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Justiça do Trabalho – Competência para julgar dissídio coletivo suscitado por professores – João Mangabeira

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Justiça do Trabalho – Competência para julgar dissídio coletivo suscitado por professores – João Mangabeira

JOÃO MANGABEIRA

JUSTIÇA DO TRABALHO

PROFESSOR

REVISTA FORENSE

REVISTA FORENSE 143

Revista Forense

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02/08/2021

REVISTA FORENSE – VOLUME 143
SETEMBRO-OUTUBRO DE 1952
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto

Abreviaturas e siglas usadas
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 – Sendo entre empregados e empregadores o dissídio coletivo entre professôres e proprietários de colégios, cabe à Justiça do Trabalho julgá-lo, desde que legalmente instaurado.

 – Interpretação do art. 123 da Constituição.

Justiça do Trabalho – competência para julgar dissídio coletivo suscitado por professores

PARECER

Em face do parág. único do art. 323 da Consolidação das Leis do Trabalho, tem a Justiça do Trabalho competência para dirimir dissídio coletivo suscitado por professôres?

Dificilmente uma questão mais simples poderia ser proposta numa consulta. A resposta afirmativa não demanda longas análises. Em casos tais, quanto menos palavras, melhor. Na concisão do parecer, a verdade, em tôda a sua evidência, ressalta rígida, límpida, brilhante, como um diamante lapidado.

A resposta à presente consulta resume-se neste silogismo:

  1. O art. 123 da Constituição prescreve que:

“Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores e as demais controvérsias oriundas de relações do trabalho regidas por legislação especial”.

  1. O dissídio suscitado porprofessôrescontra donos de colégios é um “dissídio coletivo entre empregados e empregadores”; logo,

III. “Compete à Justiça do Trabalho julgar” êsse “dissídio coletivo”.

Poderia findar aqui o parecer e êle estaria completo e a consulta tão plenamente respondida, como se lançada e justificada em resmas de papel recheadas de citações, eruditas e de argumentos supérfluos. Porque a Constituição atribui à Justiça do Trabalho a competência de “julgar os dissídios… “entre empregados e empregadores e as demais controvérsias oriundas de relações do trabalho regidas por legislação especial”.

Não disse “julgar dissídios e controvérsias”, mas “os dissídios e as controvérsias”, o que vale dizer: todos “os dissídios entre empregados e empregadores” e tôdas “as controvérsias oriundas de relações do trabalho regidas por legislação especial”.

E nessa totalidade abriu sòmente a exceção, declaradamente expressa no § 1º da mesmo artigo, e que se enuncia nestes têrmos:

“Os dissídios relativos a acidentes do trabalho são da competência da justiça ordinária”.

Essa a única brecha aberta na muralha da competência da Justiça do Trabalho, por qualquer outro ponto impenetrável.

Não se trata de acidente do trabalho? Então, seja qual fôr o “dissídio entre empregados e empregadores” ou “controvérsia oriunda de relação de trabalho”, numa ou noutra hipótese o caso judicial tem de ser resolvido pela Justiça do Trabalho, por fôrça da Constituição, que ao mesmo tempo lhe outorgou essa competência e lhe impôs êsse dever.

E a lei? E o parág. único do art. 323 da Consolidação das Leis do Trabalho a que alude a consulta?

Mas a competência da Justiça do Trabalho não decorre da lei: assenta-se na Constituição.

A lei a que se alude, ou, melhor, êsse decreto-lei foi promulgado ao tempo do ditado de 10 de novembro de 1937, que dispunha em seu art. 139:

“Para dirimir os conflitos oriundos das relações entre empregados e empregadores, reguladas na legislação social, é instituída a Justiça do Trabalho, que será regulada em lei e à qual não se aplicam as disposições desta Constituição relativas à competência, ao recrutamento e às prerrogativas da Justiça comum”.

Assim, pelo ditado de 10 de novembro de 1937, a competência da Justiça do Trabalho era fixada por lei.

