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03/01/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 146
MARÇO-ABRIL DE 1953
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto

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SUMÁRIO: Do direito de expulsar. Limites. O art. 143 da Constituição federal. Anistia.

Sobre o autor

Dardeau de Carvalho, promotor público no Distrito Federal.

NOTAS E COMENTÁRIOS

Expulsão de estrangeiros

Expulsar, segundo os léxicos, é expelir com fôrça, fazer sair por castigo (CÂNDIDO DE FIGUEIREDO). Expulsar um estrangeiro, pois, é fazê-lo sair do território nacional, inclusive com o emprêgo da fôrça ou da violência.

Do direito de expulsar

O direito de expulsão, embora contestado por alguns internacionalistas, tem sido usado sempre pelos Estados, que nêle vêem uma medida de segurança da ordem interna. A expulsão, – dizem os que a defendem – baseia-se na necessidade que o Estado tem de defender as próprias instituições, eliminando do seu meio os estrangeiros perniciosos ou nocivos à tranqüilidade pública.

As razões apresentadas para justificar o instituto são realmente muito débeis e apenas refletem a persistência, no estado atual das relações internacionais, de um estágio inferior de civilização. O direito de expulsão não é mais do que simples reminiscência do ódio que ao estrangeiro se votava nas sociedades antigas. O estrangeiro, ainda hoje, é o hostes, o inimigo potencial que deve ser tratado com desconfiança e em plano inferior. Existe para êle, estigmatizando-o, uma justiça especial, consubstanciada no direito de expulsão, medida odiosa pelo só discrime que estabelece entre homens naturalmente iguais.

A verdade, porém, é que a faculdade de expulsar estrangeiros é uma constante na política dos povos, sendo exemplo disso o próprio Brasil, que dela se vem utilizando desde o regime imperial: o regulamento n° 120, de 30 de janeiro de 1842, e a lei n° 2.615, de 4 de agôsto de 1875, continham preceitos relativos à expulsão de estrangeiros.

Depois da proclamação da República, a matéria foi regulada pela lei n° 1.641, de 7 de janeiro de 1907, para cuja execução foi baixado o dec. n° 6.484, de 23 de maio de 1907. Foram êstes, verdadeiramente, os primeiros diplomas legais que o Brasil editou sôbre expulsão de estrangeiros.

Essa legislação, todavia, só vigorou até 1921, quando foi reformada pela lei número 4.247, de 6 de janeiro dêsse ano. O problema, até então sem assentamento constitucional, foi objeto de estudos na reforma de 1926. Dêsses estudos nasceu o § 33 do art. 72 da Constituição de 24 de fevereiro de 1891, assim redigido:

“É permitido ao Poder Executivo expulsar do território nacional os súditos estrangeiros perigosos à ordem pública ou nocivos aos interêsses da República”.

A Constituição de 1934 também continha dispositivo sôbre o direito de expulsão (o art. 113, n° 15), o mesmo não ocorrendo com a Constituição de 1937, que só se ocupou dêsse instituto para declarar que competia à União o poder de legislar sôbre “a expulsão de estrangeiros do território nacional”.

A Constituição de 18 de setembro, entretanto, volta aos sistemas de 1926 e 1934 e confere ao governo federal, expressamente, a faculdade de expulsar estrangeiros. Diz, a êsse respeito, o art. 143:

“O govêrno federal poderá expulsar do território nacional o estrangeiro nocivo à ordem pública, salvo se o seu cônjuge fôr brasileiro, e se tiver filho brasileiro (art. 129, ns. I e II), dependente da economia paterna”.

Os preceitos da lei n° 4.247, contudo, foram mantidos até 1938. A 27 de abril dêsse ano foi baixado o dec.-lei n° 392, que teve felizmente duração efêmera. É que o dec.-lei n° 479, de 8 de junho de 1938, ainda em vigor, regulou sob novos moldes a expulsão de estrangeiros, cujo processo obedece às prescrições constantes do decreto-lei n° 554, de 12 de julho de 1938.

