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A publicidade dos atos processuais

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17/06/2020

O novo estatuto político brasileiro – que rejeita o poder que oculta e não tolera o poder que se oculta – consagrou a publicidade dos atos e das atividades estatais como valor constitucionalmente assegurado, disciplinando-o, com expressa ressalva para as situações de interesse público, entre os direitos e garantias fundamentais (cf. art. 5º, LX, c/c art. 37, caput, c/c art. 93, IX, todos da CRFB c/c art. 792 do CPP).

A Carta Política, ao proclamar os direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5º), enunciou preceitos básicos, cuja compreensão é essencial na caracterização da ordem democrática como um regime do poder visível, ou, na lição expressiva de Bobbio, como um modelo ideal do governo público em público.Dessa forma, não há, nos modelos políticos que consagram o Estado Democrático de Direito (cf. art. 1º da CRFB), espaço possível reservado ao mistério.

A publicidade dos atos processuais integra o devido processo legal e representa uma das mais sólidas garantias do direito de defesa, pois a própria sociedade tem interesse em presenciar e/ou conhecer a realização da justiça. No direito pátrio vigora, em regra, o princípio da publicidade absoluta (ou publicidade externa), já que qualquer pessoa pode ir ao Fórum assistir à realização de interrogatórios, oitiva de testemunhas, debates, enfim… qualquer ato processual que interesse ao cidadão. É a fiscalização popular sobre os atos da Justiça ou um verdadeiro e democrático controle (popular) externo da atividade jurisdicional.

Reclama-se, hodiernamente, de um controle externo da atividade jurisdicional, quando, na realidade, este controle já está expresso no princípio da publicidade dos atos processuais, permitindo a todos, inclusive através da imprensa, o acesso às decisões judiciais. Entretanto, em certos casos, expressamente previstos na lei, poderá ser restringida a presença de determinadas pessoas nas audiências, surgindo a publicidade interna restrita. É o que ocorre no Tribunal do Júri, quando da votação na sala secreta (cf. arts. 485 do CPP com a redação que lhe deu a Lei nº 11.689/2008).

A publicidade, portanto, poderá ser absoluta (regra) ou restrita (exceção).

O mestre Frederico Marques fala em publicidade imediata e publicidade mediata. A primeira, “quando os atos do procedimento estão ao alcance do público em geral”; a segunda, quando “os atos processuais só se tornam públicos por meio de informe ou certidão sobre sua realização e seu conteúdo” (Ob. cit., p. 257).

Assim, pelo exposto, podemos afirmar que o princípio em tela é compatível com o sistema acusatório adotado hodiernamente, pois não há como estabelecermos um processo legal com o chamado actum trium personarum sem a publicidade dos atos que lhe são inerentes.
O procedimento secreto é característica do sistema inquisitivo abolido de nossa legislação processual (cf. 2.1. infra).

Destarte, há que se ter uma visão sistemática do princípio da publicidade dos atos processuais em consonância com os princípios do devido processo legal e da verdade processual, pois não há como se respeitar os procedimentos delineados em lei sem garantir ao acusado a publicidade dos atos praticados no curso do processo a que responde (salvo nas hipóteses previstas em lei, cf. art. 1º, in fine, da Lei nº 9.296/1996) nem se descobrir a verdade dos fatos praticados sem dar ao público a oportunidade de levar informações ao conhecimento do juiz e verificar se há a imparcialidade devida no julgamento.

A sociedade é a maior interessada na correta aplicação da Lei penal, o que deve ocorrer aos olhos de todos, salvo nas hipóteses expressamente previstas na Constituição.

Há, em doutrina, o posicionamento de que o princípio da publicidade dos atos processuais inserto na Constituição Federal (cf. art. 5º, LX, c/c art. 93, IX, ambos da CRFB) revogou os artigos do Código de Processo Penal referentes à sala secreta (cf. art. 485, CPP).

Diz a doutrina defendida pelo Professor e Desembargador José Lisboa da Gama Malcher, no Habeas Corpus nº 280/1989 – São Gonçalo:

Ao cuidar das votações dos quesitos (núcleo do julgamento popular, de consciência) a Constituição determina que se mantenha “o sigilo das votações” e não o sigilo na votação. A diferença é significativa: sigilo das votações é equivalente a voto secreto e sigilo na votação corresponde a sessão secreta e esta a Constituição proibiu, no inciso LX do mesmo art. 5º.

No mesmo pensar está o mestre Tourinho Filho, entendendo que nada obsta que se proceda à “votação coram populo, desde que preservado o sigilo. Pois o julgamento torna -se mais democrático e fiscalizável ao olho do povo” (Processo penal. 18. ed. São Paulo: Saraiva. v. IV, p. 98). Lenio Luiz Streck segue a posição dos mestres acima, afirmando que:

Sem dúvida, para maior participação popular e pela democratização da instituição, urge que se dê maior transparência ao Tribunal do Júri, abolindo-se a chamada sala secreta […] A Constituição determinou que se mantenha o sigilo das votações […] e não o sigilo na votação. A diferença é significativa, pois sigilo das votações é equivalente a voto secreto, e sigilo na votação corresponde à sessão secreta; e estas […] a Constituição vedou no inciso LX do mesmo artigo 5º (Tribunal do júri: símbolos & rituais. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1994).

