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Novamente os princípios orçamentários

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Marcus Abraham

Marcus Abraham

19/04/2021

Por duas vezes, esta coluna teve a oportunidade de abordar a temática dos princípios orçamentários fundantes e norteadores para uma boa gestão fiscal. A primeira vez foi há pouco mais de cinco anos, em 4 de fevereiro de 2016, quando publicamos o texto intitulado “Onze princípios orçamentários para uma gestão responsável”. No ano seguinte, em 30 de outubro de 2017, publicamos o texto “Diretrizes orçamentárias da OCDE”, onde se apresentava o resultado de um estudo daquela instituição internacional no qual são identificados 10 princípios para orientar as boas práticas sobre toda a atividade orçamentária.

Passado esse tempo, agora, neste início do mês de abril de 2021, revisitamos o assunto dos princípios orçamentários, com um olhar focado no atual contexto fiscal que vivenciamos, após a recente – embora tardia – aprovação pelo Congresso Nacional do projeto de lei orçamentária federal de 2021, cuja proposta original enviada pelo Poder Executivo recebeu sensíveis alterações.

Noticia-se na imprensa em geral que haveria um possível “impasse orçamentário” entre os Poderes diante do que foi inicialmente proposto e do resultado final do Projeto de Lei do Congresso Nacional nº 28 de 2020 (PLOA 2021), enviado agora para sanção presidencial.

Dentre as críticas apresentadas – não apenas por especialistas na matéria, mas também por ambos os lados progenitores da LOA – indicando a criação de uma lei orçamentária para o ano de 2021 inexequível e irreal, já apelidada de “peça de ficção”, destacam-se os seguintes problemas: ter havido subestimação nos montantes dos gastos (inclusive assistenciais e previdenciários) – sobretudo pela proposta inicial estar baseada numa projeção de inflação inadequada (de apenas 2%), que estaria desatualizada e abaixo da efetivamente vivenciada no corrente ano de 2021 –, além de apurar e designar valores para o custeio da máquina estatal em montante muito inferior ao efetivamente necessário, implicando possível “shutdown”; e terem sido feito cortes de gastos na Casa Legislativa, inclusive em despesas obrigatórias, para que se pudessem destinar valores para as emendas parlamentares.

Pois bem, antes de adentrarmos a questão dos princípios orçamentários, é necessário dizer que a participação conjunta dos Poderes Executivo e Legislativo no processo orçamentário é mais do que lícita e legítima, integrando o que denominamos de “democracia orçamentária”.

Afinal, como sabemos, está previsto expressamente em nossa Constituição de 1988 que a iniciativa dos projetos de leis orçamentárias é privativa e vinculada – na modalidade de “poder-dever” – do Poder Executivo (art. 165), e estes deverão ser encaminhados ao Poder Legislativo para que sejam apreciados (art. 166), inclusive podendo – e por vezes devendo – sofrer modificações, aperfeiçoamentos ou ajustes, a partir de emendas parlamentares que são também constitucionalmente previstas e reguladas. Após, o que restar aprovado na Casa Legislativa deverá ser encaminhado à Presidência da República para sanção ou veto, total ou parcial.

Porém, neste procedimento de criação das leis orçamentárias anuais há uma série de parâmetros que devem ser seguidos. Primeiramente, o conteúdo do orçamento público deve estar sempre de acordo com o estabelecido na respectiva lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e vinculado ao previsto na lei do plano plurianual (PPA). Segundo, deve-se respeitar as limitações financeiras decorrentes do Teto de Gastos instituído pela Emenda Constitucional nº 95/2016. Terceiro, mas não último, é imperioso observar as regras impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal e demais normas constitucionais e infraconstitucionais do Direito Financeiro.

Para além destas três advertências sobre parâmetros basilares quanto ao orçamento público no Brasil, não podemos nos esquecer de alguns princípios orçamentários que são relevantíssimos e aparentemente foram deixados de lado recentemente. Sua observância e respeito impõem ao administrador público uma atuação de molde a garantir o cumprimento da finalidade do orçamento público em sua elaboração, interpretação e execução.

