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CLÁSSICOS FORENSE

REVISTA FORENSE

A prescritibilidade da ação investigatória de filiação natural

AÇÃO INVESTIGATÓRIA

FILIAÇÃO

PRESCRIÇÃO

PRESCRITIBILIDADE

REVISTA FORENSE

REVISTA FORENSE 152

Revista Forense

Revista Forense

10/08/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 152
MARÇO-ABRIL DE 1954
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,

Abreviaturas e siglas usadas
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CRÔNICARevista Forense 152

DOUTRINA

PARECERES

NOTAS E COMENTÁRIOS

  • A prescritibilidade da ação investigatória de filiação natural – Alcides de Mendonça Lima
  • Inviolabilidade do lar – Sanelva de Rohan
  • Os aumentos de capital e o direito dos portadores de ações preferenciais – Egberto Lacerda Teixeira
  • As sociedade de economia mista e as emprêsas públicas no direito comparado – Arnold Wald
  • Locação total e locação parcial – Eduardo Correia
  • Conceituação do arrebatamento como crime contra o patrimônio – Valdir de Abreu
  • Os quadros de carreira e a equiparação salarial – Mozart Vítor Russomano
  • A situação dos parlamentares que se afastam de seus partidos – Nestor Massena

BIBLIOGRAFIA

JURISPRUDÊNCIA

LEGISLAÇÃO

SUMÁRIO: 1. Fundamento ético-jurídico da prescrição. 2. A tendência moderna para reduzir os prazos. 3. A prescritibilidade da ação de investigação como ação de estado. 4. A orientação do direito comparado. 5. A solução do direito brasileiro atual. 6. A jurisprudência dominante. 7. Conclusões.

Sobre o autor

Alcides de Mendonça Lima, professor da Faculdade de Direito de Pelotas, da Universidade do Rio Grande do Sul.

NOTAS E COMENTÁRIOS

A prescritibilidade da ação investigatória de filiação natural

“Em semelhante matéria, é preciso agir com pressa e a golpe seguro”.

JOSSERAND

1.Fundamento ético-jurídico da prescrição

A prescrição é um instituto de alta transcendência jurídica, pelo objetivo a que visa. Muitas vêzes, por seu intermédio, se consolidam situações antijurídicas e imorais. Mas, em que pêse aos prejuízos que possam originar-se em tais casos, do ponto de vista individual, a ordem social, pela extinção dos choques de interêsses e pela tranqüilidade pessoal que fica assegurada, consegue vantagens enormes, que compensam os ônus causados aos que se sentem lesados pelo decurso de tempo que gerou a prescrição. Sobretudo modernamente, quando os interêsses coletivos se situam acima dos interêsses individuais, a prescrição se apresenta com característicos mais frisantes, tendentes a propiciar o equilíbrio das relações jurídicas, mesmo com o sacrifício pessoal de uma das partes. Por outro lado, a inércia do titular de um direito, por um determinado lapso, segundo a natureza da relação em jôgo, faz presumir um descaso, um desinterêsse, uma negligência, incompatíveis com a pretensão de conseguir seu gôzo e suas vantagens. E quem se achar usufruindo o direito alheio, sem ser incomodado, ou quem o violar, sem a natural reação – num ou noutro caso o inerte deve sofrer as conseqüências, em proveito de outrem, para que a paz social não seja ferida exatamente por quem não soube defender o que lhe pertencia, deixando que o tempo corroesse sua posição jurídica.

“O ordenamento”, ensina ROBERTO RUGGIERO, “não tutela quem não exerce o seu direito e mostra assim, desprezando-o, não o querer conservar, sendo do interêsse da ordem social que depois de um dado tempo desapareça qualquer incerteza nas relações jurídicas, bem como tôda possibilidade de contestação ou pleito” (“Instituições de Direito Civil”, trad. portuguêsa, vol. I, pág. 321, § 34).

Desde que haja a usurpação ou a ameaça de violação de um direito, cabe ao prejudicado usar do meio legal que o Estado lhe oferece – a ação própria, segundo a espécie. Mas, se êle próprio coopera para aquêle desajustamento, ao Estado, então, cumpre, por seu turno, extinguir os efeitos daquela situação originàriamente antijurídica, tomando uma medida que corrija a passividade do titular do direito que foi infringido sem qualquer reação. Segundo CÂMARA LEAL, “essa providência de ordem pública foi que o Estado teve em vista e procurou realizar pela prescrição, tornando a ação inoperante, declarando-a extinta e privando o titular, por essa forma, de seu direito, como justa conseqüência de sua prolongada inércia e, por êsse meio, restabelecendo a estabilidade do direito pela cessação de sua incerteza” (“Da Prescrição e da Decadência”, pág. 25).

Eis, assim, o fundamento sócio-ético-jurídico da prescrição. Pela índole do instituto, a existência de direitos prescritíveis se tornou a regra, conforme os prazos estatuídos nos Códigos, atendendo-se às peculiaridades de cada povo e às suas tradições, observada a natureza da relação jurídica. Pelo alto alcance social do instituto, não se pode conceber uma ordem jurídica em que a prescrição não se opere, dentro da escala de tempo prèviamente fixada, salvo os casos expressamente consignados, que assumem o caráter de exceção, face à regra geral universalmente estipulada.

Em sua clássica monografia, ALMEIDA DE OLIVEIRA sustenta, com grande acuidade e lógica: “Não há direitos tão absolutos, que possam verter em prejuízo da sociedade ou de terceiros. Ora, daria exatamente êsse resultado todo direito havido por eterno ou que pudesse ser exercido sem limitação alguma de tempo. Se fôsse possível fazer valer direitos seculares, ninguém se livraria de tais pretensões; o mundo seria um caos de processos e nenhuma sociedade subsistiria à falta de segurança e paz entre os homens” (“A Prescrição”, pág. 23).

