmo e Outro(s) – RJ034823
Recorrido:Os Mesmos
Recorrido:União
Interes.:Pedro de Orleans e Bragança – Espólio
Repr. por:Afonso de Bourbon de Orleans e Braganca – Inventariante
Advogado:José Carlos de Araújo Almeida Filho e Outro(s) – RJ071627

Relatório

O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA (Relator): Trata-se, na origem, de “ação de força velha” (ação possessória, processada pelo rito ordinário) proposta em 24.9.1895 pelo Conde e pela Condessa d’Eu, Princesa Isabel, contra a Fazenda Nacional, afirmando que “desde 25 de janeiro de 1865 entraram na legítima posse do prédio urbano situado na rua da Guanabara conhecido por Palácio Izabel e nella se conservaram, mansa e pacificamente, sem dúvida ou contestação de quem quer que seja, até que em 1891, isto é, 26 anos depois, por Decreto nº 447, de 18 de julho, o poder executivo, sem forma nem figura de justiça declarou que ficavam incorporados aos próprios nacionais todos os bens que constituíam o dote ou patrimônio concedidos por actos do extinto regime à Princeza Imperial Condessa d’Eu. Nestes bens se compreende o Palácio Izabel” (e-STJ fl. 4). Posteriormente à edição do decreto, o “Palácio Izabel” veio a ser ocupado militarmente em 28.5.1894.

A ação, em primeiro grau, foi julgada improcedente em 10.4.1897, sendo “considerado próprio nacional o Palácio Izabel, a fim de ser a Fazenda Nacional imitida na posse do mesmo predio por meio do respectivo processo judicial de incorporação nos proprios nacionais” (e-STJ fl. 91).

Os autores interpuseram apelação para o Supremo Tribunal Federal em 20.4.1897 (e-STJ fls. 95/96), sendo os autos encaminhados à instância superior em 18.6.1897 (e-STJ fl. 101). No STF, os autos teriam sido remetidos ao arquivo, sem regular distribuição.

Em 14.7.1964, o processo, sem número, oriundo do Supremo Tribunal Federal, foi recebido no antigo Tribunal Federal de Recursos – TFR (e-STJ fl. 102), autuado como Apelação Cível n. 28.558 e distribuído ao Ministro HENRIQUE D’AVILA (e-STJ fl. 174).

Os presentes autos (Apelação Cível n. 28.558), ainda no antigo TFR, foram apensados à Apelação Cível n. 25.448 (ação reivindicatória – REsp n. 1.141.490) em 18.9.1973 (e-STJ fls. 190/192).

A Primeira Turma do antigo Tribunal Federal de Recursos – TFR julgou as duas apelações (AC n. 25.448 e AC n. 28.558) em 17.12.1979, dando-lhes provimento, por maioria, para afastar a prescrição decretada nos autos da ação reivindicatória em apenso (AC n. 25.448 – REsp n. 1.141.490/RJ), estando o acórdão assim ementado:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – PALÁCIO GUANABARA (ANTIGO PALÁCIO ISABEL) – AÇÃO DE FORÇA VELHA – AÇÃO REIVINDICATÓRIA – CONEXIDADE – PRESCRIÇÃO EXTINTIVA E PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – INOCORRÊNCIA – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL (DECRETOS 20.910/32 E 4.597/42) – INAPLICABILIDADE ÀS AÇÕES REAIS – A AÇÃO REIVINDICATÓRIA NÃO PRESCREVE ENQUANTO O TITULAR DO DIREITO NÃO O HOUVER PERDIDO POR EFEITO DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA (AC Nº 25.448) – PROCESSO ARQUIVADO SEM DETERMINAÇÃO JUDICIAL – FALTA DE IMPULSO OFICIAL (AC Nº 28.558).

1) Não-incidência da prescrição extintiva extraordinária, antigamente trintenária, porquanto a ocupação militar, decorrente da Revolta da Armada, que se iniciara em 6 de setembro de 1893 e se prolongou por cerca de dois anos, ocorreu no dia 28 de maio de 1894, não se somando, para aquele fim, o período anterior e o posterior ao início da vigência do Código Civil, em 1º de janeiro de 1917 (Cód. Civ., art. 1806): – quanto ao primeiro período, porque houve citação válida da União, interrompendo a prescrição; e quanto ao segundo, porque somente em 1947, trinta anos após o início da vigência do Código Civil, ocorreria a prescrição, interrompida em 1946, mediante protesto judicial (Cód. Civ., art. 172, II; Cód. de Proc. Civ. de 1939, art. 720).

2) Inocorrência da prescrição quinquenal prevista nos Decretos ns. 20.910/32 e 4.597/42, porquanto inaplicável às ações reais, sendo certo que a ação reivindicatória não prescreve enquanto o titular do direito não o houver perdido por efeito da prescrição aquisitiva. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.

3) Constitui embaraço judicial, impeditivo do fluxo prescricional, a remessa do processo ao Arquivo do Egrégio Supremo Tribunal Federal, sem ordem do Relator, porquanto efetuada antes mesmo de qualquer registro ou distribuição.

4) Apelos providos. (e-STJ fls. 600/601 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso.)

Os respectivos embargos de declaração, em 19.6.1987, foram acolhidos para se reconhecer a existência de omissão, corrigindo-se o ponto omisso. Oportuno extrair do voto do em. Ministro WASHINGTON BOLÍVAR, Relator, as seguintes passagens:

Conforme descrito no relatório, verifica-se que os três embargos pedem, em síntese, que seja reconhecida a omissão do julgado quanto à existência de uma sentença de mérito, já proferida na ação possessória (fl. 47, da AC nº 28.558), bem assim que a Turma prossiga no julgamento, já que repeliu, por maioria, a prejudicial de mérito relativa à prescrição.

Todos os embargantes têm razão e, como Relator, devo reconhecer o erro e procurar corrigi-lo.

[…]

É evidente a contradição entre o que me parecera acertado – prosseguir a Turma o julgamento, interrompido pela aposentadoria intercorrente do Relator, o eminente Ministro CORRÊA PINA, o Relator originário – e a conclusão do voto pela remessa dos autos à Vara de origem a fim de que, afastada a prescrição, possa o Juiz julgar as ações intentadas, como lhe parecer de direito.

Ademais, como se ressaltou em todas as razões ofertadas com os embargos declaratórios, olvidou-se a circunstância de que o Juiz de primeiro grau já se pronunciara, na ação possessória, quanto ao mérito, julgando-a improcedente e na outra, de reivindicação, cingira-se o Juiz à prejudicial da prescrição, que também integra o mérito do litígio, extinguindo o processo.

Ante o exposto, acolho todos os embargos, para reconhecer a omissão e eliminar a contradição, declarando que a Turma deve prosseguir o julgamento, o que de logo não se empreende pela circunstância de haver também se aposentado o eminente Ministro MÁRCIO RIBEIRO, que era o Revisor, a indicar o adiamento, para que seja o processo encaminhado ao meu eminente Revisor, o Sr. Ministro CARLOS THIBAU, a fim de que tome conhecimento pessoal e direto de todas as relevantes questões de fato e de Direito expostas em ambas as ações, de inegável interesse para as Letras Jurídicas nacionais e para a História de nosso País. Essa solução, ademais, permitirá não sejam os embargantes surpreendidos, já que devem ser cientificados, na oportunidade própria, de que se vai prosseguir no julgamento, ante o acolhimento dos embargos. (e-STJ fls. 665/667 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso.)

O acórdão dos referidos aclaratórios encontra-se assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO DO JULGADO E CONTRADIÇÃO –

1) Reconhecimento de omissão do julgado quanto à existência de sentença de mérito já proferida numa das ações (AC nº 28.558) e para eliminar contradição, declarando-se que a Turma deve prosseguir no julgamento, uma vez afastada, por maioria, a prescrição.

2) Embargos declaratórios recebidos. (e-STJ fl. 672 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso.)

O mencionado aresto dos embargos de declaração transitou em julgado (e-STJ fl. 674 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso).

Com a extinção do TFR, o processo foi recebido e, em 16.11.1992, autuado no Tribunal Regional Federal da 2ª Região como AC n. 92.02.19258-8, distribuído ao Juiz CELSO GABRIEL DE REZENDE PASSOS (e-STJ fls. 193/194).

A Terceira Turma do TRF 2ª Região, em 20.6.1995, em relação à possessória, negou provimento ao recurso. O acórdão está assim ementado:

CONSTITUCIONAL E CIVIL – AÇÃO POSSESSÓRIA – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO – PALÁCIO GUANABARA É BEM PRÓPRIO NACIONAL – LEI 166 DE 29.09.1840 – DECRETO Nº 447, DE 18.07.91

  • Ordem de julgamento das ações possessória e reivindicatória obedece ao art. 923, do CPC, que afirma que “na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar ação de reconhecimento do domínio”.
  • A possessória foi proposta em 1895, ao passo que a reivindicatória só foi ajuizada em 1955. Enquanto não fosse aquela julgada, não seria possível a abertura desta.
  • Preliminar de prescrição não conhecida.
  • Imóvel em causa, Palácio Isabel, hoje Palácio Guanabara, foi adquirido especificamente para habitação de Suas Altezas Imperial e Real, fundando-se um patrimônio em terras pertencentes à Nação (Art. 8º do Contrato de Casamento da Princesa Isabel e Gastão de Orléans, Conde e Condessa d’Eu).
  • Este bem, entre outros, conforme cita o Contrato de Matrimônio e a Lei nº 166 de 29.09.1840, é próprio nacional e por conseguinte, os consortes só tinham direito de habitação, que cessou com a queda da Monarquia.
  • Título de propriedade da União sobre o Palácio Guanabara é a escritura de aquisição do imóvel que tinha finalidade justificativa na habitação dos consortes, e foi feita em cumprimento de determinações e nos termos dos contratos de matrimônio e das Leis 166 de 29.09.1840 e 1217 de 07.07.1864.
  • Ademais na forma da documentação acima referida, em 18.07.91, foi baixado o Decreto nº 447 de 18.07.91 que incorporou aos próprios nacionais todos os bens que constituíram o dote ou patrimônio do casal, em concessão do extinto regime.
  • Em consequência, o Palácio Guanabara, sede hoje do Governo do Estado do Rio de Janeiro, ficou definitivamente incorporado aos próprios nacionais, conforme o Decreto citado, que goza da presunção da legalidade, ínsita a todo ato administrativo, permanecendo até hoje intocado.
  • Apelações às quais se nega provimento. (e-STJ fl. 316.)

Rejeitados monocraticamente os primeiros embargos de declaração (e-STJ fls. 339/340), foram opostos novos aclaratórios e interposto agravo regimental (e-STJ fls. 346/351 e 354/361), os quais foram decididos pelo colegiado, em 14.3.2000, assim:

PROCESSUAL CIVIL. REJEIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – AGRAVO REGIMENTAL E EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO POSSESSÓRIA CONCOMITANTE À REIVINDICATÓRIA – APLICABILIDADE DO ART. 923, DO CPC – INEXISTÊNCIA DE OFENSA À COISA JULGADA – ERRO MATERIAL QUE NÃO INFLUENCIA O JULGAMENTO – AQUISIÇÃO DE ÁREAS COM RECURSOS PRÓPRIOS – NÃO COMPROVAÇÃO.

I – Em face ao princípio da imediata aplicação das leis processuais, escorreito o entendimento de incidência do art. 923, do CPC, em que pese o ajuizamento das ações possessória e reivindicatória ter ocorrido anteriormente à edição do CPC/73, que se aplica ao processo no estado em que se encontra.

II – Inexiste ofensa à coisa julgada quando a decisão que se diz violada tratou apenas de inadequação de procedimento, não tendo sido apreciada questão de mérito; inexistência de vedação à propositura de nova demanda veiculada de forma correta.

III – Erro material ocorrido em transcrição de documento que não influenciou o julgamento não é causa de anulação ou modificação do mesmo.

IV – A referência a acórdão do STF que se manifestou sobre situação similar a da hipótese em julgamento – e não idêntica, como referida no voto – não é erro material idôneo a justificar a modificação do julgado.

V – O silêncio da decisão embargada quanto à existência de áreas adquiridas com recursos pessoais incorporadas ao imóvel objeto das ações possessória e reivindicatória – que se reconhece, suprindo-se a omissão – não acarreta a aquisição de qualquer direito ante a carência de comprovação.

VI – Agravo Regimental provido para conhecer dos Embargos de Declaração (fls. 247/257), estes providos parcialmente para sanar as omissões apontadas, sem que tal importe em modificação do julgado (Acórdão de fls. 241/242). Embargos de Declaração (fls. 273/280) prejudicados. (e-STJ fls. 386/387.)

O TRF 2ª Região, em 12.5.2008, negou provimento a outros embargos de declaração, exarando a seguinte ementa no respectivo acórdão:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGADA CONTRADIÇÃO E OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. INVESTIDA CONTRA A FUNDAMENTAÇÃO HAVIDA NO JULGAMENTO DOS ANTERIORES RECURSOS. AÇÃO POSSESSÓRIA. PALÁCIO GUANABARA, ANTERIORMENTE DENOMINADO PALÁCIO IZABEL. RECURSO QUE SE BUSCA REVOLVER MATÉRIA SUPERADA PELO JULGAMENTO DO E. COLEGIADO. DESCABIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 535 DO CPC. 1. Afirmam os Embargantes existência de contradição entre o afirmado no v. Acórdão recorrido e o deliberado anteriormente pelo E. Colegiado, quanto ao argumento que sustenta a improcedência do pedido. Inocorrência. Função integrativa dos Embargos de declaração. Ausência de contradição entre as proposições do v. acórdão. Matéria estranha ao escopo do art. 535 do CPC. 2. Revolvimento dos fundamentos do v. Acórdão o que, à guisa de pretensa omissão, busca discutir o próprio mérito e correção do julgamento do apelo, já objeto de embargos declaratórios. Pretensão à rediscussão da causa originária, o que afronta o disposto no art. 535 do CPC. 3. Segundos embargos de declaração devem ser analisados sob a ótica do acórdão embargado e não promover o rejulgamento dos recursos anteriores. 4. Ausência de quaisquer omissões e contradições, que na dicção do art. 535 do CPC, necessitem ser sanada. 5. Embargos Declaratórios improvido. (e-STJ fl. 504.)

Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros, herdeiros do Conde d’Eu e da Princesa Isabel, interpuseram recurso especial com base no art. 105, III, “a”, da CF, alegando, em primeiro lugar, violação dos arts. 2º, § 2º, e 6º, caput, da LICC, tendo em vista que a vedação disciplinada no art. 923 do CPC/1973, por ser posterior ao ajuizamento das ações possessória (1895) e reivindicatória (1955), não poderia ter sido aplicada neste feito para sustar a ação reivindicatória.

Apontam contrariedade, também, ao próprio art. 923 do CPC/1973, inaplicável porque “a posse dos Recorrentes não está sendo disputada a título de domínio” (e-STJ fl. 447).

No que tange ao mérito acerca do domínio, deduzem as seguintes alegações sobre a afronta aos arts. 923 do CPC, 3º, 5º, 6º e 7º da Lei n. 166, de 29.9.1840, e 1º da Lei n. 1.217, de 7.7.1864:

  1. Mas ainda que se admita, o que se faz por amor ao debate, que a posse dos Recorrentes está sendo disputada a título de domínio, a presente ação deveria ser tida como procedente, sob pena de malferimento ao art. 923 do CPC.
  2. É que assim dispõe a súmula 487 do STF:

“Será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada.”

  1. Não pode restar a menor dúvida de que a ocupação do Palácio, ‘manu militari’, pela União deu-se sob o pretexto de que dito imóvel deveria ser incorporado aos próprios nacionais.
  2. E para justificar este esdrúxulo procedimento, foi alegado pela União que o direito que os príncipes detinham sobre o Palácio era simplesmente o de habitação.
  3. O próprio acórdão, às fls. 295, admite que

“a questão do domínio fica submetida, nos próprios autos da ação possessória, a ‘cognitio’, embora não ao ‘judicium’

  1. Se assim é, nada impediria que a questão do domínio fosse levada em consideração para efeito de julgamento da possessória.
  2. E neste aspecto o acórdão baseou-se em afirmativa inteiramente divorciada da realidade, qual seja, a de que o direito do casal imperial era o de habitação.
  3. Assim agindo, também restaram ofendidas as Leis nº 166, de 29/09/1840 e nº 1217, de 07/07/1864.
  4. De fato, a Lei nº 166 se referia à dotação para as Princesas Januária e Francisca, dispondo os seus artigos 3º, 5º, 6º e 7º:

“Art. 3: Fica consignada a quantia de 120.000$000 de réis para a aquisição de prédios que offereção decente habitação a estes Augustos Esposos; e em quanto não se effectuar esta aquisição, serão pagos pelo Thesouro Público, na razão de cinco por cento do referido capital, e aluguéis de prédios, que sejão para esse effeito mais idôneos”

“Art. 5º: Fundar-se-á hum Patrimonio em terras pertencentes à Nação, cujo valor será ulteriormente determinado sobre informações do Governo.”

“Art. 6º: Ao dito Patrimonio serão incorporados os prédios de que trata o art. 3º; e assim passará aos descendentes, segundo a ordem de sucessão estabelecida na Ordenação, Livro 4º, Título 100, que fica para este effeito em virgor.”

“Art. 7º: Todos os bens que se refere o artigo antecedente serão consignados como Próprios Nacionaes, quando não haja, ou se acabe a referida sucessão.”

  1. Já a Lei 1217, em seu art. 1º, estabeleceu que “ficam em vigor, para a dotação de S.A. Imperial a Sra. D. Isabel, as disposições da Lei nº 166, de 29 de setembro de 1840, com as seguintes alterações.”
  2. Tais alterações são concernentes tão só aos valores dos dotes, em nada modificando a situação jurídica antes estabelecida.
  3. O disposto no já transcrito art. 7º da Lei nº 166, não pode deixar a menor sombra de dúvida de que só quando não houvesse ou se acabasse a sucessão da Princesa (hipótese não ocorrida) é que os bens seriam considerados Próprios Nacionais.
  4. Portanto, o direito concedido aos antecessores dos Recorrentes foi de propriedade (resolúvel em caso de ausência de sucessão) e não de mera habitação, como equivocadamente entendeu o acórdão recorrido que, desta forma, também vulnerou o art. 505 do antigo Código Civil, cujo comando foi ratificado pelo parágrafo 2º do art. 1210 do atual, “in verbis”:

“Art. 505: Não obsta à manutenção, ou reintegração na posse, a alegação de domínio, ou de outro direito sobre a coisa. Não se deve, entretanto, julgar a posse em favor daquele a quem evidentemente não pertencer o domínio.”

“Parágrafo 2º do art. 1210: Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade ou de outro direito sobre a coisa.” (e-STJ fls. 448/450.)

Relativamente ao direito à posse, entendem que foram contrariados os arts. 2º, § 2º, e 6º, caput, da LICC, além dos arts. 467 e 471 do CPC, argumentando:

  1. Mas ainda que de direito de habitação se tratasse – o que só para argumentar se admite – impunha-se a procedência da possessória.
  2. O acórdão recorrido, para justificar a sua conclusão, afirma:

“Aliás, com a República, os Príncipes foram banidos do Brasil, pelo que, até por esse motivo, não poderiam mais ser reintegrados na posse pleiteada.”

  1. Esta afirmativa conflita com a legislação vigorante ao tempo do ajuizamento da demanda.
  2. Após a independência política do Brasil em 1822, a Lei de 20 de outubro de 1823 determinou continuarem em vigor, no território brasileiro, as Ordenações, Leis e Decretos promulgados pelos reis de Portugal até 25 de abril de 1821, enquanto não se editasse novo Código e não fossem especialmente alterados.
  3. Ocorre que aquelas ordenações eram paupérrimas em matéria civil, como assinalou Teixeira de Freitas (“Consolidação das Leis Civil” – Introdução, pág. XXXII) e, para supri-las, a famosa Lei de 18 de agosto de 1769 (Lei da Boa Razão) ordenara o recurso ao Direito Romano como fonte subsidiária do direito pátrio.
  4. Ora, o direito justinianeu concedia ao titular do direito de habitação não apenas a faculdade de habitar a casa, mas também a de locá-la, não se extinguindo o direito pelo não uso.É o que ensina Lacerda de Almeida:

[…]

  1. Como se vê, no regime jurídico vigorante ao tempo do esbulho que os autores sofreram, o banimento deles não obstava a manutenção da posse e sua reintegração, pois o direito de habitação lhes assegurava não apenas a posse direta da coisa para dela utilizar-se para sua moradia, mas também a posse indireta, que lhes propiciaria locá-la a terceiros ou, simplesmente, guardá-la sem dela fazerem uso.
  2. Diante de tal realidade jurídica, evidencia-se, data vênia, destituída de fundamento a assertiva do V. Acórdão de que, por terem sido banidos, os príncipes não mais poderiam ser reintegrados na posse pleiteada.
  3. Portanto, também sob tal aspecto, o acórdão, mais uma vez, infringiu o disposto no parágrafo 2º do art. 2 e no “caput” do art. 6º, ambos da LICC.
  4. A tentativa da União Federal de se apossar do imóvel retroage ao ano de 1891 e buscou como respaldo o Dec. 447 daquele ano, segundo o qual ficariam incorporados aos próprios nacionais todos os bens que constituíam o dote da Princesa Isabel, Condessa d’Eu.
  5. Apesar de tal decreto, o Governo Republicano não conseguiu entrar regularmente no Palácio, eis que embora o Ministério da Justiça houvesse expedido aviso aos representantes da família imperial para a entrega do imóvel, a imposição foi repelida pelo guardião dos bens do casal que se negou a ante ela se curvar.
  6. Em consequência, o Governo Republicano ingressou com procedimento judicial perante o Juiz Seccional do Distrito Federal, o qual indeferiu a petição inicial, tendo a Fazenda se conformado com tal decisão, dela não tendo apresentado recurso, pelo que a posse mansa e pacífica do casal se manteve sem outra perturbação que não a do inconstitucional decreto nº 447.
  7. Não obstante, em 23 de maio de 1894 o palácio foi cercado por praças do exército e ocupado pela força pública.
  8. Na tentativa de coonestar a violência praticada, a União novamente procurou o Judiciário pleiteando a incorporação do palácio, tendo mais uma vez sido indeferida a pretensão pelo Dr. Juiz Seccional.
  9. Insatisfeita, recorreu a União para o E. Supremo Tribunal Federal que, mediante acórdão proferido no Agravo nº 100, negou provimento ao apelo.
  10. A decisão, portanto, fez coisa julgada, apesar do que a União permaneceu na posse obtida em estado de sítio, a mão armada e com escandalosa preterição do pronunciamento definitivo do Poder Judiciário, o que ensejou o ajuizamento da presente ação possessória.
  11. Ficaram, assim, igualmente infringidos os artigos 467 e 471 do CPC de seguinte dicção:

“Art. 467: Denomina-se coisa julgada material a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.”

