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CIVIL

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Doação – Fideicomisso – Substituição plural

DOAÇÃO

REVISTA FORENSE

REVISTA FORENSE 149

Revista Forense

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24/02/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 149
SETEMBRO-OUTUBRO DE 1953
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto

Abreviaturas e siglas usadas
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CRÔNICA

DOUTRINA

PARECERES

NOTAS E COMENTÁRIOS

  • Autoridade do julgado civil no Juízo Criminal – Fernando de Albuquerque Prado
  • A inseminação artificial em face da moral e do direito – Armando Dias de Azevedo
  • As garantias de reparação de danos no código do ar – Floriano Aguiar Dias
  • Responsabilidade civil pelos meios de transporte – Stefan Luby
  • Cheque com endôsso falso – Edmundo Manuel de Melo Costa
  • Registro de títulos de programas radiofônicos – Aloísio Lopes Pontes
  • Ciência, teoria e doutrina econômica – Oscar Dias Correia
  • Negociação habitual por conta própria ou alheia na rescisão do contrato de trabalho – Evaristo de Morais Filho
  • Irradiação das atividades judiciárias de natureza penal – Jairo Franco

BIBLIOGRAFIA

JURISPRUDÊNCIA

  • Jurisprudência Civil e Comercial
  • Jurisprudência Criminal
  • Jurisprudência do Trabalho

LEGISLAÇÃO

Sobre o autor

Antão de Morais, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.

PARECERES

Doação – Fideicomisso – Substituição plural

– O que caracteriza o fideicomisso é a ordem sucessiva de transmissão; primeiro ao gravado depois ao fideicomissário.

– É lícita a substituição plural; o que se não permite é a substituição sucessiva, pois esta tem que parar no segundo grau.

– A referência a marido e mulher, em testamento, supõe mulher e marido conhecidos do testador.

PARECER

1. Em 1893 lavrou-se, num dos tabelionatos desta Capital, uma escritura de doação, na qual, descritos e estimados os bens transmitidos pelo doador a uma filha solteira, de maior idade, se consignou uma cláusula determinando, além da inalienabilidade, a reversão dos bens ao doador, ou, se estivesse falecido, à pessoa, que indicou, caso a donatária morresse sem descendentes; ainda, nesta última hipótese, não existindo nem o doador, nem a substituta, por êle designada, passariam os bens ao viúvo da donatária; finalmente, na falta do último, de seus descendentes diretos, ou por morte destes, ficaria a propriedade dos bens doados pertencendo à S. C. desta Capital.

2. A substituta do doador faleceu antes dêle e da donatária.

3. A donatária contraiu núpcias, estando ainda vivo o doador. Morto êste, ela convolou a segundas núpcias. Por seu falecimento, não havendo filhos, quer do primeiro, quer do segundo leito, entende o segundo marido que a êle cabe receber os bens doados; e, por isso, julgando-se fideicomissário, requereu a extinção do fideicomisso. A instituída em último lugar, S. C., pretende que a ela cabem os bens.

4. Resumida, assim, a exposição da consulta, passarei a considerar o primeiro quesito:

“O período citado da escritura de 24 de junho de 1893 (letra b) instituiu um fideicomisso?”

A cláusula que deve ser interpretada é a seguinte:

“a) O presente dota é inalienável para todos os fins, ficando igualmente inalienáveis os rendimentos dos mesmos e não podendo ser sob-rogados senão na forma da lei.

“b) No caso de a outorgada falecer sem descendentes, o dote reverterá ao outorgante se a êsse tempo vivo for, na falta dêste a dona B. C., na falta ou por morte de quem, se houver a outorgada contraído matrimônio, irá o dote pertencer ao viúvo da outorgada, se o deixar, ou aos descendentes deste, se os houver, sempre com a cláusula da inalienabilidade.

c) Na falta do viúvo da outorgada ou de seus descendentes diretos, ou por morte dêstes, ficará a propriedade perfeita dêste dote pertencendo à S. C. desta Capital”.