Desde, portanto, que se reconhece a necessidade iniludível da prescrição, compreende-se, lògicamente, que a imprescritibilidade, por si mesma, não existe, exigindo, sempre, consignação expressa em lei, como, v. g., no Cód. Civil brasileiro, em seu art. 350, com relação à ação conferida ao filho legítimo.

2.A tendência moderna para reduzir os prazos

Entretanto, outro problema surge, de capital importância: a duração dos prazos. Modernamente, não se percebe mais a vantagem social dos prazos longos, quando as condições do progresso tornam conhecidos, mais ou menos, de todos, os atos ou situações incertos, de modo que cada um obtém meios de defender-se ou de pleitear a, reparação de que seja vítima, sem ser preciso o decurso de tempo dilatado, durante o qual subsistisse a ameaça de um atrito forense, abalando o ideal da paz social.

Esta censura aos prazos extensos já fôra feita pelo nosso insigne M. I. CARVALHO DE MENDONÇA, com a visão que caracteriza os verdadeiros juristas de escol: “Nada justifica, nos tempos modernos em que todos os meios de comunicação crescem dia a dia em rapidez e precisão, a manutenção de longo prazo da prescrição liberatória, tida como suficiente para o vasto e desolado mundo romano, em uma época em que tôdas as suas províncias se achavam como que isoladas por empecilhos naturais de tôda a ordem, em que o intercurso dos indivíduos era tão freqüentemente obstado e interrompido” (“Doutrina e Prática das Obrigações”, 3ª ed., tomo I, pág. 685, nº 436).

Idênticas observações ao do grande civilista pátrio, que as escreveu, igualmente, na 1ª adição, em 1908, são alinhadas, também, pelo notável Prof. LUÍS FREDERICO CARPENTER, em 1919, em época posterior, portanto, mas já muito distante do presente, em faca das hodiernas transformações técnicas e científicas, quase milagrosas para os nossos antecessores:

“Nunca menos de metade mais curto do que o estabelecido pelo Código, deveria ser o prazo da prescrição ordinária. Assim, o prazo de 15 anos para a prescrição ordinária das ações pessoais e das reais de reivindicação de imóveis e o prazo de cinco anos para a prescrição ordinária das ações reais de reivindicação de móveis, seria suficientemente longo; afigura-se até melhor que aquêle primeiro prazo fôsse de 10 anos.

“Com efeito, o prazo de 30 anos para a prescrição ordinária das ações pessoais -2 das ações reais de reivindicação de coisas imóveis, é aquêle que vigorava entre os romanos, ao tempo de JUSTINIANO. Porventura, hoje em dia, no estado atual das relações sociais de qualquer povo culto, deve ainda ser mantido êsse prazo tão longo para a prescrição ordinária? Já não falando no telégrafo sem-fio e nos cabos submarinos, que suprimiram as distâncias entre continentes, será possível pretender que a deslocação das pessoas e a comunicação de notícias entre regiões longínquas encontram ainda hoje a mesma dificuldade que encontravam há 14 séculos passados? Haverá, acaso, para caracterizar a feição das sociedades modernas, em confronto com a velha sociedade romana, um aspecto mais brilhante que o dessa variedade de comunicações de todo o gênero, determinada pelos sistemas ferroviários, pela organização dos correios, dos telégrafos e das rêdes telegráficas, pela navegação a vapor, pela navegação aérea, pela imprensa em geral e principalmente pelo jornal diário, com o seu poder enorme de vulgarização, circulação e penetração, por essas e outras magníficas aplicações práticas do vapor e da eletricidade? Um Código moderno não pode fechar os olhos a essas conquistas dos tempos atuais e conceder aos que têm ações a exercitar o mesmo prazo que os romanos concediam. Se os romanos ressurgissem dos seus túmulos e viessem fazer o comentário da nossa lei, no seu grande senso jurídico, notariam desde logo a oposição entre ela, que ainda conserva os prazos de prescrição que êles há 14 séculos estabeleceram, e o turbilhão vertiginoso da vida intensa que se vive no momento presente” (“Da Prescrição”, in “Manual de Paulo Lacerda”, vol. IV, págs. 360-361, n° 184).

Além de DARESTE e de GUILLOUARD, citados por CARPENTER, podemos invocar a lição de ALFREDO COLMO, professor argentino, expondo argumentos análogos, baseado em observações de SCIALOJA: “La ordinaria, por acción personal, vale decir, creditoria, es de diez años entre presentes y de veinte entre ausentes, y aunque la deuda está garantizada. En êste plazo se prescribe cualquier derecho no sometido a prescripción propia. Se alcanza la relativa amplitud del plazo: precisa tener en cruenta que en su seno caben todos los derechos no mirados especialmente y que tales derechos pueden ser importantes. Por lo demás, el término es bien prudencial: los treinta años del derecho romano y de la mayoria de los Códigos, resultaban explicables cuando las comunicaciones (ferrocarrilles, vapores, telégrafos, etc.) eran poco menos que imposibles: hoy carecerian de cualquier asidero (V. SCIALOJA propicia en la R. D. Civil, 1, 3 y ss., la reducción de todos los términos de prescripción del Código Civil italiano). Resulta singular, así, que en Códigos recientes se consagre prescripciones largas: es de treinta años en los Códigos alemán (artigo 195), austriaco reformado (art. 1.485) y brasileño (art. 177)” (“De las Obligaciones en General”, 3ª ed., 1944, pág. 659, nº 954). E, modernamente, GABRIEL RESENDE FILHO também pugna pela redução dos prazos (“Curso de Direito Processual Civil”, 3ª ed., vol. I, pág. 210, nº 218).