“Art. 471: Nenhum Juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo:

I – se, tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado e fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuída na sentença;

II – nos demais casos prescritos em lei.”

  1. Na questão em exame não ocorreu qualquer das exceções previstas nos incisos do artigo 471.(e-STJ fls. 450/453.)

Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros ratificaram o seu recurso especial após a publicação do acórdão que julgou os últimos aclaratórios (e-STJ fls. 507/508).

Isabel de Orleans e Bragança e outros interpuseram recurso especial baseado no art. 105, III, “a” e “c”, da CF, asseverando que, erroneamente, “os v. Acórdãos recorridos pressupõem que a disputa da posse se faz a título de domínio” (e-STJ fl. 538). Afirmam que “o fato de o julgador adentrar no exame de matéria de domínio (porque assim entenda útil para decidir no campo possessório) não caracteriza a controvérsia como disputa de posse a título de domínio” (e-STJ fl. 538). Explicam que “a lide sobre a posse a título de domínio se estabelece quando autor e réu pretendem a posse de uma coisa fundados ambos somente no domínio, ou seja, na posse de direito derivada do domínio” (e-STJ fl. 538). Destacam que a matéria era disciplinada no art. 505, segunda parte, do CC/1916 e que, “no caso dos presentes autos, os autores, ora recorrentes, invocam a proteção possessória fundados, não na posse de direito que lhes resultaria a titularidade do domínio, mas na posse da coisa, mansa e pacífica, sem dúvida ou contestação, de que eram detentores há vinte e seis (26) anos” (e-STJ fl. 539).

Argumentam que, “de fato, ainda que o C. Tribunal a quo, ao pronunciar-se sobre o invocado acórdão proferido no Agravo nº 100, tenha negado a essa decisão os efeitos que os suplicantes nela vislumbram, não pode recusar-se, contudo, a reconhecer que o julgado da Suprema Corte, qualquer que seja o fundamento por ela adotado, resultou em recusar à União Federal a pretendida imissão na posse do Palácio Izabel, que então se postulava, posse de que, ipso facto, não era detentora. Incontroversamente, a União Federal não era e jamais fora detentora da posse do Palácio Izabel, a qual só obteve esbulhando-a” (e-STJ fls. 539/540). Invocam, nessa parte, dispositivos legais e precedentes do STF, aduzindo:

6.11 o vigente Código Civil, em seu art. 1210, § 2º, após deferir ao possuidor esbulhado o direito de ter sua posse restituída, estatui:

“Art. 1210:

…………….

§ 2º – Não obsta a manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa».

6.12 O mesmo ficara dito no art. 505 do Código Civil de 1916, como já referido, sendo certo que a segunda parte do dispositivo era restrita à hipótese de disputa da posse, a título de domínio e foi nesse contexto que o E. Supremo Tribunal Federal editou sua SÚMULA 487:

‘SÚMULA 487 – Será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for disputada’.

6.13 Esse, também, foi o entendimento do Simpósio de Curitiba, em seu enunciado LXXXIII, que, contraditoriamente, o próprio aresto recorrido cita:

‘O art. 923, 1ª parte, só se refere a ações possessórias em que a posse seja disputada a título de domínio’.

6.14 Veja-se, ainda, o voto condutor do Exmo. Sr. Ministro Moreira Alves, no acórdão proferido pelo Tribunal Pleno da Suprema Corte no Recurso Extraordinário nº 87.344-MG (R.T.J. vol. 91, pag. 594 e seguintes).

[…]

6.16 Dissentiu, pois, o v. Acórdão recorrido do entendimento jurisprudencial da Suprema Corte, reiterando, ademais, em acórdão unânime de sua Segunda Turma, proferido no Recurso Extraordinário nº 89.179-0, de 03-08-1979, da relatoria do Ministro Cordeiro Guerra (certidão anexa):

‘Na pendência de processo possessório, fundado na alegação de domínio, é defesa, assim ao autor como o réu intentar a ação de reconhecimento de domínio – art. 923 do CPC’.

(o grifo não é do original).

6.17 Não há que confundir posse fundada no direito com a simples alegação adicional do possuidor que invoque, também, sua condição de proprietário. Como lembra Sérgio Bermudes em anotação aos ‘Comentários ao Código de Processo Civil’ de Pontes de Miranda (Tomo XIII, pag. 164): ‘A alegação de propriedade é mais um argumento em favor de quem se afirma na posse do bem, dando mais viço à pretensão. Só isso’.

6.18 Na verdade, o v. Acórdão recorrido, contra toda a doutrina e a jurisprudência, concluiu por admitir a ‘exceção de domínio’ em ação possessória pura. (e-STJ fls. 540/542.)

Quanto à natureza dos direitos sobre o Palácio Izabel, entendem não se sustentar a tese de simples direito de habitação. Narram que, para o acórdão recorrido, ‘o direito concedido aos Condes d’Eu e seus sucessores seria, não o de domínio, mas o de habitação, como resultaria das Leis nos 166, de 29-09-1840, 1.217, de 07-07-1864 e 1.904, de 19-10-1870, Ora, assim sendo, impedidos os príncipes de habitar no Brasil, em razão do desterro da Família Imperial, ter-se-ia extinguido o direito de que eram titulares’ (e-STJ fl. 543). Entretanto, ‘ao aderir a esse entendimento, contudo, o v. Acórdão recorrido, proferido nos embargos declaratórios, não explicita os fundamentos de suas conclusões, posto que, ao contrário do que pressupõe, o direito de habitação, como então vigente, não se restringia ao uso pessoal do bem por seu titular’ (e-STJ fl. 543). Estaria caracterizada, então, afronta aos arts. 458, II, 459 e 535 do CPC, havendo omissão e contradição envolvendo a falta de observância das orientações contidas na Lei da Boa Razão (Lei de 18 de agosto de 1769), em vigor naquele período.

Sobre a interpretação da legislação da época (arts. 3º, 5º, 6º e 7º da Lei n. 166/1890, 1º, § 1º, da Lei n. 1.217/1864 e 1º da Lei n. 1.904/1870), sustentam ser desarrazoada a adoção da tese de que haveria simples direito de habitação. Argumentam assim:

7.15 A ocorrência de um “patrimônio político” foi afastada por todos os juristas consultados pelo Ministério da Justiça sobre a incorporação do Palácio Isabel aos próprios nacionais como uma contradição em seus próprios termos:

“… Patrimônio político, ou não tem sentido, ou é uma frase tão razoável como dizer-se, para me servir de um exemplo memorável – estátua de mármore de pau”.

(Lafayete Rodrigues Pereira – Parecer em “O Direito”, vol. 59, p. 276).

7.16 De outra parte, a integração dos bens dotais da Princesa Isabel aos Próprios Nacionais só se daria quando não houvesse, ou se acabe a sua sucessão, nos precisos termos dos arts. 6º e 7º da Lei nº 166, de 1840:

[…]

Isso mesmo ficou dito no art. 20 do pacto antenupcial do casal do Conde d’Eu:

[…]

7.18 Em suma, mesmo que se ingresse no exame da matéria do domínio – alheia, em verdade, à presente ação – não subsistem juridicamente as conclusões do R. Julgado recorrido. (e-STJ fls. 545/546.)

O Estado do Rio de Janeiro interpôs recurso especial adesivo baseado no art. 105, III, “a” e “c”, da Constituição Federal, explicando que, “como o Estado sucumbiu na parte do Acórdão que rejeitou a preliminar de mérito de prescrição”, recorre “para que a matéria da prescrição seja conhecida pela Turma no caso de acolhimento dos recursos especiais dos autores” (e-STJ fl. 693). Para tanto, deduz o seguinte:

Inquestionavelmente prescritas estão ambas as ações.

A sentença do eminente Juiz Federal dr. Evandro Gueiros Leite e o Parecer do Sr. Procurador da República Dr. Mário Vasconcellos Ribeiro, bem demonstram as razões da prescrição.

Isto porque, desde a data de 1897 até a data em que foram publicados os Editais, em 14 de julho de 1964, nenhuma providência foi adotada pela parte autora, a quem cabia impulsionar o processo.

Desta sorte, a decisão do Acórdão que rejeitou a prescrição, violou e negou vigência ao Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, e ao artigo 3º do Decreto-Lei nº 4.597, de 19 de agosto de 1952. (e-STJ fl. 696.)

Apresentadas contrarrazões aos recursos especiais, inclusive ao adesivo (e-STJ fls. 637/646, 659/674, 699/705 e 707/717), todos foram admitidos na origem (e-STJ fls. 727/728, 731/732 e 735/736).

O presente recurso foi distribuído em 29.9. 2009 inicialmente ao Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA (e-STJ fl. 744), que determinou sua redistribuição à SEGUNDA SEÇÃO, nos termos do art. 9º, § 2º, I, do RISTJ (e-STJ fls. 753/755). O processo foi redistribuído em 16.3.2010 ao em. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR e, posteriormente, em 17.6.2011, atribuído a minha relatoria (e-STJ fls. 761/762).

Em decorrência do falecimento de Dom Pedro de Orleans e Bragança, o respectivo espólio, representado por Afonso de Bourbon de Orleans e Bragança, inventariante, postulou sua habilitação no processo, nos termos do art. 43 do CPC/1973, e requereu que constasse das próximas intimações o nome do Dr. José Carlos de Araújo Almeida Filho, advogado constituído. Informou a juntada da procuração outorgada ao seu advogado e do termo de inventariante (e-STJ fls. 765/767). Entretanto, a petição veio acompanhada, apenas, da procuração, sendo indispensável comprovar que Afonso de Bourbon de Orleans e Bragança foi nomeado inventariante. Determinei, então, em despacho de 1º.8.2014, fosse o espólio de Dom Pedro de Orleans e Bragança, representado judicialmente pelo Dr. José Carlos de Araújo Almeida Filho, advogado, intimado para que juntasse cópia da certidão de óbito e do termo de inventariante passado em nome de Afonso de Bourbon de Orleans e Bragança (cf. e-STJ fls. 784/785).

O espólio de Dom Pedro de Orleans e Bragança, por sua vez, em 12.8.2014, protocolizou petição juntando tradução da certidão de óbito e da certidão de inventariança (e-STJ fls. 797/802).

Diante de manifestações da União e do Estado do Rio de Janeiro, diversas diligências foram determinadas e realizadas para regularizar o pedido de habilitação, sendo proferido o seguinte despacho em 17.12.2015:

Em 16.10.2015, foi protocolizada e juntada nestes autos certidão encaminhada pela 3ª Vara Cível da Comarca de Petrópolis – RJ, comprovando que AFONSO DE BOURBON DE ORLEANS E BRAGANÇA foi nomeado inventariante no processo de inventário/arrolamento de PEDRO DE ORLEANS E BRAGANÇA (proc. n. 0000845-23.2008.8.19.0042) (e-STJ fls. 909/910).

Proferi despacho em 6.11.2015, determinando que o espólio fosse ‘incluído na autuação como interessado, constando como respectivos advogados ‘Dr. JOSÉ CARLOS DE ARAÚJO ALMEIDA FILHO e outros’ (e-STJ fl. 913), cabendo destacar que o instrumento de mandato passado pelo inventariante aos aludidos advogados encontra-se à fl. 767 (e-STJ).

Efetuadas as alterações na autuação (e-STJ fl. 915), proferi o seguinte despacho:

‘Intime-se o ESPÓLIO DE PEDRO DE ORLEANS E BRAGANÇA para que cumpra a decisão de fls. 893/899 (e-STJ), no sentido de providenciar ’a legalização consular da certidão de óbito na forma do Manual do Serviço Consular Jurídico – MSCJ, em vigor’ (e-STJ fl. 898), com o propósito de viabilizar a requerida habilitação.

Publique-se” (e-STJ fl. 917).

Referido despacho foi devidamente publicado em 10.11.2015 (e-STJ fl. 918) – constando do respectivo ato também os nomes do ESPÓLIO DE PEDRO DE ORLEANS E BRAGANÇA, do seu inventariante e de seu advogado –, surtindo os efeitos legais. Nesse contexto, revelou-se desnecessária a expedição do ofício de fl. 921 (e-STJ) com AR (e-STJ fls. 924/925).

Enfim, conforme certificado à fl. 931 (e-STJ), o espólio não se manifestou acerca do despacho de fl. 917 (e-STJ), apesar de corretamente intimado via DJe, cabendo-lhe, quando entender de direito, regularizar sua habilitação com o propósito de exercitar plenamente o direito de defesa.

Diante da relevância do processo, abra-se vista ao Ministério Público Federal, devendo-se informar ao Parquet que foi apresentado parecer nos autos do REsp n. 1.141.490/RJ, conexo a este processo. (e-STJ fls. 933/934.)

O Dr. MAURÍCIO VIEIRA BRACKS, ilustrado Subprocurador-Geral da República, apresentou parecer assim ementado:

  • 1º Recurso especial: violação aos arts. 2º, § 2º, e 6º, caput, ambos da LICC (atual LINDB), aos arts. 467, 471 e 923, todos do CPC/1973, aos arts. 3º, 5º, 6º e 7º, da Lei nº 166/1840, ao art. 1º, da Lei nº 1.271/1864, e ao art. 505, do CC/1916.
  • Não se pode conhecer da tese de violação aos arts. 2º, § 2º, e 6º, caput, ambos da LICC (atual LINDB), primeiro por lhes faltar o requisito do prequestionamento, e, segundo, porque “Com o advento da Constituição Federal de 1988 os artigos da LICC foram alçados a status constitucional, razão pela qual não possui o Superior Tribunal de Justiça competência para apreciar eventual violação ao preceito, consoante jurisprudência uníssona” (AgRg no AREsp 705921/RO, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe de 18/12/2.015).
  • Não desafia conhecimento a suposta violação aos art. 467 e 471, ambos do CPC/1973, sob a alegação de existência de coisa julgada, pois, no ponto, o recurso esbarra analogicamente no óbice da Súmula 283, do STF.
  • Insuscetível de conhecimento a alegada violação aos arts. 3º, 5º, 6º e 7º, da Lei nº 166/1840, ao art. 1º, da Lei nº 1.271/1864, e ao art. 505, do CC/1916, pois, para que se possa fazer qualquer afirmação em sentido contrário ao juízo emitido pelo v. acórdão recorrido, exige-se interpretação incabível na via do recurso especial, conforme a Súmula 5, do STJ, além de ser inegavelmente indispensável o reexame do conjunto fático-probatório, o que vai de encontro à Súmula 7, do STJ.
  • No mérito, insta consignar que não assiste razão à tese de violação ao art. 923, do CPC/1973, visto que “esta Corte Superior há muito pacificou o entendimento de que as normas de caráter processual têm aplicação imediata aos processos em curso” (AgRg no AREsp 860628/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/11/2016, DJe de 1º/12/2016). Ademais, uma das leituras que se pode fazer da regra do art. 923, do CPC/1973, é a de que, na pendência do processo possessório, conquanto seja vedado tanto ao autor como ao réu pleitear decisão judicial para reconhecimento do domínio, a análise de aspectos relacionados à titularidade da propriedade pode eventualmente ser realizada na ação possessória para ajudar a formar a convicção do julgador, apenas com a finalidade de fornecer-lhe elementos para decidir exclusivamente sobre a proteção à posse.
  • 2º Recurso especial: violação aos arts. 458, 459, 535 e 923, todos do CPC/1973, ao art. 1.210, do CC/2002, e ao art. 505, do CC/1916, além de divergência jurisprudencial.
  • Não se pode conhecer do suposto dissídio jurisprudencial, pois não foram cumpridas as exigências processuais e regimentais. Incidência analógica da Súmula 284, do STF. Precedentes do STJ.
  • No mérito, cumpre dizer que o v. Acórdão recorrido não infringiu os arts. 458, 459 e 535, todos do CPC/1973, uma vez que houve a análise, de forma motivada e fundamentada, de todos os pontos pertinentes essenciais ao desate da lide, ainda que a decisão não a tenha citado expressamente todos os dispositivos legais de regência e não tenha vindo ao encontro dos anseios recursais.
  • Não deve ser provida a tese de violação ao art. 923, do CPC/1973, ao art. 1.210, do CC/2002, e ao art. 505, do CC/1916, pois, na pendência do processo possessório, conquanto a regra do art. 923, do CPC/1973, vede tanto ao autor como ao réu pleitear decisão judicial para reconhecimento do domínio, a análise de aspectos relacionados à titularidade da propriedade pode eventualmente ser realizada na ação possessória para ajudar a formar a convicção do julgador, apenas com a finalidade de fornecer-lhe elementos para decidir exclusivamente sobre a proteção à posse.
  • 3º Recurso especial (adesivo): violação e negativa de vigência “ao Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, e ao artigo 3º do Decreto-Lei nº 4.597, de 19 de agosto de 1952 [sic]”, além de divergência jurisprudencial.
  • Embora a presente súplica especial também tenha sido interposta com fundamento na alínea “c” do permissivo constitucional, nem ao menos foi indicado expressamente algum acórdão paradigmático ou dispositivo de lei federal para o qual o v. Acórdão recorrido teria dado interpretação divergente, circunstância que impossibilita o conhecimento do recurso, no que se refere ao suposto dissídio jurisprudencial.
  • Tem-se como deficiente a alegação de violação e negativa de vigência “ao Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, e ao artigo 3º do Decreto-Lei nº 4.597, de 19 de agosto de 1952 [sic]”. Primeiro, porque o Recorrente aduz suas razões de forma completamente genérica, sem indicar claramente a que dispositivos do Decreto nº 20.910/1932 o v. acórdão recorrido teria contrariado ou negado vigência, muito menos a forma pela qual as supostas violações teriam ocorrido. A duas, porque não existe “Decreto-Lei nº 4.597, de 19 de agosto de 1952”. Incidência analógica da Súmula 284, do STF. Precedentes do STJ.
  • Mediante aplicação analógica das Súmulas 282 e 356, ambas do STF, tem-se que a falta de prequestionamento da questão federal suscitada, sobretudo diante da ausência de oposição de embargos de declaração, constitui óbice ao conhecimento do recurso especial. Ademais, mesmo quando se tratar de questão de ordem pública, como a prescrição, o prequestionamento continua indispensável para possibilitar a abertura da instância especial. Precedentes do STJ.
  • Parecer, preliminarmente, pelo conhecimento parcial dos recursos especiais interposto pelos 1os Recorrentes e pelos 2os Recorrentes, e pelo não conhecimento do recurso especial adesivo interposto pelo 3º Recorrente, e, nos pontos suscetíveis de conhecimento, no mérito, pelo não provimento de ambos. (e-STJ fls. 942/944.)

Foram interpostos, ainda, recursos extraordinários por Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros (e-STJ fls. 456/468) e por Isabel de Orleans e Bragança e outros (e-STJ fls. 601/632), nenhum deles admitido na origem (cf. e-STJ fls. 729/730 e 733/734), tendo sido interpostos agravos de instrumento para o STF (e-STJ fl. 740).

O Instituto Cultural D. Isabel I A Redentora, na petição de fls. 1.003/1.022 (e-STJ), requereu sua admissão como amicus curiae, o que indeferi na decisão de fls. 1.024/1.026 (e-STJ), proferida em 7.11.2018 e publicada no DJe de 13.11.2018.

É o relatório.

Recurso Especial nº 1.149.487 – RJ (2009/0132773-3)

RELATOR:MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA
RECORRENTE:PEDRO HENRIQUE DE ORLEANS E BRAGANÇA E OUTROS
ADVOGADOS:MÁRIO ALBERTO PUCHEU E OUTRO(S) – RJ008447
SERGIO BERMUDES E OUTRO(S) – RJ017587
RECORRENTE:ISABEL DE ORLEANS E BRAGANÇA E OUTROS
ADVOGADO:DIRCEU ALVES PINTO E OUTRO(S) – RJ007570
RECORRENTE:ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PROCURADOR:SÉRGIO TEIXEIRA FIRMO E OUTRO(S) – RJ034823
RECORRIDO:OS MESMOS
RECORRIDO:UNIÃO
INTERES.:PEDRO DE ORLEANS E BRAGANÇA – ESPÓLIO
REPR. POR:AFONSO DE BOURBON DE ORLEANS E BRAGANCA – INVENTARIANTE
ADVOGADO:JOSÉ CARLOS DE ARAÚJO ALMEIDA FILHO E OUTRO(S) – RJ071627

Ementa

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE FORÇA VELHA (DEMANDA POSSESSÓRIA, PROCESSADA PELO RITO ORDINÁRIO) PROPOSTA EM 1895. DOTAÇÃO PARA A AQUISIÇÃO DE PRÉDIO DESTINADO À HABITAÇÃO DA PRINCESA IMPERIAL DONA ISABEL E SEU MARIDO. ATUAL PALÁCIO GUANABARA. DIREITO DE HABITAÇÃO. OBRIGAÇÃO DO ESTADO VINCULADA À MONARQUIA. PRÓPRIO NACIONAL. PRESCRIÇÃO.
  1. Caso em que a petição inicial de “ação de força velha” (demanda possessória, processada pelo rito ordinário), proposta em 1895 pelo Conde e pela Condessa d’Eu (Princesa Isabel), discute a posse do Palácio Isabel (atual Palácio Guanabara) e também a propriedade, repelindo a natureza de próprio nacional declarada no Decreto n. 447, de 18.7.1891, e afirmando a existência de esbulho e de confisco por parte do Estado. Em tal contexto, a posse está sendo postulada, igualmente, com fundamento no domínio.
  2. Coisa julgada material descaracterizada quanto ao tema de mérito relativo ao domínio, tendo em vista que, no julgamento da Petição n. 100, ocorrido em 10.8.1895, o STF indeferiu a ação de incorporação proposta pela União tão somente diante de aspectos processuais afetos ao Decreto n. 447/1891, que não serviria como argumento para viabilizar a utilização e o processamento do referido tipo de ação. Remeteu as partes, então, às vias ordinárias.
  3. O Palácio Guanabara, adquirido com recursos do Tesouro Nacional a título de dote, com fundamento nas Leis n. 166, de 29.9.1840, 1.217, de 7.7.1864, e 1.904, de 17.10.1870, destinava-se exclusivamente à habitação do Conde e da Condessa d’Eu por força de obrigação legal do Estado vinculada à monarquia e ao alto decoro do trono nacional e da família imperial.
  4. Com a proclamação e a institucionalização da República, as circunstâncias fundamentais que justificavam a manutenção da posse do palácio deixaram de existir, tendo em vista que foram extintos os privilégios de nascimento, os foros de nobreza, as ordens honoríficas, as regalias e os títulos nobiliárquicos. Em decorrência, as obrigações do Estado previstas nas leis da época perante a família imperial foram revogadas ipso factopela nova ordem imposta, dentre as quais a posse de que trata a ação.
  5. A legislação editada durante a monarquia (Leis n. 166/1840 e 1.904/1870) expressamente conferiu aos imóveis adquiridos para a residência da família imperial natureza de próprio nacional, ou seja, bens de propriedade da Fazenda Nacional.
  6. Durante o regime imperial, não se cogitava da abolição da monarquia, razão pela qual a instituição da república, extinguindo o anterior regime, qualificou nova hipótese de “fim da sucessão” dos privilégios dos membros da família imperial relacionados aos imóveis adquiridos a título de dote com dinheiro público.
  7. Prejudicado o recurso adesivo do Estado do Rio de Janeiro, tendo em vista que o pedido de decretação da prescrição foi subordinado, pelo próprio recorrente, ao efetivo acolhimento da pretensão dos herdeiros do Conde e da Condessa d’Eu. No julgamento, todavia, os referidos recursos especiais não foram providos.
  8. Recursos especiais interpostos por Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros e por Isabel de Orleans e Bragança e outros conhecidos parcialmente e desprovidos, e recurso adesivo interposto pelo Estado do Rio de Janeiro prejudicado.