Data venia, ousamos divergir.

Há que se fazer distinção entre o julgamento do Tribunal do Júri e a decisão do Conselho de Sentença.

O julgamento é público e todos os que quiserem podem a ele assistir (cf. art. 93, IX, da CRFB). Entretanto, a votação dos jurados é secreta para se assegurar o sigilo das votações.

A interpretação meramente gramatical é repudiada pelos estudiosos do direito. O mestre e jurista de todos os tempos, Carlos Maximiliano (Hermenêutica e aplicação do direito, 10. ed., p. 120), diz-nos:

Hoje nenhum cultor do direito experimenta em primeiro lugar a exegese verbal, por entender atingir a verdade só por esse processo, e, sim, porque necessita preliminarmente saber se as palavras, consideradas como simples fatores da linguagem e por si sós, espelham ideia clara, nítida, precisa, ou se, ao contrário, dão sentido ambíguo, duplo, incerto […] O progresso gramatical, sobre ser o menos compatível com o progresso, é o mais antigo (único outrora). “O apego às palavras é um desses fenômenos que, no Direito como em tudo o mais, caracterizam a falta de maturidade do desenvolvimento intelectual”.

Assim, é da essência do Tribunal do Júri a sala secreta, sala esta inerente à garantia dada ao cidadão, investido, temporariamente, da função de julgar, de que sua convicção não será publicizada. Dessa forma, devemos compatibilizar o princípio da publicidade dos atos processuais (ou da Administração Pública, cf. art. 37, caput, da CRFB) com o interesse da sociedade na descoberta de determinados fatos que a agridem (cf., verbi gratia, art. 485, do CPP c/c art. 1º, in fine, da Lei nº 9.296/1996). O julgamento do Tribunal do Júri é sempre público, pois as partes estão, obrigatoriamente, presentes, bem como todos aqueles que desejarem presenciar os debates, porém isso não significa um julgamento feito de forma a influenciar o ânimo dos jurados.

Em doutrina, há o posicionamento do Doutor Guilherme de Souza Nucci, que, em sua obra denominada Júri: princípios constitucionais, ensina-nos:

Quanto à diferença entre “voto secreto” e “sala secreta”, é de se frisar que a Constituição não se referiu a nenhum deles, mas sim a “sigilo das votações”. E votação não quer dizer “voto”, portanto não se pode sustentar que o constituinte desejou assegurar o “voto secreto”, abolindo a sala secreta. Em outras palavras, não é cabível dizer que a Constituição teria garantido o voto secreto dado em público […] Garantir o sigilo a votação é assegurar a sala secreta, ao contrário de extingui -la. Votação sigilosa quer dizer o ato de votar realizado longe do alcance do público (São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 170).

Em 1996 surgiu, no sistema jurídico, a Lei nº 9.296 regulando os casos de interceptação telefônica previstos no inciso XII do art. 5º da CRFB, trazendo para o intérprete (açodado) dúvida quanto à constitucionalidade do art. 1º, in fine, que reza:

Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do Juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça. (grifo nosso)

Diante do princípio da publicidade dos atos processuais, não poderia haver segredo de Justiça. Nada mais errado. A própria natureza da medida de interceptação telefônica demonstra claramente que o segredo de Justiça é inerente à própria eficácia da medida adotada, pois,
sendo uma medida cautelar incidental (a decretada no curso do processo criminal), não faria sentido e perderia objeto a comunicação prévia ao acusado de que seu telefone sofreria uma interceptação das comunicações por ordem judicial.

Assim, há que se interpretar o princípio de acordo com a natureza jurídica da medida adotada: trata-se de medida cautelar incidental que requer, para a sua plena eficácia, a adoção do princípio da publicidade interna restrita. Destarte, há que se observar que é a própria Constituição Federal que admite que a lei possa restringir a publicidade dos atos processuais, desde que o exija o interesse social. Diz o inciso LX:

A lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.

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A obra Direito Processual Penal trata o direito processual penal sob uma ótica sistemática, dando ênfase aos princípios da matéria, ou seja, o autor preocupa-se com a moderna visão constitucional do ordenamento jurídico. Os institutos processuais são expostos sempre a partir dos postulados básicos que fundamentam o democrático sistema acusatório, cujas bases estão assentadas na própria Constituição Federal.

O texto examina os princípios do processo penal para estudar o inquérito policial e a ação penal, o que ocorre, outrossim, nos capítulos que cuidam da prisão e da liberdade provisória. Merecem destaque também os estudos referentes às nulidades, à teoria geral dos recursos no processo penal e às ações autônomas de impugnação.

Por ter lecionado em diversos cursos da área jurídica, o autor Paulo Rangel imprime ao texto enfoque mais específico, suscitando e resolvendo inúmeras questões controvertidas, muitas das quais descuradas pela doutrina tradicional. Por ser Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, atuante na 3ª Câmara Criminal, transmite ao livro a indispensável abordagem prática.


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