As lições produzidas em era anterior ao rádio, com suas variantes e seus aperfeiçoamentos, demonstram como a tendência, mesmo a antiga, inclusive entre autores estrangeiros, cujas idéias refletem a mentalidade dominante em outros povos, é, de priscas eras, a de encurtar os prazos de prescrição, favorecendo, assim, a estabilidade das ralações jurídicas e extirpando tôda a possibilidade de incertezas e de inseguranças, em benefício da tão decantada paz social.

Êste fato elucida como a ordem jurídica sente necessidade da prescrição, afastando, assim, tôda a concepção que sustente a imprescritibilidade das ações, salvo em casos raros e especialíssimos, em função de sua própria índole, ou taxativamente consignados. Exige-se, pois, a consolidação, não muito remota, de uma situação, sempre que houver descaso de parte daquele que seria o interessado em defendê-la ou em preservá-la de qualquer lesão. Quanto mais complexa fôr a relação jurídica ou quanto, presumìvelmente, fôr mais difícil o conhecimento da violação, maiores serão os prazos de prescrição. De qualquer forma, deve ser obedecida a escala de tempo fixada em lei, até os limites máximos estatuídos, segundo a natureza da ação – real ou pessoal. E se não houver disposição expressa em contrário, cada ação prescreverá segundo a sua natureza e o prazo firmado, não se conhecendo ações imprescritíveis, abstratamente, salvo quando a lei o declare.

A prescritibilidade da ação de investigação como ação de estado

Apesar desta diretriz doutrinária, há, ainda, quem sustente que existem ações de estado ou prejudiciais, em razão do direito que protegem, imprescritíveis, não atingidas, assim, entre nós, pela regra geral do art. 177 do Cód. Civil brasileiro. Entre essas, encontra-se a ação de reconhecimento da filiação ilegítima ou ação de investigação de paternidade ou maternidade natural.

Em que pêse ao prestígio de seus prosélitos, a tese não merece beneplácito, se a estudarmos dentro dos preceitos nucleares que informam a prescrição, auscultando a própria “consciência universal” a que se referiu o venerando CLÓVIS BEVILÁQUA (parecer in “Rev. dos Tribunais”, vol. 139, pág. 446).

Na. doutrina brasileira, a tese se cinde em dois grupos de alta valia mental.

Em favor da imprescritibilidade – corrente liberal – apontam-se: ESTÊVÃO DE ALMEIDA (“Direito de Família”, in “Manual de Paulo Lacerda”, vol. VI, página 165); CARVALHO DOS SANTOS (“Código Civil Brasileiro Interpretado”, vol. V, pág. 492); CÂMARA LEAL (“Da Prescrição e da Decadência”, pág. 255, e “Teoria e Prática das Ações”, vol. I, página 134, nº 489); CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA (“Efeitos do Reconhecimento da Paternidade Ilegítima”, pág. 64); BATISTA DE MELO (“Direitos de Bastardia”, página 275); PONTES DE MIRANDA (“Direito de Família”, 3ª ed., vol. III, pág. 98, § 225); WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO (“Curso de Direito Civil” – “Direito de Família”, pág. 217); ORLANDO GOMES e NÉLSON CARNEIRO (“Do Reconhecimento dos Filhos Adulterinos”, página 329 em diante, cap. XXIII, citando, ainda, as opiniões de ALFREDO BERNARDES, MENDES PIMENTEL e SÍLVIO PORTUGAL), e DIONÍSIO DA GAMA (“Das Ações Prejudiciais”, pág. 130, nº 160).

Em favor da prescritibilidade – corrente rígida – indicam-se: CLÓVIS BEVILÁQUA (“Código Civil Brasileiro Comentado”, 5ª ed., vol. II, pág. 340, e “Soluções Práticas de Direito”, vol. 1º, página 184); CARLOS MAXIMILIANO (“Direito das Sucessões”, vol. I, nº 243, página 300); HERMENEGILDO DE BARROS (“Direito das Sucessões”, in “Manual de Paulo Lacerda”, vol. 18, pág. 440, nº 270); ARNOLDO MEDEIROS DA FONSECA (“Investigação de Paternidade”, 2ª ed., páginas 272 a 274, ns. 225 a 226); LUÍS FREDERICO CARPENTER (ob. cit., pág. 192); LINO MORAIS LEME (“Da prescrição da ação de investigação de paternidade”, in “REVISTA FORENSE”, vol. 104, págs. 24 a 28); VIEIRA FERREIRA (“Comentário ao acórdão do célebre caso da menor Colombina”, in “Rev. de Crítica Judiciária”, vol. I, pág. 673); SERPA LOPES (“Curso de Direito Civil”, vol. I, págs. 394 e seguintes, nº 271), e ADROALDO MESQUITA DA COSTA (parecer in “Justiça”, vol. VII, págs. 356 a 358).

O argumento central em prol da imprescritibilidade da ação investigatória é de que a mesma visa ao reconhecimento de um estado pessoal do autor, que, por sua natureza, é imprescritível, pois ninguém pode deixar de ser filho do verdadeiro pai, ou mãe, ao menos por motivos de ordem biológica.