Recurso Especial nº 1.149.487 – RJ (2009/0132773-3)

RELATOR:MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA
RECORRENTE:PEDRO HENRIQUE DE ORLEANS E BRAGANÇA E OUTROS
ADVOGADOS:MÁRIO ALBERTO PUCHEU E OUTRO(S) – RJ008447
SERGIO BERMUDES E OUTRO(S) – RJ017587
RECORRENTE:ISABEL DE ORLEANS E BRAGANÇA E OUTROS
ADVOGADO:DIRCEU ALVES PINTO E OUTRO(S) – RJ007570
RECORRENTE:ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PROCURADOR:SÉRGIO TEIXEIRA FIRMO E OUTRO(S) – RJ034823
RECORRIDO:OS MESMOS
RECORRIDO:UNIÃO
INTERES.:PEDRO DE ORLEANS E BRAGANÇA – ESPÓLIO
REPR. POR:AFONSO DE BOURBON DE ORLEANS E BRAGANCA – INVENTARIANTE
ADVOGADO:JOSÉ CARLOS DE ARAÚJO ALMEIDA FILHO E OUTRO(S) – RJ071627

Voto

O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA (Relator): Na origem, Conde e Condessa d’Eu, Princesa Isabel, ajuizaram “ação de força velha” (demanda possessória, processada pelo rito ordinário) em 24.9.1895 contra a Fazenda Nacional, afirmando que “desde 25 de janeiro de 1865 entraram na legítima posse do prédio urbano situado na rua da Guanabara conhecido por Palácio Izabel e nella se conservaram, mansa e pacificamente, sem dúvida ou contestação de quem quer que seja, até que em 1891, isto é, 26 anos depois, por Decreto nº 447, de 18 de julho, o poder executivo, sem forma nem figura de justiça declarou que ficavam incorporados aos próprios nacionais todos os bens que constituíam o dote ou patrimônio concedidos por actos do extinto regime à Princeza Imperial Condessa d’Eu. Nestes bens se compreende o Palácio Izabel” (e-STJ fl. 4). Posteriormente à edição do decreto, o Palácio Izabel veio a ser ocupado militarmente em 28.5.1894.Em primeiro grau, a ação foi julgada improcedente por sentença prolatada em 10.4.1897, sendo “considerado próprio nacional o Palácio Izabel, a fim de ser a Fazenda Nacional imitida na posse do mesmo prédio por meio do respectivo processo judicial de incorporação nos próprios nacionais” (e-STJ fl. 91).

Os autores interpuseram apelação para o Supremo Tribunal Federal em 20.4.1897 (e-STJ fls. 95/96), sendo os autos encaminhados à instância superior em 18.6.1897 (e-STJ fl. 101). No STF os autos teriam sido remetidos ao arquivo, sem regular distribuição.

O processo, sem número, oriundo do Supremo Tribunal Federal, foi recebido no antigo Tribunal Federal de Recursos em 14.7.1964 (e-STJ fl. 102), autuado como Apelação Cível n. 28.558 e distribuído ao em. Ministro HENRIQUE D’AVILA (e-STJ fl. 174).

Os presentes autos (Apelação Cível n. 28.558), ainda no antigo Tribunal Federal de Recursos, foram apensados à Apelação Cível n. 25.448 (ação reivindicatória – REsp n. 1.141.490) em 18.9.1973 (e-STJ fls. 190/192).

A Primeira Turma do antigo Tribunal Federal de Recursos – TFR julgou as duas apelações (AC n. 25.448 e AC n. 28.558) em 17.12.1979, dando-lhes provimento para afastar a prescrição decretada nos autos da ação reivindicatória em apenso (AC n. 25.448 – REsp n. 1.141.490/RJ), estando o acórdão assim ementado:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – PALÁCIO GUANABARA (ANTIGO PALÁCIO ISABEL) – AÇÃO DE FORÇA VELHA – AÇÃO REIVINDICATÓRIA – CONEXIDADE – PRESCRIÇÃO EXTINTIVA E PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – INOCORRÊNCIA – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL (DECRETOS 20.910/32 E 4.597/42) – INAPLICABILIDADE ÀS AÇÕES REAIS – A AÇÃO REIVINDICATÓRIA NÃO PRESCREVE ENQUANTO O TITULAR DO DIREITO NÃO O HOUVER PERDIDO POR EFEITO DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA (AC Nº 25.448) – PROCESSO ARQUIVADO SEM DETERMINAÇÃO JUDICIAL – FALTA DE IMPULSO OFICIAL (AC Nº 28.558).

1) Não-incidência da prescrição extintiva extraordinária, antigamente trintenária, porquanto a ocupação militar, decorrente da Revolta da Armada, que se iniciara em 6 de setembro de 1893 e se prolongou por cerca de dois anos, ocorreu no dia 28 de maio de 1894, não se somando, para aquele fim, o período anterior e o posterior ao início da vigência do Código Civil, em 1º de janeiro de 1917 (Cód. Civ., art. 1806): – quanto ao primeiro período, porque houve citação válida da União, interrompendo a prescrição; e quanto ao segundo, porque somente em 1947, trinta anos após o início da vigência do Código Civil, ocorreria a prescrição, interrompida em 1946, mediante protesto judicial (Cód. Civ., art. 172, II; Cód. de Proc. Civ. de 1939, art. 720).

2) Inocorrência da prescrição quinquenal prevista nos Decretos ns. 20.910/32 e 4.597/42, porquanto inaplicável às ações reais, sendo certo que a ação reivindicatória não prescreve enquanto o titular do direito não o houver perdido por efeito da prescrição aquisitiva. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.

3) Constitui embaraço judicial, impeditivo do fluxo prescricional, a remessa do processo ao Arquivo do Egrégio Supremo Tribunal Federal, sem ordem do Relator, porquanto efetuada antes mesmo de qualquer registro ou distribuição.

4) Apelos providos. (e-STJ fls. 600/601 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso.)

Os respectivos embargos de declaração, em 19.6.1987, foram recebidos para se reconhecer a existência de omissão, corrigindo-se o ponto omisso. Oportuno extrair do voto do em. Ministro WASHINGTON BOLÍVAR, Relator, as seguintes passagens:

Conforme descrito no relatório, verifica-se que os três embargos pedem, em síntese, que seja reconhecida a omissão do julgado quanto à existência de uma sentença de mérito, já proferida na ação possessória (fl. 47, da AC nº 28.558), bem assim que a Turma prossiga no julgamento, já que repeliu, por maioria, a prejudicial de mérito relativa à prescrição.

Todos os embargantes têm razão e, como Relator, devo reconhecer o erro e procurar corrigi-lo.

[…]

É evidente a contradição entre o que me parecera acertado – prosseguir a Turma o julgamento, interrompido pela aposentadoria intercorrente do Relator, o eminente Ministro CORRÊA PINA, o Relator originário – e a conclusão do voto pela remessa dos autos à Vara de origem a fim de que, afastada a prescrição, possa o Juiz julgar as ações intentadas, como lhe parecer de direito.

Ademais, como se ressaltou em todas as razões ofertadas com os embargos declaratórios, olvidou-se a circunstância de que o Juiz de primeiro grau já se pronunciara, na ação possessória, quanto ao mérito, julgando-a improcedente e na outra, de reivindicação, cingira-se o Juiz à prejudicial da prescrição, que também integra o mérito do litígio, extinguindo o processo.

Ante o exposto, acolho todos os embargos, para reconhecer a omissão e eliminar a contradição, declarando que a Turma deve prosseguir o julgamento, o que de logo não se empreende pela circunstância de haver também se aposentado o eminente Ministro MÁRCIO RIBEIRO, que era o Revisor, a indicar o adiamento, para que seja o processo encaminhado ao meu eminente Revisor, o Sr. Ministro CARLOS THIBAU, a fim de que tome conhecimento pessoal e direto de todas as relevantes questões de fato e de Direito expostas em ambas as ações, de inegável interesse para as Letras Jurídicas nacionais e para a História de nosso País. Essa solução, ademais, permitirá não sejam os embargantes surpreendidos, já que devem ser cientificados, na oportunidade própria, de que se vai prosseguir no julgamento, ante o acolhimento dos embargos. (e-STJ fls. 665/667 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso.)

O acórdão dos referidos aclaratórios encontra-se assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO DO JULGADO E CONTRADIÇÃO –

1) Reconhecimento de omissão do julgado quanto à existência de sentença de mérito já proferida numa das ações (AC nº 28.558) e para eliminar contradição, declarando-se que a Turma deve prosseguir no julgamento, uma vez afastada, por maioria, a prescrição.

2) Embargos declaratórios recebidos. (e-STJ fl. 672 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso.)

Promulgada a Constituição Federal em 1988, que extinguiu o antigo Tribunal Federal de Recursos, o processo foi remetido ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, autuado em 16.11.1992 como AC n. 92.02.19258-8 e distribuído ao Juiz CELSO GABRIEL DE REZENDE PASSOS (e-STJ fls. 193/194) para que prosseguisse com o julgamento dos recursos de apelação.

A Terceira Turma do TRF 2ª Região, em 20.6.1995, em relação à possessória, negou provimento aos recursos. O acórdão está assim ementado:

CONSTITUCIONAL E CIVIL – AÇÃO POSSESSÓRIA – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO – PALÁCIO GUANABARA É BEM PRÓPRIO NACIONAL – LEI 166 DE 29.09.1840 – DECRETO Nº 447, DE 18.07.91

  • Ordem de julgamento das ações possessória e reivindicatória obedece ao art. 923, do CPC, que afirma que ‘na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar ação de reconhecimento do domínio’.
  • A possessória foi proposta em 1895, ao passo que a reivindicatória só foi ajuizada em 1955. Enquanto não fosse aquela julgada, não seria possível a abertura desta.
  • Preliminar de prescrição não conhecida.
  • Imóvel em causa, Palácio Isabel, hoje Palácio Guanabara, foi adquirido especificamente para habitação de Suas altezas Imperial e Real, fundando-se um patrimônio em terras pertencentes à Nação (Art. 8º do Contrato de Casamento da Princesa Isabel e Gastão de Orléans, Conde e Condessa d’Eu).
  • Este bem, entre outros, conforme cita o Contrato de Matrimônio e a Lei nº 166 de 29.09.1840, é próprio nacional e por conseguinte, os consortes só tinham direito de habitação, que cessou com a queda da Monarquia.
  • Título de propriedade da União sobre o Palácio Guanabara é a escritura de aquisição do imóvel que tinha finalidade justificativa na habitação dos consortes, e foi feita em cumprimento de determinações e nos termos dos contratos de matrimônio e das Leis 166 de 29.09.1840 e 1217 de 07.07.1864.
  • Ademais na forma da documentação acima referida, em 18.07.91, foi baixado o Decreto nº 447 de 18.07.91 que incorporou aos próprios nacionais todos os bens que constituíram o dote ou patrimônio do casal, em concessão do extinto regime.
  • Em consequência, o Palácio Guanabara, sede hoje do Governo do Estado do Rio de Janeiro, ficou definitivamente incorporado aos próprios nacionais, conforme o Decreto citado, que goza da presunção da legalidade, ínsita a todo ato administrativo, permanecendo até hoje intocado.
  • Apelações às quais se nega provimento. (e-STJ fl. 316.)

Rejeitados monocraticamente os primeiros embargos de declaração (e-STJ fls. 339/340), foram opostos novos aclaratórios e interposto agravo regimental (e-STJ fls. 346/351 e 354/361), os quais foram decididos pelo colegiado, em 14.3.2000, assim:

PROCESSUAL CIVIL. REJEIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – AGRAVO REGIMENTAL E EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO POSSESSÓRIA CONCOMITANTE À REIVINDICATÓRIA – APLICABILIDADE DO ART. 923, DO CPC – INEXISTÊNCIA DE OFENSA À COISA JULGADA – ERRO MATERIAL QUE NÃO INFLUENCIA O JULGAMENTO – AQUISIÇÃO DE ÁREAS COM RECURSOS PRÓPRIOS – NÃO COMPROVAÇÃO.

I – Em face ao princípio da imediata aplicação das leis processuais, escorreito o entendimento de incidência do art. 923, do CPC, em que pese o ajuizamento das ações possessória e reivindicatória ter ocorrido anteriormente à edição do CPC/73, que se aplica ao processo no estado em que se encontra.

II – Inexiste ofensa à coisa julgada quando a decisão que se diz violada tratou apenas de inadequação de procedimento, não tendo sido apreciada questão de mérito; inexistência de vedação à propositura de nova demanda veiculada de forma correta.

III – Erro material ocorrido em transcrição de documento que não influenciou o julgamento não é causa de anulação ou modificação do mesmo.

IV – A referência a acórdão do STF que se manifestou sobre situação similar a da hipótese em julgamento – e não idêntica, como referida no voto – não é erro material idôneo a justificar a modificação do julgado.

V – O silêncio da decisão embargada quanto à existência de áreas adquiridas com recursos pessoais incorporadas ao imóvel objeto das ações possessória e reivindicatória – que se reconhece, suprindo-se a omissão – não acarreta a aquisição de qualquer direito ante a carência de comprovação.

VI – Agravo Regimental provido para conhecer dos Embargos de Declaração (fls. 247/257), estes providos parcialmente para sanar as omissões apontadas, sem que tal importe em modificação do julgado (Acórdão de fls. 241/242). Embargos de Declaração (fls. 273/280) prejudicados. (e-STJ fls. 386/387.)

O TRF 2ª Região, em 12.5.2008, negou provimento aos terceiros embargos de declaração, exarando a seguinte ementa no respectivo acórdão:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGADA CONTRADIÇÃO E OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. INVESTIDA CONTRA A FUNDAMENTAÇÃO HAVIDA NO JULGAMENTO DOS ANTERIORES RECURSOS. AÇÃO POSSESSÓRIA. PALÁCIO GUANABARA, ANTERIORMENTE DENOMINADO PALÁCIO IZABEL. RECURSO QUE SE BUSCA REVOLVER MATÉRIA SUPERADA PELO JULGAMENTO DO E. COLEGIADO. DESCABIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 535 DO CPC. 1. Afirmam os Embargantes existência de contradição entre o afirmado no v. Acórdão recorrido e o deliberado anteriormente pelo E. Colegiado, quanto ao argumento que sustenta a improcedência do pedido. Inocorrência. Função integrativa dos Embargos de declaração. Ausência de contradição entre as proposições do v. acórdão. Matéria estranha ao escopo do art. 535 do CPC. 2. Revolvimento dos fundamentos do v. Acórdão o que, à guisa de pretensa omissão, busca discutir o próprio mérito e correção do julgamento do apelo, já objeto de embargos declaratórios. Pretensão à rediscussão da causa originária, o que afronta o disposto no art. 535 do CPC. 3. Segundos embargos de declaração devem ser analisados sob a ótica do acórdão embargado e não promover o rejulgamento dos recursos anteriores. 4. Ausência de quaisquer omissões e contradições, que na dicção do art. 535 do CPC, necessitem ser sanada. 5. Embargos Declaratórios improvido. (e-STJ fl. 504.)

Daí a interposição de recursos especiais por Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros, herdeiros da Princesa Isabel e do Conde d’Eu (e-STJ fls. 437/453 e 507/508), por Isabel de Orleans e Bragança e outros, também herdeiros (e-STJ fls. 518/559) e pelo Estado do Rio de Janeiro (e-STJ fls. 691/696), os quais passo a examinar a seguir.

Recurso Especial de Pedro Henrique de Orleans e Bragança e Outros

I.a Violação dos arts. 2º, § 2º, e 6º, caput, da LICC (atual LINDB) e 923 do CPC/1973No acórdão da apelação, o TRF 2ª Região invocou o art. 923 do CPC/1973 para justificar o julgamento da apelação interposta nestes autos (ação possessória) antes do recurso interposto nos autos da ação reivindicatória, assim se pronunciando:

Desde logo, devo submeter à Egrégia Turma uma preliminar sobre a ordem de julgamento das duas ações em processos apensados.

Estabelece o art. 923, do CPC:

“Na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar ação de reconhecimento do domínio.”

Ora, a Possessória foi proposta em 1895, ao passo que a Reivindicatória só foi ajuizada em 1955.

É evidente, pois, a aplicação do art. 923, do CPC, confirmada no Simpósio de Processo Civil, realizado em Curitiba, em 1975, onde entendeu-se ‘o art. 923, primeira parte, só se refere a ações possessórias em que a posse seja disputada a título de domínio.’

Segundo tal entendimento, enquanto não for julgada a possessória, não é possível a abertura da reivindicatória.

Em assim sendo, a ação reivindicatória deve permanecer sobrestada até decisão da possessória, que pode ocorrer na sessão que hoje realizamos.

Lembre-se que na ação possessória a controvérsia não se limita ao fato da posse, mais aprofunda-se à investigação do domínio, ainda que só para se poder decidir da posse. (e-STJ fls. 275.)

Na sequência, julgou o mérito da ação concluindo que o antigo Palácio Isabel (atual Palácio da Guanabara) pertence à União e, por último, voltou a mencionar o art. 923 do CPC/1973, referido com o propósito de reforçar a possibilidade, em tese, de se discutir a propriedade em demanda possessória, desprovendo a apelação. Nesse último ponto, constam do acórdão respectivo as seguintes passagens:

No caso dos presentes autos, vemos que a controvérsia não se limita ao fato da posse, mas aprofunda-se à investigação do domínio, ainda que só para se poder decidir da posse. É certo que tal ocorrência não subtrai à ação seu caráter possessório, porque a sentença, vista em seu conteúdo autoritativo, só poderá decidir sobre a posse; entretanto, a resolução sobre domínio, necessária a concluir sobre a posse, é resolução “incidenter tantum”. Em outras palavras: a questão do domínio fica submetida, nos autos da ação possessória, à “cognitio”, embora não ao “iudicium”.

Reitere-se o disposto no art. 923, do CPC, cuja constitucionalidade é proclamada pela jurisprudência pacífica do STF, coadjuvada pela Súmula 487, também do STF, conforme relata Theotonio Negrão em notas às fls. 608, do seu “Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor”, em sua 26ª edição.

O art. 923, do CPC, redigido na forma da Lei 6820, de 16.09.80, tem a seguinte redação:

“Na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar ação de reconhecimento do domínio.”

Convém assinalar o disposto na Súmula 487 do STF:

“Será deferia a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada.”

Muito esclarecedora é a lição de Sálvio de Figueiredo Teixeira em seu “Código de Processo Civil Anotado”, quando comenta a respeito do art. 923, do CPC, tornando clara a constitucionalidade do artigo supracitado:

“AÇÃO POSSESSÓRIA – FUNDAMENTO DA POSSE NO DOMÍNIO POR AMBAS AS PARTES – INTELIGÊNCIA DO ART. 923, DO CPC.

O STF já rechaçou Arguição de Inconstitucionalidade do disposto no art. 923, do CPC, seja em sua primitiva redação, seja na que resultou da Lei nº 6.820/80.”

Ante todo o exposto, nego provimento aos apelos, para confirmar a sentença prolatada às fls. 44/47. (e-STJ fls. 285/286.)

No recurso especial, entretanto, os ora recorrentes se insurgem contra a aplicação do art. 923 do CPC/1973 tão somente no tocante à extinção da ação reivindicatória. Na verdade, esse tema foi objeto dos acórdãos proferidos nos autos do REsp n. 1.141.490/RJ, em apenso, não dos acórdãos ora recorridos.

Em tal contexto, verifica-se que o recurso especial, sem atentar para o que realmente foi decidido no acórdão ora recorrido, deixou de abordar a suposta afronta ao referido dispositivo processual sob os únicos enfoques utilizados pelo TRF por ocasião do julgamento que resultou da decisão recorrida (a correta ordem de julgamento das apelações – primeiro ação possessória e depois reivindicatória – e a possibilidade de ajuizamento de ação possessória com o propósito de debater a posse com base no domínio). Ademais, discutindo-se ou não o domínio na petição inicial, admitiu-se o processamento da presente “ação de força velha”, de natureza possessória.

Com efeito, o cabimento da ação reivindicatória deverá ser apreciado nos autos respectivos (do REsp n. 1.141.490/RJ), nos limites dos correspondentes recursos, não neste processo, razão pela qual não se deve conhecer do presente recurso quanto à suposta afronta aos arts. 2º, § 2º, e 6º, caput, da LICC (atual LINDB) e 923 do CPC/1973.

Não conheço, portanto, do recurso especial, nessa parte.

I.b Afronta aos arts. 467 e 471 do CPC/1973 – coisa julgada – Agravo de Petição n. 100 (julgado pelo STF em 10.8.1895)

No julgamento das apelações e dos posteriores recursos, o Tribunal de origem afastou a existência de coisa julgada ao fundamento de que o acórdão do STF indeferiu a ação de incorporação diante de aspectos restritos ao Decreto n. 447, de 18.7.1891, que não serviria como argumento para viabilizar a utilização e o processamento do tipo de ação então ajuizada, nada obstante, remetendo as partes para as vias ordinárias. O indeferimento, portanto, decorreu de fundamento sobretudo processual, não adentrando a questão de mérito em relação ao domínio e à caracterização do imóvel como próprio nacional, temas abordados nestes autos de ação possessória, processada pelo rito ordinário, de forma mais ampla, envolvendo, além disso, outros dispositivos legais.