Passagem dos bens

No que diz com a passagem dos bens, ficou, portanto, estabelecido, caso a donatária falecesse sem descendentes:

1º) os bens doados reverteriam ao patrimônio do doador;

2º) se êste não estivesse vivo, passariam a dona B. C.;

3°) na falta, ou por morte desta, passariam ao viúvo da donatária;

4º) se não deixar viúvo, aos descendentes dêste;

5°) na falta do viúvo da donatária, dos descendentes diretos dêste, ou, por morte deles, à S. C. desta Capital.

Trata-se de um caracterizado fideicomisso, conforme a definição do art. 1.733 do Cód. Civil:

“Pode também o testador instituir herdeiros ou legatários por meio de fideicomisso, impondo a um dêles, o gravado ou fiduciário, a obrigação de, por sua morte, a certo tempo, ou sob certa condição, transmitir ao outro, que se qualifica de fideicomissário, a herança, ou legado”.

Caracterização de fideicomisso

O que caracteriza, portanto, o fideicomisso é a ordem sucessiva da transmissão: primeiro ao gravado, depois ao fideicomissário.

Na disposição, acima analisada, figura tomo fiduciária a filha do doador; e, como fideicomissários: a) o viúvo da donatária: b) os descendentes dêste; c) a S. C. desta Capital.

5. É claro que os descendentes da fiduciária não devem figurar entre os fideicomissários; pois a condição – se morrer sem descendentes – visa impedir a constituição do fideicomisso (POTHIER, ed. Buguet, Paris, 1861, vol. 8, n° 67, pág. 477). O mesmo ocorre com dona B. C., simples substituta do doador na reversão; isto é, antes de se constituir o fideicomisso.

Aliás, mesmo que se incluíssem também êsses entre os fideicomissários, isso em nada prejudicaria o direito do consulente, pois a lei não proíbe a designação de vários fideicomissários para serem chamados um na falta do outro. O que ela proíbe é que sejam chamados um depois do outro, além do segundo grau.

6. O fato, insistimos, de se designarem vários substitutos não tem nenhuma conseqüência, no sentido de invalidar a cláusula, pois, como ensina CLÓVIS BEVILÁQUA (“Direito das Sucessões”, 2ª edição, § 89, pág. 324):

“Podem ser dados muitos substitutos a um só herdeiro ou um só substituto a muitos herdeiros: mas não é permitido fazer substituição de mais de um grau”.

Também CARLOS MAXIMILIANO (“Sucessões”, 2ª ed., nº 1.234, pág. 68)

“Verifica-se de modos diferentes a pluralidade de vocação: podem nomear um substituto para cada herdeiro, ou legatário; diversos para um só sucessor; dois ou mais para todos; um para todos; vários indicados, para se chamar um na falta do outro, ou cada um em determinada fração, ou sucederem todos numa parte da herança ou legado”.

É o que permite o art. 1.730 do Código Civil:

“Também lhe é lícito substituir muitas pessoas a uma só, ou vice versa, e ainda substituir com reciprocidade ou sem ela”.

7. É lícita, portanto, a substituição plural; o que se não permite é a substituição sucessiva, pois esta tem que parar no segundo grau (Cód. Civil, art. 1.739).

Explica CARLOS MAXIMILIANO (lugar citado, n° 1.235, pág. 69)

“A substituição há de ser direta, imediata realizada uma só vez; não se admite substituição de substituição. Quando se fala em substitutos sucessivos, entende-se que se não chamam todos, ao mesmo tempo, a participar de uma cota vaga; o apêlo vai ao primeiro; se êste não existe, ao segundo; no caso de novo óbito anterior ao do testador, ou de renúncia lucra o terceiro; porém, se o primeiro aceita a fortuna e falece em seguida, não acorre o segundo, mas o herdeiro legítimo ou dativo do primeiro. As substituições, embora múltiplas, devem ser simultâneas: desde que um membro da sério, dos herdeiros, ou legatários suplementares, se apresenta e não recusa o benefício, nada auferem os posteriores.”

Adiante (n° 1.236):

“A lei faculta ao testador determinar que os herdeiros, ou legatários, se substituam recìprocamente: os sobreviventes e aceitantes auferem os quinhões dos premortos ou renunciantes; o primeiro toma o lugar vago do segundo; a êste aproveita a falta daquele”.

CHIRONI, citado por CLÓVIS BEVILÁQUA (lugar indicado, § 89, pág. 323), em forma lapidar, resume o conceito:

“Substituição é a nova instituição, que se torna eficaz, quando a primeira não produziu efeito, ou depois que o produziu”.