O art. 143 da Constituição, incluído no título IV, capítulo II, que trata dos direitos e garantias individuais, contém, na verdade, a declaração de um direito – o direito do Estado de expulsar o estrangeiro nocivo à ordem pública – e a concessão de uma garantia – a garantia, para o estrangeiro, de que a expulsão não será decretada se o seu cônjuge fôr brasileiro, e se tiver filho brasileiro dependente da economia paterna.

A declaração do art. 143, por certo, não era de todo indispensável. O direito de expulsão, realmente, não ficaria elidido se êle não existisse. O direito de expulsão nesse caso, resultaria, não só da natureza intrínseca da medida – ato de soberania internacionalmente reconhecido, – como da disposição do art. 5°, n° XV, letra n, que confere à União competência para legislar sôbre naturalização, entrada, extradição e expulsão de estrangeiros.

Na competência para legislar sôbre expulsão, portanto, estaria implícito o poder de expulsar, que não procederia, destarte, do art. 143, mas, sim, do próprio art. 5°, n° XV, letra n. A Constituição de 1937 não continha norma semelhante à do art. 143, mas nem por isso se duvidou, durante a sua vigência, da legitimidade do direito de expulsão que estava assegurado ao govêrno pelo art. 16, n° III, de conteúdo análogo ao do art. 5°, n° XV, letra n, citado.

A garantia concedida pelo art. 143, entretanto, era até certo ponto necessária, porque, do contrário, ficaria ao inteiro arbítrio o legislador a discriminação das causas de inexpulsabilidade, que, inclusive, poderiam ser totalmente eliminadas, como aliás o foram pelo dec.-lei n° 392, felizmente de curtíssima duração.

Ante o exposto, é de concluir-se que o govêrno federal, quando expulsa, age em virtude de lei que a isso o autoriza, e não em virtude da Constituição, pois o art. 143, como vimos, contém apenas a afirmação de uma tese, que torna indiscutível o direito de expulsão. A decretação da expulsão, portanto, não depende da vontade livre do govêrno, mas, sim, da vontade da lei. O govêrno pode expulsar, mas só pode fazê-lo nos limites estritos da legalidade.

Há na expulsão, realmente, certa margem de discrição deixada ao órgão que a delibera, mas essa dose de discrição, que se não confunde com arbítrio, e muito menos com arbitrariedade, significa apenas que o govêrno, por conveniência política, pode deixar de expulsar, embora se trate de caso em que a lei permita a expulsão. Mas, ainda aqui, é preciso que a lei lhe deixe essa margem de discrição, que, embora conveniente, não é conseqüência necessária do art. 143.

O art. 143 não é demais repetir, apenas sustenta que o Brasil, apesar das garantias que concede aos estrangeiros residentes, se reserva, em tese, o direito de expulsá-los do território nacional, desde que se revelem nocivos à ordem pública. É essa, ao que parece, a única conclusão que se pode tirar do art. 143, que não sanciona, de modo algum, a conclusão de que a expulsão em si mesma, seja ato discricionário do govêrno, quer no decretá-la, quer no deixar de decretá-la. Tudo que o govêrno pode fazer ou deixar de fazer, relativamente à expulsão, detende da lei com a só limitação do art. 143, que, como regra absoluta que é, se impõe à observância do legislador ordinário.

Outra conseqüência, ainda, do princípio da legalidade da expulsão, é o de que deve resultar da lei, e não do juízo do governo, o conceito de nocividade à ordem pública. À lei, portanto é que cumpre determinar quando o estrangeiro deve ser considerado nocivo à ordem pública. É nesse particular, aliás, que se revela tôda a complexidade das leis reguladoras da expulsão. Regularmente, sendo a expulsão uma providência de resultados gravíssimos, cumpre ao legislador agir com muito cuidado e redobrada prudência no escolher os fatos reveladores da nocividade do estrangeiro.

