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Intensa conjuntura orçamentária: o teto de gastos e a CF

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Marcus Abraham

Marcus Abraham

23/09/2020

São tantos assuntos na pauta de debates exatamente neste momento que, diversamente de analisar apenas um tema por vez, hoje optei por dar um panorama geral do que está acontecendo neste tenso início de setembro em matéria fiscal, sobretudo a orçamentária.

Antes de adentrar as questões nacionais, já me vem à mente a possibilidade de um shutdown nos Estados Unidos da América, uma vez que o prazo para aprovação do orçamento de 2021 naquele país é o próximo dia 30 de setembro e, como se encontram em ano de eleição, embates políticos com reflexos fiscais são comuns.

Apenas para relembrar, o shutdown dos EUA é a paralisação temporária dos serviços públicos considerados “não essenciais” de responsabilidade do governo federal norte-americano, devido ao impasse em relação à aprovação do orçamento público da União no Congresso dos EUA dentro do prazo legal. Lembro-me de que, entre os anos de 2018 e 2019, a paralisação norte-americana chegou a 35 dias. Lá, o princípio da legalidade e anualidade orçamentária são devidamente respeitados, encontrando-se expressos no art. 1º, Seção 9, Cláusula 7, da Constituição dos Estados Unidos da América, segundo o qual “dinheiro algum poderá ser retirado do Tesouro senão em consequência de dotação determinada em lei“.

Nós não possuímos o mesmo mecanismo, embora tenhamos também o imperativo da legalidade orçamentária, segundo o qual não poderá haver nenhuma despesa sem a devida e regular previsão legal que a autorize (inc. I, art. 167 da CF/88 e art. 6º da Lei nº 4.320/1964).

No Brasil, quando o orçamento público não é aprovado até 31 de dezembro, não há qualquer paralisação. Adota-se temporariamente, na proporção mensal de 1/12 avos (duodécimos), a proposta de lei orçamentária ou a prorrogação da lei orçamentária do ano anterior, a partir da interpretação por analogia do art. 32 da Lei nº 4.320/1964, que trata da hipótese de não envio da lei orçamentária pelo Chefe do Executivo no prazo estipulado e que, neste caso, permite a utilização da lei orçamentária então vigente, desde que a lei de diretrizes orçamentárias assim o autorize.

A propósito da aprovação da lei orçamentária em nosso país, vimos, no início da semana que passou (31/08/2020), o encaminhamento, no último dia do prazo legal, do PLN 28/2020 (o projeto de lei orçamentária para 2021) pelo Poder Executivo federal ao Legislativo. Nele, a União estimou, a título de receitas para o exercício financeiro de 2021, o montante de R$ 4.291.872.437.622,00 (quatro trilhões, duzentos e noventa e um bilhões, oitocentos e setenta e dois milhões, quatrocentos e trinta e sete mil, seiscentos e vinte e dois reais) e fixou a despesa pública em igual valor. Merece destaque o seguinte trecho da mensagem presidencial que acompanha o projeto de lei:

“A retomada da agenda de equilíbrio macroeconômico por meio da consolidação fiscal é uma condição necessária para promover de forma sustentada a recuperação econômica do País. Em especial, a manutenção do teto de gastos, que constitui o pilar macrofiscal fundamental neste processo, e que permitirá endereçar pontos essenciais, tais como: fortalecer o arcabouço de proteção social transferindo recursos de programas ineficientes para programas sociais de comprovada eficiência no combate à pobreza; melhorar a eficiência das políticas de emprego; aprimorar a legislação de falências; fortalecer e desburocratizar o mercado de crédito, de capitais e de garantias; implementar o novo marco regulatório do setor de saneamento básico; aprovar o novo marco regulatório do setor de gás; promover a abertura comercial; ampliar o programa de privatizações e concessões; avançar na reforma tributária; e implementar a agenda de reformas pró-mercado, como a desburocratização, facilidade para abrir empresas e empreender, facilidade de adoção de novas tecnologias; dentre outras medidas nessa linha”.

Em teoria, tudo o que foi dito acima é bastante positivo. Colocar na prática tudo o que se pretende é o grande desafio.

Sobretudo porque há vários temas sensíveis que os Poderes Executivo e Legislativo têm pela frente na aprovação da Lei Orçamentária Anual de 2021, tais como: o respeito pelo teto de gastos; o elevado endividamento que foi gerado para fazer frente à pandemia da COVID-19; a pretensão de introdução do novo plano intitulado “Renda Brasil”; e a questão do peso da folha de pagamento dos servidores e de aposentadorias, que consome boa parte do orçamento. E, tudo isso, dentro de um contexto de pressão pelas reformas tributária e administrativa, e em meio a um período de eleições municipais.