Diz CLÓVIS BEVILÁQUA, e muito bem, que tôdas as modalidades de substituição refletem-se nesta noção sintética”.

8. Quando a fiduciária faleceu, sem descendentes, os bens constantes da doação não podiam reverter ao patrimônio do doador, nem passar para a substituta que indicou, dona B. C., porque ambos eram falecidos. Haviam, necessàriamente, que tocar ao consulente, viúvo da fiduciária, pois era o imediato, na ordem estabelecida pelo doador. Fica, assim, positivamente respondido o primeiro quesito.

9. A segunda questão é a seguinte:

“Na época da mencionada escritura era permitida esta instituição por ato inter vivos? É válida, portanto, a instituição mencionada na consulta?”

A doutrina corrente admitia a validade da constituição de fideicomisso por ato entre-vivos. Nada há que se objete, portanto, quanto à instituição do consulente por meio de escritura de doação. É fácil respigar opiniões na doutrina e na jurisprudência. Vejamos algumas dentre as recenseadas por FILADELFO AZEVEDO (“Rev. dos Tribunais”, vol. 97, página 242, nota).

Seja o primeiro MELO FREIRE (“Institutiones”, Liv. 3, tít. 7, § 19):

“Relinqui potest fideicommissum non solum testamento et codicillis, ut regulariter fieri solet, sed etiam per contractus inter vivos, quod non solum hodiernis moribus, sede et juri civili consentaneum esse videtur”.

LOBÃO (“Notas a Melo”, Lisboa, 1883, vol. 3, pág. 354) acrescenta outras às autoridades em que se apoiou MELO FREIRE.

Com êsses concorda COELHO DA ROCHA (“Instituições”, Lisboa, 1907, vol. 2, § 750, pág. 599):

“As doações e os testamentos são os dois meios que se empregam para dispor dos bens em favor dos sucessores: tanto: em um como no outro se podem impor condições, modo, substituições, e outras quaisquer cláusulas que não sejam tolhidas pelas leis”.

TEIXEIRA DE FREITAS, na “Formulário dos contratos, testamentos e de outros atos do tabelionato”, Rio de Janeiro, 1881, § 327, pág. 283, autoriza o fideicomisso convencional e lembra que já isso constava da “Consolidação”, art. 420, nota 14.

Em sua “Nova Consolidação”, artigo 1.194, CARLOS DE CARVALHO recompilou:

“A doação pode constituir fideicomisso convencional com as restrições impostas ao instituído por disposição de última vontade”.

GOUVEIA PINTO, “Testamentos é Sucessões”, na edição anotada por MACEDO SOARES, Rio, 1877, nota 185, pág. 255, observa:

“Note-se, finalmente, a respeito dos fideicomissos singulares, que não só podem ser deixados em testamentos e codicilos, por isso que são equiparados aos legados, como também por contratos inter vivos”.

Nossos jurisconsultos, em esmagadora maioria, são a favor do fideicomisso convencional. Assim opinaram: ESTEVÃO DE ALMEIDA, “Rev. dos Tribunais”, vol. 21, pág. 387; ALFREDO BERNARDES, “Rev. dos Tribunais”, vol. 56, pág. 246; FRANCISCO MORATO, “Rev. dos Tribunais”, vol. 44, pág. 444; VIEIRA FERREIRA, “Rev. dos Tribunais”, vol. 75, pág. 5; ESTEVÃO DE ALMEIDA, VILABOIM, JOÃO ARRUDA, JOSÉ ULPIANO, LAFAYETTE e CLÓVIS BEVILÁQUA, na “Rev. dos Tribunais”, vol. 21, págs. 259 a 264; PAULO DE LACERDA, CLÓVIS BEVILÁQUA e MENDES PIMENTEL, “Revista dos Tribunais”, vol. 95, págs. 56 a 58.

Na jurisprudência admitem o fideicomisso contratual várias decisões: “O Direito”, vol. 84, pág. 441; “Rev. dos Tribunais”, vols. 97, pág. 241, 102, pág. 645, 105, pág. 236, e 113, pág. 147.