A Justiça do Trabalho não era um órgão do Poder Judiciário, que, pelo art. 90 do ditado, se compunha apenas do “Supremo Tribunal Federal, dos juízes e Tribunais, dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios e dos juízes e tribunais militares”.

Pela Constituição vigente (art. 94, nº V), a Justiça do Trabalho pertence ao Poder Judiciário, e tem sua competência constitucionalmente fixada.

Assim, ou o parág. único do citado artigo 323 se conforma com aquela competência e é válido, ou a ela não se adapta e é nulo.

Imagine-se que êsse parágrafo, anterior à Constituição vigente, ou qualquer lei a ela posterior, assim prescrevesse:

“É vedado à Justiça do Trabalho conhecer de qualquer dissídio entre professôres e proprietários de colégios e cabe exclusivamente ao ministro da Educação fixar a remuneração a que têm direito os primeiros”.

Impossível uma proibição mais terminante e uma atribuição privativa mais precisa. Que validade legal teria isso?

Nenhuma. A Justiça do Trabalho teria tão-sòmente de perguntar e ela própria responder – o dissídio entre professôres e proprietários de colégios é entre empregados e empregadores?

São os professôres empregados do colégio e os seus proprietários empregadores?

Evidente que sim, pois os primeiros recebem dos segundos uma remuneração mensal pelos serviços que habitualmente lhes prestam.

O fato de ser o professor um trabalhador intelectual não lhe altera a situação.

Trabalho manual ou trabalho intelectual são modalidades da mesma fôrça, manifestações da mesma energia, consumida num serviço socialmente útil. Mas a Constituição cortou pela raiz a inutilidade de qualquer pretensão de pedante ou de imbecil a tal respeito, e assim prescreveu no parág. único do nº XVII do art. 157:

“Não se admitirá distinção entre o trabalho manual ou técnico e o trabalho intelectual, nem entre os profissionais respectivos, no que concerne aos direitos, garantias e benefícios”.

E a própria Consolidação das Leis do Trabalho estabelece no art. 2°:

“Considera-se empregador a emprêsa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços”.

É, portanto, o dono de colégio um empregador.

E o art. 3º diz:

“Considera-se empregado tôda pessoa física que prestar serviço de natureza não eventual a empregador, sob a dependência dêste e mediante salário.

Parág. único. Não haverá distinções relativas à espécie de emprêgo e à condição do trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual“.

É portanto, o professor de colégio um empregado.

Se tudo isso assim é, dúvida não pode haver que o dissídio entre professôres e proprietários de colégios é um dissídio entre “empregados e empregadores”.

E se assim é, a competência de julgar êsse dissídio é privativa da Justiça do Trabalho, em face do art. 123 da Constituição.

Essa a solução que fatalmente se imporia, ante um texto legal que vedasse à Justiça do Trabalho conhecer do dissídio coletivo, que é objeto da consulta. Mas o texto de lei a que se refere a consulta não chega a tamanho despautério.

Ei-lo na sua integridade:

“Art. 323. Não será permitido o funcionamento do estabelecimento particular de ensino que não remunere condignamente os seus professôres, ou não, lhes pague pontualmente a remuneração de cada mês.

Parág. único. Compete ao Ministério da Educação e Saúde fixar os critérios para a determinação da condigna remuneração devida aos professôres, bem como assegurar a execução do preceito estabelecido no presente artigo”.

Há duas interpretações ou explicações que não poderiam ser dadas ao parág. único do art. 323:

1ª, a que vedasse à Justiça do Trabalho conhecer de um dissídio entre empregados e empregadores, porque isso violaria o texto expresso do art. 133 da Constituição, que atribuiu a essa Justiça “julgar os dissídios” dessa natureza, exceto “os relativos a acidentes do trabalho”; 2ª, a que proibisse aos professôres suscitarem dissídios coletivos, mesmo contra “os critérios fixados” pelo Ministério da Educação, porque seria derrogar por um texto anterior à Constituição o mandamento peremptório desta, que prescreve que “não se admitirá distinção entre o trabalho manual ou técnico e o trabalho intelectual, nem entre os profissionais respectivos no que concerne a direitos, garantias e benefícios”.