Limites da expulsão de estrangeiros

O direito de expulsão não pode ser exercido sem limites. Só deve ser utilizado contra os estrangeiros realmente perigosos e capazes de perturbar, efetivamente, a segurança interna. A expulsão, que não raro causa sérios distúrbios à vida do estrangeiro, só deve ser executada quando assim o exigir necessidade real e imediata do Estado. A expulsão, no fundo, é pena imposta ao estrangeiro, e não se cominam penas por motivos fúteis.

Há que assegurar também, numa lei de expulsão, a plenitude de defesa do expulsando, porque assim o querem o espírito do regime e a própria letra da Constituição, que, no art. 141, § 25, assegura plena defesa aos acusados, “com todos os meios e recursos essenciais a ela”.

Não haveria razão, nem jurídica, nem moral, para que se não obedecesse a êsse preceito nos processos de expulsão, que encerram sempre uma acusação mais ou menos grave. O expulsando é acusado e, como acusado, tem o direito incontestável de defender-se.

Seria inconstitucional, portanto, a lei que não assegurasse aos expulsandos o direito de defesa. A forma dessa defesa, é certo, depende da própria lei, que pode reduzi-la aos têrmos mais simples. Não pode, todavia, suprimi-la de maneira absoluta.

As Constituições anteriores, como vimos não cuidaram de mencionar as causas de inexpulsabilidade, deixando a solução do problema à inteira discrição do legislador. A Constituição vigente, pelo contrário, foi expressa a respeito, declarando que não será expulso o estrangeiro, “se o seu cônjuge fôr brasileiro, e se tiver filho brasileiro (art. 129, ns. I e II), dependente da economia paterna”.

Estará limitada, por isso, a esfera de ação do legislador? Poderá êle, a despeito da disposição constitucional, estabelecer outras causas de inexpulsabilidade? A questão, sem dúvida, é delicada, mas, bem pesados os argumentos, deve ter solução negativa.

A Constituição, ao conceder ao govêrno o poder de expulsão, determinou desde logo o limite dêsse poder, de modo que, constitucionalmente, o govêrno só não poderá expulsar o estrangeiro que satisfizer as condições do art. 143, in fine. A especificação legal de outras causas impeditivas da expulsão, – como, por exemplo, a residência prolongada, – importaria restrições que, conforme a sua amplitude, acabariam por anular, pràticamente, o poder do govêrno e, conseqüentemente, o direito de expulsão.

O art. 143 da Constituição federal

A Constituição, no art. 143, confere ao governo, como vimos, um direito – o direito de expulsão. Ora, quando a Constituição confere um direito, as restrições ao seu exercício só poderão provir da própria Constituição. Se esta não lhe traça qualquer limite, há de entender-se que pode ser exercido em tôda plenitude. É esta, aliás, regra de hermenêutica enunciada expressamente: “Quando o estatuto fundamental define as circunstâncias em que um direito pode ser exercido, ou uma pena aplicada, esta especificação importa proibir implicitamente qualquer interferência legislativa para sujeitar o exercício do direito a condições novas ou estender a outros casos a penalidade” (“Hermenêutica e Aplicação do Direito”, 3ª ed., 1941, pág. 369).

É bem de ver, portanto, que os princípios da exegese constitucional, bem como a própria finalidade da expulsão, que justificam como medida de defesa da segurança interna, – se contrapõem, na espécie, à liberdade de ação do legislador.

O art. 143 permite seja expulso o estrangeiro nocivo à ordem pública, salvo se o seu cônjuge fôr brasileiro, e se tiver filho brasileiro, dependente da economia ” paterna”. Neste caso, é evidente, ele não poderá ser expulso. Pergunta-se, porém: são necessárias as duas condições – cônjuge e filho – ou basta a existência, de uma delas – cônjuge ou filho?

O exame dos trabalhos parlamentares que resultaram no art. 143 revela, sem dúvida, que é necessário coexistam as duas condições para que o estrangeiro não possa ser expulso. Seria esta, não há negar, a vontade do legislador.