FILADELFO AZEVEDO, no lugar citado (“Rev. dos Tribunais”, vol. 97, página 242), diz que, “pesquisando nas coletâneas de jurisprudência, não encontrei um só julgado em oposição à sua admissibilidade”.

Fica, assim, suficientemente justificada a resposta dada ao segundo quesito.

10. No terceiro quesito, pergunta-se:

“Vigorava, então, preceito proibitivo da instituição de fideicomisso além do segundo grau?”

O direito anterior ao Cód. Civil era semelhante, segundo diz CLÓVIS BEVILÁQUA, comentando o art. 1.739 do Código Civil. No “Direito das Sucessões”, 2ª ed., § 95, pág. 340, diz êle:

“A nossa Ord., Liv. 4, 87, pr., e § 12, não aceita substituição além do segundo grau. São, portanto, inadmissíveis substitutos do fideicomissário”.

CORREIA TELES, “Digesto Português”, vol. 3, art. 1.639, diz:

“Não será permitido fazer substituições de substituições; isto é, fazer mais do que um grau de substituição fideicomissária”.

E em nota (n° 6) prestigia a inteligência dada por CLÓVIS BEVILÁQUA à Ord., Liv. 4, tít. 87, §§ 12.

Assim também interpretou a legislação anterior CARLOS DE CARVALHO, “Nova Consolidação”, art. 1.794:

“Sòmente é permitida a substituição fideicomissária no primeiro grau ou instituição e nomeação em segundo”.

11. O último quesito é dêste teor:

“Tendo a fiduciária se casado duas vêzes, nos têrmos da escritura, e explicações dadas na consulta, é o segundo marido, hoje viúvo da fiduciária, o fideicomissário a quem devem ser entregues as bens descritos na escritura?”

A verba da escritura, dispõe, como vimos: “se houver a outorgada contraído matrimônio, irá o dote pertencer ao viúvo da outorgada”.

POTHIER, “Oeuvres”, edição Bugnet, Paris, 1861, vol. 8, pág. 251, diz o seguinte:

“Devendo os legados ter origem na justa afeição que o testador dedica ao legatário, conforme estabelecemos nos artigos precedentes, segue-se que os legados feitos a pessoas incertas, que não podiam merecer o afeto do testador, e que se filiam a um puro capricho dêle, são nulos; como se o testador legasse aos que, no dia de seu entêrro, ocupassem, na comédia, o quarto camarote.

“Como conseqüência dêste princípio, é que, pelo direito do “Digesto”, os legados feitos a pessoas incertas, incertis personis, eram nulos; JUSTINIANO ab-rogou neste ponto o direito do “Digesto”, como se pode ver no título de Leg. nas “Institutiones”.

Depois mostra que o legado feito a um póstumo, que não era válido pelo direito do Digesto”, é válido pela reforma de JUSTINIANO, pois, conquanto se trate de pessoa incerta, por quem o testador não podia ter afeição, êsse legado se justifica pelo afeto que o testador teria pelos pais do nascituro, e isso basta.

Pela mesma razão, POTHIER justifica o legado feito ao futuro genro:

“Pela mesma razão deve decidir-se que o legado feito por um testador àquele que desposar sua filha ou sua sobrinha, que não era válido pelo antigo ” direito, é válido pela constituição de JUSTINIANO; porque parte de um motivo plausível, que é o de propiciar melhor partido à sua filha ou à sua sobrinha: e se este legatário não logrou merecer por si mesmo a afeição do testador, que não o conhecia, ele pode merecê-la através da pessoa que esposará”.

Como bem observa CÂNDIDO DE OLIVEIRA FILHO (“Prática Civil”, vol. 12, pág. 200, nota):

“Há legatários cuja designação é impossível. São válidos, por exemplo, os legados aos empregados domésticos que estiverem ao serviço do testador por ocasião de sua morte, à pessoa que lhe desposar a filha ou às pessoas que lhe assistirem às exéquias (ARNTZ, “C. d. dr. civ. fr., vol. II, nº 2.100; “Pand. belg.”, verb. “Legs”, n° 1217)”.

12. Dispõe o art. 1.667, nº II, do Cód. Civil:

“É nula a disposição que se refira a pessoa incerta, cuja identidade se não possa averiguar”.

