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LL.M. na Itália: experiência inesquecível

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Luiz Dellore

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21/01/2021

Nesse texto, o Prof. Guilherme Freire de Melo Barros narra como foi o caminho para fazer o LLM na Itália, em inglês. É interessante verificar que o professor tinha um plano de focar no processo, mas que a carreira o levou para o direito material – e seus estudos de pós graduação se deram nesse sentido. Muitas vezes, é isso o que acontece: imaginos um caminho, mas a vida nos mostras outras oportunidades, e isso é bom!Vale, então, a leitura, para verificar como foi o caminhdo do LLM do Prof. Guilherme, e verificar o quão interessante são suas colocações.

Dellore


por Guilherme Freire de Melo Barros*

Recebi o convite do amigo Jordão Violin para escrever sobre minha experiência de estudar direito fora do Brasil. Aceitei o convite obviamente – senão, você leitor aí de frente para a tela não estaria lendo este texto (risos).

Em 2013, fui estudar na Turim na Itália, mas acho que é preciso contextualizar quem sou e por que fiz essa escolha. Bom, meu nome é Guilherme Barros, sou natural do Rio de Janeiro, mas mudei para Curitiba em 2008, em razão da aprovação no concurso de procurador do estado do Paraná. Sou casado com a Marcelle, fizemos faculdade juntos e ‘importei-a’ do Rio para Curitiba.

Sempre gostei de processo civil desde o segundo período da faculdade e comecei na PGE-PR atuando no contencioso cível e tributário. Quando terminei a faculdade, minha pretensão era passar em concurso e me aprofundar em processo civil (pós, mestrado, doutorado). De fato, após mudar para Curitiba, fiz a Pós-graduação em Processo Civil do Instituto Bacellar, mas foi então que as coisas começaram a tomar um rumo bem diferente do que imaginava (e isso foi e é maravilhoso). Fui convidado a assumir um cargo na Assessoria do Gabinete do Procurador-Geral do Estado e lá só havia consultivo; meus conhecimentos cada vez mais profundos de processo civil tinham quase nenhuma utilidade. Foi um abrir de olhos para focar mais no direito material.

Além disso, fui convidado para compor a Comissão Organizadora do Concurso da PGE, que tinha na presidência a Professora Marcia Carla Pereira Ribeiro, grande nome da Análise Econômica do Direito, que tinha recém publicado o livro “O que é análise econômica do direito?: uma introdução” (Ed. Fórum, 2011). A influência da Professora Marcia Carla na minha formação acadêmica foi muito marcante. Optei por fazer mestrado em direito econômico e me inscrevi, juntamente com Marcelle, no processo seletivo da PUC-PR. Meu objetivo era escrever uma dissertação sobre análise econômica da arbitragem em contratos internacionais. Afinal, arbitragem também é processo!

Em paralelo a isso, ambos alimentávamos o sonho de ter a experiência de morar fora, não apenas como turistas, mas vivenciando o dia a dia de outra cultura, outros hábitos e formas de pensar. Então decidimos aplicar para programas de LL.M. fora do Brasil. Passamos semanas lendo tudo sobre programas fora do país (o site llm-guide.com foi uma mão na roda!). Precisávamos conciliar as temáticas, o custo, o tempo de duração. Queríamos encontrar algo que fosse proveitoso para ambos; que pudéssemos pagar não só o curso, mas também o custo de vida; por fim, o tempo de duração também era relevante, porque eu precisaria me ausentar da PGE.

Encontramos, então, o que nos parecia o programa perfeito para nossa realidade, o LL.M. International Trade Law: contracts and dispute resolution, da Universidade de Turim, na Itália. O curso é fruto de uma parceria entre diversas instituições: a coordenação científica fica a carga da Universidade de Turim, mais especificamente do espetacular Professor Jean Gianmaria Ajani, e as aulas são realizadas no Centro de Treinamento das Nações Unidas, cujas instalações ficam às margens do rio Pó. Apesar de ser na Itália, o curso é em inglês.

Quanto ao conteúdo, as temáticas atendiam a ambos os nossos interesses. Marcelle é advogada na área de propriedade intelectual e direito empresarial; eu queria estudar arbitragem e contratos. O custo do curso também era mais baixo do que diversos outros programas, por ser organizado pelas Nações Unidas. Além disso, os custos de morar na Itália se encaixavam na nossa realidade financeira.

Por fim, a estrutura do curso acabou sendo o fator final determinante para nossa decisão. O programa dura 12 meses, dividido em 3 fases de 4 meses cada. A primeira é feita à distância, com leituras e debates online com tutores; a segunda é feita in loco, em Turim; e a terceira é a redação do trabalho de conclusão, que pode ser feito no país de origem. Esse formato se encaixava na minha necessidade de não ficar ausente por muitos meses do trabalho.