Notem-se, a propósito, as seguintes passagens do acórdão proferido por ocasião do julgamento dos embargos de declaração e do agravo regimental (e-STJ fls. 366/387):

A segunda insatisfação dos autores com o julgado diz respeito à omissão quanto à alegação de coisa julgada no que concerne à impossibilidade de serem incorporados aos próprios nacionais os bens que constituíram o dote da Princesa Isabel, em vista da manifestação do STF, quando do julgamento do Agravo de Petição n. 100.

Quanto a este item, realmente não se pronunciou o acórdão embargado. Supre-se, neste momento, a lacuna.

A ação de incorporação, ajuizada pela União Federal através de seu Procurador Seccional da República nos idos de 1890, teve a sua petição inicial indeferida por entender o julgador que o Decreto nº 447 não preenchia os requisitos das Ordenações Filipinas.

Segundo essas Ordenações, a ação de incorporação deveria ter por fundamento escritura ou título específico que revelasse inconteste o domínio do autor (fls. 154).

Tendo em vista que a ação se baseava no Decreto nº 447 que, à época, tinha efeitos controvertidos no seio da comunidade jurídica, como comprova o resultado das consultas feitas às diversas Faculdades Jurídicas, o d. Juiz a quo, assim como o Supremo Tribunal, entendeu que o Decreto mencionado não revelava de forma clara o domínio, o que era imprescindível para o procedimento intentado, razão pela qual, indeferiu a ação sob este argumento, remetendo as partes às vias ordinárias. Observe-se que, em momento algum naqueles autos, houve qualquer pronunciamento a respeito do mérito da questão, pois este esbarra em pressuposto processual para o procedimento eleito.

Assim, tal Decreto foi inservível, como argumento, para ação de incorporação (procedimento sumário), nada obstaculizando a que fosse fundamento em ação ordinária, como asseverou o juiz ao indeferir a incorporação (fls. 153), ou mesmo conhecido para efeito de se julgar a posse de quem a disputasse a título de domínio (o que era perfeitamente possível à época).

Portanto, desprovida de qualquer sustentação jurídica o argumento de ofensa à coisa julgada. Na cópia do julgamento do Agravo de Petição, juntada por cópia às fls. 152/153 por iniciativa dos próprios autores, pode-se ler que:

“negou-se provimento ao agravo interposto do despacho que indeferiu a petição do procurador seccional, para que fosse incorporado o palácio Isabel aos próprios nacionais, visto não terem sido observadas as disposições que regulam tais incorporações”.

Por conseguinte, não se entrou no mérito. A recusa foi por inadequação do procedimento, não sendo vedada nova postulação, veiculada na forma correta, ou seja, pelo procedimento ordinário, conforme dito pelo ilustre Min. H. do Espírito Santo. (e-STJ fls. 378/379 – grifei.)

Os recorrentes não impugnaram a fundamentação adotada pelo Tribunal de origem para repelir a alegação de coisa julgada. No recurso especial, sustentaram a tese de coisa julgada de forma genérica, dessa forma:

  1. A tentativa da União Federal de se apossar do imóvel retroage ao ano de 1891 e buscou como respaldo o Dec. 447 daquele ano, segundo o qual ficaram incorporados aos próprios nacionais todos os bens que constituíam o dote da Princesa Isabel, Condessa d’Eu.
  2. Apesar de tal decreto, o Governo Republicano não conseguiu entrar regularmente no Palácio, eis que embora o Ministério da Justiça houvesse expedido aviso aos representantes da família imperial para a entrega do imóvel, a imposição foi repelida pelo guardião dos bens do casal que se negou a ante ela se curvar.
  3. Em consequência, o Governo Republicano ingressou com procedimento judicial perante o Juiz Seccional do Distrito Federal, o qual indeferiu a petição inicial, tendo a Fazenda se conformado com tal decisão, dela não tendo apresentado recurso, pelo que a posse mansa e pacífica do casal se manteve sem outra perturbação que não a do inconstitucional decreto nº 477.
  4. Não obstante, em 23 de maio de 1894 o palácio foi cercado por praças do exército e ocupado pela força pública.
  5. Na tentativa de coonestar a violência praticada, a União novamente procurou o Judiciário pleiteando a incorporação do palácio, tendo mais uma vez sido indeferida a pretensão pelo Dr. Juiz Seccional.
  6. Insatisfeita, recorreu a União para o E. Supremo Tribunal federal que, mediante acórdão proferido no Agravo nº 100, negou provimento ao apelo.
  7. A decisão, portanto, fez coisa julgada, apesar do que a União permaneceu na posse obtida em estado de sítio, a mão armada e com escandalosa preterição do pronunciamento definitivo do Poder Judiciário, o que ensejou o ajuizamento da presente ação possessória.(e-STJ fls. 451/452.)

Com efeito, os recorrentes passaram ao largo dos fundamentos do acórdão ora recorrido, que ingressou no exame detalhado do conteúdo do acórdão proferido pelo STF, para concluir que o indeferimento da petição inicial da ação de incorporação decorreu de aspecto meramente processual, vinculado ao procedimento eleito e à impossibilidade de o decreto em apreço viabilizar o processamento sumário da pretensão, remetendo as partes às vias ordinárias. A questão de mérito, assim, não foi enfrentada no STF, o que permitiria o ajuizamento de ações próprias para a discussão aprofundada do tema. Tal motivação não foi impugnada no recurso especial, sendo insuficiente a afirmação genérica dos recorrentes no sentido de que a ação de incorporação teve a petição inicial indeferida e que a decisão transitou em julgado.

Incide, nesse caso, por analogia, a vedação contida na Súmula n. 283 do STF, segundo a qual “é inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles”.

O recurso também não merece conhecimento nesse ponto.

I.c Contrariedade aos arts. 923 do CPC/1973, 3º, 5º, 6º e 7º da Lei n. 166, de 29.9.1840, 1º da Lei n. 1.217, de 7.7.1864, 505 do CC/1916, 1.210, § 2º, do CC/2002, a Lei de 20 de outubro de 1823

Conforme se adiantou no relatório do presente voto, o “Conde e Condessa d’Eu” (Princesa Isabel) ajuizaram a presente ação em 24.9.1895, afirmando que “desde 25 de janeiro de 1865 entraram na legítima posse do prédio urbano situado na rua da Guanabara conhecido por Palácio Izabel e nella se conservaram, mansa e pacificamente, sem dúvida ou contestação de quem quer que seja, até que em 1891, isto é, 26 annos depois, por Decreto nº 447 de 18 de julho, o poder executivo, sem forma nem figura de justiça declarou que ficavam incorporados aos próprios nacionaes todos os bens que constituam o dote ou patrimônio concedidos por actos do extincto regimen à Princeza Imperial Condessa d’Eu. Nestes bens se compreende o Palacio Izabel” (e-STJ fl. 4). Explicaram que, “em virtude deste Decreto, o Ministro do Interior, por aviso de 24 de julho do mesmo anno de 1891, determinou ao General Guilherme Carlos Lassance, procurador dos possuidores do referido predio, para entregar as respectivas chaves ao Engenheiro Francisco Joaquim Bittencourt da Silva” (e-STJ fl. 5). Tal procurador declarou não ser possível cumprir o mencionado aviso, e o Ministro do Interior remeteu o assunto ao Ministro da Fazenda com o objetivo de “mandar promover pelo Procurador Seccional da República […] a incorporação aos próprios nacionais” (e-STJ fl. 5). Foi negado judicialmente, inclusive no âmbito do Supremo Tribunal Federal, o pedido específico de “incorporação nos próprios nacionaes do palacio ‘Izabel’, rementendo-se às partes às vias ordinárias” (e-STJ fl. 5), despacho contra o qual não houve recurso. Entretanto, em 22.12.1891, o Ministro da Guerra comunicou ao Ministro do Interior que foi expedida ordem ao “quartel-mestre-general para tomar posse do mesmo palácio” (e-STJ fl. 6). Segundo os autores, a competência da Justiça Federal para solucionar o tema foi postergada, e o “palácio Izabel foi ocupado militarmente” (e-STJ fls. 6/7). Houve tentativa da “1ª Seção da Directoria do Interior” de aplicar o “art. 8º da lei de 9 de setembro de 1826, que regula a única excepção do direito de propriedade” e que “faz referência expressa aos arts. 5º e 6º que impõem a indemnisação ou o depósito previo do valor do uso ou do dominio da propriedade” (e-STJ fl. 7). Afirmaram os autores que tal norma nem mesmo seria aplicável “se a propriedade fosse do Estado” e que essa escusa valeria “como confissão official do esbulho, senão mesmo do confisco” (e-STJ fl. 7). A necessária ação ordinária não foi utilizada, e o palácio não foi desocupado pelos militares, permanecendo o esbulho, daí a presente ação possessória para impugnar a “occupação militar e irresistível em 28 de maio de 1894” (e-STJ fl. 8). Pediram a reintegração na posse, “com os rendimentos perdas e damnos” (e-STJ fl. 9).

Na sequência, ainda em 24.9.1895, foram juntados pareceres a respeito da questão do domínio relativamente aos Palácios “Izabel” e “Leopoldina” (cf. e-STJ fls. 11/27), assim como, em 11.9.1896, a manifestação, a propósito, da Procuradoria Seccional da República (cf. e-STJ fls. 74/82).

A sentença de improcedência, proferida em 10.4.1897, enfrentou o tema relativo ao domínio à luz da extinção da monarquia, concluindo que o “Palácio Izabel” seria próprio nacional (e-STJ fls. 85/92).

A apelação interposta pelos autores para o STF foi apresentada por termo em 20.4.1897 (e-STJ fls. 95/96), e o Estado da Guanabara – já no âmbito do TFR, em 25.11.1969 – protocolizou contrarrazões defendendo a prescrição intercorrente (e-STJ fls. 110/119).

Diversamente do que alegam os recorrentes no recurso especial, conforme se pode verificar, os autores discutiram na petição inicial o direito à posse, mas sempre rebatendo o decreto que declarou o Palácio Isabel como bem próprio nacional, afirmando, consequentemente, haver esbulho ou até mesmo “confisco”, alegações que, se acolhidas, implicariam reconhecer o domínio pleno em favor dos requerentes. Ao longo do processo, tais matérias igualmente foram discutidas e decididas. E no próprio recurso especial, no item 67 da peça recursal, visando a afastar a hipótese de direito de habitação, qualificam o direito concedido aos antecessores dos recorrentes como propriedade (resolutiva em caso de ausência de sucessão).

Esse contexto, sem dúvida, desde o seu primeiro momento, não permitiria decidir a ação sem enfrentar o título que deu sustentação, ab initio, à posse.

A “Constituição Política do Império do Brasil”, elaborada por um Conselho de Estado e outorgada pelo Imperador D. Pedro I, em 25.3.1824 – “Carta de Lei de 25 de Março de 1824”, estabelecia, no art. 109, que “a Assembléa assignará também alimentos ao Principe Imperial, e aos demais Principes, desde que nascerem”, e, no art. 112, que, “quando as Princezas houverem de casar, a Assembléa lhes assignará o seu Dote, e com a entrega delle cessarão os alimentos”.

A “Assembléa Geral”, composta pela Câmara de Deputados e pela Câmara de Senadores ou Senado, então, aprovou a Lei n. 166, de 29 de setembro de 1840, assegurando dotações à Princesa Imperial D. Januária e à Princesa D. Francisca para quando houvesse de realizar-se seus casamentos. Com poucos dispositivos, assim regulamentou o tema:

Art. 1º A Dotação de Sua Alteza Imperial, quando houver de realisar-se o seu Consorcio, será de noventa e seis contos de réis por anno, paga pela fórma por que o he a de Sua Magestade o Imperador, cessando desde a epoca do referido Consorcio os alimentos assignados por Lei.

Art. 2º O Esposo, que sobreviver ao outro, continuará a perceber a metade da referida Dotação, emquanto residir no Imperio, ou se se ausentar com licença do Imperador.

Art. 3º Fica consignada a quantia de cento e vinte contos de réis para a acquisição de predios, que offereção decente habitação a estes Augustos Esposos: e emquanto não se effectuar essa acquisição, serão pagos pelo Thesouro Publico, na razão de cinco por cento do referido capital, os aluguéis de predios, que sejão para esse effeito mais idoneos.

Art. 4º Fica mais consignada a quantia de cem contos de réis para enxoval, e outros objectos do serviço de Sua Alteza Imperial, e de Seu Augusto Esposo.

Art. 5º Fundar-se-ha hum Patrimonio em terras pertencentes á Nação, cujo valor será ulteriormente determinado sobre informações do Governo.

Art. 6º Ao dito Patrimonio serão incorporados os predios, de que trata o artigo 3º; e assim passará aos descendentes, segundo a ordem de sucessão estabelecida na Ordenação, Livro 4º, Titulo 100, que fica para este effeito em vigor.

Art. 7º Todos os bens, a que se refere o artigo antecedentes, serão consignados como Proprios Nacionaes, quando não haja, ou se acabe a referida sucessão.

Art. 8º Se o Principe tiver da sua parte alguns bens vinculados, e como taes os considerar no respectivo contrato, ou se taes bens lhe sobrevierem, observar-se-ha a este respeito, o que determina a Ordenação, Livro 4º, Título 100, § 5º, e seguintes, salvo o direito de successão estabelecido pela Legislação do Paiz, a que pertencer o mesmo Principe; por que em tal caso o contrato lhe será subordinado em tanto, quanto discrepar da referida Ordenação.

Art. 9º O Governo fica autorisado para despender fóra do Imperio as quantias, que forem necessarias para as negociações relativas ao Casamento de Sua Alteza Imperial, e transporte de seu Augusto Esposo, ficando igualmente comprehendidas nesta autorisação as despezas, que forem mister para o ajuste do Consorcio de Sua Magestade o Imperador, e transporte da Sua Augusta Esposa para o Brasil.

Art. 10. No caso de que venha a ter lugar a successão de Sua Alteza Imperial ao Throno, ficarão sem effeito as disposições desta Lei, que se tornem incompatíveis com os artigos, em que a Constituição regula os direitos, e prerogativas da Família Imperial.

Art. 11. Realisado o caso de sahir do Imperio Sua Alteza Imperial, se lhe entregará, por huma vez somente, na forma do artigo 113 da Constituição, a quantia de setecentos e cincoenta contos de réis, segundo o Padrão Monetário, além da somma marcada no artigo 4º da presente Lei para enxoval.

Art. 12. As disposições relativas ao Casamento de Sua Alteza Imperial são inteiramente applicáveis ao Consorcio da Princeza a Senhora D. Francisca.

Art. 13. Ficão derogadas todas as Leis em contrario. (Grifei.)

Em nova atividade legislativa, a “Assembléa Geral” aprovou a Lei n. 1.217, de 7 de julho de 1864, que apenas alterou a Lei n. 166, de 29 de setembro de 1840, quanto aos valores das dotações e das despesas relacionadas, especificamente, às Princesas Isabel e Leopoldina. Confira-se o texto do referido diploma:

Art. 1º Ficão em vigor, para a dotação de Sua Alteza Imperial A Senhora D. Izabel, as disposições da Lei numero cento e sessenta e seis de vinte e nove de Setembro de mil oitocentos e quarenta, com as seguintes alterações:

§ 1º Quando se realizar o Consorcio de Sua Alteza Imperial, será a sua dotação de cento e cincoenta contos de réis, cessando desde então os alimentos, que actualmente percebe, e será paga pela fórma, por que o é a de Sua Magestade o Imperador.

§ 2º Fica decretada a quantia de trezentos contos de réis para a acquisição de predios, destinados á habitação de Sua Alteza Imperial e seu Augusto Consorte.

Emquanto se não effectuar esta acquisição, será pago pelo Thesouro, na razão de seis por cento para o mesmo fim mais idoneos.

  • 3º Fica decretada a quantia de duzentos contos de réis para as despezas do enxoval e outros objectos do serviço dos Augustos Consortes.
  • 4º Sahindo Sua Alteza Imperial para fóra do Imperio, se lhe entregará por uma só vez, na fórma do artigo cento e treze da Constituição Politica, o dote de mil e duzentos contos de réis.

Art. 2º As disposições relativas ao Consorcio de Sua Alteza Imperial são inteiramente applicaveis ao de Sua Alteza a Senhora D. Leopoldina.

Art. 3º Ficão revogadas as disposições em contrario. (Grifei.)

Quanto ao mais, permaneceu íntegra a Lei n. 166, de 29 de setembro de 1840.

Apenas para facilitar a melhor compreensão e poder extrair dos próprios textos legais da época seus verdadeiros objetivos, com as limitações que possam ter, cumpre rememorar o conceito de dote.

Para Pontes de Miranda, “Dote é a porção de bens, que a mulher, ou alguém por ela, transfere ao marido, para com os frutos e rendimentos provenientes dele, sustentar os encargos do matrimônio, sob as cláusulas de incomunicabilidade e restituição de tais bens, ou do seu valor, quando se dissolver a sociedade conjugal” (Tratado de Direito Privado. São Paulo: RT, 2012 – atualização –, Parte Especial, Tomo VIII, p. 463). Na hipótese de reversão: “Se no contrato dotal se estipulou a reversão do dote ao dotador, é óbvio que o benefício da restituição cabe a esse, e não à dotada, ou seus herdeiros” (ob. cit. p. 506).

Alexandre Corrêa e Gaetano Sciascia, por sua vez, destacam que, na evolução do Direito Romano, o direito de propriedade antes conferido ao marido que tenha recebido dote perdeu corpo, assim:

Por influência da regulamentação do matrimônio cum manu, os bens dotais passam a ser propriedade do marido. Mas, desde o período republicano via se desenhando uma corrente pela qual, do ponto de vista econômico, o dote se considera res uxoria, e. é., da mulher. Os escândalos dos frequentes divórcios facilitam o desenvolvimento do princípio jurídico pelo qual quamvis in bonis mariti dos sit, mulieris tamen est. Assim, do ponto de vista jurídico, a propriedade do dote é do marido, mas os seus poderes são limitados pelo direito; e dissolvendo-se o matrimônio tem que restituir os bens dotais.

[…]

Na legislação justinianéia as duas ações clássicas, actio ex stipulatu e actio rei uxoriae se encontram fundidas na actio ex stipulatu, chamada também actio de dote. Tem caráter equitativo e cabe não somente a quem precedentemente fêz a stipulatio, mas a quem quer que constitui o dote; além disso a ação é transmissível ativa e passivamente. O processo de transformação se consumou: o marido já não é proprietário, mas somente usufrutuário dos bens dotais, como no direito moderno. Quem constituiu o dote tem sôbre os bens do marido hipoteca tácita, que legalmente garante a restituição dotal. (Manual de Direito Romano. 6ª ed. São Paulo: RT, 1988, págs. 106/108.)

Com base nas leis referidas, de caráter especial, portanto, em 1865 foi adquirido de um comerciante português, chamado José Machado Coelho, um palacete situado na antiga Rua Paissandu com a Rua Guanabara, atual Rua Pinheiro Machado, distrito de Laranjeira, pelo preço de 250:000$000 (duzentos e cinquenta contos de réis). A construção de tal palacete se deu em uma propriedade anteriormente denominada “Chácara do Rozo”, de Domingos Francisco de Araújo Rozo. A obra teve início em 1853 e foi utilizada como residência particular pelo alienante José Machado Coelho até 1860. Após sua aquisição e reforma, o palacete se tornou a residência do Conde e da Condessa d’Eu e ficou conhecido como Paço Isabel ou Palácio Isabel, atual Palácio Guanabara.

O Palácio Isabel passou a integrar um patrimônio ainda maior – considerado “proprio nacional” – quando estabelecidos em benefício do casal, Conde e Condessa d’Eu, bens consistentes em terras nas Províncias de Santa Catharina e de Sergipe, mediante a aprovação da Lei n. 1.904, de 17 de outubro de 1870, com o seguinte teor:

Art. 1º Fica estabelecido para Sua Alteza Imperial a Senhora D. Izabel Christina e seu Augusto Esposo, nos termos do respectivo contrato matrimonial, um patrimonio em terras, constante de duas porções, cada uma de 49 leguas quadradas, sendo uma na Provincia de Santa Catharina e outra na de Sergipe, ou em qualquer outra Provincia do Imperio, se porventura nesta ultima não houver porção de terras sufficiente; podendo os lotes conter no minimo até 6 leguas quadradas.

Este patrimonio, do qual fará parte o predio comprado para habitação de Suas Altezas, será considerado como proprio nacional, com o destino que lhe é dado, e nos termos do mesmo contrato matrimonial.

É porém, permitida a venda de metade das terras a colonos que as venhão cultivar, sendo o producto liquido da alienação empregado em apolices da divida publica fundada do Imperio, as quaes, inscriptas como inalienaveis no grande livro, farão parte do patrimonio de Suas Altezas.

Art. 2º As ditas terras serão medidas e tombadas á custa do Thesouro Nacional; e á custa de Suas Altezas as medições das subdivisões para venda, e neste caso empregado em apolices inalienaveis o produto liquido.

Fica para esse fim concedido ao Governo um credito de 35:000$000.

Art. 3º Ficão revogadas as disposições em contrario. (Grifei.)

Aliomar Baleeiro, comentando a Constituição de 1891, assim descreve, os pródomos da República e o clima emocional do período 1880-91:

O povo brasileiro cansara-se da monarquia, cuja modéstia espartana não incutia nos espíritos a mística e o esplendor dos tronos europeus. O Imperador vestia trajes civis, pretos, como qualquer sujeito respeitável da época, sem as fardas de dourados, de almirante e general, as condecorações, crachás que impressionam o homem da rua. Conta-se que a Princesa Imperial trazia consigo, no decote, fósforos para acender ela mesma as velas à boca da noite.

O Conde D’Eu era cordialmente detestado e temia-se que viesse a manter sua copa-e-cozinha política quando o sogro fechasse os olhos. E a moléstia do Imperador, em 1888, tornava esse perigo muito próximo.

Passada a euforia da promulgação da Lei de 13 de maio de 1888, com a qual D. Isabel acreditara ganhar durável popularidade, o País sentiu na carne as consequências do gesto generoso que, como o Barão de Cotegipe profetizou à Princesa, lhe custaria a perda do trono.

Não foram previstas medidas de gradual adaptação dos ex-escravos aos trabalho livre, nem de amparo à produção agrícola, a básica do País na época.

Em sua ingenuidade primitiva, muitos africanos ou filhos deles, recém-libertados, pensavam que poderiam subsistir sem a dureza do trabalho quotidiano e árduo.

Depois de dias de festejos e batucada, quase todos abandoraram as fazendas e procuraram viver de biscates nas cidades, saturando o mercado de trabalho. O impacto sobre a produção foi tremendo, embora para os Estados do Sul, nos dois anos anteriores a 1888, fossem importados milhares e milhares de imigrantes italianos. A substituição do braço escravo pelo livre importava a necessidade de aumento do numerário para pagamento semanal e regular dos trabalhadores assalariados.

