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A busca pela eficiência na cobrança fiscal

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Marcus Abraham

Marcus Abraham

04/08/2022

Embora o tema não seja novo aqui na Coluna Fiscal (assunto já publicado em janeiro de 2019), voltamos a tocar nesta tecla diante de novos dados e recentes propostas que vêm sendo debatidas a respeito da necessidade de se buscar maior eficiência no atual modelo de cobrança de créditos fiscais.

Atual modelo de cobrança de créditos tributários precisa urgentemente ser repensado

Inicialmente, cabe destacar que a dívida ativa tributária brasileira gira em torno de R$ 3,6 trilhões, apenas considerados créditos federais e estaduais somados. A dívida ativa federal é da monta de R$ 2.788.006.632,61 (referente ao ano de 2021), segundo dados disponibilizados pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), ao passo que a dívida ativa estadual alcança cerca de R$ 896,2 bilhões (referente ao ano de 2019). Infelizmente, não foi possível identificar o valor consolidado atualizado da dívida ativa dos municípios.

Esses números parecem estar se elevando a cada ano, uma vez que a dívida ativa federal em 2019 era de R$ 2,4 trilhões e, em 2020, subiu para R$ 2,5 trilhões, estando agora em R$ 2,78 trilhões (fonte: PGFN). O mesmo parece ocorrer em relação à dívida ativa dos estados, que no ano de 2015 girava em torno de R$ 682,2 bilhões, passando para o montante de R$ 896,2 bilhões em 2019.

Os números indicam duas hipóteses: ou a inadimplência fiscal vem aumentando ou a eficiência na cobrança dos créditos tributários vem caindo. Seja qual for a real situação, fato é que, a cada ano, o volume de recursos públicos de titularidade do erário que deixa de ser cobrado aumenta, quando o ideal deveria ser o inverso, sobretudo diante das novas tecnologias e ferramentas para facilitar a localização de devedores e respectivos bens.

A busca pela eficiência na cobrança fiscal

Mas o problema não está apenas na questão do aumento da dívida ativa. Há também que se considerar nesta equação o custo para a sua cobrança, que também aumenta ano a ano, gerando uma despesa elevada e em grande parte descabida.

Segundo o relatório anual Justiça em Números, publicado em 2021 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no ano de 2020 o Judiciário como um todo custou aos cofres públicos R$ 100.067.753.052, finalizando aquele ano com 75,4 milhões de processos em tramitação.

Desse total de processos, 36% são ações de execução fiscal, processos judiciais que trazem um elevado índice de congestionamento.

Importante esclarecer que a “taxa de congestionamento” mede o percentual de processos que ficaram represados sem solução, comparativamente ao total tramitado no período de um ano. Quanto maior o índice, maior a dificuldade do tribunal em lidar com seu estoque de processos, afetando todos os demais processos judiciais.

O referido relatório do CNJ indica as execuções fiscais como as principais responsáveis por essa taxa de congestionamento do Poder Judiciário, representando 36% do total de casos pendentes e congestionamento de 87% em 2020 (ao passo que a taxa de congestionamento geral é de 75%). Ou seja, de cada 100 processos de execução fiscal que tramitaram no ano de 2020, apenas 13 foram baixados.

Afirma o referido documento que, “historicamente as execuções fiscais têm sido apontadas como o principal fator de morosidade do Poder Judiciário” (pág. 175). Portanto, além das execuções fiscais serem lentas por natureza, afetam a velocidade e a qualidade de julgamento das demais ações judiciais de todas as naturezas em todas as esferas.

Identificou-se, também, que o tempo médio de tramitação do processo de execução fiscal baixado no Poder Judiciário é de 8 anos e 1 mês. Os tribunais da Justiça Federal apresentam os maiores tempos de tramitação dos processos de execução fiscal, em média 10 anos e 11 meses, enquanto a Justiça Estadual leva em média 7 anos e 10 meses para baixar um processo de execução fiscal, enquanto a Justiça do Trabalho 6 anos e 5 meses e a Justiça Eleitoral 5 anos e 11 meses.

