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Dividendos das estatais também são receitas públicas

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Marcus Abraham

Marcus Abraham

22/03/2021

Cerca de 20 dias atrás, passamos por um momento de turbulência na economia em decorrência de fatos de gestão que envolveram importantes empresas estatais brasileiras, como a Petrobras, Eletrobras e o Banco do Brasil.

Esta coluna, que tem sempre um foco acadêmico e didático, e um olhar voltado à análise jurídico-fiscal de questões que se apresentam no nosso dia a dia, sem emitir qualquer juízo ou opinião de natureza política, pretende hoje abordar a temática dos dividendos que as estatais podem gerar e que têm natureza jurídica de receita pública, podendo contribuir positivamente com as contas públicas.

Antes de tudo, é importante revisitar as modalidades de receitas públicas que o nosso Direito Financeiro contempla.

As receitas públicas em sentido amplo podem se originar: a) do patrimônio estatal: da exploração de atividades econômicas por entidades estatais ou do seu próprio patrimônio, tais como as rendas do patrimônio mobiliário e imobiliário do Estado, receitas de aluguel e arrendamento dos seus bens, de preços públicos, compensações financeiras da exploração de recursos naturais e minerais (royalties), de prestação de serviços comerciais e de venda de produtos industriais ou agropecuários; b) do patrimônio do particular: pela tributação, aplicação de multas e penas de perdimento, recebimento de doações, legados, heranças vacantes etc.; c) das transferências intergovernamentais: relativas à repartição das receitas tributárias transferidas de um ente diretamente para outro ou por meio de fundos de investimento ou de participação; d) dos ingressos temporários: mediante empréstimos públicos, ou da utilização de recursos transitórios em seus cofres, como os depósitos em caução, fianças, operações de crédito por antecipação de receitas etc.

Exatamente no primeiro item acima – do patrimônio mobiliário estatal – identificamos a remuneração que advém dos dividendos pagos pelas empresas públicas e sociedades de economia mista, em que o Estado detém a totalidade ou parcela das cotas ou ações daquelas sociedades empresariais (sendo consideradas “estatais” aquelas em que o Estado detém o controle acionário). Portanto, quando empresas como o BNDES, a CEF, o Banco do Brasil, a Eletrobras ou a Petrobras obtêm lucros, elas geram rendimentos financeiros ao Estado ao distribuírem dividendos e juros sobre capital próprio (JCP) aos seus acionistas, controladores ou não.

Não se pode esquecer que a alienação destes títulos em processos de privatização gera, também, rendimentos financeiros para o Estado. Porém, neste caso, o rendimento financeiro se dará de uma única vez, com o pagamento do preço das ações alienadas pelo “mercado” ao Estado.

A propósito, é o Decreto nº 2.673/1998 que dispõe sobre o pagamento de dividendos e juros sobre o capital próprio das empresas estatais federais. Sobre a destinação de tais recursos, o § 2º do artigo 1º do referido decreto estabelece que, após deliberação em Assembleia Geral de acionistas, “o recolhimento, ao Tesouro Nacional, de dividendos ou juros, de que trata este Decreto, far-se-á na Conta Única do Tesouro Nacional, na forma a ser estabelecida pela Secretaria do Tesouro Nacional, nos prazos a seguir: I – pelas sociedades por ações, no prazo máximo de dez dias, a partir da data em que se iniciar o pagamento aos demais acionistas; II – pelas empresas públicas, no prazo máximo de trinta dias, a contar da data da publicação a que se refere o art. 4º deste Decreto”.

Portanto, ao lado dos valores arrecadados com tributos e outras espécies de receitas públicas, os recursos oriundos de parcela dos lucros que as empresas estatais distribuem à União ingressam como recursos financeiros no Tesouro Nacional, em se tratando da esfera federal; e da mesma forma ocorre com as empresas estaduais e municipais, que versarão seus valores aos respectivos cofres.