Por outro lado, Afonso Celso  (Visconde de Ouro Preto), o último Presidente de Gabinete, procurou aplacar a ira dos fazendeiros desapossados dos escravos, facilitando-lhes o crédito para manutenção do trabalho agrícola por homens livres. Como isso exigia vultosas emissões, manifestou-se, desde 1888 e primeiro semestre de 1889, um impulso inflacionário com inevitável reflexo no valor do mil-réis, que estava, antes ao par, na relação de 27 pence por Rs. 1$000. Logo o câmbio baixou, subindo celeremente o valor da libra esterlina em relação ao mil-réis.

Afonso Celso, estadista enérgico e competente, lutou como um leão na arena econômica e na política, metralhado pelos artigos que Rui escrevia, cada manhã, no Diário de Notícias, na lenta erosão do que restava do prestígio do trono e do regime.

As questões militares dos anos anteriores distruíram a disciplina do Exército, solidarizando generais com subalternos, nas hostilidades ostensivas ao Ministério Civil.

Por outro lado, o establishment dos velhos políticos, dos barões, viscondes e marqueses, banqueiros e exportadores, desfalcadas as fileiras pela deserção dos fazendeiros e militares, não conseguira captar a lealdade dos filhos, os jovens, que desde 1870 se deixavam fascinar pela sereia republicana, ou pelo positivismo e pelas instituições norte-americanas, às quais creditavam o formidável desenvolvimento econômico dos Estados Unidos nos dois decênios após o término da Guerra de Secessão. Nas classes médias, muitas crianças nascidas por esse tempo ganhavam como prenome ‘Washington’, ‘Hamilton’, ‘Jefferson’, do mesmo modo que um menino nascido em meio do século XIX, no fastígio da Carta de 1824, fora batizado Benjamin Constant Botelho de Magalhães.

Os que esperavam ascensão social e política com o próximo 3º reinado armaram o braço ameaçador dos libertos da ‘Guarda Negra’ e dos capoeiristas contra os propagandistas da Republica. Um deles, Silva Jardim, escapou do assassínio.

E, por fim, a velha estrutura monárquica, que, somada à tradição, contava oito séculos, desmoronou-se toda em poucas horas na madrugada de 15 de novembro.

(Constituições Brasileiras. 3ª ed. Brasília: Edição do Senado Federal, 2012, vol. II, págs. 11/12.)

Com a proclamação da República, foi enviada ao Imperador, D. Pedro II, no dia 16 de novembro de 1889, mensagem do Governo Provisório informando acerca da abolição da monarquia e intimando-o para que a família imperial deixasse o País em 24 horas. Segundo texto reproduzido em obra de Paulo Bonavides e de Paes de Andrade, quanto às garantias e aos direitos assegurados à família imperial, assim constou da referida mensagem:

[…]

O transporte vosso e dos vossos para um porto da Europa correrá por conta do Estado, proporcionando-vos para isso o governo provisório um navio com a guarnição militar precisa, efetuando-se o embarque com a mais absoluta segurança de vossa pessoa e de toda a vossa família, cuja comodidade e saúde serão zeladas com o maior desvelo na travessia, continuando-se a contar-vos a dotação que a lei vos assegura, até que sobre esse ponto se pronuncie a próxima Assembleia Constituinte. Estão dadas todas as ordens a fim de que se cumpra esta deliberação. O país conta que sabereis imitar, na submissão ao seus desejos, o exemplo do Primeiro Imperador, em 7 de abril de 1831. Rio de Janeiro, 16 de novembro de 1889. – Manuel Deodoro da Fonseca. (História Constitucional do Brasil. 1ª ed. Brasília: Ed. Paz e Terra, 1989, pp. 640/641.)

O embarque para o exílio deu-se na madrugada de 17 de novembro de 1889 sem resistência do Imperador.

O Governo Provisório editou, ainda, o Decreto n. 2, de 16 de novembro de 1889, concedendo à família imperial quantia necessária ao seu estabelecimento no exterior (5.000:000$000 – cinco mil contos de réis), com o seguinte texto:

O Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, querendo prover á decência da posição da família que acaba de ocupar o trono do país, e ás necessidades do seu estabelecimento no estrangeiro, resolve:

Art. 1º É concedida á família imperial, de uma vez, a quantia de cinco mil contos de réis.

Art. 2º Esta concessão não prejudica as vantagens asseguradas ao chefe da dinastia deposta e sua família na mensagem do Governo Provisório, datada de hoje.

Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário.

No entanto, o imperador deposto, por meio de carta, recusou a indenização, por entendê-la ilegal e arbitrária.

A respeito da referida ajuda financeira, o historiador Laurentino Gomes escreveu:

Pouco antes da partida, um oficial subiu a bordo com a notícia de que o governo republicano daria uma ajuda de 5 mil contos de réis para custear as despesas do imperador no exílio. Era uma grande fortuna na época, equivalente a cerca de 70 milhões de dólares ou 150 milhões de reais hoje, mas dom Pedro II limitou-se a receber o papel, sem dar uma resposta conclusiva. Esse gesto seria motivo de uma grande controvérsia nos anos seguintes. Para o governo republicano, dom Pedro ao receber o documento havia, implicitamente, aceitado a ajuda financeira. Isso faria com que, ao chegar a Portugal semanas mais tarde, fosse acusado por um jornalista de ter “vendido a Monarquia brasileira” por uma soma em dinheiro.

O fato é que, ao chegar a São Vicente, no arquipélago de Cabo Verde, duas semanas após a partida do Brasil, dom Pedro enviaria uma carta ao governo provisório renunciando formalmente a qualquer ajuda financeira, além do salário mensal a que já tinha direito por lei enquanto monarca. A atitude foi considerada insolente pelo governo republicano, que, em represália, resolveu banir para sempre a família imperial do território brasileiro. A renúncia ao dinheiro custaria também grandes humilhações a dom Pedro, obrigado a recorrer a empréstimos de amigos para pagar suas contas na Europa até morrer, em 1891. (1889: Como um Imperador Cansado, um Marechal Vaidoso e um Professor Injustiçado Contribuíram para o Fim da Monarquia e a Proclamação da República no Brasil. 1ª ed. São Paulo: Editora Globo S.A., 2013, pp. 294/295)

Em consequência dessa resposta, o Governo Provisório decretou o banimento da Família Imperial e a proibição de ter bens no Brasil. Eis o inteiro teor do Decreto n. 78-A, de 21 de dezembro de 1889:

O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisório, constituído pelo Exército e Armada, em nome da Nação, considerando:

que o Sr. D. Pedro de Alcantara, depois de acceitar e agradecer aqui o subsidio de 5.000:000$ para ajuda de custo do seu estabelecimento na Europa, ao receber das mãos do general, que lh’o apresentou, o decreto onde se consigna essa medida, muda agora de deliberação, declarando recusar semelhante liberalidade;

que, repellindo esse acto do Governo Republicano, o Sr. D. Pedro de Alcantara pretende, ao mesmo tempo, continuar a perceber a dotação annual sua e de sua familia em virtude do direito que presume subsistir-lhe por força da lei;

que essa distincção envolve a negação evidente da legitimidade do movimento nacional, e encerra reivindicações incompatíveis hoje com a vontade do paiz, expressa em todas as suas antigas provincias, hoje Estados, e com os interesses do povo brazileiro, agora indissoluvelmente ligados à estabilidade do regimen republicano;

que a cessação do direito da antiga familia imperial á lista civil é consequencia immediata da revolução nacional, que a depoz, abolindo a monarchia;

que o procedimento do Governo Provisorio, mantendo, a despeito disso, essas vantagens ao principe decahido, era simplesmente uma providencia de benignidade republicana, destinada a attestar os intuitos pacificos e conciliadores do novo regimen, ao mesmo tempo que uma homenagem retrospectiva á dignidade que o ex-imperador occupara como Chefe do Estado;

que a attitude presentemente assumida pelo Sr. D. Pedro de Alcantara neste assumpto, presuppondo a sobrevivencia de direitos extinctos pela revolução, contém o pensamento de desautoral-a, e anima velleidades inconciliaveis com a situação republicana;

que, conseguintemente, cessaram as razões de ordem politica, que se inspirara o Governo Provisorio, proporcionando ao Sr. D. Pedro de Alcantara o subsidio de 5.000:000$, e respeitando temporariamente a sua dotação;

Decreta:

Art. 1º É banido do territorio brazileiro o Sr. D. Pedro de Alcantara, e com elle sua familia.

Art. 2º Fica-lhes vedado possuir immoveis no Brazil, devendo liquidar no prazo de dous annos os bens dessa especie, que aqui possuem.

Art. 3º É revogado o decreto n. 2 de 16 de novembro de 1889, que concedeu ao Sr. D. Pedro de Alcantara 5.000:000$ de ajuda de custo para o seu estabelecimento no estrangeiro.

Art. 4º. Consideram-se extinctas, a contar de 1 desse mez, as dotações do Sr. D. Pedro de Alcantara e sua familia.

Art. 5º Revogam-se as disposições em contrario. (Grifei.)

Veja-se que, inicialmente, foi imposto à família imperial o exílio, instituto correspondente ao estado de residir longe da própria casa, no caso em outro país, conceito que se aproxima da pena de desterro disciplinada no art. 52 do Código Criminal do Império (Lei de 16 de dezembro de 1830). Posteriormente, pelas razões invocadas no decreto citado, o exílio foi convolado em banimento político, mais abrangente e que outrossim envolvia a perda de outros direitos, semelhante à pena de banimento judicial assim definida à época pelo referido Código:

Art. 50 A pena de banimento privará para sempre os réos dos direitos de cidadão brazileiro, e os inhibirá perpetuamente de habitar o território do Império.

Os banidos, que voltarem ao territorio do Imperio, serão condemnados á prisão perpetua.

Seguindo tais disposições, editadas após a proclamação da República, foi baixado o Decreto n. 1.050, de 21 de novembro de 1890, efetivando a incorporação ao domínio nacional das terras cedidas à Condessa d’Eu – Princesa Isabel –, nos seguintes termos:

Art. 1º Ficam incorporadas ao dominio nacional as terras situadas nos Estados do Paraná e de Santa Catharina, concedidas, a titulo de dote, á Condessa d’Eu, ex-princeza imperial do Brazil.

Art. 2º Ficam revogadas as disposições em contrario.

É de conhecimento público e notório, conforme revela a historiografia constitucional brasileira, que a “Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil”, promulgada em 24 de fevereiro de 1891, ratificou a igualdade a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil perante a lei, extinguindo expressamente todos os privilégios de nascimento, ordens honoríficas, títulos de nobreza. Para ilustrar, é oportuno reproduzir a norma do art. 72, § 2º, com o seguinte teor:

Art. 72. […]

§ 2º Todos são iguais perante a lei.

A República não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho.

Nas “Disposições Transitórias”, mais especificamente no art. 7º, entretanto, por uma questão de deferência ao governante deposto, abriu-se exceção à regra do art. 72, § 2º, criando uma pensão vitalícia ao ex-Imperador, assim:

Art. 7º – É concedida a D. Pedro de Alcântara, ex-Imperador do Brasil, uma pensão que, a contar de 15 de novembro de 1889, garanta-lhe, por todo o tempo de sua vida, subsistência decente. O congresso ordinário, em sua primeira reunião, fixará o quantum desta pensão.

Com fundamento do art. 7º das “Disposições Transitórias” da Carta de 1891, então, o Congresso Nacional aprovou a Lei n. 20, de 22 de outubro de 1891, fixando o pensionamento anual em 120:000$ (cento e vinte contos de réis), possuindo tal diploma o teor seguinte:

Art. 1º É fixada em 120:000$ annuaes a pensão a que tem direito D. Pedro de Alcantara, ex-Imperador do Brasil, a contar de 15 de novembro de 1889.

Art. 2º O pagamento desta pensão se fará por meio de prestações mensaes ao cambio de 27 dinheiros por 1$, pagando-se de uma só vez todas as prestações vencidas até á data da publicação desta lei.

Art. 3º O Presidente da Republica é autorizado, na deficiencia da receita, a fazer as operações de credito necessarias para o dito pagamento.

Art. 4º Revogam-se as disposições em contrario. O Ministro de Estado dos Negocios do Interior assim o faça executar.

Observo, todavia, que, segundo alguns historiadores – dentre eles Aristides A. Milton (A Constituição do Brazil – Notícia Historica, Texto e Commentario. 2ª ed. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1898) –, o ex-Imperador nunca recebeu tal pensionamento, tendo falecido, vale registrar, no dia 5.12.1891, em Paris, França.

Em 18 de julho de 1891, o Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, como Presidente da República, editou o Decreto n. 447 – entre, portanto, a promulgação da “Constituição da República dos Estados Unidos do Brasi”, de 24 de fevereiro de 1891, e a Lei n. 20, de 22 de outubro de 1891 –, efetivando formalmente a incorporação do patrimônio da ex-Princesa Isabel aos próprios nacionais, assim justificando e estabelecendo:

Considerando que o dote instituido em favor da ex-princeza D. Isabel, condessa d’Eu, e ao qual se referem as leis ns. 166 de 20 de setembro de 1840, 1217 de 7 de julho de 1864 e 1904 de 17 do outubro de 1870, e o contracto de 11 de outubro de 1864, tirava sua razão de ser e se fundamentava em o regimen politico então vigente o que – suppunha-se – seria perpetuo;

Considerando que, tanto esse dote como a lista civil annualmente decretada, significavam um auxilio para que a princeza imperial, e com ella o seu consorte, pudessem manter a representação e decóro social compativeis com a elevada posição que occupava na monarchia e com a qualidade de futura depositaria das funcções magestaticas, como se evidencia do elemento historico daquellas leis;

E pois

Considerando que o patrimonio politico, assim constituido para fins e sob leis especiaes, sómente poderia existir emquanto se não verificasse o implemento da condição resolutiva a que estava naturalmente subordinado: a extincção do regimen monarchico; e, dado este facto, devem os bens ser devolvidos ao dominio pleno do Estado, que aliás reservou sempre para si a nua-propriedade sobre elles;

Considerando que nas mesmas condições de taes bens se acha o immovel denominado – palacete Leopoldina –, em cujo uso-fructo estava investido do ex-principe D. Pedro, como filho primogenito da princeza D. Leopoldina, Duqueza de Saxe, fallecida, em 1871;

Considerando, finalmente, que o compromisso assumido pelo Governo Provisorio em 15 de novembro de 1889, no sentido de “reconhecer e acatar todos os compromissos nacionaes contrahidos durante o regimen anterior, os tratados subsistentes com as potencias estrangeiras, a divida publica externa e interna, os contractos vigentes e mais obrigações legalmente contrahidas”, não póde evidentemente referir-se ás leis citadas, as quaes por essa occasião já haviam caducado de para com a monarchia, de que eram immediato consectario;

Resolve decretar, ampliando o disposto no decreto n. 1050 de 21 de novembro de 1890, que providenciou sobre as terras situadas nos Estados do Paraná e de Santa Catharina, que faziam parte do alludido patrimonio:

Art. 1º Ficam incorporados aos proprios nacionaes todos os bens que constituiam o dote ou patrimonio concedido por actos do extincto regimen á ex-princeza imperial D. Isabel, Condessa d’Eu; bem assim o immovel denominado – palacete Leopoldina – e sito á rua Duque de Saxe.

Art. 2º Revogam-se as disposições em contrario.

Cumpre registrar que o período era marcado por convulsões em todo o País. Deodoro, em 03.11.1891, três semanas antes de sua renúncia, dissolveu o Congresso Nacional e instaurou o estado de sítio, suspendendo todos os direitos individuais e políticos previstos na nova Constituição republicana. Floriano Peixoto, com o argumento da ameaça da restauração da monarquia, tendo em vista a desilusão com o novo regime, governou o País com mão de ferro. Sob os influxos da Segunda Revolta da Armada, em 1893, novamente suspendeu as garantias constitucionais, decretando estado de sítio. O Rio de Janeiro encontrava-se debaixo do risco de bombardeio. Nesse contexto, houve a ocupação do Palácio Guanabara, com o suposto propósito de se instalar, ali, um hospital militar.

O panorama histórico e legislativo acima demonstra que o atual Palácio Guanabara foi adquirido para os fins específicos previstos na Constituição do Império e posterior legislação infraconstitucional, de caráter especial, em consequência de obrigações do Estado, vinculadas à monarquia e ligadas ao alto decoro do trono nacional, da família imperial e sua ordem de sucessão.

São neste sentido as conclusões do acórdão recorrido, à fl. 279 (e-STJ):

Verifica-se que tanto as declarações da escritura, como as cláusulas do contrato nupcial e os artigos de lei transcritos, todos, sem exceção, fazem certo que o imóvel em questão foi comprado com o dinheiro do Tesouro para o fim específico e exclusivo de proporcional uma habitação para a Princesa Imperial D. Isabel, que se casara com o Conde d’Eu e que seria, na ausência de filhos varões, a herdeira do trono.

[…]

Evidentemente, a extinção do regime monárquico, com o desterro de toda a família imperial, fez cessar a destinação do imóvel, desaparecendo a razão pela qual fora ele comprado.

O imóvel tinha destinação exclusiva: servir de moradia aos herdeiros do trono, membros da família imperial. Ora, com a substituição da monarquia pela república não há que se falar mais na figura do imperador, nem em príncipes, nem em princesas, cessando, “ipso facto”, a razão pela qual o imóvel era utilizado, devendo retornar ao patrimônio da União, de onde na verdade nunca saiu, pois foi adquirido como “próprio nacional”, a teor do art. 7º da Lei nº 166.

Após examinar os textos legais, o respectivo contrato de casamento e a escritura de aquisição do imóvel, concluiu o TRF 2ª Região (e-STJ fls. 280/281):

[…] os bens não foram atribuídos a pessoas privadas, mas a representantes da nação, enquanto detentores deste título, e não podiam acompanhá-los quando perderam essa qualidade, ou seja, quando extinto o regime monárquico.

O que existia, na realidade, era um mero direito de habitação, restituindo-se o prédio ao proprietário. E como se se não bastassem os fatos, por si sós, para que fossem devolvidos os bens, foi editado o Decreto nº 447, determinando a incorporação dos bens dotais ao patrimônio da União, embora, ressalte-se, na realidade eles nunca tivessem deixado de integrá-lo.

Com efeito, com a proclamação e a institucionalização da República, as circunstâncias fundamentais que justificavam a manutenção da posse do palácio pela família imperial deixaram de existir, tendo em vista que o novo regime constitucional republicano extinguiu todas as prerrogativas, privilégios, regalias e títulos nobiliárquicos inerentes à monarquia. Em decorrência, as antigas obrigações do Estado perante a família imperial foram revogadas ipso factopela nova ordem imposta, entre as quais a posse do imóvel de que trata a ação.

As fontes citadas também permitem responder a indagação se, em relação ao imóvel em apreço, o dote implicou transmissão de domínio pleno em favor do casal.

No ponto, entendo, não se ter caracterizado concessão de qualquer direito de propriedade aos ilustres e respeitáveis ascendentes dos recorrentes.

Com efeito, a “Constituição Política do Império do Brasil”, outorgada pelo Imperador D. Pedro I em 25 de março de 1884, no seu art. 112, determinava que, “quando as Princezas houverem de casar, a Assembléa lhes assignará o seu Dote”, encerrando os alimentos previstos no art. 109. No entanto, a norma constitucional não estabeleceu os contornos jurídicos e os efeitos do referido dote, ficando a cargo da Assembleia Geral defini-los.

Em tais condições, o Poder Legislativo editou a Lei n. 166, de 29 de setembro de 1840, acima reproduzida, segundo a qual os prédios adquiridos com o propósito de fornecer decente habitação aos recém-casados constituirão patrimônio “consignado como próprio nacional” “quando não haja, ou se acabe a referida sucessão” (arts. 3º, 5º, 6º e 7º).

Evidentemente que, nessa época, não se cogitava da abolição da monarquia, daí que, em tese, o fim da sucessão se daria apenas quando o casal não deixasse prole ou outros sucessores previstos na legislação então em vigor, caso em que se escolheria uma nova dinastia. No entanto, a instituição da república e o fim da monarquia qualificou uma nova hipótese de “fim da sucessão” de tais privilégios, reforçando a ideia de que o imóvel em apreço tratar-se-ia de próprio nacional, definido por Pedro Nunes como bem imobiliário, da propriedade que faz “parte do patrimônio privado de uma entidade de direito público interno: próprios nacionais, estaduais ou municipais” (Dicionário de Tecnologia Jurídica. 13ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 875). De Plácido e Silva, em obra atualizada por Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho, define “próprios nacionais” como sendo “expressão usada para determinar o conjunto de bens pertencentes ou de propriedade do Estado. Corresponde a bens do domínio da União” (Vocabulário Jurídico. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 1.119). Essas definições, a propósito, remontam ao Brasil Império, podendo-se citar a definição apresentada por Augusto Teixèira de Frêitas Senior em 1883:

— Proprios Nacionáes (Consolid. das Lêis Civ., Art. 59) são os bêns como táes incorporados, e assentados nos Livros d’êlles; isto é, os que se-adquirirão para a Fazenda Nacionál por algum titulo; em cujo numero entrão as Fortalêzas, Fontes, Castellos, Baluartes, Cidadellas, , com tôdos os seus pertences: (in Vocabulario Juridico. Rio de Janeiro: B.L. Garnier – Livrêiro-Editor, 1883.)

Tal dicionário jurídico, como se pode verificar, faz remissão ao conceito inserido no art. 59 da Consolidação das Leis Civis de 1858, igualmente elaborado por Teixeira de Freitas, encomendada pelo governo imperial, com o seguinte teor:

Art. 59. São proprios nacionaes os bens como taes incorporados, e assentados nos Livros delles; isto é, os que se-adquirirão para a Fazenda Nacional por algum titulo, ou em virtude de Lei; em cujo numero entrão as fortalezas, fortes, castellos, baluartes, cidadellas, com todos os seus pertences.

Revela-se oportuno destacar que o art. 6º da Lei n. 166/1840 invoca, apenas a título de ordem de sucessão, a disciplina contida na “Ordenação, Livro 4º, Título 100”, que dispõe sobre o morgado e bens vinculados, que não podiam ser alienados ou divididos, passando ao primogênito ou, na falta deste, na respectiva ordem estabelecida no referido diploma. A propósito, a título de ilustração, De Plácido e Silva assim define “morgado”:

MORGADO. Derivado de majoratus, de baixa latinidade, era o vocábulo empregado na terminologia do Direito antigo, para indicar o vínculo instituído a certos bens, a fim de que se transmitam seguidamente aos sucessores, com a mesma imposição, sem se poderem vender ou dividir.