Passamos pelo processo seletivo e fomos aprovados, tanto no LL.M. da Itália, quanto no mestrado da PUC-PR. Mais uma vez, a Prof. Marcia Carla apareceu como peça chave em nossas vidas acadêmicas. Ela proporcionou a transmissão da sua disciplina no mestrado da PUC de forma online para a Itália. Assim, poderíamos cursar o LL.M. e o mestrado simultaneamente.

A primeira fase de estudos começou no final de 2012. Entre os meses de outubro e fevereiro, passamos pela fase à distância do curso. Semanalmente recebíamos textos para leitura (capítulos de livros e artigos científicos) e tínhamos que postar resumos e comentários na plataforma online. Havia uma tutora que estimulava os debates e tirava dúvidas. Foi uma boa forma de começar a ter contato com o estudo do direito em outro idioma. Como optei por seguir carreira pública, meu foco de estudo sempre foram textos jurídicos em português – manuais, lei seca, informativos do STJ etc. (enfim, vida de ‘concurseiro’). Falar inglês como turista e ser capaz de absorver conhecimento jurídico em inglês são coisas bem diferentes. Daí que a fase de distance learning foi um bom aquecimento.

Veio, então, a fase face-to-face. Chegamos a Itália em fevereiro de 2013. Havia neve por todo lado. O centro de treinamento das Nações Unidas oferece hospedagem para os estudantes, mas achamos caro diante de outras boas ofertas nas redondezas. Alugamos um apart hotel que ficava a 15 minutos de ônibus do local das aulas.
Essa parte é obviamente o coração do curso. O ritmo é muito intenso. Em geral outros programas de LL.M. têm aulas algumas vezes por semana durante a manhã ou à noite. No nosso caso, as aulas eram concentradas: segunda a sexta-feira, de 9:00 às 15:30h. Almoçávamos no próprio campus diariamente – o valor era subsidiado, muito baixo e a qualidade muito boa para um ‘bandejão’.

Com muita frequência, depois da aula o dia não tinha acabado: ora ficávamos no campus preparando alguma atividade em grupo para o dia seguinte com os colegas; ora íamos à biblioteca da Universidade de Turim pesquisar material; ora íamos para casa para estudar. Posso dizer que foi fundamental para mim fazer o curso junto com minha esposa. O volume de horas dedicadas aos estudos durante a semana era muito intenso. Não sei como seria se um de nós tivesse ido apenas para acompanhar o outro. Juntos podíamos sempre puxar e auxiliar um ao outro.

Ao longo do curso, tive contato com muitos temas sobre os quais nunca tinha ouvido falar, como a CISG e os Princípios Unidroit. Foi tudo muito proveitoso. A oportunidade de estudar fora abre um campo enorme de pesquisa, porque se está mais próximo do que está sendo discutido em diversos outros países. Minha sensação foi de estar em contato com a vanguarda da pesquisa científica. Lembro da professora Alessandra Zanobetti comentar sobre um projeto de pesquisa que tratava da responsabilidade civil em acidentes marítimos decorrente do uso de diferentes sistemas de navegação (GPS, Beidou, Glonass etc.). Em outra ocasião, a professora Giudetta Cordero-Moss – italiana com doutorado na Rússia, professora na Noruega – nos passou um texto de sua autoria sobre direito obrigacional em que analisava uma situação sob a perspectiva de 4 ou 5 sistemas jurídicos. Tudo isso fez aumentar minha vontade de seguir na vida acadêmica, dar aulas, escrever, pesquisar.

Ter aula diariamente em dois períodos obviamente é puxado, mas o método de ensino ajuda a tornar a rotina menos desgastante. Eu levaria alguns anos até me tornar professor da PUC-PR em 2017 e conhecer a expressão “metodologia ativa” em sala de aula, mas passei 4 meses imerso nesse tipo de método na Itália.
As aulas não eram simplesmente expositivas. Fazíamos inúmeras atividades de debate, análise de casos concretos, trabalho em grupos, simulações. Foi um modelo de ensino completamente novo para mim. Minha formação acadêmica tinha sido nas salas de aula da UFRJ, de cursinhos e da pós-graduação. Todas elas com um modelo de ensino tradicional, com aulas expositivas (professor, giz, slides).

Sob a perspectiva de um hoje professor de graduação, eu diria que o formato das aulas no LL.M. me foi tão valioso quanto o conteúdo ensinado. As técnicas que conheci lá fazem parte do cotidiano das minhas aulas hoje – e da pós-graduação em Processo Civil, Mediação e Arbitragem que coordeno na PUC-PR. Naturalmente, depois de ingressar como professor da PUC-PR, passei a ler e aprender do ponto de vista teórico sobre metodologia ativa, mas o despertar para o método foi na Itália.

Em uma sala de aula, há sempre alunos mais tímidos que quase não falam na sala; há outros que participam mais ativamente. Para mim foram muito marcantes as aulas do Professor Patrick O’Malley, pela incrível capacidade de fazer os alunos se sentirem acolhidos e instigados a dar opinião e participar. Suas aulas se iniciavam sempre com um brainstorm sobre o tema (ex.: joint venture) em que os alunos diziam o que vinha a mente e ele trazia para o quadro.