É importante recordar que, em maio deste ano, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) completou 20 anos. Nesse período, a LRF nos brindou com efeitos positivos na gestão do erário, ao tentar criar uma cultura de gestão fiscal responsável. Todavia, a sua não observância plena ensejou a elevação do déficit público e do endividamento, que se avolumaram após 2015.

Para corrigir o rumo das finanças, estabeleceu-se o Regime do Teto de Gastos, pela Emenda Constitucional nº 96/2016, e o Regime de Recuperação Fiscal, através da Lei Complementar nº 159/2017. Ambos complementam e fortalecem a LRF, na busca de se ter justiça fiscal acompanhada de justiça social.

Esses dois institutos consubstanciaram duas grandes conquistas fiscais que obtivemos e que não podem sofrer retrocessos. Do contrário, prejudica-se o cidadão, pois o déficit fiscal gera endividamento público – o qual, por sua vez, drena recursos financeiros que deveriam custear gastos fundamentais como a educação, a saúde e a segurança –, despendendo-se centenas de milhões de reais para o pagamento de juros e amortização da dívida. Quem ganha são os investidores financeiros. Quem perde são os brasileiros.

Pelo Teto de Gastos se estabeleceu que, por 20 anos, haverá um limite de gastos para a despesa primária total, corrigida anualmente apenas pela variação da inflação (IPCA). O objetivo é reduzir as despesas públicas e permitir a retomada do crescimento econômico e do equilíbrio fiscal sustentável.

Qualquer tentativa de burlar o teto de gastos ensejará não apenas violação à Constituição, mas também descrédito perante os agentes econômicos, abalando este importante pilar de solvência do país. Ou os gastos são racionalizados, tornando-os mais eficientes, ou teremos que aumentar os tributos.

Já o Regime de Recuperação Fiscal (RRF) destinou-se a criar instrumentos jurídico-fiscais para que os Estados pudessem ajustar as suas finanças e superar a situação de grave desequilíbrio fiscal, assegurando-se a suspensão de certas restrições da LRF, bem como o acesso a instrumentos de recuperação financeira.

Embora os Estados do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás já tenham solicitado seu ingresso no regime, ainda se encontram em processo de adesão. O Estado do Rio de Janeiro foi o único que efetivamente ingressou no RRF, nele mantendo-se ao longo de três anos, prazo esse que está para se esgotar no início do próximo mês, mas em vias de prorrogação, tal como admite expressamente a LC nº 159/2017, sem impor qualquer condicionante.

A possibilidade de prorrogação do RRF aos Estados, como ocorre agora com o Rio de Janeiro, manifesta-se de modo claro, ostentando natureza vinculante, por estar adstrita ao binômio possibilidade-necessidade: a lei permitir a prorrogação, com o Estado sendo capaz de se manter dentro das regras do regime (o que vem ocorrendo, no Rio de Janeiro, ao longo desses três anos), juntamente com a imperiosa necessidade de renovação por outro período a fim de manter as contas públicas em ordem (no caso fluminense, por outro triênio).

Ora, no exemplo anterior, o objetivo do programa do RRF ainda não foi plenamente alcançado, e a prematura exclusão levaria o referido Estado ao colapso fiscal. No fim, o maior prejudicado acabaria sendo o próprio cidadão fluminense, sobretudo em meio à dramática conjuntura da pandemia da COVID-19. Para evitar esse malfadado resultado, uma bem lançada decisão liminar do Ministro do TCU Bruno Dantas garantiu a prorrogação do RRF, minimizando esta insegurança.

Não obstante, esforços deverão ser implementados pelo Estado do Rio de Janeiro para equacionar as suas contas públicas, renegociando contratos de fornecedores, reavaliando desonerações e benefícios fiscais concedidos e, principalmente, “cortando na carne” da máquina pública estadual, sobretudo no que se refere às despesas de pessoal (em especial o número de cargos comissionados).

Ao singrar os mares revoltos das finanças públicas, o navio da cultura da responsabilidade fiscal procura orientar-se na direção de águas mais tranquilas, em busca de um porto seguro que nos conduza a um cenário de ordem e de progresso.

FONTE: JOTA

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