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Obras de artes plásticas em nova dimensão

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Gustavo Martins de Almeida

Gustavo Martins de Almeida

31/03/2021

Imagine uma nova dimensão para as obras de artes plásticas, em que além de todas as obras de arte do mundo poderem ser reproduzidas  em ambiente imaterial, sem a corporificação num suporte físico (tela, papel, mármore, madeira, etc.). Acrescente o fato de  algumas delas poderem ser criadas e comercializadas  como obras originais.

O recente caso do artista Beeple ilustra essa hipótese. Uma obra imaterial foi vendida pela Casa de Leilões Christie’s por 69 milhões de dólares em 11.3.2021. Uma obra de arte criada através da “colagem” de milhares de imagens virtuais, tudo em arquivo JPG (abreviatura de Joint Photographics Experts Group, criador desse tipo de arquivo, veja em jpeg.org), que só existe em meio virtual.

Como é possível isso? A evolução do mundo imaterial é evidente, acelerada pela pandemia que nos força a viver numa Ágora virtual.

Se não nos damos conta dessa mudança, basta lembrar que as ações das companhias das quais somos sócios não são representadas por cautelas em papel, são registros imateriais custodiadas em bancos virtuais; as transferências  de dinheiro on line, não se concretizam em remessa de cédulas de um banco para outro, apenas registros eletrônicos; declaramos imposto de renda por meio virtual, sem carimbo na declaração de papel; ouvimos música, geralmente, no Spotify, cada vez mais raros CD e LP, fita cassete é arqueológica; cada vez mais lemos livros no e-book, ou ouvimos por audiobooks, sem o suporte físico de papel. O que circula são impulsos eletrônicos, códigos, senhas, que representam dinheiro, notas musicais, documentos, papel-moeda, etc.

Blockchain e DEFI

Em 2008 surgiu uma tecnologia que permite registrar o curso dessas informações com grande segurança e precisão, de modo que se possa atribuir  a propriedade de determinado bem imaterial,  transferi-la e acompanhar o seu trajeto em termos de vinculação a pessoas. Esse é o sistema blockchain.

Começaram a ser utilizadas nesses sistemas moedas virtuais, baseadas em DeFi, abreviatura de  “descentralized finance”. Não são criadas por governos, nem por instituições, atendem a regras de mercado e vão se disseminando mundialmente, como a Ethereum, Bitcoin.

Podem ser utilizadas como moedas para operações financeiras, como empréstimos, bem como para a aquisição de bens físicos. “O presidente-executivo da montadora de carros elétricos Tesla, Elon Musk, anunciou nesta quarta-feira (24) que as pessoas poderão comprar os veículos usando bitcoins, a principal criptomoeda do mercado.” (O Globo, 24.03.2021).

Fungibilidade

Quem empresta 100 dólares a alguém espera receber os mesmos 100 dólares, mas não necessariamente a mesma cédula representativa da quantia que foi emprestada; podem ser outras cédulas ou uma remessa eletrônica.

No mundo físico, se empresto para alguém 1 kg de café, não espero receber de volta a mesmíssima embalagem que entreguei, com igual peso e conteúdo, pois será consumido. Serei restituído  com  produto igual no peso, mas equivalente nas características e dimensões. Trata-se de bem fungível, isto é que pode ser substituído por outro de igual qualidade, sem perda da substância.

Já se empresto um livro dos Rolling Stones com autógrafo original de  Mick Jagger para mim, o destinatário fica obrigado a devolver aquele mesmíssimo livro. Não há outro igual. Aquele bem emprestado deve ser o mesmo a ser restituído, no prazo e nas mesmas condições. Esse livro autografado tem características singulares, não pode ser substituído; é infungível.

A característica básica dos bens imateriais é a sua reprodutibilidade,  geralmente sem perda de qualidade. Uma foto da Mona Lisa, tirada em altíssima resolução, circula pela internet aos milhões. Confiram-se por exemplo, as reproduções do riquíssimo Google Arts and  Culture.

Vamos supor, no entanto, que em uma, apenas uma, dessas  milhões de reproduções, fosse possível acrescentar um código invisível,  secreto, declarando ser aquele conjunto de símbolos digitais agrupados, aquele arquivo digital,  a reprodução oficial da Mona Lisa para a finalidade de confronto com falsificações.

Esse arquivo, então, teria uma identidade, uma singularidade, uma distinção em relação aos demais; seria “O” arquivo da Mona Lisa, equivaleria a um ….. original digital.

NFT

Então voltamos a cadeia de identificação de bens imateriais, da blockchain, e chegamos ao NFT – Non Fungible Token. O que é o NFT? Basicamente um certificado digital, impossível de ser copiado ou falsificado, que atesta a existência de determinado bem, tornando-o não fungível. Seria um carimbo imaterial na obra, porém plenamente visível, identificável, rastreável e com força atributiva de propriedade.