Mesmo quando a sugestão do aluno não tinha nenhuma relação com a temática, ele recebia a informação sorridente e conversava com o aluno para aprimorar a sugestão até chegar em algo que podia ir para o quadro. Depois o Prof. O’Malley conseguia inserir cada palavra trazida em algum momento da exposição e das atividades. O resultado era que em suas aulas 90% dos estudantes participavam ativamente. Para mim estava muito claro que o ponto não era apenas simpatia ou jeito cativante – os professores em geral eram sempre muito simpáticos –, a questão era de pura técnica para lecionar. Foi incrível.

Outro aspecto marcante das aulas foi participar de um moot court de arbitragem. O módulo foi também um dos pontos altos do curso. Tivemos que fazer muito do que hoje se vê com frequência nas competições de arbitragem: peças escritas, debates sobre estratégias, argumentos orais. Tivemos que ouvir testemunhas, apresentar e defender pontos de vista. Um dos professores foi Pierre Tercier, ex-presidente da Câmara de Arbitragem da CCI, um dos grandes nomes da arbitragem no mundo.

Em resumo, depois de mencionar alguns professores, posso dizer que o corpo docente é muito qualificado, de formação sólida e diferentes nacionalidades. Tivemos aulas com professores da Itália, Estados Unidos, Espanha, Suíça, Alemanha, Inglaterra etc. Este não é um artigo de marketing do curso que fiz, então há naturalmente pontos que não foram perfeitos; houve algumas aulas que não foram legais e alguns professores que deixaram a desejar – mas tudo dentro de uma margem de erro que considero natural (nunca estudei em Harvard, mas acho que por lá também há algumas aulas ou professores que ficam abaixo da expectativa). A rotina de aulas tão intensa durante a semana reduz o tempo de estudo solitário de leitura e fichamentos; esse é um ponto que considero negativo.

No final do período face-to-face na Itália, tivemos de identificar o assunto sobre o qual iríamos escrever o trabalho de conclusão de curso. Essa parte é assessorada por professores e tutores. Elaboramos um projeto e apresentamos oralmente em uma banca de três professores. Eles avaliam, corrigem e dão sugestões de aprimoramento. Com as idas à biblioteca da Universidade de Turim, pudemos também reunir material de pesquisa.

Quando voltamos ao Brasil, tivemos quatro meses para escrever a dissertação – a minha foi sobre a aplicação dos Princípios Unidroit no Brasil, a da Marcelle sobre contratos de transferência de tecnologia.

O LL.M. na Itália me abriu portas importantes no Brasil. Assim que voltei, passei a integrar a equipe de arbitragem da PUC-PR, ao lado dos Professores Carlos Pianovski e Helena Coelho. Os alunos estavam se preparando para o Vis Moot de Viena de 2014, que cobra conhecimentos de arbitragem internacional e CISG. Foi uma ótima oportunidade para iniciar minha vida acadêmica na PUC-PR.

Deixando de lado a parte acadêmica da viagem, posso dizer que morar na Itália foi absolutamente maravilhoso. Não conhecíamos o país e fomos muito bem recebidos. Vivemos muito felizes. É um país lindo, com comida maravilhosa, cultura e história inesgotáveis. Ao final, na nossa percepção, concluímos que o italiano é o europeu mais parecido com o brasileiro – mais até do que o português.

Além disso, a experiência de convivência no curso com os outros alunos foi muito enriquecedora. Havia italianos na nossa turma, mas a maioria era de diferentes nacionalidades – Canadá, EUA, Espanha, Argentina, Irlanda, Nigéria, Quênia, Índia, Moldova etc. Trabalhar em equipe com pessoas cujos hábitos e percepções do mundo são tão diferentes é desafiador e nos faz pessoas melhores. No campus das Nações Unidas havia também inúmeros outros cursos de maior ou menor duração, de modo que havia sempre pessoas novas chegando e saindo, com suas culturas e visões do mundo.

Terminamos o curso com a certeza de que os clichês “todo mundo gosta disso”; ou “todo mundo concorda com isso” são simplesmente uma ilusão. Há um mundo lá fora enorme com muito mais cores e sabores do que os que estamos acostumados a vivenciar. Em suma, voltamos ao Brasil com mais bagagem jurídica e, principalmente, de vida.

Depois de concluir o LL.M. em 2013, seguimos os estudos no mestrado da PUC-PR. Após concluir os créditos, tínhamos de escrever a dissertação de mestrado. Para aprofundar a pesquisa, fomos para o Instituto Suíço de Direito Comparado, em Lausanne, na Suíça. Mas essa já é história para uma outra oportunidade…

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*Guilherme Freire de Melo Barros – Procurador do Estado do Paraná, Mestre em Direito Econômico e Socioambiental pela PUCPR e Professor da PUCPR. Possui LL.M em Contratos Internacionais e Resolução de Disputas pela Universidade de Turim/Itália.

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