Não se trata, porém, de negar esta evidência. Trata-se de situar a espécie dentro de nosso direito positivo, consoante as linhas mestras em que foi gizado, confrontando-o com o direito comparado de povos cujas origens, desenvolvimento e peculiaridades se ajustam ao nosso ordenamento jurídico. Os corifeus da imprescritibilidade realizam trabalho de criação legislativa, lege ferenda, oferecendo subsídios para que, de modo categórico, se exclua, também, aquela ação do alcance do art. 177 do Cód. Civil, como ação pessoal de estado, sem a prescrição, porém, de qualquer têrmo fixo. Mesmo assim, é discutível se deve conceder-se tal privilégio, pelas razões em que se assenta o instituto da prescrição, como vimos no exórdio dêste estudo. É difícil de compreender qual o interêsse honesto que o investigando possa ter em demorar a propositura da ação, deixando que o tempo apague ou arrefeça as provas a serem produzidas. É, também, difícil compreender como poderá, durante longo tempo, ignorar sua situação, em face das condições modernas da vida social. A qualquer das hipóteses, falta uma resposta lógica que satisfaça, de modo a aconselhar que a ação não sofra qualquer limite prescricional.

A ação de investigação é, sem dúvida, uma ação prejudicial ou de estado, como é corrente na doutrina. Mas êsse atributo, por si só, é incompatível com a prescrição? Será a imprescritibilidade da essência de tais ações? Não. Em nosso próprio direito positivo encontram-se inúmeros casos de ações de estado sujeitas a prescrição e, o que é mais importante, em prazos extremamente curtos, quais sejam: a) a ação para anular casamento com mulher já deflorada (art. 178, § 1º – 10 dias); b) a ação para o marido, se presente, contestar a legitimidade do filho de sua mulher (art. 178, § 3° – dois meses); c) idem, se ausente o marido ou se lhe ocultaram o nascimento (art. 178, § 4°, I – três meses); d) a ação para anulação de casamento realizado sob coação (artigo 178, § 5º, I, – seis meses); e) a ação promovida pelo incapaz para consentir para anular seu casamento (art. 178, § 5º, II – seis meses); f) a ação para anular casamento de menor de 16 e do menor de 18 anos (art. 178, § 5°, III – seis meses); g) a ação dos herdeiros do filho para prova da legitimidade da filiação (art. 178, § 6º, XII – um ano); h) a ação do cônjuge para anular o casamento (art. 178, § 7º, I – dois anos); i) a ação do filho natural para impugnar o reconhecimento (arts. 178, § 9°, VI, e 362 – quatro anos).

Algumas, ainda sendo ações de estado (indicadas nas alíneas a, d, e, f e h), não têm analogia com a finalidade da ação de investigação, a qual tem por objetivo tornar legal ou oficial uma situação, biológica, que sobrepaira as formulações legais. Pela natureza dos vícios ou da violação do direito, o tempo tem o poder de revelar anuência tácita de parte daquele que tinha a faculdade de impugnar o ato realizado imperfeitamente e cujo defeito, poderia ser argüido, se ignorado do outro contratante.

Entretanto, outras existem que são afins com a ação de investigação de paternidade (ou maternidade), isto é, as mencionadas nas alíneas b, c, g, e i. Se, como alegam os prosélitos da imprescritibilidade, um filho nunca deixa de ser filho por se ter escoado o prazo durante o qual deveria ter proposto a ação de investigação, ipso facto, um pai também não se torna pai de alguém que não é seu filho, apesar de concebido por sua mulher, pelo fato de terem decorrido dois ou três meses, conforme a hipótese (alíneas b e c, supra) ou, de outra forma, um filho não, se torna, só por isso, filho do marido de sua mãe, por não ter o pretenso pai proposto a ação contestatória da legitimidade da paternidade. Além disso, alguém não, deixa de ser filho de seu verdadeiro pai, pelo fato dos herdeiros daquele não terem intentado a ação competente para provar a legitimidade da filiação no prazo de um ano (alínea g); e o filho natural não se torna filho de quem o reconheceu, apenas por não haver impugnado o reconhecimento dentro de quatro anos de sua maioridade (alínea i).

Isso demonstra, portanto, que, se, biològicamente, a situação do filho não se modifica, jurìdicamente, porém, o mesmo não acontece, porque ocorrem outros interêsses em jôgo, cuja defesa depende da iniciativa da parte, sob pena de lesar direitos alheios consolidados, sem que a sociedade tenha vantagem em abalá-los ou alterá-los, gerando atritos e prejuízos imprevisíveis.

E o Cód. Civil brasileiro ainda abre outra brecha à apregoada doutrina de que as ações de estado são imprescritíveis: o artigo 350, que reza:

“A ação de prova da filiação legítima compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros se êle morrer menor ou incapaz”.

Sôbre o assunto, merece relembrada a lição de ASTOLFO RESENDE, que ORLANDO GOMES e NÉLSON CARNEIRO citam, com a expressa referência de ser “a argumentação mais impressionante”: “A situação do filho ilegítimo é fundamentalmente diferente (da do filho legítimo), porque não se apóia sôbre os dois princípios básicos da filiação legítima, que são as presunções de legitimidade e a que se traduz na máxima pater ist est quam nuptiae demonstrant. Dêsse modo, o filho legítimo, ao propor a ação para provar a sua qualidade, a fundamenta num fato certo, provado, indiscutível, como é o casamento. Mas o filho ilegítimo não possui estado, resultante de fato certo, nem título, proveniente de registro de nascimento e, por isso, não tem de provar apenas a sua filiação, mas, antes de tudo, a origem, a gênese desta, que é sempre duvidosa e incerta. O legítimo tem a qualidade; o ilegítimo demanda, para adquiri-la. Por êsse motivo, o estudo do primeiro não prescreve, porque dêle não se exige senão que prove a sua filiação, o que pode fazê-lo em qualquer tempo; o ilegítimo demanda o reconhecimento da filiação, de sorte que a ação não pode deixar de perecer pela prescrição, porque não se trata de um direito existente e, sim, de uma pretensão, que se procura converter em direito por fôrça de uma sentença” (parecer in “Revista de Jurisprudência Brasileira”, vol. 53, pág. 105, apud “Do Reconhecimento dos Filhos Adulterinos”, págs. 331-332, nº 281).