Outros dados interessantes a serem considerados são: i) o maior impacto das execuções fiscais está na Justiça Estadual, que concentra 83% dos processos, respondendo a Justiça Federal por 17%; ii) a maior taxa de congestionamento de execução fiscal está na Justiça Federal (93%), seguida da Justiça Estadual (86%) e da Justiça do Trabalho (88%); iii) tramitam nos tribunais de Justiça de São Paulo e Rio de Janeiro mais de 55% do total de processos de execução fiscal.

Para os fins específicos desta nossa análise, outro dado interessante revelado pelo relatório “Justiça em Números” de 2021 foi que, em 2020, foram arrecadados em execuções fiscais R$ 40,2 bilhões (quase 1% da dívida ativa), dos quais R$ 34,9 bilhões (86,8%) são provenientes da Justiça Federal e R$ 5,1 bilhões (12,6%) são da Justiça Estadual.

Ora, se o orçamento do ano de 2020 do Poder Judiciário foi de R$ 100 bilhões e se 36% de todos os processos são execuções fiscais, significa que se gastou cerca de R$ 36 bilhões para movimentar estas cobranças judiciais, tendo como resultado financeiro o montante antes mencionado de R$ 40,2 bilhões. Considerando que nessa “equação” não foram levadas em consideração outras despesas como as condenações da Fazenda Nacional em honorários sucumbenciais, os custos das procuradorias das três esferas que são responsáveis por estas ações, entre outros gastos, devemos nos perguntar: será que vale a pena manter este modelo de cobrança judicial?

Algumas eficientes medidas vêm sendo adotadas pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e que servem de exemplos positivos paras as demais representações judiciais fazendárias diante de resultados bastante satisfatórios, como a transação em matéria tributária (autorizada pela Lei 13.988, de 14 de abril de 2020), a não resistência judicial em processos com teses fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o protesto de Certidão da Dívida Ativa Federal, o ajuizamento seletivo de execuções fiscais e o regime diferenciado de cobrança de créditos (RDCC), em que se incluiu o não ajuizamento (ou pedido de suspensão) de execuções fiscais abaixo de R$ 1 milhão ou aquelas em que não há bens suficientes para garantir o sucesso da cobrança.

Entre essas medidas, encontra-se o “rating” da dívida ativa que foi elaborado pela PGFN, a partir da classificação do crédito fiscal quanto ao grau de recuperabilidade, conforme a seguinte tipologia: “A” — alta recuperabilidade; “B” — média recuperabilidade; “C” — baixa recuperabilidade; “D” — irrecuperável.

A partir dessa classificação, do montante da dívida ativa federal de R$ 2.788.006.632,61 no ano de 2021, identificou-se que cerca de R$ 300 bilhões eram de alta recuperabilidade (nível A), cerca de R$ 700 bilhões eram de média recuperabilidade (nível B), cerca de R$ 417 bilhões eram de baixa recuperabilidade (nível C) e R$ 1,285 trilhões era considerado irrecuperável (nível D). Portanto, pode-se dizer que R$ 1 trilhão é de razoável recuperabilidade e R$ 2,7 trilhões são de difícil recuperabilidade.

Nesse ponto, é interessante apresentar uma das propostas que foram expostas no mês de junho passado no X Fórum Jurídico de Lisboa, congresso anual que debate temas de relevante interesse nacional, com a troca de experiências entre Brasil e Portugal.

Na mesa de debates intitulada “A Securitização da Dívida Ativa no Brasil”, da qual este subscritor participou, um eminente advogado tributarista que também integrava os debates expôs a seguinte interessante proposta: considerando que estes créditos fiscais que somam R$ 2,7 bilhões classificados pela PGFN como “C” e “D” são de difícil recuperabilidade (e que a PGFN não ajuíza mais cobranças abaixo de R$ 1 milhão e/ou desprovidas de bens para o respectivo pagamento), por que não cedê-los onerosamente (venda com deságio) ao mercado para que empresas especializadas em cobrança realizem essa tarefa, prática comum no setor privado, afinal são expressivos valores já considerados como “perdidos” pela Fazenda Nacional?

Seja qual for o mecanismo que venha a ser adotado — securitização ou cessão da dívida ativa, utilização de inteligência artificial na cobrança fiscal, entre outros —, fato é que, pelos números apresentados, além de concluirmos que o maior “cliente” do Poder Judiciário brasileiro é o próprio Estado, inequivocamente o atual modelo de cobrança precisa urgentemente ser repensado.

Fonte: Jota

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