O art. 143 tem por fonte o art. 160, parág. único, do projeto primitivo, que assim dispunha: “O govêrno federal poderá expulsar do território nacional o estrangeiro perigoso à ordem pública ou nocivo aos interesses nacionais, salvo se, casado com brasileiro, tenha filho brasileiro nato, na dependência da economia paterna”.

Êsse parágrafo, segundo informa JOSÉ DUARTE (“A Constituição Brasileira de 1946”, 3° vol., pág. 86), aprovado no primeiro turno da votação, recebeu várias emendas, entre elas a de n° 1.330, que, aceita pela Subcomissão respectiva, determinou ficasse o dispositivo com a seguinte redação: “O govêrno federal poderá expulsar do território nacional o estrangeiro perigoso à ordem pública”. Assim passou ele para o projeto revisto.

Na discussão final, entretanto, os Srs. CARLOS PRESTES e MAURÍCIO GRABOIS requereram destaque para a emenda n° 3.143 (anteriormente rejeitada pela Subcomissão), com o fim de substituir o art. 143 do projeto revisto pelo parág. único do art. 160 do projeto primitivo, ou melhor, acrescentar ao atual art. 143 o seguinte: “salvo se, casado com brasileira, tenha filho brasileiro nato, na dependência da economia paterna”.

A Comissão de Constituição, falando pelo Sr. MÁRIO MASAGÃO, concordou com a proposta constante do destaque, para que se acrescentasse ao texto do projeto revisto a cláusula proposta. Acontece, porém, que o Sr. CARLOS PRESTES, depois de declarar que a concordância do relator da Comissão atendia ao pensamento da emenda, pediu atenção para um ponto de redação, dizendo: “Talvez fôsse possível incluir-se no texto – “tanto brasileiro como brasileira, para atender-se ao caso da estrangeira casada com brasileiro”.

A Comissão de Redação, entretanto, não soube exprimir com clareza o pensamento da Assembléia, evidentemente manifestado em prol da concomitância das condições, máxime se considerarmos que foram rejeitadas as emendas ns. 3.145 e 3.985, que se batiam pela disjuntiva ou, e 3.151, que dispensava a condição de ser brasileiro o cônjuge.

A queda dessas emendas, certamente, não seria argumento decisivo, pois elas não foram pròpriamente rejeitadas; ficaram prejudicadas, o que é bem diferente, pela aceitação da emenda n° 1.330, que suprimia a exceção constante o art. 160, parágrafo único, do projeto primitivo. De qualquer modo, porém, o dispositivo aprovado exigia as duas condições, com o adminículo, aliás desnecessário, do Sr. CARLOS PRESTES.

Os trabalhos parlamentares, contudo, não são a última palavra em hermenêutica. Há até quem os relegue – e não são poucos – para plano secundário, dando preferência a outros processos de interpretação, entre êles o processo finalístico ou teleológico. É preciso, pois, pesquisar a finalidade da lei, no caso a finalidade da exceção consignada no art. 143.

A Constituição, no art. 143, in fine visa menos ao interêsse do estrangeiro do que à proteção dos brasileiros que dêle dependem. A proteção ao estrangeiro, no caso, é apenas reflexo da proteção devida aos brasileiros, que a Constituição não permite, nem poderia permitir, sejam expulsos. Determinar, porém, a expulsão do estrangeiro que tenha cônjuge brasileiro, mas que não tenha filho, seria autorizar a expulsão do brasileiro; seria, em suma, realizar por via indireta aquilo que não poderia ser realizado diretamente.

É certo que o cônjuge brasileiro, nesse caso, tem a liberdade de seguir ou não o companheiro expulso. Legislar com êsse espírito, entretanto, seria legislar sem o substrato ético que dá às leis a sua fôrça natural. Não é possível que a Constituição queira colocar o cônjuge brasileiro nesse dilema, que se reveste de angustiantes características: de um lado, o dever moral, o próprio dever jurídico, de não abandonar o companheiro no momento justo da vicissitude e do infortúnio; de outro, o sentimento de pátria, o confôrto e a proximidade dos parentes e amigos, que teriam de ser trocados pela vida em terra estranha.