Glosando êste notável ensinamento, GOMES e CARNEIRO sustentam que o art. 350 do Cód. Civil estabelece a legitimatio ad causam, como exceção ao princípio personalíssimo da ação, que se transmite a seus herdeiros, se o filho morrer menor ou incapaz, não tendo o legislador a intenção de declarar que a ação fôsse imprescritível. Discordamos, data venia, do artifício. Se procedesse a observação sutil dos ilustres professôres baianos, o Código poderia ter prescrito, tão-somente, que a ação, se o filho morresse menor ou incapaz, se transmitiria aos seus herdeiros. Não a tornaria ilimitada, dentro da vida do filho. Atender-se-ia, assim, à exceção da regra do sentido personalíssimo da ação, sem, contudo, torná-la imprescritível. Se o filho morresse menor, a prescrição começaria a correr, para seus herdeiros, da data em que aquêle completasse 18 anos (art: 189, nº I, combinado com o artigo 165, do Cód. Civil); se o filho, porém, morresse incapaz, a prescrição sòmente começaria a correr da data de seu óbito. Se, porém, o filho se houvesse tornado Incapaz (loucura declarada judicialmente, em processo de interdição), depois dos 48 anos de idade, a ação não poderia ser proposta por seus herdeiros, porque, ao falecer seu antecessor, já se havia consumado a prescrição de 30 anos, estatuída para as ações pessoais (art. 177 do Cód. Civil). Na falta de dispositivo expresso, porém, bastaria o filho morrer em qualquer idade ou em qualquer condição de capacidade, para que se privassem seus herdeiros de acionar. Mas, como a situação de filho legítimo se reflete, em todos os sentidos – biológico, jurídico, moral e social, – em seus herdeiros, a lei não podia deixar de reconhecer êste fato, obstando qualquer iniciativa dos herdeiros, que se tornavam interessados diretos na prova do estado legítimo de seu antecessor. Por conseguinte, o art. 350 teve duas finalidades distintas, estipulando dois preceitos de exceção: a) imprescritibilidade da ação para o próprio filho; b) concessão especial aos herdeiros para intentarem a ação, mas apenas se o antecessor houver morrido menor ou incapaz. Se o de cujos se tornar inerte, durante sua vida, seus herdeiros perderão a oportunidade de gozar das vantagens que lhes adviriam da situação de seu antecessor, se bem que, nem por isso, deixassem de ser parentes do pai (ou da mãe) daquele que não se importou em provar sua filiação legítima.

A disparidade de situação do filho natural e do filho legítimo é acolhida, também, pela doutrina estrangeira, que abona a opinião trasladada de ASTOLFO RESENDE, conforme se verifica da seguinte passagem citada por G. CHÉNEAUX, se bem que a rebata logo após: “L’art. 328, si è detto, non deve estendersi alla filiazione naturale, poichè non è possibile alcuna assimiliazione tra il figlio legittimo e quello naturale. Il primo tiene il proprio stato a un tempo dalla legge e dalla natura. E la legge stessa che regola il suco stato, e gli assegna il suo posto nella famiglia. Al contrario il figlio naturale non ha stato al momento della sua nascita. Egli non può acquistare uno stato se non mediante un atto di volontà. Fa d’uopo che egli sia volontariamente riconosciuto dal padre o dalla madre. In mancanza di riconoscimento è necessario ch’egli eserciti un’azione in giudizio, vale a dire ch’egli compia un atto volontario. Quindi lo stato del figlio dipende dalla sua volontà e da quella de suoi genitore. Se cosi è, perchè colpire di nullità le convenzioni relative a questo stato? Perchè non ammettere in particolare che il figlio possa obbligarsi a mantenere il silenzio e a non ricercare la sua filiazioni? E se il figlio può rinunciare alia sua azione, bisogna logicamente dire che essa sia prescrittibile” (“Trattato Teorico-Pratico di Diritto Civile”, sob a direção de BAUDRY-LACANTINERIE, edição italiana, vol. IV, pág. 699, nº 702).1

4. A orientação do direito comparado

Modernamente, porém, no direito positivo dos povos cultos e de maior influência na civilização, muitos com gênese jurídica semelhante à nossa, a doutrina em favor da imprescritibilidade não vingou, vigorando, pelo contrário, prazos curtos, excessivamente curtos. Em tais casos, a questão se situa em posição oposta à nossa, porquanto a limitação reduzida de prazo pode gerar prejuízos irreparáveis para o investigando, sem maiores oportunidades para investigações mais detalhadas e demoradas, em busca de elementos de prova, muitas vêzes difíceis e complexos, que exigem pesquisas afanosas, variadas e múltiplas, até mesmo em lugares distantes. Apesar disso, entre as legislações mais adiantadas, não se aponta exemplo de norma declarando imprescritível a ação de reconhecimento ou de investigação de paternidade (ou maternidade) natural, enquanto, porém, é considerada imprescritível a ação para provar a filiação legítima, sistema idêntico ao nosso.

No direito português, o prazo é de um ano após o falecimento do pai (ou da mãe) ou até quatro após a maioridade, se o filho era menor quando o pai faleceu (dec. nº 2, de 25 de dezembro de 1910, art. 37). O direito, porém, do filho legítimo para reivindicar o estado que lhe pertence é imprescritível (art. 14 do citado decreto) (LUÍS DA CUNHA GONÇALVES, “Princípios de Direito Civil”, vol. 3, páginas 1.279-1.280).

No direito italiano, segundo seu moderníssimo Cód. Civil, o prazo é de dois anos a contar da maioridade (art. 269). O filho legítimo, porém, pode mover a ação para provar seu estado durante tôda a vida, sendo, assim, imprescritível (artigo 269) (STOLFI-STOLFI, “Il Nuovo Codice Civile”, 1939, vol. I, págs. 268 e 287).

