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Direito à diversidade e inclusão social das minorias

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Direito à diversidade e inclusão social das minorias

DIREITO À DIFERENÇA

DIREITO À DIVERSIDADE

INCLUSÃO SOCIAL

MINORIAS

Irene Patrícia Nohara

Irene Patrícia Nohara

11/07/2022

Neste trecho do livro Fundamentos de Direito Público, Irena Patrícia Nohara trata do Direito à diversidade e inclusão social das minorias. Continue a leitura e saiba mais!

Direito à diversidade e inclusão social das minorias

Outro tema de acentuada relevância no Estado Democrático de Direito é o direito à diversidade. Democracia envolve pluralismo, sendo comum que haja nos distintos Estados “grupos que se diferenciam da população em característica de língua, religião, nacionalidade e também nas mais variadas formas culturais de identidade”.[42]

O processo de formação dos Estados nacionais ocorreu por meio da imposição de valores de agregação coletiva, para criação de uma identidade que nem sempre se harmonizou com o respeito às diversidades contidas num mesmo espaço territorial. Dito em outros termos, o Estado nacional moderno representou a passagem de um “rolo compressor” sobre as diversidades tendo em vista sua proposta normalizadora, isto é, uniformizadora.

Ainda, o processo de colonização da América, por exemplo, implicou no extermínio e assujeitamento de inúmeras populações ameríndias[43]

Como começa a acontecer paulatinamente na formação de grupos coletivos de mulheres: na docência, nas contratações, na visão delas sobre o direito administrativo, procurando estimular a união e o apoio recíproco entre as mulheres, para garantir um espaço de fala, de trocas e de expressão. Também se deve destacar a Lei 14.192/2021, que combate a violência política contra mulher, sendo como tal caracterizada toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar e restringir os direitos políticos das mulheres. que aqui se encontravam antes do contato com os europeus.

A ideia de que povos e culturas estavam em distintos estágios de desenvolvimento resultou na postura de imposição da cultura reputada mais desenvolvida, que foi considerada, dado poderio militar e econômico, a europeia, que, na dinâmica do Capitalismo Mercantil, ao intervir em outros povos, ditando padrões de comportamento por meio de um projeto narcisista de afirmação de superioridade sobre outras culturas, enxergava-os como selvagens ou bárbaros.

Assim, dentro de uma suposta “missão civilizatória”, europeus envolvidos com o projeto de colonização espoliaram as colônias de seus recursos naturais, sendo os povos que aqui se encontravam privados de “sua música, sua arte, sua forma de comer e pensar”, entre outras coisas.[44]Houve, portanto, o encobrimento, não só na formação do Estado moderno europeu, mas também no processo colonial, da diversidade de povos e culturas que, de tão ricos, revelariam um mundo mais amplo.[45]

Ao longo do século XIX, a geopolítica mundial foi se desvencilhando aos poucos do modelo colonial, o que não significou o fim da imposição cultural, que hoje sofre os reflexos do manto do neocolonialismo, pois no século XX se desdobrou um modelo monopolista e financeiro, capitaneado também pelo eixo norte, agora não mais exclusivamente pela Europa, mas também pelos Estados Unidos e Japão, em busca não apenas de matéria-prima, mas, com a expansão industrial e financeira: de mercados consumidores e de mão de obra barata, o que se encontrava com mais frequência em países com maior flexibilidade na legislação social.

Ao mesmo tempo em que as multinacionais,[46]que são protagonistas desse novo colonialismo, vão influenciando o mundo, há uma preocupação dos impactos negativos da padronização imposta em relação à preservação das culturas locais.

Assim, para evitar que haja esse processo de assujeitamento cultural, intensificado com a globalização econômica, que traz ao mundo não só benefícios, mas, segundo seus críticos, muitos malefícios[47]do ponto de vista local, que se postula um novo paradigma de globalização, denominado de globalização contra-hegemônica. Nesta perspectiva, ganha importância o direito à diferença, que é sintetizado em conhecida frase de Boaventura de Sousa Santos: “devemos lutar pela igualdade, sempre que a diferença nos inferioriza; mas devemos lutar pela diferença sempre que a igualdade nos descaracteriza” (Fórum Social Mundial, 2002).

Do ponto de vista social, o direito à diferença diz respeito também à proteção das minorias e de seus modos de vida. Ressalte-se que, ao contrário do que parece, nem sempre minoria significa um grupo que é constituído por um menor número de indivíduos em uma dada sociedade, mas se trata de grupo que sofre subordinação política, econômica ou cultural em relação a um grupo dominante, que pode não ser necessariamente mais numeroso.

Tal noção é explicada por Richard T. Schaefer, que esclarece que, do ponto de vista sociológico, o número de pessoas e um grupo “não necessariamente determina seu status como uma minoria social (ou um grupo dominante). Quando os sociólogos definem um grupo de minoria, estão preocupados basicamente com o poder econômico e político – ou a falta deste poder”.[48]

Ainda, faz parte da agenda política contemporânea o resgate das tradições, sendo a cultura reconhecida como um direito de terceira geração ou dimensão. A diversidade cultural é vista atualmente do prisma de patrimônio comum da humanidade e motor do desenvolvimento sustentável das comunidades, povos e nações.

Segundo a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, a diversidade cultural é considerada indispensável à paz e à segurança, ao florescer em um ambiente de democracia, tolerância, justiça social e mútuo respeito entre povos e culturas. A cultura assume formas diversas no tempo e no espaço e esta diversidade se manifesta na originalidade e na pluralidade das identidades, assim como nas expressões culturais dos povos e das sociedades que formam a humanidade.