O morgado, assim, apresentava-se perpétuo e indivisível, e tinha por objetivo manter os bens assim vinculados para conservação do nome e esplendor da família.

O herdeiro do morgado era o primogênito. E a este, por extensão, também se dava a denominação de morgado.

E designava, ainda, o direito de suceder nos bens vinculados ou que constituíram o morgado. (Vocabulário Jurídico. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 931.)

Anos depois da edição da Lei n. 166, de 29 de setembro de 1840, a Assembleia, em 7 de julho de 1864, aprovou a Lei n. 1.217, que tão somente modificou os valores das dotações e das despesas relacionadas às Princesas Isabel e Leopoldina, deixando ainda mais claro, no art. 1º, § 2º, que os prédios se destinariam especificamente a uma digna “habitação de Sua Alteza Imperial e seu Augusto Consorte”.

Finalmente, a Lei n. 1.904, de 17 de outubro de 1870, de forma ainda mais explícita, declarou que as terras adquiridas em Santa Catarina e em Sergipe e os prédios destinados à habitação do casal imperial constituiriam patrimônio “considerado como proprio nacional”. Permitiu a venda da metade das referidas terras a colonos, mas impôs que o produto líquido da alienação fosse utilizado na aquisição de apólices da dívida publica, inscritas como inalienáveis. Veja-se, portanto, que a ideia era impedir que o patrimônio fosse retirado da esfera de domínio do Estado ou do âmbito da família imperial. Vedava-se, pois, ao casal conferir nova destinação de tais bens, diversa da que lhes indicasse a legislação então vigente.

Em tal contexto fático e jurídico, o Conde e a Condessa d’Eu detinham a posse do Palácio Isabel, hoje Palácio Guanabara, tão somente para fins de direito de habitação, não possuindo o domínio sobre tal imóvel. Adquirido apenas para satisfazer a constituição de dote em favor da família imperial, a propriedade sempre foi do Estado, sendo considerado, desde a compra, próprio nacional. Sob o enfoque da organização vertical da posse, tratada pelo Ministro aposentado do STF José Carlos Moreira Alves, na obra Posse – Estudo Dogmático (2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999), os recém-casados tinham a posse direta ou imediata (direito limitado à efetiva habitação), e o Estado, a posse indireta ou mediata, sem embargo da manutenção do domínio sobre o bem.

Com o fim da monarquia e a extinção dos privilégios de nascimento, portanto, caracterizou-se uma nova hipótese de “fim da sucessão” dos benefícios no âmbito da família imperial, cabendo o retorno da posse do respectivo bem e de outros dotes ao Estado.

Modernamente, encontram-se julgados dos tribunais, inclusive do STJ, a respeito de controvérsias jurídicas que – guardadas as devidas proporções, particularidades e nível de aplicação – possuem certo parentesco com o caso em exame. Trata-se da utilização do próprios nacionais residenciais por autoridades e servidores públicos investidos de cargos de governo ou funções de confiança.

Em tais circunstâncias, como deixaram de produzir efeitos jurídicos no regime republicano as designações de nobreza, encargos, privilégios e regalias que amparavam a posse do atual Palácio da Guanabara pelo Casal Imperial, e como tal imóvel sempre permaneceu sob o domínio do Estado, a improcedência da presente ação possessória deve ser mantida, à míngua de título que lhes pudesse garantir a posse. Irrelevante para o julgamento desta ação ajuizada em 1895, também pela ausência de direito possessório por parte dos autores, a forma pela qual o palácio foi ocupado após a Proclamação da República, a promulgação da Carta de 1891 e após o banimento da família real. Sem título possessório (título nobiliárquico e respectivos privilégios) e definitivamente impossibilitados, materialmente, também em decorrência do referido banimento, de exercer diretamente o direito de habitação, não há como acolher a proteção possessória.

Destaco que, pela natureza do direito constituído e de sua finalidade específica, estabelecidas na Carta Constitucional de 1824 e nas leis especiais que se seguiram, o exercício do direito de habitação pelos membros da família imperial, no presente caso, é intransferível e personalíssimo, não podendo ser repassado a terceiros, ainda que estivessem na posse do imóvel em nome dos supostos titulares.

Nesse ponto, diversamente do que alegam os recorrentes, desnecessário o exame de normas e disposições contidas nas Ordenações, na Lei da Boa Razão (Lei de 18 de agosto de 1769) e nas oriundas do Direito Romano para efeito de permitir que a família imperial, sob qualquer título, repassasse a terceiros o direito de habitação. A Lei de 20 de outubro de 1823, invocada no recurso especial pelos recorrentes, de fato, determinava no seu art. 1º que as Ordenações e as leis, entre outras, permaneceriam “em inteiro vigor na parte, em que não tiverem sido revogadas, para por ellas se regularem os negocios do interior deste Imperio, emquanto se não organizar um novo Codigo, ou não forem especialmente alteradas”. No entanto, o direito ao dote das princesas foi estabelecido e disciplinado posteriormente, pela Carta de 1824 e pelas leis especiais que se seguiram. Esses novos diplomas, que revelam o caráter personalíssimo do direito conferido à habitação da família imperial, é que devem ser observados para solução da lide.

Tal característica, a propósito, de modo ilustrativo, é apontada mais modernamente, também, por Orlando Gomes, nos seguintes termos:

O direito real de habitação também é personalíssimo.

A habitação é, atualmente, uso limitado, e, assim, espécie do direito real de uso. Perdeu, com efeito, sua significação de usufruto restrito. No direito alemão, qualifica-se entre as servidões pessoais limitadas, ao lado do usufruto e das servidões prediais.

Tal como o direito de uso, do qual é, afinal simples modalidade, o direito de habitação tem cunho personalíssimo, não podendo ser transferido, nem mesmo seu exercício. O titular o exerce, residindo na casa alheia. Tem, portanto, destinação invariável. A casa não pode ser habitada por outrem, nem ser usada para outro fim. (Ob. citada, p. 286.)

Com isso, igualmente em nada socorre os autores e seus sucessores o fato de, eventualmente, terem permanecido no imóvel, após o exílio e o banimento político, detentores – empregados e/ou guardiães e/ou procuradores – que representavam a família imperial. Sem título de posse para habitar e impossibilitados, definitivamente, de exercer a habitação, improcede a ação de força velha ajuizada pelo Conde e pela Condessa d’Eu.

A propósito, nos autos da ação reivindicatória em apenso (REsp n. 1.141.490/RJ), a União juntou, mediante certidão, como precedente, julgado do Supremo Tribunal Federal relativo à ação de força verdadeira proposta por D. Pedro Augusto de Saxe Coburgo Gotha e Bragança, representada por seu pai, o Duque de Saxe, contra a União, no qual buscava reaver o Palácio Leopoldina “com os rendimentos perdas e danos” (e-STJ fls. 319/339 – REsp n. 1.141.490/RJ). Os fatos da referida demanda são semelhantes aos destes autos, alegando o autor do referido processo que:

Diz o Duque de Saxe, mediante a presente ação de força verdadeira, na qualidade de curador de seu filho primogenito, Dom Pedro Augusto de Saxe Coburgo Gotha, que, desde dezoito de julho de mil oitocentos e sessenta e cinco, entrou o mesmo Duque com sua esposa Dona Leopoldina na legítima posse do Palácio Leopoldina e a conservaram sem contestação alguma até que, atingindo seu referido filho a maioridade, sendo já falecida sua mãi, sucedeu pela clausula quinta do acôrdo celebrado em oito de Maio de mil oitocentos e oitenta e oito no vinculo estabelecido na lei numero cento e seis de vinte e nove de setembro de mil oitocentos e quarenta e seis e lhe foi transferida a administração e usufruto do aludido palácio, continuando na posse mansa e pacifica dos primeiros possuidores; que no dia vinte e seis de setembro de mil oitocentos e noventa e um foi o mesmo prédio ocupado militarmente, sem intervenção do poder judiciário; que, a vista do exposto, pede que seja restituida a posse do palacio de que foi esbulhado violentamente o seu filho com os rendimentos, perdas e danos ou condenada a mesma Fazenda Nacional na pena da Ord. Livro: quatro, título cincoenta e oito, princ e mais a pagar-lhe todas as perdas e danos que se liquidarem na execução. (e-STJ fls. 326/327 – REsp n. 1.141.490/RJ.)

Da sentença proferida em 10 de abril de 1897, pelo Juiz Godofredo Xavier da Cunha, que ensejou a Apelação Cível n. 296/RJ, extrai-se a seguinte motivação, bastante consistente e representativa do pensamento político e das fontes jurídicas da época, sendo aplicável, em muito, ao presente caso, in verbis:

(…) considerando que entre esses pareceres deve prevalecer o das Faculdades Livres de Direito do Rio de Janeiro e os dos Doutores Brazilio dos Santos, João Vieira e Leovegildo Filgueiras, porque se trata de uma questão essencialmente política, ligada intimamente á instituição monarquica com a qual nasceu, viveu e morreu, devendo tudo quanto se relaciona com a referida questão ser decidido de acordo com as circunstancias politicas e os principios e disposições do nosso direito público; considerando que encarada essa questão como mista, sob o duplo ponto de vista do direito público e do direito civil, ainda assim as relações de carater público, dominadas pelo principio da superioridade, devem preponderar sobre as de carater privado, reguladas pelo principio da egualdade como ensina Paula Baptista no seu Compendio de Hermeneutica Juridica, paragrafo vinte e dois nas seguintes palavras: – “as leis constitucionais, na parte que estabelecem o regimen político e garantem os direitos individuais, exercem uma preponderancia decidida sobre todas as leis secundarias; e as que proclamam novos principios destroem as antigas que estão em oposição com elas, apenas representam um tempo que já acabou: – o que chama revogação implicita das leis; – considerando que não é nova essa questão, como diz o Douto Brasilio dos Santos, pois já foi debatida em França, a proposito do apanagio da familia Orleans, sendo resolvida pela assembléia nacional em mil setecentos e noventa e mil setecentos e noventa e um, pela convenção em mil setecentos e dois, de novo sujeita ás camaras francezas em mil oitocentos e quatorze, mil oitocentos e vinte e cinco e mil oitocentos e trinta e sete, variando sempre as respectivas decisões ao influxo dos diferentes regimens politicos daquela nação nas epocas mencionadas; – considerando de pleno acôrdo com o voto da minoria da Faculdade Livre de Direito da Bahia, baseado nas leis do tempo da monarquia, nas leis republicanas, nos autores patrios e estrangeiros por ela citados, que o poder legislativo, como delegação da nação, não podia ultrapassar as rais do seu mandato dando destino ou aplicação aos bens nacionais por mera liberalidade, sem ter em vista a utilidade pública; – que a nação no exercicio de sua soberania, e não no carater de parte contratante, fundou os patrimonios públicos dos principes, como acessorios e condições inseparaveis da monarquia, tendo por fim garantir a representação da dinastia e manter o seu decoro, fazendo refletir sobre ela o esplendor da corôa, cuja perpetuidade era o fundamento das leis; – que esses elementos são substanciais e não extrínsecos ás leis e constituem a sua causa, a sua razão de ser, que os direitos excepcionais garantidos á familia imperial constituiam privilégios, tendo sua justificação sómente no estado e posição especialíssima do chefe e membros da dinastia; que, adotada a forma republicana, cessou a condição, a qualidade, o estado, em suma, daqueles perdendo todos eles os privilégios inerentes ao seu antigo estado; – que, não obstante os pactos antenupciais assegurarem dotações aos principes–contratantes e alimentos aos seus filhos, cessou a sua prestação, como cessou a dotação do imperador, com a abolição da Constituição do imperio, que os garantia e o nascimento de novo direito público; que as leis de dotação regia, dominio da corôa e apanagio dos principes, conquanto produzem efeitos civis, prendem-se ao direito público de cada nação, passando por diversas evoluções e mudanças, e até extinguindo-se, segundo a variedade e transformação dos regimens politicos; que a Constituição da República não revalidou as leis citadas;” julgo improcedente a ação proposta para ser considerado o palácio Leopoldina como próprio nacional, afim de ser a Fazenda Nacional imitida na posse por meio do respectivo processo judicial e consequente processo de incorporação aos proprios nacionais, pagas as custas pelo autor, Dom Pedro Augusto de Saxe Coburgo Gotha e Bragança. (e-STJ fls. 329/331 – REsp n. 1.141.490/RJ.)

A improcedência da ação de força verdadeira foi mantida pelo STF na Apelação Cível n. 296/RJ, sendo oportuno reproduzir as seguintes passagens da fundamentação adotada no respectivo acórdão, proferido em 16 de março de 1898:

Não se trata, porem, desses bens; mas sómente do predio da rua Duque de Saxe, numero vinte e dois, denominado Palacio Leopoldina. – Com relação a este imovel não houve doação da propriedade, nem do usufruto. O direito conferido foi o de habitação. É o que se deduz das Leis que autorisaram o contrato. – COM EFEITO: – A lei numero cento e sessenta e seis de vinte e nove de setembro de mil oitocentos e quarenta, artigo terceiro, dispõe: “Fica consignada a quantia de cento e vinte contos de reis, para a acquisição de prédios, que ofereçam decente habitação a estes augustos esposos.” – A lei numero mil duzentos e dezessete de sete de Julho de mil oitocentos e sessenta e quatro, artigo segundo, dispõe: – “Fica decretada a quantia de trezentos contos de reis, para a acquisição de prédios destinados á habitação de Sua Alteza Imperial e seu augusto consorte.” – As leis numeros mil novecentos e quatro e mil novecentos e cinco de dezenove de Outubro de mil oitocentos e setenta declaram: – “Este patrimonio, do qual fará parte o prédio comprado para habitação de Suas Altezas…” – A lei numero dois mil e noventa e dois de vinte de outubro de mil oitocentos e setenta e sete, artigo dezenove, dispõe: – “Fica o Governo autorisado a permitir que se troque por apolices da divida pública o prédio comprado para residência da falecida princesa Dona Leopoldina e seu augusto esposo.” – Sempre as expressões – prédio para habitação, semelhantemente ao que dispoz a Constituição de mil oitocentos e vinte e quatro, artigo cento e quinze, sobre os palácios nacionais existentes e construção de outros, destinados à residência do Imperador. Ora, a habitação, considerada como direito real, não contem os atributos do direito de propriedade, nem os do direito de usufruto, mas, o de ocupar o predio, tirando dele mais ou menos proveito, conforme a intenção do instituidor. – E é bom de ver que sujeitando o palácio Leopoldina a esse onus, não podia a intenção da Nação, pelos seus legítimos representantes ser outra senão a de ser habilitado pela mãi do apelante e seus descendentes, não, por terceiros, gratuitamente ou por aluguel. – Estabelecida, assim, a natureza e extensão do direito adquirido pela mãi do apelante, segue-se que cessou, desde que o apelante, seu sucessor, não pode habitar o predio, em consequencia de estar banido do territorio brasileiro pelo decreto numero setenta e oito A de vinte e um de Dezembro de mil oitocentos e oitenta e nove. E é por cessar o direito de habitação, desde que não pode ser exercido, que a citada lei numero dois mil e noventa e dois de mil oitocentos e setenta e sete, além dos dois casos de reversão, estabelecidos pelas citadas leis numero cento e sessenta e seis de mil oitocentos e quarenta e numero mil duzentos e dezessete de mil oitocentos e sessenta e quatro – falta ou extinção da descendência – declarou o de mudança de residência para fora do pais. – Objeta-se que não pode a Nação tirar proveito, pela reversão, da mudança de residencia, quando foi ela que obrigou o apelante a fazer a mudança, decretando o seu banimento. – Quincunque sub conditione obligatus, curaverit ne conditio existeret, nihilominus obligatur: lei oitenta e cinco, D. de verb ob ligat. – A doutrina é fundada no direito romano,  e foi aceita pelos codigos modernos, como se vê do Italiano, artigo mil cento e setenta; mas, não tem aplicação. Da citada lei oitenta e cinco resulta que o implemento ou o não implemento da condição não aproveita aquele que, com o fim de resolver ou firmar o contrato, em seu proveito, consegue, por sua diligencia, (curaverit), realizar ou impedir o implemento da condição. Mas isso não se deu com o banimento do apelante. O Governo da República, não teve em vista a resolução do onus a que estava sujeito o prédio de propriedade da Nação: praticou um ato político, exigido pela estabilidade das novas instituições. […] Em todo caso, não tem aplicação a citada Ord., nem cabe ao apelante ação possessoria, desde que cessou o titulo da sua posse, o direito de habitação […]. (e-STJ fls. 334/337 – REsp n. 1.141.490/RJ.)

Ao rejeitar os respectivos embargos de declaração, o Supremo Tribunal Federal acrescentou que, “não obstante a natureza possessoria da ação proposta, o acórdão embargado fez abstração completa da posse violentada do esbulho, como se não fosse esse o objeto e fim da ação, para conhecer da propriedade por argumento tirado por interpretação de atos legislativos e do contrato matrimonial, por que reduz o morgado instituido no palacio Leopoldina á direito de habitação, extinto pela proclamação da Republica” (e-STJ fl. 339 – REsp n. 1.141.490/RJ). A propósito, é oportuno reportar ao parecer oferecido em 1938, nos autos do Agravo de Petição n. 8.261, pelo então 2º Procurador da República, Dr. LUIZ GALLOTTI, que, posteriormente, veio a ocupar assento no Supremo Tribunal Federal com indiscutível brilhantismo. Tal recurso de agravo foi interposto em ação ordinária proposta pela União contra o Sr. Joaquim Catramby, discutindo-se o domínio de duas casas alienadas pelo Duque de Saxe ao réu, então agravante. Entre os fatos históricos mencionados pelo douto Procurador, destaco a ausência de recolhimento da “sisa” (Serviço de Impostos de Sua Alteza), antiga denominação do atual imposto sobre transmissão inter vivos, por se tratar de próprio nacional, in verbis:

Premido pela exigência das provas do seu pretenso domínio, acabou o réu por juntar a escritura de fl. 168, pela qual o 1º Duque de Saxe, em 18 de julho de 1865, comprou o terreno, em que foram construídos, quer o palácio Leopoldina propriamente dito, quer as casas vendidas ao réu e que serviram de moradia aos atos dos principes D. Pedro e D. Augusto (fl. 7).

E com esse suposto titulo de domínio do 1º Duque de Saxe, pretende o réu haver dissipado todas as dúvidas!

Acontece, porem, que quem vendeu ao réu não foi o 1º Duque, foi o 2º. Logo, o domínio deste é que lhe cumpria provar. Isso sem falar que o réu não fez prova de ter comprado os terrenos.

Mas, na verdade, nem mesmo o 1º Duque jamais foi proprietário do imovel em apreço.

Na referida escritura de fl. 168, o Duque declara:

“que os prédios e chácara são adquiridos par os fins mencionados e nos termos dos arts 6º e 8º do contrato de casamento de Sua Alteza a Princesa Dona Leopoldina, com o mesmo Augusto Senhor e as disposições do auto de Aróca das ratificações da convenção matrimonial de Sua Alteza, firmada em Gotha, em 18 de fevereiro de 1865, e dos arts. 6º e 7º da lei de 28 de setembro de 1840, e §§ 1º e 2º da lei de 7 de julho de 1864” (fls. 169 e 169v.).

A seguir, vem a declaração de que a escritura “não paga sisa”, conforme Portaria do Ministério da Fazenda (fls. 169 v.).

A esse respeito, é interessante recordar o ofício que, em 27 de junho de 1865, poucos dias antes de ser lavrada a escritura, enviou o Marquês de Olinda, Ministro dos Negócios do Império, ao Mordomo da Casa de Sua Alteza o Duque de Saxe, nestes termos:

“Comunico a Vm., em resposta aos oficios que me dirigiu de ordem de Sua Alteza Real, o Sr. Duque de Saxe, em datas de 21 e 22 deste mês:

1º Que conforme se decidiu, em avisos deste Ministério, de 4 e 19 de janeiro último, por ocasião das compras dos prédios para habitação de S. A. Imperial e de seu Augusto Esposo, o Sr. Conde d’Eu, a compra dos prédios para habitação de S.A. a Sra. D. Leopoldina e de seu Augusto Consorte é isenta de pagamento de sisa, PELA RAZÃO DE QUE FICAM OS DITOS predios INCORPORADOS ao PATRIMONIO NACIONAL, nos termos dos arts. 6º e 7º, da lei n. 166 de 22 de setembro de 1840, e art. 1º, § 2º, de acordo com o art. 2º da lei n. 1.217, de 7 de julho de 1861, COMO PROPRIOS NACIONAIS, sujeitos, contudo, ao selo proporcional, à vista da disposição do art. 6º, § 1º do Regulamento de 26 de dezembro de 1860, e ao dos laudêmios municipais, si forem devidos.

2º Que nesta data requisito do Ministério da Fazenda a expedição das convenientes ordens não só para entrega da quantia de 300:000$000, que tem de ser empregada na aquisição de prédios, como da de d150:000$000, para perfazer a de 2000:000$000, destinada a enxoval e outros objetos de serviço, visto já ter verificado por conta desta, em 16 de dezembro do ano p p., o adiantamento de 50:000$000.

Deus guarde a Vm. – (ass.) Marquês de Olinda” (v. Rodrigo Otávio, Dominio da União e dos Estados, 2º ed., págs. 109-110).

Eis como conclue o insigne Rodrigo Otávio, depois de examinar os atos e leis antes referidos:

“Alem dos bens da Coroa, mesmo aqueles com os quais se faziam dotações a pessoas da familia imperial, reputavam-se próprios nacionais.

De acordo com esse princípio, os Palácios Isabel (atual Guanabara) e Leopoldina, adquiridos pelo Tesouro para habitação das duas filhas do segundo Imperador, foram comprados isentos de sisa e impostos de transmissão de propriedade, por serem considerados próprios nacionais, como expressamente o declararam as leis que constituiram o patrimônio dotal das duas princesas, e nessa qualidade se mandou demarcar o primeiro.

Com o advento da República, porem, todas estas distinções desapareceram. Em favor da Nação, que já tinha o dominio direto, consolidou-se o dominio desses bens, por ocasião da existência da monarquia e consequente cessação da sucessão de direitos excepcionais, até reconhecidos nas pessoas do monarca e dos descendentes, e tais bens foram, por atos expressos, mandados incorporar ao patrimônio nacional. Todos esses bens são hoje do dominio privado pleno da União” (op. cit., págs. 109 a 111).

Convem lembrar que a lei n. 1.905, de 17 de outubro de 1870, estabelecendo um patrimonio “para Sua Alteza a Sra. Leopoldina e seu Augusto Esposo, nos termos do respectivo contrato matrimonial”, dispõe de modo terminante no art. 1º, 2ª alínea:

“Este patrimônio, do qual fará parte o prédio comprado para habitação de suas altezas, será considerado como PRÓPRIO NACIONAL, com o destino que lhe é dado e nos termos do mesmo contrato matrimonial.”