Ora, um dos direitos, um dos benefícios, uma das garantias de todo trabalhador manual e de todos os trabalhadores intelectuais é o dissídio coletivo.

Logo, um decreto-lei não pode ter validade, contra a Constituição, se de fato admite uma distinção entre trabalhadores, para privar os de uma certa profissão do direito ao dissídio coletivo, porque o ministro da Educação lhes fixa, sem recurso, a remuneração, que em seu arbítrio julgar “condigna”.

Não se poderia conceber violação mais brutal de garantia constitucional do que essa distinção, arbitràriamente imposta por ato administrativo.

Mas a verdade é que o art. 323 e seu parágrafo não vedam à Justiça do Trabalho o conhecimento de nenhum dissídio, nem tampouco proíbem aos professôres suscitá-lo.

O que o artigo enuncia é um “preceito” de moralidade, decência e justiça a que o parágrafo procura dar eficiência, conferindo ao Ministério da Educação a competência – que de outro modo não teria – de fixar “os critérios” para uma remuneração condigna.

Nada mais, nada menos.

É uma providência útil, porque evita atritos entre professôres e colégios e a êstes dá dignidade, pela maneira “condigna” por que remunera seus professôres.

Sem isso, tais colégios não funcionam.

Por outro lado, a posição de ministro da Educação dá-lhe autoridade para que empregados e empregadores se submetam a seus “critérios”. De tudo isso a utilidade da medida legal.

Mas bem pode ser que os “critérios” não sejam certos ou justos. Bem pode ser que o ministro não os fixe. Em casos tais, não estão os professôres impedidos de suscitar o dissídio coletivo. A lei não lhes veda êsse direito. Se vedasse, teria violado uma garantia que a Constituição lhes assegura e a vedação seria nula.

Mas tanto a lei não vedou que a própria Consolidação, no art. 7º, ao enumerar, nas letras a, b, c, d, e e, os trabalhadores aos quais não “se aplicam os artigos” dela constantes, não incluiu os professôres.

Ao contrário: o capítulo I do título III, onde se inclui a seção XII, da qual faz parte o art. 323 e seu parágrafo, dispõe sôbre duração e condições do trabalho dos bancários, empregados de telefone, telégrafo submarino, radiotelegrafia, músicos profissionais, operadores cinematográficos, ferroviários, marítimos, empregados de frigoríficos, estivadores, empregados de minas de subsolo, jornalistas, professôres e químicos”.

Mas a nenhum dêles veda ou restringe o direito de suscitar dissídio coletivo.

A lei, portanto, isto é, a própria Consolidação, e o seu art. 323 e seu parágrafo, autorizam o suscitamento do dissídio que é o objeto da consulta.

Essa a interpretação jurídica, essa a aplicação legítima do parág. único, acima transcrito.

Adota o parágrafo uma providência administrativa para harmonizar professôres e colégios, e dar a ambos uma situação “condigna”. Mas isso não impede em absoluto as divergências de caráter econômico.

Se elas surgem, se os dissídios se levantam, cabe à Justiça do Trabalho dirimir êsses conflitos econômicos entre empregados e empregadores.

Essa, sobretudo essa, de árbitro entre dissídios econômicos, a grande função da Justiça do Trabalho. Sua função suprema é dar uma decisão jurídica, rápida e justa a tais conflitos, para cuja solução a justiça comum é lenta, tardígrada e não raro desaparelhada de conhecimentos técnicos.

Sou, portanto, de parecer que o dissídio foi legalmente suscitado e que a Justiça do Trabalho é, dentro da Constituição, o órgão único com a competência de julgá-lo.

E é de seu estrito dever tal julgamento.

João Mangabeira, advogado no Distrito Federal.

________________

Nota:

* N. 

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