No direito uruguaio, o prazo é de cinco anos a contar da maioridade (Cód. Civil, art. 241).

No direito turco, o prazo é até um ano depois do nascimento, o mais tardar (Cód. Civil, art. 296).

No direito francês, que, originàriamente, se mostrou infenso à ação investigatória, a lei de 16 de novembro de 1912 passou a admitir a ação, mas limitou sua propositura a um ano a contar da maioridade, alterando o art. 340 do Cód. Civil, em seu 14º parágrafo.

Aliás, no projeto primitivo da dita lei, pretendeu-se privar o filho do direito de acionar, caso a mãe não houvesse feito, dentro do prazo de dois anos após o parto. Entretanto, por emendas ao texto, o Senado percebeu que o principal interessado na ação não era, em absoluto, a mãe, mas o filho, discursando, a respeito, o senador RATIER: “Il semblerait vraiment anormal et injusto de refuser à l’intéréssé le droit d’invoquer une action que la mère n’aurait pas exercée par incurie, faiblesse ou même par intérét” (R. SAVATIER, “La Recherche de la Paternité”, pág. 156, nº 91, e nota n° 2; FRANÇOIS BRUN, “La Recherche de la Paternité”, págs. 128 a 130, nº 79).

A razão do prazo curto funda-se no interêsse social de impedir que ressurjam escândalos em tôrno do fato, pois “on ne pouvait en effet laisser perpétuellement un homme sons le coup d’une telle menace” (FORTUNÉ CREVOISIER, “La Reconnaissanca Judiciaire de la Paternité”, pág. 97), com o abono de COLIN et CAPITANT (“Cours de Droit Civil Français”, vol. I, pág. 340).

Sem justificar, contudo, a diretriz do legislador, SAVATIER faz a seguinte observação ao prazo de dois anos concedido à mãe depois do parto: “En adoptant cette disposition, le législateur à endormir tout scandale et à rendre irrémédiablement incertaines les preuves de la paternité. Exacte ou non, cette idée s’accorde en tout cas bien mal avec la disposition rouvrant l’exercice de l’action à l’enfant devenu majeur” (ob. cit., pág. 151, nº 87).

Por seu turno, JOSSERAND, aplaudindo o sistema francês, escreve de modo incisivo: “La ley ha incluído la acción de investigación de la paternidad natural en plazos bastantes breves; es urgente terminar con un problema irritante y evitar un retraso malicioso, con fienes ilícitos, tanto más temible cuanto las pruebas son menos seguras a medida que se borren en la lejanía. En semejante materia es preciso obrar de prisa y a golpe seguro” (“Derecho Civil”, edição argentina, tomo I, volume II, pág. 377, nº 1.226).

O Prof. LINO MORAIS LEME indica mais as seguintes legislações com prazos curtos, a contar da maioridade: Inglaterra e Venezuela – um ano; Bélgica – quatro anos; Chile – 10 anos. E cita a semelhança entre a nossa situação e os Códigos alemão e austríaco, que não têm artigo especial sôbre a prescrição desta ação, entendendo seus comentadores, como CALOYANNI, que o prazo é, pois, de 30 anos, por ser o ordinário (ob. cit., nº 3). Idêntica resenha encontra-se na mencionada obra do Prof. ARNOLDO MEDEIROS DA FONSECA (págs. 77 a 96).

5. A solução do direito brasileiro atual

Assim sendo, não se pode dizer que a prescritibilidade da ação seja uma teoria aberrante de sua substância e de sua essência. Pelo contrário. A perpetuidade durante a vida do filho é que se choca com os princípios nucleares que regem o instituto da prescrição e com as próprias regras da ação investigatória.

Todos sabem como é mais fácil, paradoxalmente, ao contrário do que acontece com as demais ações, tentar a investigação depois de longo tampo do que nos anos mais próximos. Dir-se-á que o ônus da prova cabe ao investigando e que, quanto mais a prova enfraqueça, pior para êle. Entretanto, não é difícil forjar testemunhos, que indiquem alguns fatos longínquos e inverídicos, com aparência de mais, sem que o pretenso pai e – o que é mais grave – seus herdeiros consigam fazer a contraprova, pois, antecipadamente, ignoram os últimos, em regra, os detalhes que as testemunhas possam apresentar em juízo e que davam ser ilididos. São na maioria dos casos fatos simples, que podem ser ensinados sem dificuldades para as testemunhas ímprobas.

Sobretudo nas ações fundadas em concubinato longínquo, já sendo o investigando de meia idade, sempre se delineia aquela situação referida por aresto da douta 3ª Câmara Cível do egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, de lavra do culto desembargador LOUREIRO LIMA: “Como em quase todos os casos de investigação de paternidade ilegítima, em que o suposto filho tem mais de meio século e seu escopo único é se aproveitar de uma herança, a principal testemunha “sempre é um negro velho, entrado em anos, companheiro de mocidade do filho do senhor, e que tudo sabe” (apelação cível nº 5.400, ac. de 9-6-1949, in “Justiça”, vol. 31, pág. 384).

Na omissão, portanto, de texto expresso, não se pode deixar de incluir a ação investigatória da paternidade (ou maternidade) sob a égide do art. 177 do Cód. Civil brasileiro, estabelecendo o prazo de 30 anos, a contar da data em que o investigando completar 16 anos. Na falta de outra norma, têm de ser obedecidas as três décadas clássicas. Isso, aliás, é uma peculiaridade de nosso regime, ainda suportando os resquícios da tradição e de vetustas fórmulas. Por sinal que, em que pêse a pontos de vista divergentes, se sustentava que, no direito anterior ao Cód. Civil, o prazo já era de 30 anos (cf. voto do então ministro MORETZSOHN DE CASTRO, do Tribunal de Justiça de São Paulo, acórdão de 23 de fevereiro de 1917, in “Rev. dos Tribunais”, vol. 21, pág. 202, e voto do desembargador NICOLAU DE BARROS, do Tribunal de Justiça da Bahia, acórdão de 30 de novembro de 1943, in “REVISTA FORENSE”, vol. 108, pág. 490).