Mas, a identidade da pessoa do futuro genro pode ser sempre averiguada. Trata-se, portanto, de pessoa certa. É o que mostra PACIFICI-MAZZONI (“Istituzioni”, 5ª ed., vol. 6, parte 1, nº 122, página 361):

“A pessoa é certa, quando se lhe possa determinar a individualidade presentemente, ou ante a realização de um fato indicado pelo tentador, como se houvesse instituído herdeiro quem esposar sua filha. Ao contrário, se a sua individualidade não puder determinar-se, nem agora, nem no futuro, a pessoa é incerta”.

Da mesma forma CARLOS MAXIMILIANO (“Sucessões”, 2ª ed., vol. 2, nº 578, pág. 65):

“A instituição de herdeiro ou legatário pode resultar da simples referência a um fato verificável no futuro, embora redunde em condição ou encargo, ou às relações de parentesco, amizade ou dependência para com o de cujus. Exemplos: a) A moça que mora com a sua mãe à rua tal, número tanto, b) A quem casar com a minha filha Beatriz…”.

13. Sendo, portanto, válida, em si mesma, a cláusula pela qual o doador instituiu o futuro genro de sua filha, e não havendo dúvida alguma, de que pode ser chamado, porque ninguém, antes dêle, recebeu da fiduciária os bens da doação, podemos enfrentar a dúvida do quesito: se as segundas núpcias exercem alguma influência sôbre a devolução da herança; isto é, se o doador apenas se referiu ao primeiro genro.

VITALI (“Successioni”, 2ª ed., vol. 2 ns. 1.282 e 1233, pág. 335) estuda dois casos semelhantes. Num dêles, o testador havia feito o legado à sua, cozinheira. Quando morreu, verificou-se que duas estiveram a serviço dêle. A qual delas êle quis referir-se? À que tinha, quando fêz o testamento, ou à que lhe prestava serviços, quando faleceu? É questão, como se vê, de fato, que, no caso, se resolveu a favor da primeira cozinheira, porque esta, durante muitos anos, prestou bons serviços ao testador, só o deixando por motivos particulares, mas continuando a lhe freqüentar a casa e dando sempre amostras de afeição ao antigo patrão, ao passo que a segunda cozinheira não só estava há pouco tempo a serviço do testador, como êste não lhe havia mostrado nenhum interêsse especial. Outro exemplo: um testador, que se casara duas vêzes, instituíra herdeira, em seu testamento, genèricamente, sua mulher, sem indicar qual. Sobrevivendo-lhe a segunda mulher, surgiu a controvérsia de saber a qual delas êle se referiu. Também aqui razões de fato é que se invocaram para resolver a questão, lembrando-se que já em direito romano a mesma dúvida se decidiu a favor da primeira mulher, porque se apurou que a coisa legada fôra adquirida para ela, de modo que o testa dor, se tivesse mudado de vontade, devia expressamente dispor em benefício da segunda espôsa. Os intérpretes acolheram a solução, observando não ser lógico que o testador cogitasse da segunda mulher, quando ainda convivia com a primeira. Nota, em conseqüência, VITALI que, se o testamento fôsse feito na vigência do segundo matrimônio, a solução deveria ser a favor da segunda mulher e não de uma terceira.

14. Mas, no caso da consulta, quando se fêz a escritura de doação, o doador não podia cogitar do primeiro ou do segundo genro, porque sua filha era solteira. Nessas condições, falando, como falou, genèricamente, sem fazer distinção alguma, deve concluir-se que sua intenção foi referir-se ao marido de sua filha quando esta falecesse. Isto é tanto mais lógico quanto o primeiro marido da fiduciária faleceu ainda em vida do doador. Se sua intenção fôsse beneficiar apenas êste, devia esclarecê-lo, embora êsse esclarecimento não obrigasse o juiz: seria simples adminículo de interpretação, para ser admitido na medida em que não alterasse o ato jurídico perfeito e acabado, coisa que o doador não tem o arbítrio de fazer (ASCOLI, “Donazioni”, Milão, 1935, páginas 139, 141 e 298).