Os filhos menores, então, nem esta pseudo-liberdade teriam, pois os filhos menores são obrigados, pelo próprio Código Civil brasileiro, a seguir o domicílio do pai. Sofreriam êles, involuntàriamente, a penalidade imposta aos pais, a não ser que se pretendesse deixá-los no Brasil.

Mas expulsar o pai, deixando os filhos no Brasil, disse muito bem o ministro OTAVIO KELLY no julgamento do habeas corpus n° 28.091, “é sacrificar o interêsse dêstes, que são brasileiros e não podem ser desamparados – e, se infantes, sofrerem a pena imposta a seus pais” (“Direito”, vol. XVIII, pág. 296).

É deveras ponderável, sem dúvida, o direito de expulsão atribuído ao Estado. Não menos ponderável, contudo, é o dever que êle tem de tratar os nacionais com a consideração que devem merecer. Se a inexpulsabilidade do estrangeiro acarretasse a impunidade dos atos por êle praticados, ainda se compreenderia o sacrifício dos interêsses do brasileiro dependente. Mas o Brasil tem leis, e se não as tem devia tê-las, capazes de reprimir e prevenir os surtos da criminalidade. Nessas condições, se o estrangeiro comete crime no Brasil, que responda perante os nossos tribunais e só seja expulso quando a expulsão resultar num castigo exclusivamente pessoal.

O Brasil não permite a extradição de brasileiros ( Constituição, art. 141, § 33). Não permite, pois, seja entregue a país estrangeiro o nacional que nela delinqüiu; permite, todavia, seja expulso do Brasil o brasileiro que nenhum crime cometeu.

O art. 141, § 30, da Constituição, enfàticamente declara que “nenhuma pena passará da pessoa do delinqüente”. Mas a expulsão – que em certo sentido não deixa de ser pena – passa da pessoa do expulsando para a do cônjuge ou dos filhos brasileiros, que devem sofrer as conseqüências de atos que não praticaram.

A Constituição também diz, de maneira categórica, que não haverá pena de banimento (art. 141, § 31). Mas o cônjuge brasileiro ou os filhos brasileiros do estrangeiro que venha a ser expulso podem ser banidos do Brasil; devem suportar sem clamor a pena absolutamente proscrita.

Ora, se a Constituição tem um sistema, se tem a informá-la um espírito de unidade e de conjunto, fôrça é convir que o art. 143, in fine, ficará deslocado se se entender que as condições nêle previstas devem ser coexistentes. Êsse entendimento, admitindo-se não contrarie expressamente a letra de quaisquer dêsses artigo, seria contrário ao pensamento nêles dominante.

Tudo indica, portanto, que as condições devem ser alternativas. Essa é a opinião de PONTES DE MIRANDA (“Comentários à Constituição de 1946”, vol. III, pág. 385). É também a opinião de vários ministros do Supremo Tribunal, onde prevalece, contudo, a opinião contrária.

A expulsão, no Brasil, é determinada. por decreto. Êsse decreto, em última análise, contém apenas uma ordem, um comando que deve ser obedecido. Não se confundem, por isso, a resolução de expulsar (decreto) com a execução da medida. (saída do território nacional). Esta, via de regra, realiza-se por conta do Estado que expulsa para o Estado da nacionalidade do expulsando.

Mas isso não quer dizer que a expulsão não possa ser executada com os recursos do próprio expulsando e para outro país que não o da nacionalidade dêste. A única distinção que existe entre a saída para o Estado da nacionalidade ou para outro Estado, está em que o primeiro é obrigado a receber o expulsando, ao passo que os demais só o receberão se quiserem. Em qualquer caso, porém, o mandamento soberano se cumpre, porque, em qualquer caso, o estrangeiro deixa o território nacional.

O decreto de expulsão, como vimos, o que determina é que o estrangeiro expulso saia do país. Como em geral o estrangeira recalcitra, obstina-se em cumpri-lo, vê-se o Estado, para que se não enfraqueça a sua autoridade, na contingência, de embarcá-lo, de pô-lo a bordo manu militari, custeando-lhe as despesas para o Estado da nacionalidade.