Apenas para dimensionar o volume de recursos financeiros que ingressam nos cofres públicos federais a título de dividendos e/ou JCP, o montante total, referente ao ano de 2014, foi de cerca de R$ 18,9 bilhões; já relativamente ao ano de 2015, o valor girou em torno de R$ 12 bilhões; por sua vez, dos dividendos e JCP das estatais referentes ao ano base de 2019, o valor foi de R$ 20,870 bilhões, sendo destes R$ 3,708 bilhões do Banco do Brasil, R$ 4,785 bilhões da Caixa Econômica Federal, R$ 9,498 bilhões do BNDES e R$ 1,313 bilhão da Petrobras.

E, conforme anunciado há cerca de três semanas, referente aos lucros do ano de 2020, somente a Petrobras repassará em breve ao Governo Federal R$ 2,9 bilhões, de um total de R$ 10,3 bilhões que distribuirá a seus acionistas.

Não nos olvidemos de que, para além de dividendos, todas as empresas – públicas ou privadas – movimentam a economia, geram empregos diretos e indiretos, pagam tributos e fornecem bens e serviços para toda a sociedade. Enfim, todas elas acabam por exercer a sua “função social” perante a coletividade.

E tudo isso atendendo aos preceitos constitucionais previstos no art. 5º, inciso XXIII, o qual estabelece que “a propriedade atenderá a sua função social”; no art. 170, prevendo que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I – soberania nacional; II – propriedade privada; III – função social da propriedade”; no artigo 173, contemplando que, “ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei”, sendo que o seu § 1º fixa que “a lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: I – sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade”. Na mesma linha, atente-se ao Código Civil, trazendo em seu art. 421 a previsão de que “a liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato”.

Não à toa, o tema da Governança Ambiental, Social e Corporativa (“ESG – Environmental, Social and Corporate Governance”, em inglês) tem, cada vez mais, ingressado nos debates corporativos. E não poderia ser diferente em relação às empresas estatais. Sem perder o foco no seu “core business”, todas as empresas devem se preocupar não apenas com o retorno financeiro a seus acionistas, mas também com questões ambientais e sociais.

A criação de fundos específicos para gerir e destinar os recursos financeiros advindos da distribuição de lucros das empresas estatais, como se tem noticiado, não deixa de ser uma opção aos governos para propiciar maior transparência fiscal na aplicação dos dinheiros públicos, facilitando ao cidadão visualizar onde esses recursos são aplicados.

Entretanto, devemos lembrar que esta importante modalidade de receita pública – dividendos das estatais – possui natureza eventual e valor variável, não sendo adequada para custear despesas fixas (sobretudo as correntes), uma vez que, em se tratando de atividade empresarial, poderá haver períodos em que os lucros sequer existam ou mesmo nem sejam distribuídos.

O importante é gerir com responsabilidade fiscal seja qual for a modalidade de receita pública, inclusive os dividendos pagos pelas empresas públicas e sociedades de economia mista em que o Estado detenha participação.

E o óbvio ainda impera: quanto mais lucros elas derem, mais dividendos distribuirão, mais tributos pagarão e mais empregos gerarão; por outro lado, o prejuízo destas empresas implicará custos adicionais, muitas vezes absorvidos pelos acionistas, sobretudo o controlador (o que acaba, no fim do dia, sendo repartido por toda a coletividade).

Portanto, essa dimensão de responsabilidade social e gestão adequada é ainda mais aguda em se tratando de empresas estatais, pois, em última instância, o capital para sua criação e mesmo aportes eventuais de seu controlador (o Estado) saem do erário público, o qual, por sua vez, é alimentado pelos recursos provenientes dos cidadãos.

Não em sentido técnico e jurídico, mas recorrendo aqui a uma licença poética, pode-se dizer que, como vivemos em uma república (derivada da ideia de res publica ou coisa pública, em latim), temos uma “pequenina fatia indireta” de participação em todas essas estatais. Sua gestão, destinos e caminhos trilhados – e sua saúde e robustez financeiras – são certamente do interesse de todos nós brasileiros.

FONTE: JOTA

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