15. Se, quando se faz o testamento, uma pessoa já é marido ou mulher, a referência deve supor-se a favor dessa pessoa, que o testador conhece, e não a outra futura. É o que se lê na “Cyclopedia of law and procedure”, vol. 40, pág. 1.456:

“A devise or bequest to the husband or wife of a certain person ordinarily means the person who answers that description at the date of the will, and at the testator’s death, and does not extend to an after-taken husband or wife, unlesse the context shows an intention to the contrary; but a gift to the widow of a designated person includes such wife as may survive him”.

Ou seja:

“Uma deixa ou legado ao marido ou mulher de certa pessoa ordinariamente significa a pessoa que tem essa qualidade na data do testamento ou por ocasião da morte do testador; mas não compreende um posterior marido ou mulher, salvo se o contexto revelar intenção contrária. Todavia, uma doação à viúva de certa pessoa inclui a viúva que lhe sobreviver”.

Por esta lição, a referência ao marido e mulher supõe mulher e marido conhecidos do testador; abrindo-se exceção para a viúva, quando, naturalmente, seja. genérica a indicação, porque, nessa hipótese, herda quem na data da morte do herdeiro ou legatário tiver essa qualidade: o que corresponde, no caso da consulta, à situação do segundo genro.

16. Idêntico ensinamento nos ministra GEORGE THOMPSON, em sua excelente obra sobre a interpretação dos testamentos (“Construction and interpretation of wills”, Indianópolis, The Bobbs. Merril Company, 1928, § 146, pág. 267):

“The word “husband” or “wife” is descriptive of the person of a particular individual, and where a devise or bequest is made to the husband or wife ot a certain person, and there is nothin in the will indicating the contrary, the term “husband” or “wife” will apply to lhe person who answers that description at the date of lhe will, and at lhe death of the testator, and not to one he or she may subsequently marry. Where lhe testator designates a person as beneficiary by use of the term “wife” and such person is unmarried at the time the will is executed, the person answers the description at the time the gift takes effect in enjoyment will be the beneficiary; but a betrothed named as wife, but not married before the testator’s death, can not take under lhe will”.

Em português:

“A expressão marido e mulher é indicativa da pessoa de determinado indivíduo; quando uma deixa ou legado é feito ao marido ou mulher de certa pessoa, nada havendo no testamento que indique o contrário, o têrmo marido ou mulher referir-se-á à pessoa que tenha essa qualidade na data do testamento, ou na da morte do testador, e não a uma que êle ou ela possa ter esposado subseqüentemente. Quando o testador designa, como beneficiário, uma pessoa, com o uso da expressão espôsa, – sendo essa pessoa solteira ao tempo em que se fêz o testamento, – a pessoa que tenha essa qualidade quando a doação se torne efetiva servi a beneficiária; porém uma noiva chamada espôsa, não ainda casada antes da morte do testador, não pode receber pelo testamento”.

Do exposto resulta que, se o beneficiado era casado quando se fêz o testamento, a êsse é que o testador se referiu, o que, como já se notou, é tudo quanto há de mais natural. Salvo indicação contrária, por que supor que o testador quis contemplar também pessoas futuras, inteiramente desconhecidas dêle? Entretanto, na hipótese da consulta, na previsão do doador não podia estar ninguém, determinadamente, porque, sendo sua filha solteira, êle só podia cogitar, como cogitou, da pessoa que casasse com ela; e isso, indiferentemente, no primeiro, ou em subseqüente matrimônio, porque nenhuma razão havia para preferir, entre pessoas futuras, que desconhecia, esta ou aquela, podendo bem acontecer até que o segundo merecesse mais que o primeiro. Assim, se o intuito do doador era beneficiar a pessoa que escolhesse sua filha para esposa; se, provàvelmente, como sugere POTHIER, isso teria por motivo propiciar-lhe bom partido, nenhuma razão há para supor preferisse êle o primeiro ao segundo marido. Se essa idéia estivesse em sua mente, êle o teria declarado ou esclareceria mais tarde seu pensamento, quando assistiu à morte do primeiro genro. Guardando silêncio, e mantendo a instituição indiferente e genérica, bem claro tornou ser desejo seu beneficiar também o novo marido de sua filha. E, dessarte, nenhuma dúvida pode haver de que êsse é quem terce o direito de receber os bens fideicometidos. Finalizo, assim, respondendo, pela afirmativa, o último quesito.

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