Um exemplo de transformação na forma de se tratar a diversidade a partir de um ambiente efetivamente mais democrático foi o tratamento do direito dos indígenas pela Constituição de 1988. Antes da atual Constituição, havia, na ditadura militar, a chamada política integracionista, baseada em um pressuposto monocultural, que influenciou a elaboração do Estatuto do Índio, Lei 6.001/1973.

A política de integração, que vigorou ao longo do século XX no Brasil, via o índio, primeiro, como ser genérico, sem considerar as particularidades étnico-culturais das diversas comunidades indígenas,[49]depois, como indivíduo que precisava ser preparado para integrar a “civilização”, daí o uso do termo integração.

Com a difusão de valores multiculturais, que devem permear a ambiência democrática, todavia, não há mais como permitir a manutenção dessa visão autoritária, que pressupõe um único modelo de desenvolvimento cultural, uma vez que houve a positivação do direito à manutenção da “organização social, costumes, crenças e tradições” indígenas, assegurado no art. 231 da Constituição de 1988.

O Brasil, em particular, deve se preocupar com a questão do direito à diversidade, pois sua formação histórica congregou num mesmo território “inúmeros povos” com origens étnicas e culturais distintas, dadas as correntes migratórias de origens variadas. Trata-se de fator enriquecedor de nossa conformação enquanto nação, mas que demanda um olhar cuidadoso para com o respeito à diferença.

Instrumento relevante é a Convenção 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais, que chama a atenção para as importantes contribuições de povos indígenas e tribais para a diversidade cultural e a harmonia social e ecológica da humanidade e para a cooperação e entendimento internacionais.

Atualmente, existe também no Brasil um decreto (Decreto 6.040) que define os povos e comunidades tradicionais como grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais. São grupos que possuem formas próprias de organização social, os quais ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos por tradição.

São exemplos de povos e comunidades tradicionais, aos quais se deve estender o reconhecimento do direito à diferença: quilombolas, ciganos, seringueiros, castanheiros, caiçaras,[50]sertanejos, jangadeiros e pantaneiros. Segundo dados do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento),[51]as comunidades tradicionais representam cinco milhões de brasileiros que ocupam um quarto do território nacional, sendo que os seus processos históricos e condições específicas de pobreza e desigualdade os coloca em situação de maior vulnerabilidade socioeconômica.

Saiba mais sobre o livro

Fundamentos de Direito Público: conheça as novidades da segunda edição do livro de Irene Patrícia Nohara


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NOTAS

[42]Cf. MACHADO, Nélida Reis Caseca; MIRANDA, Thiago Alves. Estados nacionais e as minorias. Direito à diferença. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 145. 

[43]Que apesar de estarem aqui, não são reputadas propriamente autóctones, pois se supõe que tenham migrado da Ásia nas glaciações pelo estreito de Behring.

[44]MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Estado moderno, direito à diversidade e pluralismo epistemológico. Direito à diferença. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 232. 

[45]MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Estado moderno, direito à diversidade e pluralismo epistemológico. Direito à diferença. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 240. 

[46]Note-se que deve haver o respeito aos direitos humanos, diversidade e multiculturalidade por parte de multinacionais que atuam em distintas regiões do planeta, como reconhecimento da existência de culturas indígenas e de suas instituições, pois, no fenômeno colonial, período de companhias de capital aberto, houve extermínio, eugenia e racismo, com graves consequências para a humanidade e para os povos locais, sendo de se exigir das corporações contemporâneas, por sua vez, segundo expõe Flavio de Leão Bastos Pereira, que assumam novas responsabilidades sociais devido à sua alta capacidade transformadora. Cf. PEREIRA, Flávio de Leão Bastos; RODRIGUES, Rodrigo Bordalo. Compliance em direitos humanos, diversidade e ambiental. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. p. 140-141. 

[47]Quanto aos malefícios da globalização e sua promessa não cumprida de benefícios globais, destaca-se a obra de Joseph E. Stiglitz (A globalização e seus malefícios), ganhador privatização forçado por integrantes do sistema financeiro internacional, que, no contexto de países em desenvolvimento, provocou retração de serviços relevantes e uma grande dose de sofrimento social, pois os mercados não se ergueram com a rapidez imaginada pelo FMI para suprir, de forma segura, as demandas da população. Cf. STIGLITZ, Joseph E. A globalização e seus malefícios. São Paulo: Futura, 2002. p. 87.do prêmio Nobel de Economia de 2001. Aborda o autor o movimento de desregulação e 

[48]SCHAEFER, Richard T. Sociologia. 6. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. p. 241.

[49]É imensa a diversidade étnica e linguística dos índios, estando entre as maiores do mundo. A Funai identifica 215 sociedades indígenas. Ser Índio. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/indios/conteudo.htm#SER_INDIO>. Acesso em: 5 set. 2010. 

[50]A propósito das comunidades tradicionais caiçaras, obra pioneira é: STANICH NETO, Paulo. Direito das comunidades tradicionais caiçaras. São Paulo: Café com Lei, 2016, passim.

[51]Apresentados pela Secretaria de Promoção da Igualdade Racial. Disponível em: <http://www.seppir.gov.br/comunidades-tradicionais/o-que-sao-comunidades-tradicionais>. Acesso em: 23 jan. 2016.

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