Mais adiante, em seu parecer, o eminente Ministro LUIZ GALLOTTI, então 2º Procurador da República, igualmente se remete à ação de força verdadeira proposta por D. Pedro Augusto de Saxe Coburgo Gotha e Bragança, representado por seu pai, o Duque de Saxe, contra a União, julgada improcedente em primeiro grau, e mantida a sentença pelo Supremo Tribunal Federal na Apelação Cível n. 296/RJ, processo a que me referi anteriormente.

Por último, recebi memorial em nome dos recorrentes Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros, no qual afirmam que “também no direito comparado se observa a presença de precedentes favoráveis aos recorrentes” e que “talvez o caso que mais se assemelhe ao tratado nestes recursos é o do Rei da Grécia contra a Grécia no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos”. Sucede, porém, que respostas a pretensões na esfera da justiça transicional demandam uma dinâmica específica em relação à natureza da reparação que se pretende no âmbito dos regimes sucessores, matéria que refoge dos limites do recurso especial. A esse respeito, conforme anteriormente reproduzido, o Juiz de primeiro grau destacou em sua sentença, de 10.4.1897, que “não é nova essa questão, como diz o Douto Brasilio dos Santos, pois já foi debatida em França, a propósito do apanagio da familia Orleans, sendo resolvida pela assembleia nacional em mil setecentos e noventa e mil setecentos e noventa e um, pela convenção em mil setecentos e dois, de novo sujeita ás camaras francezas em mil oitocentos e quatorze, mil oitocentos e vinte e cinco e mil oitocentos e trinta e sete, variando sempre as respectivas decisões ao influxo dos diferentes regimens politicos daquela nação nas épocas mencionadas” (e-STJ fls. 329/330 – REsp n. 1.141.490/RJ – grifei).

Mesmo no Brasil, por ocasião da proclamação da Independência, em 7 de setembro de 1822, a ruptura com o regime colonial até então vigente atingiu profundamente o direito à propriedade. Transcrevo o inteiro teor dos decretos baixados logo após a separação entre Brasil e Portugal:

DECRETO — DE 12 DE NOVEMBRO DE 1822

Declara de nenhum effeito as graças e officios pertencentes a pessoas residentes em Portugal.

Tomando em madura consideração o solemne acto, pelo qual o heroico e brioso povo deste vasto e rico Imperio, proclamou a sua Independencia, e deixou de ser parte integrante da Nação Portugueza; reflectindo, outrosim, que pela separação dos dous Estados deve necessariamente caducar o direito que tinha todo o cidadão Portuguez á posse e gozo daquelles officios, graças e mercês, que lhe haviam sido conferidos e pagos pelos rendimentos do Brazil, emquanto unido a Portugal; sabendo além disto que ainda antes desta separação o Congresso ou o Governo de Lisboa, abusiva e escandalosamente havia dado a Portuguezes officios pertencentes a habitantes do Brazil, só pelo simples facto de não terem até então ido residir em Portugal, e por tão arbitrario procedimento se havia constituido primeiro quebrantador de um direito naquelle tempo incontestavel: Hei por bem, que todas e quaesquer graças, ou mercês, officios de Justiça ou Fazenda, concedidas, ou pertencentes a pessoas residentes em Portugal, fiquem de nenhum effeito desde a publicação deste Decreto, e tornem a entrar na massa geral das rendas do Imperio, para delles se dispor, como melhor convier aos interesses do mesmo. Os Meus Ministros de Estado, e do Meu Conselho, a quem o conhecimento e cumprimento deste pertencer, assim o tenham entendido e façam executar com os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro em 12 de Novembro de 1822.

Com a rubrica de Sua Magestade Imperial.

Martim Francisco Ribeiro de Andrada. (Grifei.)

DECRETO — DE 11 DE DEZEMBRO DE 1822

Manda sequestrar as mercadorias, predios e bens pertencentes a vassallos de Portugal.

Sendo bem patentes os escandalosos procedimentos e as hostilidades manifestas do Governo de Portugal contra a liberdade, honra e interesses deste Imperio, por cavillosas insinuações, e ordens do Congresso demagogico de Lisboa, que, vendo infructuosa a horrivel idéa de escravisar esta rica e vasta região, e seus generosos habitantes, pretende opprimil-os com toda a especie de males e horrores da perfidia e da guerra civil, que lhe tem suscitado seu barbaro vandalismo: E sendo um dos Meus principaes deveres, como Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo deste grandioso Imperio, Empregar todas as Minhas diligencias, e providenciar com as medidas mais acertadas, não só para tornar effectiva a segurança e respeitavel a defesa do Paiz, pondo-o ao abrigo de novas e desesperadas tentativas, de que possam lançar mão seus inimigos; mas também para privar, quanto seja possivel, aos habitantes daquelle Reino, que continuam a fazer ao Brazil uma guerra fraticida, dos meios e recursos, com que intentam tyrannisar os meus bons e honrados subdito, para manterem seu pueril orgulho e fantastica superioridade: Hei por bem Ordenar, que se ponham em effectivos sequestros: 1º Todas as mercadorias existentes nas Alfandegas deste Imperio, e pertencentes aos subditos do Reino de Portugal; 2º Todas as mercadorias, ou a sua importancia, que existirem em poder de negociantes deste Imperio; 3º Todos os predios rusticos e urbanos, que estiverem nas mesmas circumstancias; e 4º Finalmente, as embarcações ou parte dellas, que pertencerem a negociantes daquelle Reino: sendo porém exceptuadas deste sequestro as Acções do Banco Nacional, as das Casas de Seguro, e as da Fabrica de Ferro da Vila de Sococaba. José Bonifacio de Andrada e Silva, do Meu Conselho de Estado, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Imperio e Estrangeiros, o tenha assim entendido, e faça executar com os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro em 11 de Dezembro de 1822, 1º da Independencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade Imperial.

José Bonifácio de Andrada e Silva. (Grifei.)

Mediante edição desses decretos, portanto, o Imperador D. Pedro I, igualmente impondo a força militar do novo regime, confiscou em prol do novo império todos os bens e direitos acima referidos, pertencentes a portugueses, indistintamente, considerados inimigos e contrários à independência, além de perigosos à Nação. Tais ideias foram repetidas, apenas com menos fulgor, na justificativa apresentada no Decreto n. 78-A, de 21 de dezembro de 1889, para o banimento da família imperial do Brasil, retirando-lhes dotações antes concedidas e proibindo-lhes de possuir imóveis no País. Confira-se o seguinte trecho da motivação apresentada para a edição do mencionado decreto:

[…]

que essa distincção envolve a negação evidente da legitimidade do movimento nacional, e encerra reivindicações incompatíveis hoje com a vontade do paiz, expressa em todas as suas antigas provincias, hoje Estados, e com os interesses do povo brazileiro, agora indissoluvelmente ligados à estabilidade do regimen republicano;

Quanto a esse aspecto, entretanto, não é necessário nem é permitido ir mais longe na presente discussão. Prescindível porque as próprias normas infraconstitucionais do Império, conforme anotado anteriormente, consideravam o Palácio Isabel próprio nacional, vedado por se tratar de matéria que refoge ao âmbito de competência deste Tribunal, atrelado aos efeitos da promulgação da Constituição Republicana.

Enfim, a par dos fatos históricos narrados acima, dispensando-se o reexame de provas, tem-se que as Leis n. 166, de 29 de setembro de 1840, 1.217, de 7 de julho de 1864, e 1.904, de 17 de outubro de 1870, todas editadas durante o período imperial, por si, consideravam o Palácio Isabel próprio nacional residencial, destinado, tão somente, ao direito de habitação do Conde e da Condessa d’Eu.

O Decreto n. 1.050, de 21 de novembro de 1890, baixado após o banimento da família imperial do Brasil, e o Decreto n. 447, de 18 de julho de 1891, posterior à promulgação da “Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil”, apenas efetivaram a retomada do próprio nacional, até mesmo porque, com o banimento, seria impossível que o casal exercesse o direito personalíssimo de ali habitar.

Por outro lado, as normas legais apontadas no recurso especial, nessa parte, não foram violadas, inexistindo título que confira aos autores o direito de postular judicialmente a retomada do mencionado imóvel, tampouco de requerer suposta conversão em reparação de danos.

O desprovimento do recurso acerca desse tema meritório, por isso, é impositivo.

I.d Imóveis incorporados ao Palácio – ausência de impugnação nessa parte – mera narrativa apresentada no recurso especial

Em parte do relatório apresentado no recurso especial, os recorrentes asseveraram que “em 1869 procedeu-se judicialmente à medição e, posteriormente, o Conde d’Eu realizou novas aquisições, que foram incorporadas àquela área primitiva e a ampliaram, dando-lhe a feição definitiva. O imóvel passou, então, a denominar-se ‘Palácio Isabel’” (e-STJ fl. 440).

Destaco que o recurso especial não enfrenta a questão dos imóveis supostamente incorporados ao Palácio, que teriam sido adquiridos com recursos particulares do Conde d’Eu, deixando de indicar, portanto, divergência jurisprudencial e eventuais dispositivos legais que tenham sido afrontados. Ademais, ainda que o fizesse, o conhecimento da tese esbarraria na vedação contida na Súmula n. 7 do STJ, tendo em vista que o Tribunal de origem, em embargos de declaração, descartou a existência de tais bens com fundamento no exame soberano das provas dos autos. A propósito, disse o Tribunal:

Por derradeiro, chega-se ao pedido de suprimento da omissão decorrente da ausência de análise da questão relativa à parte do Palácio adquirida com recursos pessoais do Conde D’Eu.

Realmente, o v. acórdão silenciou quanto a esse item. Todavia, no mérito não têm razão os embargantes.

Inicialmente, é de se ver que a petição inicial da ação possessória não se refere a terrenos outros senão aqueles doados para a habitação do Conde e da Condessa D’Eu. A alegação da existência de outros terrenos veio, por primeira vez, já neste século, veiculada pelos herdeiros habilitantes. Ademais, apesar da tardia alegação da posse abrangendo terrenos adquiridos até por doação e, posteriormente, agregados ao Palácio Guanabara, tais aquisições restaram indemonstradas.

É de se observar que nestes autos de ação possessória, não há prova de domínio – senão a testemunhal, na qual se pretendia provar a posse e o esbulho. A escritura de aquisição do imóvel só foi juntada nos autos da reivindicatória – proposta mais de meio século depois, ao que se sucedeu, inclusive, a juntada da ação de demarcação. E aquela escritura de compra e venda (único documento nos autos comprobatório de aquisição de propriedade), consta o seguinte:

“E pelo procurador bastante e representante de Sua Alteza Real o Senhor Conde d’Eu, foi dito que, em nome do mesmo Augusto Senhor, e como se presente fôra, na qualidade de comprador, em virtude dos poderes especiais que lhe forão conferidos acceitara esta escriptura, com a declaração de que o prédio e chácara são adquiridos para os fins mencionados e nos termos dos artigos oitavo e vinte do contrato de cazamento de Sua Alteza a Princeza Imperial Senhora Dona Izabel com o mesmo Augusto Senhor, e dos artigos sexto e séptimo da Lei de vinte e nove de septembro de mil oitocentos e quarenta, e primeiro e paragrapho segundo da lei de sete de julho do anno passado” (fls. 38 de vº dos autos da reivindicatória – processo 89.02.09474-0).

Portanto, a única aquisição e posse comprovada nestes autos e nos da ação reivindicatória foi aquela a título de dote da Princesa Isabel.

Observe-se que a fls. 3 dos autos da ação reivindicatória, na petição inicial, os autores alegam a aquisição de outras áreas que foram incorporadas à área do Palácio Isabel com recursos próprios do Conde d’Eu, referindo-se a (docs.), sem referência concreta.

É de se notar ainda que o protesto juntado a fls. 32/36 dos autos da reivindicatória também nenhuma alusão faz à causa outra de aquisição do imóvel em litígio que não o dote matrimonial.

A certidão pela qual se transcreve a ação de demarcação também noticia apenas a existência de uma escritura aquisitiva, a saber, aquela que tem como causa o dote matrimonial (fls. 135 da ação reivindicatória).

A réplica de fls. 223/233 dos autos da reinvindicatória também nenhuma alusão faz a qualquer outra aquisição senão àquela relativa ao dote matrimonial.

Na audiência de instrução e julgamento de fls. 306 dos autos da reivindicatória, os autores dizem não terem outras provas a produzir. Apenas produzem razões finais em memoriais (fls. 307/314), quando reiteram a alegação de incorporação de outras áreas ao imóvel em litígio com recursos outro que não o dote matrimonial, sem fazer referência a qualquer documento que a comprove (fls. 309).

Assim, não há outra conclusão a se inferir que não seja a de improcedência do pedido inicial, relativamente ao argumento de que o imóvel era constituído também de parcelas adquiridas com recursos próprios pelos autores originais. (e-STJ fls. 382/383.)

Dessarte, o presente recurso especial, interposto por Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros, merece parcial conhecimento e, nessa parte, deve ser desprovido.

II.Recurso Especial de Isabel de Orleans e Bragança e Outros

II.a Contrariedade aos arts. 458, 459 e 535 do CPC/1973Os recorrentes entendem ter havido equívocos e omissões nos acórdãos recorridos, argumentando assim na peça recursal:

9.1 O V. acórdão recorrido de fls. 241/242, integrado por aqueles proferidos em embargos de declaração (fls. 284/285 e), ao recusar seu pronunciamento sobre a questão possessória que lhe foi submetida, afrontou os artigos 458 e 459, do CPC, deixando de manifestar-se sobre a questão jurídica suscitada pelos autores, negando, assim, a prestação jurisdicional, que é o dever magno do Magistrado.

9.2 Os reclamos dos recorrentes quanto ao desatedimento dessas normas processuais no curso do processo, como ocorreu nos embargos declaratórios protocolados em 16 de junho de 2006, não mereceram do E. Tribunal local a devida acolhida.

9.3 Para desconsiderar a matéria possessória, específica da lide, os julgadores decidiram o pleito a partir da controvérsia sobre o direito de domínio, infringindo o artigo 1.210 e seus parágrafos, da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que corresponde ao artigo 505 do anterior Código Civil, o qual, por sua vez colheu a orientação do direito pré-codificado (Assento de 16-02-1786, interpretando Alvará de 09-11-1754).

9.4 É mister anotar que esses dispositivos, por sua natureza processual, aplicam-se imediatamente, independentemente do momento em que ocorreu o fato versado.

9.5 Ainda indebitamente, os acórdãos recorridos, incorrendo em flagrante erro de direito, caracterizaram a espécie jurídica em debate como “disputa de posse a título de domínio” para, desse modo, afrontarem tais dispositivos da lei civil e, assim também, o art. 923 do CPC. Essa a controvérsia em que, a final, centralizaram-se os questionamentos nestes autos.

9.6 O v. acórdão afrontou, também assim, o art. 535 do Código de Processo Civil, ao recusar-se a explicita os fundamentos de suas razões de decidir, quando adotou entendimento no sentido de estar em causa, na ação, pretensão de posse fundada em domínio. Do mesmo modo, restou infundada a afirmativa de que o exílio dos autores impedir-lhes-ia o exercício do direito de habitação, que lhes é atribuído, quando se tem em conta a regência legal desse direito no momento do esbulho.

9.7 Também em seus embargos declaratórios de 16-06-2006 os suplicantes invocaram, sem êxito, esse art. 535 do CPC (item 4.11). (e-STJ fls. 556/557.)

Nesse ponto, asseveram também que buscaram, sem sucesso, “que o C. Tribunal explicitasse a razão por que entendeu cessada a posse dos suplicantes em resultado de seu banimento do País, quando sustentou que o direito de habitação, que se lhes reconhecia, não comportaria senão o uso pessoal do prédio, muito diferentemente do que então prevalecia no direito vigorante” (e-STJ fl. 536).

Na verdade, os recorrentes pretendem apenas reformar os acórdãos recorridos, proferidos na apelação e nos embargos de declaração, inexistindo omissão ou qualquer outro defeito material que deva ser sanado. Isso porque, fundamentadamente, o Tribunal de origem entendeu que a posse estava sendo disputada com base no domínio. Inicialmente, para efeito de reconhecer a necessidade de julgamento, em primeiro lugar, do recurso de apelação interposta na ação possessória, afirmou o Tribunal de origem que “na ação possessória a controvérsia não se limita ao fato da posse, mais aprofunda-se a investigação do domínio, ainda que só para se poder decidir da posse” (e-STJ fl. 275). Após examinar o mérito da ação, reconhecendo que o Palácio Guanabara tinha o único propósito de habitação, sendo considerado próprio nacional, concluiu:

No caso dos presentes autos, vemos que a controvérsia não se limita ao fato da posse, mas aprofunda-se à investigação do domínio, ainda que só para se poder decidir da posse. É certo que tal ocorrência não subtrai à ação seu caráter possessório, porque a sentença, vista em seu conteúdo autoritativo, só poderá decidir sobre a posse; entretanto, a resolução sobre domínio, necessário a concluir sobre a posse, é resolução “incidenter tantum”. Em outras palavras: a questão do domínio fica submetida, nos autos da ação possessória, à “cognitio”, embora não ao “iudicium”. (e-STJ fls. 285/286.)

No julgamento dos embargos de declaração, o TRF 2ª Região foi absolutamente claro quanto ao fato de que se discutia na ação possessória também o domínio, ressaltando, ademais, a importância do banimento da família imperial para efeito da improcedência da ação. Nesse sentido, reproduzo os seguintes trechos do respectivo acórdão:

A hipótese em discussão, todavia, tinha uma peculiaridade: foram intentadas as duas ações, possessória e reivindicatória, sob a égide de legislação que isso admitia. Todavia, as leis processuais têm aplicação imediata, aplicando-se ao processo no estado em que se encontra. Em assim sendo, e em considerando que o juiz não pode negar jurisdição, impedia que se encontrasse uma solução que se adequasse à nova norma processual. Ou seja, o juiz tinha que usar o seu papel criador para solucionar o impasse resultante daquele conflito advindo com a demora no julgamento.

Diante do impasse, entendeu a Egrégia 3ª Turma que, ante a vedação do art. 923, que proíbe a discussão, em sede possessória, sobre o domínio, deveria a ação reivindicatória ser sobrestada até que se decidisse sobre a posse. Tal foi feito: julgou-se, primeiro, a ação possessória, onde, por várias oportunidades, foi dito pelo senhor Relator, aprofundava-se em discussões que iam além da questão possessória. Esta, a posse, estava sendo disputada a título de domínio – isso era permitido pela legislação contemporânea à sua propositura, em 1895. Isto importou na necessidade de a Turma examinar as normas legais atinentes à matéria para demonstrar a inexistência do esbulho por parte da União Federal, cujo ato teria sido justificado pela extinção dos motivos que justificavam a posse dos autores. Essa matéria será examinada no momento próprio. (e-STJ fls. 373/374.)

A terceira omissão denunciada pelos autores diz respeito à ausência de fundamentação do acórdão embargado para sustentar a assertiva de que o direito dos antecessores dos embargantes era o de mera habitação. Supõem eles, embargantes, ter o eminente relator sido influenciado por um erro material ocorrido quando da transcrição do art. 20, que teria omitido palavras fundamentais ao entendimento da matéria.

Realmente houve erro material indicado na transcrição do contrato antenupcional, que deveria ter a seguinte grafia:

“Todos os bens compreendidos no patrimônio serão considerados como próprios nacionais se suas Altezas Imperial e Real morrerem sem descendência, ou quando essa venha a extinguir-se depois de sua morte”,

e não aquela que foi erroneamente reproduzida dessa forma:

“Todos os bens compreendidos como próprios nacionais, se suas Altezas …”.

Não têm razão, porém, os embargantes ao asseverar que tal erro material teria influenciado o julgado. De fato, o fundamento determinante para se decretar a improcedência da ação foi a exegese que se deu às leis instituidoras do dote da Princesa Isabel, frente ao surgimento da República, considerando como de domínio da União os bens que lhe foram doados a título de dote, por força da função que ela exercia e que perdeu, junto com todas as suas prerrogativas, diante do surgimento da República.

Aliás, com a República, os Príncipes foram banidos do Brasil, pelo que, até por esse motivo, não poderiam mais ser reintegrados na posse pleiteada.

Esse erro material em nada influiu no julgado. O contrato matrimonial data de 1864, enquanto a Lei n. 1904, de 17.10.1870, que estabelece um patrimônio em terras em favor do casal autor, dispõe o seguinte:

“Este patrimônio, o do qual fará parte o prédio comprado para habitação de Suas Altezas, será considerado como próprio nacional, com o destino que lhe é dado, e nos termos do mesmo contracto matrimonial.” (fls. 14vº – grifei)

Tanto é verdade que os príncipes não dispunham livremente do domínio das terras e prédio, que a Lei 1904, de 1870, determinava até a proporção em que as terras poderiam ser vendidas, bem como a quem e como seria aplicado o dinheiro proveniente da eventual compra e venda:

“É, porém, permitida a venda de metade das terras a colonos que as venham cultivar, sendo o produto líquido da alienação empregado em apólices da dívida pública fundada do Império, as quais, inscritas como inalienáveis no grande livro…” (fls. 14vº – grifei)

Assim, o erro datilográfico apontado em nada altera a conclusão de que a Nação Brasileira instituiu o doto à Princesa, com o fim específico de proporcionar-lhe moradia condigna com o decoro do trono, conforme bem assevera o procurador do Conde D’Eu na escritura de aquisição do imóvel em litígio, juntada nos autos da reivindicatória. (e-STJ fls. 379/380.)

A violação dos arts. 458, 459 e 535 do CPC/1973, portanto, não está caracterizada, ausentes omissões ou erros materiais que devam ser sanados, cabendo o desprovimento do recurso especial nessa parte.

II.b Violação da Lei n. 1.217/1864, do art. 3º da Lei n. 166/1840, do art. 505 do CC/1916, do art. 1.210, § 2º, do CC/2002 e do art. 923 do CPC/1973

Nesse capítulo, relativo ao mérito da demanda, asseveram os recorrentes que:

3.1.1 Dispunha a Constituição Imperial de 25 de março de 1824, em seu artigo 112, que, quando as princesas da Família Imperial houvessem de casar, a Assembléia lhes assinaria o seu dote.

3.1.2 Em virtude desse preceito constitucional, quando esteve para casar-se a Princesa D. Januária, filha do Imperador Pedro I, que era então a Princesa Imperial, a Assembléia Geral votou a Lei nº 166, de 29 de setembro de 1840, que, nos artigos 1º a 11, regulou-lhe a dotação.