Esta é a solução de nosso direito positivo, lege lata. Sòmente com a reforma do Cód. Civil, intrometendo-se outros dispositivos de cunho nìtidamente liberal e protecionista daqueles que são, injustamente, estigmatizados pela mentalidade tacanha e retrógrada da sociedade, responsabilizando-os pelo êrro e pelos vícios dos pais, é que se poderá considerar imprescritível a ação de investigação de paternidade (ou maternidade) ou ação de reconhecimento de filiação ilegítima.

Entre os adeptos da imprescritibilidade, há a salientar que alguns admitem, porém, a prescritibilidade dos efeitos patrimoniais que do estado derivam, não podendo ser cumulada a ação de investigação com a de petição de herança, se decorridos já 30 anos da abertura da sucessão do pretendido pai. São imprescritíveis, assim, na opinião dessa plêiade, apenas os “efeitos morais” (cf. ORLANDO GOMES e NÉLSON CARNEIRO, ob. cit., pág. 341, nº 290; ESTÊVÃO DE ALMEIDA, loc. citado; ODILON DE ANDRADE, parecer in “REVISTA FORENSE”, vol. 85, pág. 333; HAHNEMANN GUIMARÃES, voto nos embargos nº 14.196, vol. 138, pág. 116). Na literatura francesa, existem pronunciamentos similares, como expressão teórica, de vez que a lei respectiva atual não mais ampara o conteúdo das afirmativas doutrinárias (cf. FRANÇOIS BRUN, ob. citada, pág. 126; CHEVEUX, ob. cit., pág. 700: “Ma i diritti pecuniari che ne discendono possono prescriversi e possono formare oggetto di valide convenzioni”).

Nesta hipótese, portanto, o prazo da prescrição se dilata ainda mais, de modo quase indefinido, estendendo-se, na certa, além dos 46 anos de idade do investigando (16 + 30), sem têrmo fixo, pois seu início dependerá de evento futuro imprevisível. Enquanto isso, perdurará um ambiente de insegurança e de ameaça, em detrimento do equilíbrio social e da estabilidade das relações jurídicas.

Se bem que, do ponto de vista da honra pessoal, os “efeitos morais” deveriam sobrelevar os “efeitos patrimoniais” da ação, ninguém propõe tal demanda para o fim exclusivo do mero reconhecimento. A ambição pecuniária é, sempre, o motivo preponderante, mesmo quando o valor seja pequeno. Será raro, raríssimo, o caso em que o investigando não tenha preocupações de ordem financeira. Qual o interêsse prático, portanto, de deixar em aberto o prazo para ser intentada a ação de investigação, depois de decorrido o lapso de 30 anos em que prescreverão os direitos patrimoniais? Na verdade, só por extrema coincidência o prazo da abertura da sucessão se iniciará quando o investigando tenha 16 anos, ambos terminando quando o filho complete 46. Mas, desde que se admite a prescritibilidade dos efeitos patrimoniais, que geram os resultados concretos do reconhecimento visados pelo investigando (apesar de reiterados argumentos de sentido puramente moral…), é mister uniformizar o prazo, contado sempre do dia em que o investigando se torna relativamente incapaz (art. 6°, nº I, combinado com o art. 169, nº I, do Cód. Civil), e não dependê-lo de acontecimento futuro incerto, qual seja a abertura da sucessão do suposto pai. Se o objetivo moral é aquele que deva ser amparado pela sociedade, embora as pretensões do investigando sejam, realmente, outras, a situação econômica do pai não merece causar privilégios, servindo para dilatar o prazo da prescrição. Ou a ação é prescritível e, nesta hipótese, sê-lo-á para todos os efeitos, ou a ação é imprescritível e, nesta hipótese, sê-lo-á, igualmente, para todos os efeitos. A solução meio-termo não condiz com a apregoada defesa da situação natural ou biológica do investigando, pois, se o decurso do prazo não deve influir no reconhecimento de um estado que está acima dos pronunciamentos judiciais, também não deve influir para as demais conseqüências, pois a injustiça seria muito maior, em concedendo um direito por um lado e negando-o por outro.

A jurisprudência dominante

Refletindo a opinião dominante e captando os influxos da “consciência universal”, a jurisprudência de nossos Tribunais, de uns tempos para cá, se apresenta pacífica e torrencial em favor da prescritibilidade, contado o prazo da vigência do Cód. Civil – 1º de janeiro de 1917, pelo fundamento de que antes era vedada tal ação – e a partir, para o interessado, do dia em que completar 16 anos de idade.