Assim, uma fotografia digital da cantora Madonna, que tenha um certificado NFT atestando que aquela foto, “codificada” e expressa em determinado arquivo JPG,  é a original, é a referência, ela será  única. Muito embora possam existir arquivos  iguais no mundo inteiro, aquela é “A” foto daquele tema, por ter um código, uma “marca d´água virtual” vinculada unicamente a ela no blockchain. Seria o original digital.

Podem até existir fotos impressas também, mas no mundo virtual, aquela será a única.

Então a tecnologia conseguiu que o mundo imaterial  reproduzisse quase por completo – às vezes aprimorasse –   o mundo real.

Relembrando. E books, arquivos digitais musicais, JPEGS, MPEGS, hologramas, avatares, projetam o  mundo real na dimensão do imaterial

No mundo das artes plásticas é possível essa reprodução. Desde Nam June Paik, artistas também se utilizam das ferramentas digitais para criar seus produtos. Sites, hologramas, sons eletrônicos, conversão de sons em imagens num Blender.

No âmbito material um artista plástico cria  quadros ou esculturas em telas e mármore, e expede certificado de autenticidade vinculado a cada uma dessas obras. Mas pode também criá-las em suporte imaterial e vincular um NFT a cada uma delas. Assim é possível coexistirem obras no mundo real para serem exibidas em parede ou pedestais, mas também no mundo imaterial, para serem reproduzidas em telas apropriadas, como no sistema de tela digital  Meural que reproduz seus trabalhos digitais em sequência programada, numa tela eletrônica  afixada na parede.

E essas obras imateriais estão vinculadas indissociavelmente a um NFT, como a de Beeple, referida no início, que lhe dão caráter de singularidade, individualidade, enfim exclusividade. Além do mais o registro de propriedade e autenticidade dessas obras, bens móveis imateriais,  fica atestado na blockchain, impedindo falsificação e “furto”.

Proteção das obras imateriais pelo direito

A lei brasileira de direito autoral considera os direitos autorais bens móveis (art. 3º) e protege as obras imateriais, no seu art. 7º:

Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, TANGÍVEL OU INTANGÍVEL, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:

O mesmo corre com as leis correspondentes na Itália, França, e Portugal, que também protegem obras imateriais, como por exemplo os ebooks.

Fica demonstrado que existe proteção legal para as obras imateriais no Direito Brasileiro, mas sempre sujeitas ao princípio de autorização por parte de seu autor ou titular (art. 29).

Transferência dos bens

Para a transferência de bens imóveis a lei brasileira exige um registro. Já  para os bens móveis não há esse requisito;  o bem móvel corpóreo (escultura, pintura) se transmite pela tradição, pela entrega, não sendo essencial um registro. Cria-se, então, um registro para obras de arte  imateriais, que tem enorme utilidade.

Além da identificação da autoria da obra, da sua autenticidade e da sua propriedade, o registro permite outras utilidades, como, por exemplo, dar a obra em garantia de empréstimo de obrigação, e até registrar participação do autor na revenda da obra, caso convencionado.

Obras perecidas

Por último, uma utilidade especial que as obras imateriais podem oferecer. O direito autoral protege as obras de arte, mesmo que … desapareçam. Assim, por exemplo, o quadro Samba, de Di Cavalcanti, infelizmente destruído num incêndio, pode ter vida imaterial se a obra for reproduzida e autenticada por NFT.

O mesmo pode acontecer, a meu ver, com as obras perdidas no triste incêndio de 26.3 em São Paulo. As obras podem ser, então, criadas pelos autores, comercializadas, registradas as transferências, enfim, uma nova vida, imaterial.

Então as obras imateriais certificadas com um NFT podem ter as características de (a) fidelidade em relação a obra física, (b) circulação no mercado, (c) dificuldade de falsificação, (d) preservação da memória, e (e) ficarem sujeitos a valoração pelo mercado.

Exemplo recentíssimo dessas características  está na galeria Superchief em Nova Iorque que abriu em 25.3 uma exposição de obras de arte certificadas por NFT e expostas em telas digitais de alta resolução.

A inovação  está se disseminando na velocidade da internet. A potencialidade dos NFTs parece ser infindável.

* * *

O mundo imaterial se amplia irreversivelmente. Nos negócios, nos hábitos cotidianos de leitura e reprodução musical, e agora no mundo das artes, as habilidades humanas são absorvidas e transpostas para essa nova dimensão, que coexiste com o mundo palpável.

De um modo geral, foi exposto o trajeto dessa tecnologia e as utilidades do NFT em relação as obras de arte. Uma nova dimensão se apresenta, com inúmeras oportunidades e novidades, que desafiam o direito, o mercado de artes e toda a sociedade.


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