3.1.3 Posteriormente, tendo de casar-se a Princesa D. Isabel, então Princesa Imperial, filha de Dom Pedro II, foi decretada a Lei nº 1.217, de 17 de julho de 1864, que revigorou a de 29 de setembro de 1840, para efeito de regular-lhe o dote.

3.1.4 Autorizado por essa lei, foi então firmado com a intervenção da Nação Brasileira, um pacto antenupcial datado de 11 de outubro de 1864, em contemplação do matrimônio de S.A. Imperial a Princesa D. Isabel, filha do Imperador D. Pedro II, com S. A. Real o Príncipe Luiz Felipe Maria Fernando Gaston de Orléans, Conde d’Eu, filho do Duque de Nemours. Por essa intervenção, a Nação Brasileira, como pessoa jurídica, obrigou-se, como instituidora do dote da Princesa Imperial, a fornecer, entre outras contribuições, a quantia de trezentos contos de réis (300.000$000), destinada à aquisição de prédios onde o casal estabelecesse sua residência.

3.1.5 Por escritura pública lavrada pelo tabelião Antônio Joaquim de Cantanheda Junior no livro de notas nº 212, a fls. 196, do Cartório de Pedro José de Castro, aos 25 de janeiro de 1865, comprovou então o Conde d’Eu a José Machado Coelho e sua mulher os prédios urbanos nos 4 e 6 e chácara situados, de acordo com as denominações da época, na Rua da Guanabara, canto da do Rozo, bairro das Laranjeiras, Freguesia da Glória, no então Município da Corte, hoje cidade do Rio de Janeiro.

3.1.6 Em 1869 procedeu-se judicialmente à medição e, posteriormente, o Conde d’Eu realizou novas aquisições, que foram incorporadas àquela área primitiva e a ampliaram, dando-lhe a feição definitiva. O imóvel passou, então, a denominar-se ‘Palácio Isabel’.

3.2 – O Esbulho

3.2.1 Por ocasião da proclamação da República em 15 de novembro de 1889, encontrava-se o augusto Casal na posse mansa e pacífica dos bens dotais de S.A. Imperial a Princesa Isabel, bens de seu patrimônio privado, de seu domínio particular, entre os quais se incluía o Palácio Isabel, que detinha há 24 anos.

3.2.2 A queda do Império acarretou a extinção dos privilégios de ordem política de que gozava a Família Imperial, mas não privou qualquer de seus membros dos respectivos direitos civis, nada lhes retirando na esfera civil, na esfera do direito privado.

3.2.3 O próprio governo recém-inaugurado, para resguardo de sua autoridade moral, fez publicar no Diário Oficial do dia imediato proclamação solene, datada de 15 de novembro de 1889, em que declarava:

“O Governo Provisório reconhece e acata todos os compromissos nacionais contraídos durante o regime anterior, os tratados subsistentes com as potências estrangeiras, a dívida púbica externa e interna, os contratos vigentes e mais obrigações legalmente constituídas”.

3.2.4 Reconhecendo não dispor de meios legítimos para contestar a propriedade e posse de S.A. a Princesa Imperial quanto a seus bens dotais, viu-se o Governo Provisório, para abrir caminho a seu indefensável objeto, na triste contingência de praticar um mal mascarado ato de confisco, baixando o Decreto nº 1.050, de 21 de novembro de 1890 […]

[…]

3.2.5 Não tendo sido contemplado no decreto supra o Palácio Isabel, ampliou o Governo Republicano, como expressamente então o declarou, os termos desse diploma legal, promulgando o Decreto nº 447, de 18 de julho de 1891 […]. (e-STJ fls. 523/525.)

Anotam que, “no caso dos presentes autos, os autores, ora recorrentes, invocam a proteção possessória fundados, não na posse de direito que lhes resultaria da titularidade do domínio, mas na posse da coisa, mansa e pacífica, sem dúvida ou contestação, de que eram detentores há vinte e seis (26) anos” (e-STJ fl. 539).

As alegações apresentadas nesse tópico, relativas ao mérito da possessória, foram ampla e fundamentadamente repelidas no item “I.c”, acima, pertinente ao recurso especial interposto por PEDRO HENRIQUE DE ORLEANS E BRAGANÇA e outros. Adotando a mesma motivação, à qual me remeto, nego provimento ao recurso nesse ponto.

II.c Afronta à coisa julgada – Agravo de Petição nº 100 – STF

Afirmam estar caracterizada a coisa julgada, argumentando que:

3.5.2 Invocaram, também, nesses recursos, o acórdão de 10 de agosto de 1895, proferido no Agravo de Petição nº 100 e transitado em julgado (fls. 110/111 dos autos do proc. 89.02.09474-0), pelo qual o E. Supremo Tribunal Federal recusou à Fazenda Nacional a incorporação do Palácio Isabel aos próprios nacionais, ao reconhecer que o Decreto nº 447, de 18 de julho de 1891, em que se baseava a pretensão, não era título jurídico hábil para justificá-la.

3.5.3 Demonstrou-se, desse modo, que, face à coisa julgada constituída, resultava inconcusso o direito dos autores à posse do imóvel e incontroverso o caráter esbulhativo da apropriação do imóvel pela União Federal, obtida violentamente, manu militari, em período de governo discricionário, nascido da quartelada capitaneada por Floriano Peixoto.

3.5.4 Contrapuseram-se os autores à sentença do Juiz Godobredo Xavier da Cunha, ao qualificar a questão de “essencialmente política”, confessadamente, decidiu-a, litteris, “de accordo as circunstâncias políticas” de então. Ademais, tal julgado, desconsiderando a natureza da ação então em exame – uma ação possessória – ingressou na apreciação do domínio, matéria a que a lide é alheia.

3.5.5 Na análise da questão petitória, os apelantes reiteraram a demonstração de seu inconcusso direito à propriedade do Palácio Izabel, invocando, na oportunidade, a lição dos doutos que se pronunciaram na matéria, por provocação do Ministério da Justiça. Evidenciaram, na oportunidade, a insubsistência jurídica das teses segundo as quais e constituíra para os Príncipes e seus descendentes, não domínio sobre o Palácio, mas mero direito de habitação ou contraditio in terminis – um patrimônio político. (e-STJ fls. 529/530.)

Nesse particular, destaco que os recorrentes não indicaram os dispositivos legais contrariados, que disciplinariam a coisa julgada, nem apresentaram precedentes com o propósito de comprovar eventual divergência jurisprudencial. Incide, portanto, a vedação contida na Súmula n. 284 do STF, segundo a qual “é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.

Nada obstante, pelo fato de o tema ter sido debatido nos dois recursos especiais interpostos pelos descendentes da parte autora, acrescento que o Tribunal de origem corretamente repeliu a coisa julgada. Considerou que o STF indeferiu a ação de incorporação diante de aspectos restritos ao Decreto n. 447, de 18.7.1891, que não serviria como argumento para viabilizar a utilização e o processamento do tipo de ação então ajuizada, todavia, remetendo as partes para as vias ordinárias. O indeferimento, portanto, decorreu de fundamento sobretudo processual, não adentrando a questão de mérito em relação ao domínio e à caracterização do imóvel como próprio nacional, temas abordados nestes autos de ação possessória, pelo rito ordinário, de forma mais ampla, envolvendo, além disso, outros dispositivos legais.

Confiram-se, a propósito, as seguintes passagens do acórdão proferido no julgamento do Agravo de Petição n. 100 pelo STF:

  1. 100. — Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de aggravo de petição entre partes, como aggravante a Fazenda Nacional e como aggravados os conde e condessa d’Eu, negam provimento ao aggravo interposto do despacho do juiz seccional desta capital, que indeferiu a petição inicial do procurador seccional, em que foi requerida a incorporação do palacio Isabel aos proprios nacionaes, porquanto fundando a aggravante a sua intenção no Decreto n. 447 de 18 de julho de 1891, não preenche este as condições e requisitos exigidos pela Ord., liv. 4º, tit, 58, § 3º e Instruções de 10 de abril de 1851, arts. 33 e 34 para que possa ter logar a requerida incorporação.

E assim julgando, condemnam a aggravante nas custas.

Supremo Tribunal Federal, 10 de agosto de 1895. – Aquino e Castro, P. – Piza e Almeida. – Pereira Franco. – H. do Espírito Santo, neguei provimento ao aggravo por não se ter usado do processo ordinário, que é o que cabe no caso e não o summario, como pede a aggravante. – Fernando Osorio. – U. do Amaral. – Lucio de Mendonça, vencido: é inapplicavel à espécie a Ord. citada; só se trata do processo administrativo, para o qual são titulos sufficientes à Fazenda Nacional os Decretos expedidos sobre a especie desde o Governo Provisório da Republica. – A. Braziliense. – Americo Lobo. – Bernardino Ferreira. – Macedo Soares, vencido. (e-STJ fl. 221 – grifei.)

Em tal contexto, permanece hígida a motivação adotada no acórdão recorrido, de fls. 366/387 (e-STJ), que julgou embargos de declaração e agravo regimental, com o seguinte teor:

A segunda insatisfação dos autores com o julgado diz respeito à omissão quanto à alegação de coisa julgada no que concerne à impossibilidade de serem incorporados aos próprios nacionais os bens que constituíram o dote da Princesa Isabel, em vista da manifestação do STF, quando do julgamento do Agravo de Petição n. 100.

Quanto a este item, realmente não se pronunciou o acórdão embargado. Supre-se, neste momento, a lacuna.

A ação de incorporação, ajuizada pela União Federal através de seu Procurador Seccional da República nos idos de 1890, teve a sua petição inicial indeferida por entender o julgador que o Decreto nº 447 não preenchia os requisitos das Ordenações Filipinas.

Segundo essas Ordenações, a ação de incorporação deveria ter por fundamento escritura ou título específico que revelasse inconteste o domínio do autor (fls. 154).

Tendo em vista que a ação se baseava no Decreto nº 447 que, à época, tinha efeitos controvertidos no seio da comunidade jurídica, como comprova o resultado das consultas feitas às diversas Faculdades Jurídicas, o d. Juiz a quo, assim como o Supremo Tribunal, entendeu que o Decreto mencionado não revelava de forma clara o domínio, o que era imprescindível para o procedimento intentado, razão pela qual, indeferiu  a ação sob este argumento, remetendo as partes às vias ordinárias. Observe-se que, em momento algum naqueles autos, pois este esbarra em pressuposto processual para o procedimento eleito.

Assim, tal Decreto foi inservível, como argumento, para ação de incorporação (procedimento sumário), nada obstaculizando a que fosse fundamento em ação ordinária, como asseverou o juiz ao indeferir a incorporação (fls. 153), ou mesmo conhecido para efeito de se julgar a posse de quem a disputasse a título de domínio (o que era perfeitamente possível à época).

Portanto, desprovida de qualquer sustentação jurídica o argumento de ofensa à coisa julgada. Na cópia do julgamento do Agravo de Petição, juntada por cópia às fls. 152/153 por iniciativa dos próprio autores, pode-se ler que:

“negou-se provimento ao agravo interposto do despacho que indeferiu a petição do procurador seccional, para que fosse incorporado o palácio Isabel aos próprios nacionais, visto não terem sido observadas as disposições que regulam tais incorporações”.

Por conseguinte, não se entrou no mérito. A recusa foi por inadequação do procedimento, não sendo vedada nova postulação, veiculada na forma correta, ou seja, pelo procedimento ordinário, conforme dito pelo ilustre Min. H. do Espírito Santo. (e-STJ fls. 378/379 – grifei.)

Em decorrência da aplicação analógica da Súmula n. 284 do STF, o recurso especial também não merece conhecimento nessa parte.

II.d Imóveis incorporados ao Palácio – ausência de impugnação nessa parte – mera narrativa apresentada no recurso especial

Também neste recurso especial, os recorrentes apenas narram que “em 1869 procedeu-se judicialmente à medição e, posteriormente, o Conde d’Eu realizou novas aquisições, que foram incorporadas àquela área primitiva e a ampliaram, dando-lhe a feição definitiva. O imóvel passou, então, a denominar-se ‘Palácio Isabel’” (e-STJ fl. 524).

Reitero aqui o que foi anotado no item “I.d” acima, pertinente ao recurso de Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros.

Em suma, conheço em parte do recurso especial interposto por Isabel de Orleans e Bragança e outros e nego-lhe provimento.

III. Recurso Especial Adesivo do Estado do Rio De Janeiro

Afirma se reportar “a manifestação do Estado, a fls. 59/68 dos autos judiciais, bem como a todas as demais manifestações pelo Estado do Rio de Janeiro, lançadas aos autos, a fim de que seus termos fiquem fazendo parte integrante e complementar das presentes razões” (e-STJ fl. 692).Explica que, “como o Estado sucumbiu na parte do Acórdão que rejeitou a preliminar de mérito de prescrição”, recorre “para que a matéria da prescrição seja conhecida pela Turma no caso de acolhimento dos recursos especiais dos autores” (e-STJ fl. 693 – grifei). No mérito recursal, apresenta as seguintes razões:

Inquestionavelmente prescritas estão ambas as ações.

A sentença do eminente Juiz federal dr. Evandro Gueiros Leite e o Parecer do Sr. Procurador da República Dr. Mário Vasconcellos Ribeiro, bem demonstram as razões da prescrição.

Isto porque, desde a data de 1897 até a data em que foram publicados os Editais, em 14 de julho de 1964, nenhuma providência foi adotada pela parte autora, a quem cabia impulsionar o processo.

Desta sorte, a decisão do Acórdão que rejeitou a prescrição, violou e negou vigência ao Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, e ao artigo 3º do Decreto-Lei nº 4.597, de 19 de agosto de 1952. (e-STJ fl. 696.)

Ao final, “requer seja o presente conhecido e provido para que seja determinada que, em caso de eventual provimento dos recursos especiais interpostos pelos autores da ação, seja examinado o presente recurso adesivo para que seja o Acórdão reformado a fim de que se decrete a prescrição da eficácia da pretensão dos autores da ação” (e-STJ fl. 696 – grifei).

Preliminarmente, não incide a vedação da Súmula n. 207 do STJ, segundo a qual “é inadmissível recurso especial quando cabíveis embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de origem”. No presente caso, a ação foi julgada improcedente em primeiro grau e a Primeira Turma do antigo TFR, em acórdão de 17.12.1979, rejeitou a tese de prescrição, por maioria, relativamente também à presente ação possessória (AC n. 28.558) (cf. e-STJ fls. 532/601 do REsp n. 1.141.490/RJ – apenso). Houve sucessivos embargos de declaração, sendo que os últimos foram julgados em 12.5.2008, publicado o acórdão em 28.5.2008 (e-STJ fls. 496/505), ocasião em que o art. 530 do CPC/1973 possuía a seguinte redação:

Art. 530. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente a ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência. (Redação dada pela Lei n. 10.352, de 26.12.2001.)

Sucede que a sentença de mérito de improcedência não foi reformada, sendo incabível a interposição de embargos infringentes. Em tal circunstância, deixa-se de aplicar o óbice da Súmula n. 207 do STJ.

Entretanto, este recurso especial, segundo o próprio recorrente, é condicional e somente deverá ser apreciado “no caso de acolhimento dos recursos especiais dos autores”. O presente voto, submetido à elevada e criteriosa consideração da Quarta Turma, propõe o desprovimento dos recursos especiais dos autores. Em decorrência, considero prejudicado o recurso do Estado do Rio de Janeiro.

Caso seja ultrapassada a preliminar de prejudicialidade em decorrência do eventual provimento por este colegiado dos recursos especiais dos herdeiros, entendo que o presente recurso também não merece conhecimento.

Com efeito, por analogia, incide o óbice da Súmula n. 283 do STF, segundo o qual “é inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles”. Destaco, para tanto, que o recurso especial adesivo não impugna o principal fundamento adotado no acórdão do antigo TFR, que, em relação à presente ação possessória, afastou a prescrição intercorrente diante da ausência de culpa por parte dos herdeiros dos autores no tocante à paralisação do processo por várias décadas. A propósito, confiram-se os seguintes trechos do acórdão recorrido especificamente quanto a esta “ação de força velha”:

Data vênia, ao afirmado faço os seguintes reparos:

1º) – A apelação foi interposta por petição (fl. 49) e por termo (fls. 50), para o então denominado “Superior Tribunal Federal”, sendo recebida, segundo disse o Juiz, “nos seus efeitos regulares”, que eram, como agora, o suspensivo e o devolutivo.

2º) – Remetidos os autos à Superior Instância, por insistência dos autores (fls. 52 e 52v), ingressou no Tribunal em 18 de junho de 1897 (fl. 53); daí em diante, silêncio total, nos autos, isto é, não foi protocolado, nem distribuído a nenhum Ministro.

3º) – Assim, ao contrário da inferência tirada pelo eminente Relator de que os autos estavam “não no arquivo, mas na Secretaria, sem que tivessem andamento”, a verdade é que não tiveram andamento porque ficaram não na Secretaria, mas no arquivo daquela Alta Corte, sem que ninguém houvesse ordenado o arquivamento. Faço tal afirmação por verificar, na antiquíssima folha de rosto dos autos em referência, o carimbo “Archivo do Supremo Tribunal Federal” e, ainda, as indicações à lápis azul, presumivelmente de época mais recente – «M.9 – Lata 5», o que provavelmente significa “maço 9, lata 5”. Quer dizer, os autos, sem ordem de ninguém, foram simplesmente para o arquivo, que ainda se escrevia “Archivo”, conforme o carimbo; para o arquivo e não para a Secretaria, onde deveria estar tramitando o processo, por impulso oficial, pelo menos nesta providência inicial de ser devidamente registrado no protocolo e distribuído a algum Relator, para o devido despacho.

4º) – A falta de razões, por outro lado, não seria obstáculo ao seu andamento, já que àquele tempo (como agora) as alegações das partes deveriam ser produzidas depois da interposição do recurso, sua impugnação e admissão (Cfr. CPC, 1939; Lei nº 3.396, de 2.6.58; CPC, 1973, arts. 542 e 543).

5º) – Se o eminente Relator concede que os descendentes dos autores ignoravam que havia uma ação a defender, já que dela somente se deram conta pelo edital publicado, em 1969, neste Tribunal, para onde os autos foram encaminhados em 1964, não poderiam, mesmo, manifestar interesse, antes dessa ciência.

Acolheu o nobre Relator a alegada prescrição intercorrente, prevista no Decreto nº 20.910/32, citado no Decreto-Lei nº 4.597, e 19.8.42 (art. 3º).

Entretanto, como se demonstrou, os autos estiveram pura e simplesmente desaparecidos, porquanto arquivados em razão e sem que aos autores, ou seus descendentes, se possa imputar qualquer parcela de culpa pelo equivocado funcionamento da Justiça.

Logo, não poderia correr prazo algum, e, muito menos, os de natureza prescricional. (e-STJ fls. 587/588 do REsp n. 1.141.490/RJ – AC n. 25.448, em apenso – grifei.)

Neste recurso adesivo, no entanto, não se discute, em nenhuma passagem, o elemento subjetivo relativo à culpa pela paralisação do processo. Busca demonstrar, apenas, o período em que o processo permaneceu sem movimentação.

Tampouco a manifestação de “fls. 59/68” – atualmente “e-STJ fls. 110/119” –, à qual o recurso especial se reporta, cuida da culpa à luz dos fatos e dos atos processuais especificamente verificados neste processo, se dos autores e dos herdeiros ou se do Poder Judiciário, pelo desaparecimento do processo e pela ausência de trâmite normal por tantos anos. Observo que tal manifestação indica precedentes que, em tese, defendem a prescrição intercorrente quando houver culpa exclusiva do autor pelo retardamento do feito (cf. e-STJ fls. 117/119). Entretanto, conforme anotado, não discute a existência de culpa dos autores e dos herdeiros em confronto com os elementos específicos desta demanda e considerados no voto condutor do acórdão.

Ante o exposto, CONHEÇO PARCIALMENTE dos recursos especiais interpostos por Pedro Henrique de Orleans e Bragança e outros e por Isabel de Orleans e Bragança e outros e NEGO-LHES PROVIMENTO. Julgo PREJUDICADO o recurso adesivo interposto pelo Estado do Rio de Janeiro.

É como voto.

Certidão de Julgamento

QUARTA TURMA
Número Registro: 2009/0132773-3PROCESSO ELETRÔNICOREsp 1.149.487 / RJ
Números Origem:  3960592021925889659846
Pauta: 27/11/2018JULGADO: 06/12/2018

Relator

Exmo. Sr. Ministro  ANTONIO CARLOS FERREIRAPresidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. MARCELO ANTÔNIO MUSCOGLIATI

Secretária

Dra. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

Autuação

Recorrente:Pedro Henrique de Orleans e Bragança e Outros
Advogados:Mário Alberto Pucheu e Outro(s) – rj008447
Sergio Bermudes e Outro(s) – rj017587
Recorrente:Isabel de Orleans e Bragança e outros
Advogado:Dirceu Alves Pinto e Outro(s) – rj007570
Recorrente:Estado do Rio de Janeiro
Procurador:Sérgio Teixeira Firmo e Outro(s) – rj034823
Recorrido:Os Mesmos
Recorrido:União
Interes.:Pedro de Orleans e Bragança – Espólio
Repr. por:Afonso de Bourbon de Orleans e Braganca – inventariante
Advogado:José Carlos de Araújo Almeida Filho e Outro(s) – RJ071627

ASSUNTO: DIREITO CIVIL – Coisas – Posse

Sustentação Oral

Dr. DIRCEU ALVES PINTO, pela parte RECORRENTE: ISABEL DE ORLEANS E BRAGANÇA Dr. GABRIEL DE ORLEANS E BRAGANÇA, pela parte RECORRENTE: PEDRO HENRIQUE DE ORLEANS E BRAGANÇA Dra. DANIELA ALLAM GIACOMET, pela parte RECORRENTE: ESTADO DO RIO DE JANEIRO Dr. MARCIA DANTAS(EX LEGE), pela parte RECORRIDA: UNIÃO

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  1. Os originais devem ser digitados em Word (Windows). A fonte deverá ser Times New Roman, corpo 12, espaço 1,5 cm entre linhas, em formato A4, com margens de 2,0 cm;
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  3. Devem apresentar o título, o resumo e as palavras-chave, obrigatoriamente em português (ou inglês, francês, italiano e espanhol) e inglês, com o objetivo de permitir a divulgação dos trabalhos em indexadores e base de dados estrangeiros;
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Veja também:

Certidão

Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:A Quarta Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente e, nesta parte, negou provimento aos recursos especiais interpostos por PEDRO HENRIQUE DE ORLEANS E BRAGANÇA E OUTROS e por ISABEL DE ORLEANS E BRAGANÇA E OUTROS; e julgou prejudicado o recurso adesivo interposto pelo ESTADO DO RIO DE JANEIRO, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Marco Buzzi, Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.

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