Nos repositórios de maior divulgação e conceito, encontram-se os seguintes julgados:

Supremo Tribunal Federal:

Acórdão de 2 de abril de 1946 – recurso extraordinário nº 8.742, relator o eminente ministro BARROS BARRETO, in “REVISTA FORENSE”, vol. 108, págs. 488-499, e in “Direito”, vol. 39, pág. 264;

Acórdão de 2 de janeiro de 1950 – recurso extraordinário nº 14.196, relator o preclaro ministro JOSÉ LINHARES, in “REVISTA FORENSE”, vol. 144, págs. 108-109, e in “Direito”, vol. 69, pág. 319; confirmado em grau de embargos por acórdão de 18 de outubro de 1950, relator o insigne ministro EDGAR COSTA, in “REVISTA FORENSE”, vol. 138, págs. 114 a 116, e “Arq. Judiciário”, vol. 98, pág. 129.2

Tribunal de Justiça de São Paulo:

Acórdão de 5 de maio de 1942 – agravo nº 15.624, da 2ª Câmara Cível, relator o desembargador PERCIVAL DE OLIVEIRA, in “REVISTA FORENSE”, vol. 91, páginas 452-453;

Acórdão de, 1º de março de 1945, da 4ª Câmara Cível, relator o desembargador PINTO DO AMARAL, in “Repertório de Jurisprudência do Código Civil”, vol. II, pág. 737, nº 1.934;

Acórdão de 12 de março de 1945, do 1º Grupo de Câmaras Cíveis, relator o desembargador FREDERICO ROBERTO, in “Repertório”, cit., nº 1.935;

Acórdão de 17 de agôsto de 1948, da 2ª Câmara Cível, relator o desembargador PERCIVAL DE OLIVEIRA, in “Repertório”, cit., pág. 741, nº 1.949.

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Acórdão de 30 de julho de 1945, da 1ª Câmara Cível, relator o desembargador ADMAR BARRETO, in “Justiça”, vol. 28, pág. 379;

Acórdão de 26 de dezembro de 1952, das Câmaras Cíveis Reunidas, relator o desembargador DÉCIO PELEGRINI, in “Revista Jurídica”, vol. 2, pág. 105.3

Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

Acórdão de 17 de agôsto de 1950, da 1ª Câmara Cível, relator o desembargador EDUARDO DE MENESES FILHO, in “Ementário Forense”, ano IV, coleção nº 39, ficha nº 36.

Tribunal de Justiça do Distrito Federal:

Acórdão de 8 de maio de 1942, da 5ª Câmara Cível, relator o desembargador CÂNDIDO LÔBO, in “REVISTA FORENSE”, vol. 92, pág. 433.

Tribunal de Justiça da Bahia:

Acórdão de 30 de novembro de 1943, relator o desembargador SÍLVIO MARTINS, in “REVISTA FORENSE”, vol. 108, págs. 488 a 499, e in “Direito”, vol. 39, página 264;

Acórdão de 31 de maio de 1949, da 1ª Câmara Cível, relator o desembargador EUVALDO LUZ, in “Ementário Forense” ano II, coleção nº 13.

Tribunal de Justiça do Paraná:

Acórdão de 5 de novembro de 1947, da 1ª Câmara Cível, relator o desembargador CUNHA PEREIRA, in “REVISTA FORENSE”, vol. 131, págs. 506 a 509.

É impressionante, assim, o rumo da jurisprudência, desde o augusto Supremo até os venerandos Tribunais de Justiça de diversos Estados. Quando uma tese merece esta consagração entre os órgãos que servem de índice da mentalidade predominante, pela variedade de concepções que se chocam e se cruzam nos inúmeros processos, é porque, além do prestígio da doutrina que a sustenta, conta com o apoio da própria alma jurídica nacional, como a síntese da evolução e da formação de um povo.

Conclusões

Em conclusão:

a) A prescrição, sobretudo no mundo contemporâneo, é um instituto de grande alcance para a paz social, merecendo ser incentivado.

b) A tendência moderna é para encurtar os prazos prescricionais, abandonando as arcaicas fórmulas romanas, que se tornaram incompatíveis com a realidade hodierna.

c) O Cód. Civil brasileiro não conhece ações imprescritíveis por sua natureza. Quando a ação deva ser excluída da regra geral do art. 177 para os casos não-previstos no art. 178, o Código menciona expressamente (art. 350, por exemplo).

d) O fato de a ação de investigação ser de estado não a isenta da prescritibilidade estatuída no art. 177, ex vi do artigo 179 – 30 anos, – porque há outras ações de idêntica finalidade com prazos curtos, no elenco do art. 178.

e) Em povos de formação jurídica semelhante e, até, diversa da nossa, se estabelecem prazos muito curtos para a prescrição de tal ação, não se apontando exemplo de ser imprescritível.

f) A divergência doutrinária na literatura brasileira em prol das duas teses se enfraquece ante a orientação quase unânime e torrencial da jurisprudência, em favor da prescritibilidade da ação, contado o prazo da data em que o investigando completar 16 anos, ou após a vigência do Cód. Civil, se aquela idade houver sido atingida antes de 1º de janeiro de 1917.

Alcides de Mendonça Lima, professor da Faculdade de Direito de Pelotas, da Universidade do Rio Grande do Sul.

__________

Notas:

1 O autor escrevia segundo o direito francês, referindo-se ao texto do art. 328 do Cód. Civil de sua pátria.

2 Na obra citada dos doutos juristas ORLANDO GOMES e NÉLSON CARNEIRO, êste último aresto é invocado como favorável à tese por êle defendida, da imprescritibilidade (pág. 341, nota 346, do rodapé). Entretanto, a decisão foi contrária àquele ponto de vista. Na fonte, donde foi, inadvertidamente, colhido o julgado, a ementa está errada, sendo, apenas, um trecho do voto do emérito ministro HAHNEMANN GUIMARÃES, sem corresponder, portanto, ao conteúdo do acórdão e à decisão nêle contidos.

3 Recentemente, porém, a conspícua 1ª Câmara Cível, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, contrariando esta orientação das egrégias Câmaras Cíveis Reunidas, decidiu pela imprescritibilidade, por haverem dois de seus ilustres membros alterado seu ponto de vista, aderindo ao do Exmo. Sr. desembargador presidente, que ficara isolado no aresto anterior (agravo de petição nº 4.524, cujo acórdão ainda não foi publicado).

*

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