Aqui não me refiro aos tradicionais princípios orçamentários da legalidade, unidade, publicidade, exclusividade, dentre outros. Destacaria, diante do atual contexto fiscal e orçamentário, a importância do respeito aos princípios da sinceridade orçamentária, da transparência fiscal, da sustentabilidade financeira e da equidade fiscal intergeracional.

O princípio da sinceridade orçamentária visa coibir os orçamentos considerados “peças de ficção”, que acabam sendo realizados em desacordo com a realidade econômica e social, com base em receitas “superinfladas” e despesas subestimadas ou inexecutáveis. Este postulado pode ser considerado também como princípio orçamentário da exatidão.

Sua fundamentação decorre do respeito aos princípios da moralidade, da legalidade, da transparência e do planejamento orçamentário, no ideal de boa-fé para com a sociedade daqueles que elaboram, aprovam e executam o orçamento público.

O princípio orçamentário da transparência obriga não somente à ampla divulgação do orçamento público, mas principalmente impõe que as suas previsões, tanto de receitas e despesas públicas, assim como as renúncias fiscais, sejam dispostas de maneira facilmente compreensível para todos. Pretende, principalmente, coibir a existência de despesas obscuras ou a inclusão de verbas, programas ou benefícios fiscais imprecisos ou inexplicáveis que, por falta de clareza ou transparência, possam induzir a erro ou serem manipulados para atender a objetivos diversos dos originalmente previstos e aprovados. Este princípio visa também coibir a denominada “contabilidade criativa” no orçamento público, em que manobras fiscais ilegítimas e de legalidade duvidosa acabam sendo adotadas para maquiar os números estabelecidos no orçamento, os resultados financeiros e as metas fiscais.

O princípio orçamentário da sustentabilidade financeira, derivado do ideal de equilíbrio fiscal em uma gestão responsável, recomenda que para toda despesa haja uma receita suficientemente bastante para financiá-la, a fim de evitar o surgimento de déficits orçamentários crescentes ou descontrolados, que possam prejudicar as contas públicas presentes e futuras. Através dele almeja-se alcançar resultados eficientes que permitam a protração no tempo de um equilíbrio de modo estável ou sustentável para a presente e as futuras gerações, com a gestão racional e prudente da dívida pública, numa noção de solidariedade e equidade intergeracional.

Como seu desdobramento, temos o princípio orçamentário da equidade fiscal intergeracional, que revela a capacidade financeira de uma nação satisfazer necessidades atuais sem comprometer as futuras. Pretende-se garantir que não se imporá às gerações futuras o ônus financeiro da dívida pública contraída no passado, de maneira que haja uma justa e proporcional distribuição entre diferentes gerações dos benefícios obtidos com a atividade estatal e os custos para o seu financiamento.

Não podemos nos olvidar de que o Direito Financeiro moderno e todas as suas regras e princípios orçamentários possuem a elevada função de direcionar positivamente os atos dos governantes e influenciar para melhorar a vida em sociedade.

E o orçamento público, nesse contexto, é um importante instrumento que integra a nossa democracia e garante a realização da cidadania fiscal. É, portanto, um mecanismo jurídico de racionalização do processo de alocação de recursos, dotado de valores éticos que não podem ser menosprezados. Lealdade, correção e veracidade compõem o substrato com o qual os Poderes Executivo e Legislativo devem conduzir todo o processo orçamentário, sob pena de desmoralizar a significância das leis orçamentárias e prejudicar o cidadão, ao aprovarem orçamentos que não são capazes de garantir recursos suficientes para a satisfação das necessidades sociais.

Num momento tão difícil como o atual, com premência de recursos para necessidades fundamentais, sobretudo para o enfrentamento da pandemia da COVID-19, ainda temos que debater os pressupostos e princípios de que partimos para tratar as matérias orçamentárias, pois, como nos recorda Aristóteles, “um pequeno erro no princípio acaba por tornar-se grande no fim”.

FONTE: JOTA

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