A expulsão, entretanto, não se despe do seu caráter compulsório se o estrangeiro se propõe ingressar em outro país, executando por si mesmo a medida. Havendo um decreto de expulsão, devidamente conhecido do expulsando por notificação hábil, a saída do território nacional, após êsse conhecimento, presume-se saída obrigatória, não voluntária, em conseqüência da expulsão.

Não está na lei, nem na doutrina, que o estrangeiro deva sempre ser entregue ao país de origem. A lei (dec.-lei n° 554), pelo contrário, dá a entender que o expulsando só não poderá desembarcar, como é óbvio, em outra parte do território nacional, porque, nesse caso, não teria havido realmente expulsão. Não será demais, portanto, o permitir-se (quem fala em permissão supõe um ato de autoridade) que o estrangeiro se destine a outro Estado que não o da nacionalidade, se êle encontra, bem entendido, Estado terceiro que queira recebê-lo.

Não se diga que isso seria permitir, sem aviso prévio, o ingresso de elementos indesejáveis em outro país, que não poderia tomar contra êles as medidas julgadas convenientes. O ato de expulsão, pelo menos no Brasil, é ato público, consta de decreto que se presume conhecido das representações diplomáticas estrangeiras acreditadas junto ao govêrno do Brasil. Nenhuma delas, de outra parte, concede “visto” de entrada nos respectivos países sem que o pretendente faça prova de bons antecedentes. Nenhuma delas, portanto, pode alegar ignorância da expulsão ou dos seus motivos.

E certo que o intercâmbio entre as nações, pelo menos em teoria, está submetido à censura da ordem jurídica Internacional. Assim, se o Brasil procurasse lançar em outros Estados, e à revelia dêles, indivíduos perigosos e convencidos de crimes comuns – hipótese, aliás, de difícil realização, – estaria na verdade violando o direito das gentes, visto como em todos os Estados existe um sentimento geral de repulsa contra o crime.

A simples permissão de ingresso, porém, não poderia ser encarada com êsse caráter, porque, além de se tratar de permissão genérica, que não menciona pais algum, depende do beneplácito do país para o qual o estrangeiro tenha requerido a entrada.

Outra questão se apresenta ainda em matéria de expulsão. Poderá o estrangeiro expulso regressar ao Brasil se o fato determinante da expulsão foi objeto de anistia? Cometerá êle, nesse caso, o crime previsto no art. 338 do Cód. Penal?

Anistia

Anistia, de a (não) e mnasthai (lembrar), significa, literalmente, não lembrar. Anistiar, assim, é esquecer, olvidar. Conceitualmente, portanto, a anistia importa o esquecimento do passado. É esta, aliás, a finalidade precípua da anistia, segundo o ensinamento de todos os escritores que tratam do assunto: “com ela (a anistia), olvida-se o ato criminal, com a conseqüência de se lhe não poderem atribuir efeitos de direito material ou processual. Aconteceu o ato; agora, indo-se ao passado, onde êle está, acontece juridicamente desaparecer, deixar de ser, “não ser” (PONTES DE MIRANDA, “Comentários à Constituição de 1946”, vol. I, página 273).

“A anistia jamais corresponderá ao esquecimento absoluto de uma infração, pelo motivo de dar origem a uma ficção legal de ficarem os fatos incriminadoscomo se não tivessem sido praticados. O decreto manda olvidá-los apenas sob o aspecto penal” (CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários à Constituição”, vol. II, págs. 162 e 163).

Na anistia, pois, a extinção da punibilidade é mera conseqüência do desaparecimento do fato. Não é que o fato, històricamente, desapareça, porque o fato histórico permanece, mas porque a lei, tirando a relevância jurídica do fato, relega-o para o domínio dos fatos indiferentes ao direito.

É como decorrência do desaparecimento jurídico do fato que cessa a imposição das penas e a propositura das ações penais, que são os efeitos normais da prática do crime. Se o fato, porém, deu origem a outros efeitos, mediatos ou imediatos, também êstes devem desaparecer, porque, do contrário, haveria a persistência do efeito sem a persistência da causa.

A anistia, lançando o véu do esquecimento sôbre os fatos, deve eliminar tôdas as conseqüências que dêle derivam. Tudo, portanto, que tenha relação com os fatos anistiados, deixa de existir juridicamente, ainda mais porque, sendo a anistia um favor, um benefício, deve a lei que a concede ser interpretada de maneira extensiva, consoante a doutrina de CARLOS MAXIMILIANO: “Interpreta-se a anistia pelo processo direto, isto é, pelos próprios têrmos do decreto: servem como subsidiários, apenas, os motivos inspiradores da clemência. Por ser um favor, goza de interpretação extensiva, em virtude da regra antiga – favores ampliando” (ob. cit., pág. 100).

É certo que a anistia – mesmo no silêncio do decreto – não faz desaparecer as ações civis para reparação do dano, mas, nesta altura, é preciso distinguir. A anistia importa renúncia. Como renúncia, que é, só compreende os direitos que o Estado pode renunciar, ou melhor, só compreende os direitos que lhe pertencem. A ação civil para reparação do dano é direito de terceiro e, como tal, insuscetível de renúncia por parte do Estado, que não poderia renunciar direito que não é seu.

A persistência da ação civil para reparação do dano, portanto, não infirma o princípio de que as leis de anistia, impondo perpétuo silêncio aos fatos anistiados, impõem o silêncio de tôdas as conseqüências que dêles dimanam. Só subsistem, pois, os efeitos expressamente excluídos e, pelas razões apontadas, a responsabilidade civil pelos prejuízos causados.

Há quem afirme entretanto, que a anistia não apanha a expulsão, pois a expulsão não é pena nem tampouco conseqüência da condenação. Mas não se trata, evidentemente, de saber se a expulsão é pena ou conseqüência da condenação, porque a extinção da pena, como vimos, é simples conseqüência do silêncio que a lei mandou impor aos fatos. Trata-se de saber, isto sim, se a expulsão é resultado do fato criminoso, que a anistia, juridicamente, faz desaparecer, pois a anistia, segundo o ensinamento de CARLOS MAXIMILIANO, “visa aos fatos, e não ao homem, “aproveita às categorias de delinqüentes, e não a indivíduos isolados; é um dom coletivo, inspirado por motivos sociais; oblitera o crime, deixa em vigor só as conseqüências civis que aproveitam a terceiros…” (ob. cit., págs. 107-168).

Ora, se a anistia só deixa em vigor as conseqüências civis, não pode deixar em vigor a expulsão, desde que decretada com fundamento nos fatos que ela veio declarar não criminosos. É que a expulsão, admitindo-se não seja pena (nem tôdas as penas estão no Cód. Penal), não seria também uma medida de natureza civil.

Mas a expulsão, embora não sendo pena, pelo menos de lege constituta, tem um caráter penal irrecusável. Ela está muito mais próxima da pena e da medida de segurança do que de quaisquer outras medidas de defesa do Estado, razão por que é freqüentemente incluída como conseqüência da condenação. Assim acontece, por exemplo, no Cód. Penal italiano de 1930, em cujo art. 235, se diz:

“L’espulsione dello straniero dal territorio dello Stato è ordinata dal giudice, oltre che nei casi espressamente preveduti dalla legge, quando lo straniero sia condannato alla reclusione per un tempo non inferiore a dieci anni”.

Bastaria, pois, êsse caráter penal de que a expulsão se reveste para que a anistia também a compreendesse, porque o decreto de anistia, como vimos, deve ser interpretado no sentido de abranger tôdas as conseqüências que não forem expressamente excluídas.

Assim, o argumento de que anistia não abrange a expulsão, porque a. expulsão não é pena, teria valor meramente relativo, caso devesse prevalecer. Mas a anistia, não é demais repetir, não visa sòmente às penas; se visasse, não seria anistia, mas, sim, indulto de graça. A anistia visa aos fatos cortando-lhes os efeitos, entre êlesas penas.

Mas a expulsão, dir-se-á, é ato discricionário do govêrno. Sim, é ato discricionário, mas nem por isso pode deixar de conformar-se com os ditames da lei, porque, do contrário, seria ato arbitrário, que se não conforma com o regime jurídico que vigora no Brasil. O poder discricionário do govêrno, em matéria de expulsão, não significa que êle possa expulsar contra a lei e sem motivos; significa, tão-sòmente, que êle pode deixar de expulsar, embora haja razões para a expulsão. Não é outra, aliás, a doutrina de PONTES DE MIRANDA, que afirma: “Entregue ao Poder Executivo (a deliberação da expulsão), não no sendo, não pode ordenar; sendo, fica-lhe o arbítrio, aquela conveniência política, a que aludia LAFAYETE “RODRIGUES PEREIRA”. (“Comentários à Constituição”, vol. I, pág. 331).

Pouco adiante, como que a dar maior vitalidade ao que escrevera, acrescenta o ilustre constitucionalista: “Aliás, os atos discricionários só gozam de discrição dentro dos limites que se lhes traçaram na Constituição ou nas leis. Se procedeu bem ou mal, podendo expulsar, não se apura, e nesse sentido é que se diz discricionário o ato. Mas, apura-se se podia“. (ob. e pág. citadas).

E evidente, pois, que a expulsão não pode ser decretada contra lei. Ora, a lei de anistia é lei de caráter geral e obrigatório, como o são tôdas as leis. É votada pelo Poder Legislativo e está subordinada à mesma tramitação das outras leis. Nessas condições, a decretação da expulsão, ou a manutenção dos seus efeitos, pelos mesmos fatos que a lei anistiou, é ilegal, é contra lei, porque baseada num fato juridicamente inexistente.

Parece-nos fora de dúvida, portanto, que o Poder Executivo – adstrito como está ao cumprimento da lei de anistia não poderá reexpulsar o estrangeiro expulso, desde que a expulsão tenha sido motivada pelos mesmos fatos que a anistia apagou.

A anistia, pois, obriga o govêrno a revogar a expulsão. É o que se deduz da natureza do instituto e da lição dos mestres, entre êles o ilustre PONTES DE MIRANDA, que, mais uma vez, vai socorrer-nos. Êsse jurista, ao concluir o estudo do artigo 5°, n° XV, letra n, da Constituição, assim se expressa: “Ao Poder que expulsa é facultado revogar a expulsão, com as correspondentes conseqüências ex nunc. As conseqüências ex tunc, se equivalem à anistia do crime de volta voluntária do estrangeiro expulso, só as pode conferir o Poder Legislativo, como as conferiria a anistia” (ob. cit., vol. I, pág. 339).

Não se tolhem, por isso, as atribuições do Executivo, cujas prerrogativas, na espécie, permanecem inalteradas. Na verdade, nada impede que o govêrno, desde que ocorra novo fato, desde que haja novo motivo, possa decretar a expulsão do mesmo estrangeiro. Para tanto, porém, não basta uma alegação vaga de que o alienígena é nocivo à ordem pública, expressão que a Constituição emprega como um gênero cujas espécies devem ser definidas.

É preciso, pois, que se especifique a natureza do ato, porque o conceito de nocividade à ordem pública, é ainda PONTES DE MIRANDA quem diz, “tem o seu conteúdo dado pela lei, porém a lei não pode considerar suficiente para caracterizar a nocividade ato ou atividade que seria permitida, pelas leis, dentro do país. Há alusão, pelo menos, à punibilidade, de ato ou atividade” (ob. cit., vol. III, página 385).

Não importa que o estrangeiro, antes da expulsão, não tenha sofrido outras penas, porque, como vimos, a anistia não visa às penas e suas conseqüências; visa, isto sim, aos crimes aos fatos e a seus efeitos. Desde que existe a punibilidade do fato como crime, apanhou-o a anistia, embora não tenha havido imposição de pena criminal.

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